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LISTA DE PROCEDIMENTOS ÉTICOS FIRMADOS PELA HISTÓRIA DO JORNALISMO

24 As megafusões midiáticas e sua repercussão nos princípios deontológicos profissionais e

1.3.5 Enquadramento e análise de conteúdo

O modelo metodológico adotado nesta dissertação utiliza métodos complementares: A análise de enquadramento (Frame Analysis) e a técnica da pesquisa qualitativa, a Análise de Conteúdo (AC). As opções metodológicas são ferramentas condutoras, municiam o estudioso na consecução de encontrar as respostas para os questionamentos da pesquisa, quais sejam os objetivos, o problema de pesquisa e as categorias.

Enquadramentos da mídia

Os estudos de análise de enquadramento (Frame Analysis) têm origem em correntes da psicologia cognitiva e na sociologia de Erving Goffman. Definidos, nesse aspecto, como quadros gerais que são “[...] acionados pelas pessoas para definir situações e, dar sentido a acontecimentos” assim, organizar a experiência pessoal e social (GOFFMAN, 1974 apud MAIA, 2009, p. 306).

92 Pode-se citar como lugares de constrangimento por deslizes éticos no campo jornalístico, o ObjEthos e o

Considerando que as notícias não promovem apenas os fatos na cobertura de debates políticos, conforme Gross e Brewer (2007), os jornalistas podem usar a estrutura/frame de substância ou de conflito. O primeiro enfoca as implicações das propostas políticas com os valores e interesses partilhados. O outro focaliza as estratégias e táticas dos lados concorrentes em um debate político (por exemplo, manobras parlamentares, negociações), bem como as implicações da política de resultados para obter vantagens políticas. Os estudiosos compreendem que os jornalistas algumas vezes aplicam frames de substância (expõem detalhes das propostas políticas, seus prós e contras etc.). Entretanto, a prática mais comum no jornalismo político contemporâneo é o que gira em torno de conflitos.

Pesquisador influente sobre o tema, Robert Entman (1993, p. 52, tradução nossa), assinalou o frame como a promoção de uma “definição particular de um problema, uma interpretação causal, avaliação moral e/ou uma recomendação de tratamento para o item descrito”, referindo-se aos quadros narrativos criados para os temas agendados. Assim, o

frame refere-se a uma ferramenta utilizada para representar um tipo específico de cobertura

midiática, a exemplo, dos enquadramentos citados acima de substância e conflito ou ainda outros como os identificados por Semetko e Valkenburg (2000), atribuição de responsabilidade (responsability frame), moralidade (morality frame), interesse humano (human interest frame) e consequências econômicas (economic consequences frame).

Entman (1993) também propõe quatro funções para o frame que são caminhos para identificar os quadros numa reportagem: definem problemas (políticos ou econômicos, por exemplo, geralmente medidos em termos de valores culturais comuns), diagnosticam as causas (atores que criam os problemas), fazem julgamentos morais (positivo ou negativo e seus efeitos) e sugerem soluções; além disso, ainda podem atuar politicamente.

Para o autor, os quadros têm pelo menos quatro locais no processo de comunicação: o comunicador, o texto, o receptor e a cultura. Os comunicadores fazem o julgamento de quadros conscientes ou inconscientes das palavras escolhidas, guiadas por imagens que organizam os seus sistemas de crença.

Considera-se que uma seleção estabelece-se como um exercício de inclusão e exclusão de fatos, apreciações e juízos de valor. Ainda conforme Entman (1993), enquadramentos constituem propriedades específicas da narrativa noticiosa, as quais encorajam percepções e pensamentos sobre eventos e compreensões particulares. A seleção de notícias concretiza-se pela presença ou ausência de palavras-chave, metáforas, expressões, ironias, imagens visuais, insinuações, símbolos, conceitos, imagens estereotipadas, sugestões da narrativa noticiosa,

fontes de informação etc. O enquadramento define a realidade, dizendo de outra forma, as visões dos jornalistas ou os interesses das empresas de comunicação e influenciam as escolhas, a seleção, exclusão e produção das notícias.

Maia (2009) refere-se ao compartilhamento da cultura, à presença de traços intersubjetivos como juízos de valor nas coberturas jornalísticas. Seguindo o mesmo raciocínio, Hackett (1993, p. 121) opina que um enquadramento, necessariamente, não é um processo consciente por parte dos jornalistas; afirma que pode ser o resultado da “absorção inconsciente de pressuposições acerca do mundo social” no qual a notícia tem de ser inserida e compreendida pelo público pretendido. Argumenta ainda que a notícia e as ideologias sociais dominantes estão integralmente ligadas.

Hackett (1993, p. 121) replica Hall (1982, p. 72) quando defende que os relatos podem ser ideológicos, “não por causa da parcialidade ou distorções manifestadas dos seus conteúdos superficiais, mas porque são produzidos a partir de uma limitada matriz ideológica”. Para Hall (1993, p. 121) tal matriz trata-se de um conjunto de regras e conceitos destinado a dar sentido ao mundo que se encontra sistematicamente limitado pelo seu contexto social e histórico. Constitui-se numa “estrutura profunda” que é ativada pelos jornalistas, conscientes ou não, “e sem levar em conta as suas intenções deliberadas de iludir ou manipular”. Um dos fatores mais importantes dessa estrutura regente da produção dos noticiários são os enquadramentos.

Salientar trechos ou enquadrar um determinado acontecimento jornalístico faz parte de um jogo de interesses que permeiam a notícia enquanto produto de consumo, lembra Cremilda Medina (1988). Compreende que, com uma análise apurada, sempre será possível detectar tendências de angulação da empresa na codificação do jornalismo informativo, seja na seleção das pautas, na formulação do código linguístico e visual, na orientação dos editores aos repórteres, ou na intenção declarada dos redatores de “fecharem” as páginas de acordo com a política jornalística da empresa, por exemplo (MEDINA, 1988, p. 74).

Teoricamente, há uma variação dos quadros, conforme Colling (2001), enquanto Entman (1993) os observa na visão dos meios de comunicação (media frame), Goffmann (1975) os analisa do ponto de vista da audiência (thought frame ou individual frame).

O primeiro refere-se aos recursos simbólicos verbais e visuais: palavras, imagens e estilos de apresentação que um falante usa quando trata a informação sobre um tema/evento para uma audiência, ou seja, o que os jornalistas ou outros agentes midiáticos usam para organizar a informação em seus textos (CHONG; DRUCKMAN, 2007). Segundo, um

enquadramento no pensamento refere-se ao entendimento cognitivo individual de uma dada situação.

Gaye Tuchman (1978) observa as notícias como janelas abertas para o mundo que através de seus enquadramentos oferecem às pessoas conhecimento sobre si mesmas e sobre os outros, sobre seus líderes e porta-vozes, instituições e outros para atribuição de sentido. Ela define as notícias como “estórias” e estas como frames. Tuchman (1993) compreende que ser repórter (lida com fatos) e contador de estórias (produz contos) não são atividades antiéticas; a notícia como “estória” não a rebaixa ou não a torna fictícia. A pesquisadora foi a primeira que se deteve na aplicação do conceito de enquadramento no campo da comunicação.

Pesquisa Qualitativa: Análise de Conteúdo

A outra opção que vai direcionar este estudo está no âmbito das técnicas qualitativas como já foi citada, a Análise de Conteúdo (AC). Creswell (2010) elenca algumas características deste tipo de pesquisa, entre elas a multiplicidade de dados examinados e organizados em categorias ou temas que cobrem todas as fontes dos dados. A “lente teórica” ajuda os pesquisadores a enxergar detalhes em seus estudos, a exemplo da organização em torno da identificação do contexto social, político e histórico do problema tal como ocorre nesta dissertação.

Outra característica é a forma de investigação interpretativa que permite esclarecer as variadas visões que podem emergir do problema. Na coleta de dados pratica-se a “seleção intencional” (CRESWELL, 2010, p. 212) dos locais (as revistas semanais Carta Capital e

Veja), dos indivíduos participantes (os jornalistas que nelas escrevem) e dos eventos (as

coberturas jornalísticas sobre o escândalo político).

Ainda sobre os dados é pertinente dizer que eles “reconstroem as maneiras pelas quais a realidade social é representada por um grupo social” (BAUER; GASKELL; ALLUM , 2008, p. 22). As revistas semanais estudadas representam, logo, um indicador da visão de mundo de quem as lê, colocando-as numa categoria dada.

Além das características das pesquisas qualitativas existem suas estratégias de investigação, conforme Creswell (2010) elas se concentram na coleta, análise e redação dos dados e fluem durante todo o processo.

A AC permite uma descrição sistemática, objetiva, quantitativa e qualitativa do conteúdo; por seu intermédio pode-se compreender melhor um texto com a extração dos

momentos mais importantes. A técnica qualitativa constitui-se num tratamento analítico de dados, voltada para a investigação jornalística, definida como:

Método de pesquisa que recolhe e analisa textos, sons, símbolos e imagens impressas, gravadas ou veiculadas em forma eletrônica ou digital encontrados na mídia a partir de uma amostra aleatória ou não dos objetos estudados com o objetivo de fazer inferências sobre seus conteúdos e formatos a partir de seu enquadramento em categorias previamente testadas, mutuamente exclusivas e passíveis de replicação (HERSCOVITZ, 2005, p. 4).

Para Heloisa Herscovitz (2005, p. 4), os pesquisadores que utilizam o método trabalham como detetives em busca de pistas que desvendem os significados aparentes/implícitos dos signos e das narrativas jornalísticas. O objetivo é expor “tendências, conflitos, interesses, ambigüidades ou ideologias presentes nos materiais examinados”.

É possível, através da análise de conteúdo reconstruir valores atitudes, opiniões, preconceitos e estereótipos e compará-los. “Em outras palavras, a AC é pesquisa de opinião pública com outros meios” já que se avalia um corpus de texto como a representação e expressão de uma comunidade que escreve; neste caso, considera-se tal corpus como uma realidade, daí a técnica ser avaliada como uma construção social (BAUER, 2008, p. 192-203). A tendência atual da AC favorece a integração entre as opções quantitativa e qualitativa, de modo que os conteúdos manifesto (visível) e latente (oculto, subtendido) sejam incluídos em um mesmo estudo para que se compreenda os significados aparente e implícito do texto, “o contexto onde ele ocorre, o meio de comunicação que o produz e o público ao qual ele é dirigido” (HERSCOVITZ, 2005, p. 3-4).

A técnica de pesquisa também permite à construção de índices, um sinal que indica outro fenômeno, assim a forma como os jornalistas cobrem escândalos políticos podem nos indicar “valores societais”, ou seja, a narrativa dá uma medida da posição de como a população brasileira encara os preceitos éticos (BAUER, 2008). Guerra (2012, p. 62, grifos do autor), autora portuguesa, também opina sobre o tema,

A análise de conteúdo tem uma dimensão descritiva que visa dar conta do que nos foi narrado e uma dimensão interpretativa que decorre das interrogações dos analistas face a um objeto de estudo, com recurso a um sistema de conceitos teórico- analíticos cuja articulação permite formular as regras de inferência.

Vai-se utilizar, pois, a fórmula normal de investigação que é o confronto entre um quadro de referência do pesquisador e o material empírico que foi recolhido para estudo.

Começamos então, no segundo capítulo, com a investigação do contexto político que propiciou a explosão do escândalo e um passeio ao universo das revistas analisadas.

2 CONTEXTUALIZAÇÃO

Para melhor situar o leitor, o segundo capítulo apresenta, na primeira seção, o contexto de onde eclodiu o colapso ético-político governamental. Quando, onde e como explodiu o escândalo político midiático; na segunda, com duas subseções, contém o jornalismo de revista e um panorama com as qualificações e história inerentes às duas plataformas impressas pesquisadas neste trabalho, as questões ideológicas, propostas editoriais, a posição do veículo no mercado brasileiro de revistas e o perfil dos leitores de cada uma.