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Mestre em Arquitetura e Urbanismo e Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo da UFRN

No período de 2007 a 2013, a Matriz de Responsabilidades (MR) do Governo Federal definiu diversos projetos para a cidade-sede do Natal, boa parte deles relacionados à adequação de vias e de construção de novas estruturas de suporte ao transporte – viário, portuário e aeroportuário. Ao todo, estavam previstas 16 (dezesseis) obras para Natal, sendo 11 (onze) sob a respon- sabilidade da Prefeitura do Natal e as demais pelo Governo do Estado do Rio Grande do Norte. Entretanto, tais obras sofreram diversos atrasos decorrentes de dificuldades na gestão dos projetos, especialmente com as licitações (mesmo utilizando o Regime Diferenciado de Contratações – RDC), a desapropriação de terrenos e a obtenção de condições legais mínimas para financiamentos.

As alterações na MR seguiram um contexto político-ins- titucional ligado aos interesses da pactuação entre o Governo Federal, os governos locais (municipal e estadual) e a FIFA, mesmo que esta última atue fora do quadro legal da Matriz. Ainda em 2010, ao assinarem os documentos da MR, o Ministério do Esporte passou a acordar com os governos locais as ações necessárias para viabilizar a Copa das Confederações (realizada em junho de 2013) e a Copa do Mundo 2014. A MR define para

os governos locais as responsabilidades e a origem dos recursos necessários para a construção de obras de mobilidade urbana, dos estádios de futebol, melhorias no entorno dos aeroportos e acessibilidade aos terminais turísticos. Ao governo Federal coube implementar obras em portos e aeroportos (ampliação ou construção) nas doze cidades-sede. Em relação à FIFA, ressalta- se que os governos locais também se obriguem a atender as exigências dessa organização assim como do Comitê Organizador Local (Cláusula Quarta, inciso XI).

A Matriz foi atualizada ao ritmo dos novos prazos e recursos dos governos estaduais e municipais, inserindo ou retirando obras, restando ao final (versão de dezembro de 2014) o compromisso de executar sete, sendo que destas apenas quatro estavam presentes na MR original, desde o anúncio de Natal como cidade-sede, sendo elas, o 1) Aeroporto de São Gonçalo do Amarante; 2) o Terminal Marítimo de Passageiros; 3) o prolon- gamento da Av. Omar O’Grady; e, 4) o acesso viário ao Aeroporto Internacional de São Gonçalo do Amarante. Nesse contexto, as obras integrantes na MR possuíram prioridade de execução e, por isso, contaram com recursos garantidos, não passíveis de contingenciamento. Além disso, os projetos e as ações previstas para o megaevento Copa do Mundo 2014 poderiam ser licitadas por meio do Regime Diferenciado de Contratações (Lei Federal nº 12.462, 04 de agosto de 2011), reduzindo o tempo e os trâmites burocráticos, pois a Lei Federal nº 8.666, 21 de junho de 1993, não precisaria ser atendida no todo.

A busca por maior “flexibilidade” na execução dos pro- jetos parte do princípio de que as obras ligadas ao megaevento são estratégicas e não podem ser compreendidas no padrão convencional de contratação, exigindo menor dependência do controle estatal na viabilização das ações, conforme especificada na Lei nº 8.666/93, e maior capacidade de ajustes contratuais em curto prazo, ajustes estes previamente definidos com as empresas privadas (construtoras, basicamente). Aos governos

locais coube acompanhar os cronogramas e mitigar qualquer obstáculo à plena execução das obras – um modelo que colo- cou os órgãos de controle e regulação urbanas (secretarias municipais e estaduais) em dependência direta da capacidade da articulação intergovernamental do Comitê Organizador Local com as empresas contratadas. Um complexo esquema que reduz – ou afasta por completo – a capacidade de participação comunitária nos processos decisórios.

Em Natal os recursos previstos (Tabela 1) alcançam R$ 1,54 bilhão, sendo que destes, R$ 444 milhões estão destinados para obras de mobilidade urbana (28%), R$ 400 milhões para cons- trução do estádio Arena das Dunas (25%), R$ 572 milhões para o novo Aeroporto Internacional em São Gonçalo do Amarante (37%), Porto de Natal com R$ 79 milhões (5%) e 19,2 milhões para ações em turismo (1,3%). Os recursos provenientes do governo Federal (transferência e empréstimos) perfazem R$ 1,0 bilhão ou 65% do total de recursos da MR, contra 10% dos governos locais e 26% da iniciativa privada, sendo esta última exclusivamente envolvida na concessão do terminal de passageiros do novo Aeroporto de São Gonçalo do Amarante (R$ 375 milhões).

TABELA 1 – Natal: Investimentos públicos e privados

na Matriz de Responsabilidades (em R$ milhões)

Projeto Total Finan- ciamento Federal Investi- mento Federal Investi- mento Governo Local Investi- mento Inicia- tiva Pri- vada Construção do estádio Arena das Dunas 400 396,6 0 3,4 0

Projeto Total Finan- ciamento Federal Investi- mento Federal Investi- mento Governo Local Investi- mento Inicia- tiva Pri- vada Acesso ao Novo Aeroporto de São Gonçalo do Amarante 73,1 12,1 0 61 0 Corredor Estruturante – Zona Norte / Estádio Arena das Dunas 370,95 293,0 0 78,0 0 Aeroporto São Gonçalo do Ama- rante - Pistas e Pátio 189,2 0 189,2 0 0 Aeroporto São Gonçalo do Amarante – Concessão 383,4 0 8,0 0 375,4 Terminal Marítimo de Natal 79,8 0 79,8 0 0 Ações em Turismo 19,24 0 17,58 1,66 0 Obras Com- plementares 30,7 0 0 30,7 0 Total 1.546,39 701,70 294,58 174,76 375,4 Total (%) 100 45,38 19,05 11,30 24,28

Fonte: elaboração própria com dados da Matriz de Responsabilidades (versão dezembro de 2014). Portal da Copa 2014. Disponível em: http:// www.copa2014.gov.br/pt-br

Na versão da MR de setembro de 2013 ainda estava previsto um total de R$ 28 milhões para obras de mobilidade na Avenida Prudente de Morais, ligando o município de Parnamirim à Natal, criando assim um novo eixo de penetração. Entretanto, na versão de dezembro de 2014 esta obra foi excluída, por alteração de contrato, que passou a ser financiada com outros recursos. Mesmo assim, apesar de terem sido iniciadas as intervenções na área, a obra não foi concluída no prazo e sua finalização é incerta até o momento, seja por problemas no licenciamento ambiental ou na desapropriação de terrenos (D’AGOSTINO, 2013). Outro projeto retirado da MR foi o de reestruturação da Avenida Engenheiro Roberto Freire, ainda em dezembro de 2012, e sequer começou a ser construído – por diversos problemas – até final de 2014.

Ademais, o total de recursos para as obras mobili- dade urbana ficou restrito a construção do trecho-corredor estruturante do Aeroporto Internacional/Região Norte da cidade/ Estádio Arena das Dunas (em seu entorno) e ao acesso até o Aeroporto Internacional em São Gonçalo do Amarante. Entretanto, apesar dos investimentos, os responsáveis pela execução das obras concluíram (até maio de 2014) apenas o acesso ao Aeroporto Internacional em São Gonçalo do Amarante – município contíguo a Natal.

Refletindo, a partir de Carlos Vainer, Fabrício Oliveira e Pedro Junior (2012), projetos desse tipo possuem potencial de causar rupturas nos espaços físico e social, em variadas dimensões e colaboram para a consolidação de mudanças na dinâmica socioespacial - ou reconfigurações escalares e efeitos de desenvolvimento desigual na escala local. Tais características negativas advém da forma de sua implementação e da pouca consideração ao tecido urbano, ambiental e social preexistente. Os efeitos desse impacto, por vezes, são sentidos antes mesmo das obras começarem – pelos processos de retirada da população residente, por exemplo. Portanto, a seguir, relataremos as

características e os aspectos relevantes das principais obras com impacto no sistema de mobilidade urbana de Natal, que estiveram presentes na Matriz de Responsabilidades entre os anos de 2011 a 2014.

Terminal de Passageiros do Aeroporto em