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2 “ENQUANTO VIVE UM POETA O HOMEM ESTÁ VIVO”

“Um dia, ao começar a escrever um livro didático sobre literatura, tive que dar uma definição de poesia e embatuquei. Eu, que desde os dez anos de idade faço versos; eu, que tantas vezes sentira a poesia a passar em mim como uma corrente elétrica e afluir aos meus olhos sob a forma de misteriosas lágrimas de alegria: não soube no momento forjar já não digo uma definição racional dessas que, segundo a regra da lógica, devem convir a todo o definido e só ao definido, mas uma definição puramente empírica, artística, literária”. (Manuel Bandeira, 1958)

Em uma perspectiva canônica, a literatura é uma das sete artes tradicionais e contempla a poesia que transmite a realidade sob a perspectiva do autor e a leitura é feita de acordo com a identificação do leitor. A palavra poesia vem do latim poēsis.is, que deriva do conceito grego

poiēsis.eos, que significa ação de fazer algo ou criação. É conhecida como a arte de escrever

em versos, mas também encanto, graça e sentimento do belo. Neste sentido, a poesia é a manifestação da beleza ou da estética através da palavra, seja em versos ou prosas e que não se limita ao gênero literário.

O “Poeta é o doador de sentido” (BOSI, 1977, p.140), que traz em seus versos mais do que palavras: traz significados. A poesia passa a ser uma forma de expressão, um ato de liberdade e um instrumento de justiça. O poeta deixa de ser aquele de nomeia, como afirma Platão, e passa a ter um papel transformador no processo de libertação da sociedade.

O poema está frequentemente vinculado à poesia, mas esta relação não é de exclusividade, pois pode haver poesia em tudo, desde pequenos objetos até grandes tragédias e em diferentes vertentes artísticas além da literatura: música, cinema, teatro, artes plásticas ou fotografia. Pode haver poema sem poesia, sem o desejo de despertar sensações no leitor e pode haver poesia sem o poema, partindo da linguagem como atitude criativa, transfigurando a literatura para uma linguagem de sentimentos.

Mesmo quando aparece escrita, a poesia é oral, aproximando-se muitas vezes da música, como nos antigos hinos e odes. Faustino fala que a criação poética “trata antes de tudo de uma maneira de ser da literatura, ou seja, da arte da palavra, da arte de se exprimir percepções através de palavras, organizando estas em padrões lógicos, musicais e visuais” (FAUSTINO, 1977, p. 60). A interação dos versos entre sons, ritmos e palavras traduz novas descobertas das mensagens. Ela cria imagens a partir da transfiguração da realidade por meio do pensamento, do sentimento, da relação entre emissor e receptor, que será diferente em cada cultura. Leminski

fala sobre esta relação entre quem produz e quem consome a poesia, pois para ele, entender poesia também é ser poeta:

Eu tenho uma teoria particular de que tem de existir tanta poesia no receptor quanto no emissor, certo? Você precisa ser tão poeta para entender o poema quanto para fazê- lo e que só poetas são capazes de entender poesia. Então, você pode ter passado sua vida inteira sem ter feito nenhum verso, nenhuma letra de música, nada! Mas, ao mesmo tempo, você diz assim: - ‘Há 30 anos que eu leio Vinícius de Moraes, João Cabral de Mello Neto, Mário Quintana e aquilo tudo me emociona e, nos meus momentos de crise, eu vou ali e’... – esse cara é poeta. (LEMINSKI, 2014)5

Os significados da poesia são atribuídos de acordo com a interpretação de mundo do receptor. No processo comunicativo a ressignificação cultural pode atribuir diferentes funções e sentidos para músicas, filmes, obras de arte e poesia. Durante o processo criativo a ressignificação atribui novos significados a eventos comuns.

Octavio Paz diz que “o poema não diz o que é e sim o que poderia ser” (PAZ, 1972, p. 38), preenchendo as lacunas, construindo e transfigurando a realidade. Através da linguagem a poesia consegue ultrapassar as normas cultas e práticas, rompendo os limites da língua que é escrita. Já sobre a produção poética como trabalho, Carlos Drummond de Andrade fala:

Entendo que poesia é negócio de grande responsabilidade, e não considero honesto rotular-se de poeta quem apenas verseje por dor-de-cotovelo, falta de dinheiro ou momentânea tomada de contato com as forças líricas do mundo, sem se entregar aos trabalhos cotidianos e secretos da técnica, da leitura, da contemplação e mesmo da ação. Até os poetas se armam, e um poeta desarmado é, mesmo, um ser à mercê de inspirações fáceis, dócil às modas e compromissos. (ANDRADE, 1944, p. 1344).

A poesia enquanto fazer é a essência da análise de Jean-Luc Nancy. Para ele a poesia diz mais o que a poesia quer dizer, é o primeiro fazer. Desta forma, é o acesso de sentido que se constrói conforme se faz a poesia, que antes de ser uma arte específica está em toda arte. Aí pode-se perceber a essência plural da poesia, que se estende a uma pluralidade de aplicações. Nancy afirma que a “poesia é, por essência, mais e outra coisa que a própria poesia. Ou ainda: a própria poesia pode muito bem ser encontrada ali onde sequer há poesia” (NANCY, 2013, p.416), como a pedra do caminho de Drummond virou poema, porém para muitos é motivo de tropeço.

Jean-Luc Nancy perturba a noção clássica que diferencia poema e verso, afirmando que “o poema ou o verso, dá na mesma: o poema é um todo de que cada parte é um poema, ou seja, um “fazer” consumado; e o verso é uma parte de um todo que ainda é um verso, ou seja, uma

virada, uma revirada ou um reverso de sentido”. (NANCY, 2013, p.419) A poesia é comunicação, feita de versos, ou não, comumente abordando emoções no campo afetivo, sensorial ou conceitual, “é também por isso que “poesia” diz mais do que o que “poesia” quer dizer. E mais precisamente – ou melhor, exatamente: “poesia” diz o mais-que-dizer como tal e na medida em que estrutura o dizer”. (NANCY, 2013, p.419).

A resistência da poesia enquanto sentido, conforme o autor, busca reivindicar um papel na articulação das artes. Esta seria a representação da resistência da linguagem à sua infinitude. Portanto, a poesia “não tem exatamente um sentido, mas, antes, o sentido do acesso a um sentido a cada vez ausente e adiado. O sentido de “poesia” é um sentido sempre por fazer” (NANCY, 2013, p.416), como se a poesia fosse o sentido do que é apresentado como indefinível.

Este campo infinito de possibilidades da poesia nas artes abre espaço para diversas discussões. A poesia continua buscando sentidos em diferentes esferas, como no caso da literatura feminina, mostrando que a alteridade assume diversas posições e sentidos no campo literário e demais categorias artísticas, conforme apresentado a seguir. O envolvimento das mulheres no fazer artístico é significante, porém este espaço só foi conquistado após ultrapassar as barreiras impostas pela sociedade patriarcal, enfrentando desafios de superação relacionados ao gênero.

2.1. “COSTURO O INFINITO NO PEITO”

A arte-historiadora Linda Nochlin, em seu artigo “Por que não houve grandes artistas mulheres?” questiona o motivo da ausência de grandes mulheres artistas. Ela diz que:

Nunca houve grandes mulheres artistas, até onde sabemos, apesar de haver algumas interessantes e muito boas que ainda não foram suficientemente investigadas ou apreciadas, como não houve também nenhum grande pianista de jazz lituano ou um grande tenista esquimó, e não importa o quanto queríamos que tivesse existido. (NOCHLIN, 2016, p.5)

Isso ocorre porque geralmente a situação da mulher, e por consequente, da artista, na sociedade é diferente da do homem. Assim, a arte produzida por um grupo de mulheres “determinado a impulsionar uma consciência de grupo sobre a experiência feminina deve ser identificado como arte feminista – ou feminina”. (NOCHLIN, 2016, p.9)

Nochlin afirma ainda que a culpa não está nos astros, nos hormônios, ou nos nossos ciclos menstruais, mas em “nossas instituições e em nossa educação, entendida como tudo o que acontece no momento que entramos nesse mundo cheio de significados, símbolos, signos e sinais” (NOCHLIN, 2016, p.9) e aponta John Stuart Mill que há mais de um século assegurou: “[...] tudo que é costumeiro parece natural. Sendo a sujeição das mulheres aos homens um costume universal, qualquer desvio desta norma naturalmente parece antinatural”. (NOCHLIN, 2016, p.12)

Historicamente as mulheres estiveram à sombra dos homens, inclusive nos aspectos artísticos e culturais. Porém, mesmo sob estas circunstâncias, vêm contribuindo para a literatura há muito tempo. O primeiro romance da história foi escrito por uma mulher: a japonesa Murasaki Shikibu escreveu o livro A história de Genji no século XI (entre 1001 e 1005)6. Assim como Murasaki Shikibu, muitas outras escritoras ganharam e continuam ganhando destaque na literatura mundial, como Jane Austen, Virginia Woolf, Sylvia Plath, Agatha Christie, Emily Dickinson, Simone de Beauvoir, Clarice Lispector, Cecília Meireles entre outras. “Apesar de um trânsito restrito, de uma linguagem bastante adequada ao que esperava do universo feminino, o século XIX é crivado de mulheres que escrevem muito” (HOLLANDA; HERKENHOFF, 2006, p. 46) mas que não tiveram o devido destaque.

A herança europeia, seja pela migração ou por valores políticos e culturais, passa a influenciar o Brasil, que lentamente estabelece mudanças de valores. As mulhes que tiveram acesso à escola, filhas da alta burguesia, já não aceitavam com tanta facilidade os modelos de educação. Até então o detentor do conhecimento e do discurso era o homem branco, de classe média alta, neste sentido todo e qualquer outro grupo era silenciado. Assim, cabia à estas mulheres as manifestações contrárias à sociedade falocêntrica.

A literatura passa neste momento a representar as vozes das mulheres, que até então era marginalizada. O cânone literário masculino não possibilitava esta representação e perspectiva social, pois se tratava de um terreno sexista retratado apenas por homens. Até o século XIX as mulheres brasileiras, em sua maioria, viviam sem ter acesso à cultura e isso era “natural”. O direito básico de ler e escrever era reservado aos homens e somente com a Lei de 15 de outubro de 1827 - que mandava criar escolas de primeiras letras em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos do império – que houve autorização para abertura de escolas públicas femininas.

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As mulheres nesta época eram criadas para serem boas mães, donas de casa e obedecer ao marido, pois a sociedade patriarcal imperava e as mulheres não precisavam de estudos, inteligência ou cultura. Para as que quisessem estudar, segundo a pesquisadora Constância Lima Duarte, “até então as opções eram uns poucos conventos, que guardavam as meninas para o casamento, raras escolas particulares nas casas das professoras, ou o ensino individualizado, todos se ocupando apenas com as prendas domésticas” (DUARTE, 2003, p.153). Duarte afirma ainda que foram essas as primeiras e poucas mulheres que tiveram uma educação diferenciada, que tomaram para si a tarefa de estender o conhecimento às demais mulheres, abriram escolas, publicaram livros e enfrentaram a opinião de quem dizia que mulher não precisava ler nem escrever. Neste sentido, Zahidé Muzart (2003)aponta que:

[...] no século XIX, as mulheres que escreveram, que desejaram viver da pena, que desejaram ter uma profissão de escritoras, eram feministas, pois só o desejo de sair do fechamento doméstico já indicava uma cabeça pensante e um desejo de subversão. E eram ligadas à literatura. Então, na origem, a literatura feminina no Brasil esteve ligada sempre a um feminismo incipiente. (MUZART, 2003, p.267).

As mulheres iniciavam uma luta para conquistar espaço em diversos setores, inclusive na literatura. A potiguar Nísia Floresta Brasileira Augusta (pseudônimo de Dionísia Gonçalves Pinto) foi uma educadora, escritora e poeta brasileira que rompeu os limites entre os espaços públicos e privados publicando textos em jornais da chamada "grande" imprensa. Seu primeiro livro, “intitulado Direitos das mulheres e injustiça dos homens, de 1832, é também o primeiro no Brasil a tratar do direito das mulheres à instrução e ao trabalho, e a exigir que elas fossem consideradas inteligentes e merecedoras de respeito” (DUARTE, 2003, p.153). Anos depois, em Porto Alegre, a jovem escritora Ana Eurídice Eufrosina Barandas publicou o livro: A

philosopha por amor (1845) com contos, versos e uma peça teatral e foi considerada a primeira

cronista do país. (DUARTE, 2003, p.155)

Duarte assinala ainda que “apenas em meados do século XIX começam a surgir os primeiros jornais dirigidos por mulheres. Os críticos chegam junto, considerando-a desde sempre uma imprensa secundária, inconsistente e supérflua, pois destinava-se ao segundo sexo”. (DUARTE, 2003, p.155) E assim seguiu até o início do século XX, quando houve uma movimentação organizada por mulheres “que clamam alto pelo direito ao voto, ao curso superior e à ampliação do campo de trabalho, pois queriam não apenas ser professoras, mas também trabalhar no comércio, nas repartições, nos hospitais e indústrias” (DUARTE, 2003, p.160).

Embora haja forte engajamento das mulheres literatura do século XIX, não há grandes nomes de escritoras, conforme Heloisa Buarque de Hollanda e Paulo Herkenhoff:

Isso é razoavelmente compreensível, quando pensamos na condição socialmente muito limitada imposta às mulheres daquela época e na experiência muito disciplinar da performance do que se chamou “maternidade republicana”, isto é, os deveres cívicos da maternidade. Menos compreensível é o gargalo que o Modernismo trouxe para a literatura feminina. (HOLLANDA; HERKENHOFF, 2006, p. 50)

Durante muitos séculos a mulher ocupou o papel de musa inspiradora nas poesias, enquanto as vozes expressivas eram as masculinas. Sempre bela, recatada e do lar. Com poucas exceções, como Safo, as mulheres foram silenciadas. Porém, mesmo sem espaço, foram deixando de ser apenas o objeto da poesia. Eram mulheres em um universo de homens. Podemos citar a dupla jornada de Pagu e Ana Cristina César, que foram revolucionárias e ainda assim musas inspiradoras.

Em 1915 José Veríssimo escreveu a História da Literatura Brasileira e nela não havia espaço para mulheres. Após muitas lutas e mudanças o trabalho das mulheres está longe de estar concluído. Na Semana de 22 pouco espaço dedica à literatura feminina. Cecília Meireles que já havia publicado Espectros (1919) e teve forte influência modernista, ficou de fora da Semana de Arte Moderna. No livro História Concisa da Literatura Brasileira (1994), o autor Alfredo Bosi menciona poucas poetas, entre elas Francisca Júlia, Gilka Machado, Auta de Sousa, Narcisa Amália e Cecília Meireles. Destas, somente Francisca Júlia ganhou biografia e algum destaque.

Italo Moriconi organizou o livro Os cem melhores poemas brasileiros do século, publicado pela editora Objetiva, em 2001, e nele selecionou os que considerava os 100 melhores poemas brasileiros do século XX. Destes, apenas 19 foram escritos por mulheres e o restante por homens. As autoras também estão em menor proporção, sendo 12, enquanto havia poemas de 47 homens. Entre os autores com poemas repetidos no livro Carlos Drummond de Andrade lidera com nove poemas, seguido de Manuel Bandeira com seis, João Cabral de Melo Neto com cinco, Murilo Mendes e Vinicius de Moraes ambos com quatro poemas publicados. Já entre as escritoras, Cecília Meireles se iguala aos homens com seis poemas publicados. As autoras com poemas repetidos são Adélia Prado, Ana Cristina Cesar e Hilda Hilst, com dois poemas publicados cada uma. As demais escritoras tiveram apenas um poema no livro.

Na Festa Literária Internacional de Paraty – FLIP comemorou-se o fato de ter uma mulher homenageada em 2018. A FLIP acontece anualmente e, desde a criação em 2003, esta foi a terceira mulher homenageada: Clarice Lispector em 2005, Ana Cristina César em 2016 e

Hilda Hilst em 20187. Estes dados reforçam que o cânone literário brasileiro é restrito aos

homens.

Este apagamento na literatura é percebido e há resistência. Na década de 1960, segundo a historiadora Joan Scott (1992, p. 64), “[...] as ativistas feministas reivindicavam uma história que estabelecesse heroínas, prova da atuação das mulheres, e também explicações sobre a opressão e inspiração para a ação”. A Professora Andréa Senra Coutinho aponta que a revisão da condição da mulher é motivada pelos crescentes estudos sobre o movimento feminista e o início da luta pelos direitos da mulher. Os costumes, a sexualidade, o corpo e as questões de gênero têm se tornado objetos de pesquisa, inclusive na produção artística realizada por mulheres, que:

Passaram, então, a formar um grupo coeso de pensamento e produção, direcionando suas obras para as questões do feminino e do feminismo, produzindo imagens e representações do universo singular da mulher pelo ponto de vista feminino, criando uma arte feita por e a propósito de mulheres. Visto que, até então, de maneira geral, a mulher ocupava o lugar de modelo na obra de arte, daquela a ser representada pelos artistas homens, pronta para ser apreciada e consumida pelo olhar masculino. (COUTINHO, 2007, p.2)

Assim, há a necessidade de mudança nos padrões que reforçam a imagem de submissão da mulher e no enfoque dado à sua representação social e ideológica dentro da produção literária feminina. As mulheres estão cientes do lugar que ocupam, como portadoras de significados sob a perspectiva masculina, pois “se atrevem a levantar críticas, ironizando ou delatando posturas, propondo resistências através de ações e comportamentos onde suas próprias experiências são apresentadas em inúmeras propostas de trabalhos artísticos”. (COUTINHO, 2007)

Nelly Novaes Coelho (1991) afirma que o cenário da literatura feminina no Brasil teve força nas décadas de 30 e 40 com enfoque social e ético. Nos anos seguintes a preocupação era em relação ao rompimento do modelo patriarcal e a partir dos anos 60 se procurava multiplicar o que foi criado anteriormente. A autora afirma que:

Já não há dúvida de que, na base das mudanças que dia a dia alteram o mundo herdado do passado, está a gradativa e crescente mudança dos conceitos que definiam, nos planos social, econômico e político, as figuras da Mulher, da Criança e das chamadas "raças inferiores". Nessa ordem de ideias, insere-se o chamado boom da Literatura Infantil a partir de meados dos anos 70; bem como a tímida produção literária ou crítica da "negritude" (e também a redescoberta da nossa "mitologia indígena"), que se tem manifestado, entre nós. E, principalmente, se compreende a força com que a Literatura Feminina se vem impondo à crítica, como um fenômeno especial a exigir a atenção; mesmo a despeito das muitas vozes (inclusive de muitas escritoras...) que

7 http://flip.org.br/a-flip/homenageados

veem nessa distinção (feminino versus masculino) mais uma discriminação. (COELHO, 1991, p.91-92)

Algumas escritoras ocuparam o espaço literário brasileiro, como Raquel de Queiroz, consagrada como modernista e primeira mulher a ingressar na Academia Brasileira de Letras em 1977, assumindo a cadeira de número 5; Clarice Lispector, uma das escritoras brasileiras mais importantes do século XX; e Nélida Piñon, primeira mulher a ser Presidente da Academia Brasileira de Letras na década seguinte8.

Segundo Duarte (2003), no campo literário, algumas escritoras se posicionavam frente ao governo ditatorial, revelando com coragem suas posições políticas, como Lygia Fagundes Telles e Nélida Piñon, que participaram da redação do Manifesto dos 1000 contra a censura e a favor da democracia no Brasil. Além delas, várias outras escritoras poderiam ser citadas pela reflexão que seus textos e personagens geram nas leitoras, como Clarice Lispector, Sônia Coutinho, Hilda Hilst, Marina Colasanti, Lya Luft, entre outras.

Heloisa Buarque de Hollanda (1990) diz que “A partir do final da década de 70, vários estudos começam a identificar uma “insistente presença da voz feminista” como um dos traços mais salientes da cultura pós-moderna”. Nelly Coelho afirma que a diferença cultural entre homens e mulheres produz sim uma literatura masculina e uma literatura feminina, de acordo com o sistema social e cultural que estabelece diferença entre homens e mulheres. Ela alega que a arte ou a literatura são formas de relações entre homens e suas circunstâncias de vida e que o contexto econômico, histórico ou social do artista ou escritor definirá a natureza da arte produzida.

Não é possível pensarmos a criação artística ou literária, em sua verdade maior, sem pensarmos na Cultura em que ela está imersa. E através dessa perspectiva que, sem dúvida, podemos falar em uma literatura feminina e uma literatura masculina... pois as coordenadas do Sistema Social/Cultural ainda vigente estabelecem fundas diferenças entre o ser homem e o ser mulher. Dessa diferença deriva, evidentemente, certas peculiaridades que podem ser detectadas na criação literária de um e de outro. A grande mudança, que o nosso século trouxe para a vida da mulher, foi evidentemente fator determinante para o surgimento e expansão de uma literatura feminina. (COELHO, 1991, p. 95)

Na poesia as vozes femininas se fazem ouvir a partir dos anos 1960, de acordo com Nelly Coelho, embora apresentando variadas tendências e estilos, processos ou temas, apresentam um traço que se aproxima e identifica como participantes de uma mesma força. “A consciência experimentalista no sentido do reajustamento da linguagem às solicitações dos

novos tempos com impulso dinâmico de integração do ser humano e da poesia no processo

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