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Ensinar o passado aos jovens brasileiros: a nação nas páginas da(s)

No documento A NAÇÃO COMO POSSIBILIDADE: (páginas 65-81)

2. A difusão do passado nacional: a divulgação de uma “história do Brasil” nos

2.1. Ensinar o passado aos jovens brasileiros: a nação nas páginas da(s)

2.1. Ensinar o passado aos jovens brasileiros: a nação nas páginas da(s) História(s) do Brasil.

Uma nova era começou em 18 de julho de 1841, assim como dez anos antes tinha marcado a providência um decênio para o nosso purgatório. Quais serão os futuros do Brasil? Se mau fado nos não persegue mais, como até aqui, podem anunciar- se como muito lisonjeiros de baixo do reinado do segundo Pedro. (ABREU e LIMA, José Ignácio de. Compêndio da História do Brasil. t. II, p. 138. Grifos meus.)

Um laço comum, vínculo de amor fraternal e de identidade de interesses ligou todas as províncias, e formou o vasto império americano, cujo portentoso futuro se anuncia tão brilhante com as seguranças de uma natureza opulentíssima, com as garantias da moralidade e da índole pacífica de seu povo, e com o encanto das instituições livres. (MACEDO, Joaquim

Manuel de. Lições de História do Brasil. vol. II, p. 298. Grifos meus.)103

Futuro! Essa era a questão fundamental para José Ignácio de Abreu e Lima e Joaquim Manuel de Macedo nas páginas de encerramento de seus manuais didáticos. E um futuro recheado de aspectos positivos é o que se pode depreender da análise dos trechos acima, extraídos, respectivamente, de Compêndio da História

do Brasil, do primeiro escritor, e Lições de História o Brasil, do segundo.

Encerrando suas narrações acerca dos episódios por ele reunidos sob o título de História de Brasil, os dois autores fazem questão de assinalar os dias “lisonjeiros” e o caráter “portentoso” da época que, em princípio, começava no momento em que os livros por eles escritos eram fechados pelos seus leitores. E, mais relevante, devemos nos lembrar, é que não se tratava de quaisquer leitores: eram estes, jovens, em idade estudantil, e, particularmente, freqüentadores do Colégio de Pedro II, local onde os dois manuais didáticos acima indicados foram adotados para as aulas destinadas ao ensino da história pátria.

Antes de averiguar, porém, as particularidades oriundas da relação entre os

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Doravante, nesse e nos demais capítulos, as citações, como essas duas, contendo fragmentos tanto do manual didático escrito por Abreu e Lima quanto o de Macedo serão acompanhadas, entre parêntesis, do número do volume pertencente à obra, em algarismo arábico, e do número da página do referido volume, em algarismo romano, como forma de identificar a origem da cada uma delas.

conteúdos veiculados pelos dois textos e os aspectos contextuais marcantes no momento da publicação de cada um deles, é importante notar a existência também de semelhanças muito significativas, tais como a perspectiva dos dois autores acerca de certa “função” da história, como se pode perceber na defesa de Macedo da “história imparcial” (I, p. 31) ou nas considerações de Abreu e Lima sobre a atuação do Marquês de Pombal à frente da administração do Império português, ao afirmar que

os portugueses não perdoaram a este grande político o uso arbitrário, que fizera do poder; mas a história imparcial deve reconhecer, que as suas medidas e projetos tinham por alvo tirar seus compatriotas do abatimento em que se achavam, fazer reviver o Comércio, e animar a indústria nacional. A sua solicitude pelo Brasil foi marcada por melhoramentos, que o tinham levado a um ponto de prosperidade até então desconhecido. (I, p. 241. Grifos meus).

Para os dois letrados, a história deveria ser dotada de imparcialidade, característica muito condizente com uma ação que, no entender de ambos, a mesma deveria promover: a de julgar os fatos do passado, de modo a eliminar da memória interpretações equivocadas sobre um determinado acontecimento, como evidencia Abreu e Lima ao assumir, no fragmento acima, a defesa de Pombal diante dos ataques, a seu ver sem propósito, veiculados pelos portugueses à época e pouco depois do período em que ele foi o principal ministro do rei D. José, em Portugal.

Ou, então, como sugere Macedo, abordando outro tópico da chamada história do Brasil, ao criticar a ação de Calabar no contexto da ocupação holandesa nas terras do nordeste da América portuguesa no século XVII, afirmando que

qualquer que fosse o motivo do ato que praticou Domingos Fernandes Calabar, a história não lhe perdoará jamais o ter combatido contra a sua pátria e seus irmãos, ligando-se indignamente ao estrangeiro invasor. (II, p. 78.)

A defesa da imparcialidade apresenta-se, então, como um recurso discursivo voltado para a veiculação de uma visão sobre os episódios da chamada história do Brasil. História essa que os autores pretendiam construir, tomando-a enquanto ferramenta de difusão, na verdade, daquela que era a sua visão, individual e/ou de grupo, acerca do passado nacional.

tentativa de legitimar uma ou outra versão do passado para que, tornando-a oficial, fosse possível fazer da mesma, veículo de comportamentos compatíveis, no entender dos setores elitistas envolvidos com tal tentativa, com a nacionalidade em construção.

Nesse sentido, nota-se que, ambos, o Compêndio e as Lições, refletiam o desejo de instruir e, como podemos depreender da leitura das citações acima e das muitas páginas de cada um deles, de servir de transmissão de normas de comportamento ao público-leitor desses textos, visto que os muitos episódios narrados – dentre eles a administração pombalina e as invasões holandesas – nesses dois manuais didáticos de história do Brasil são revestidos de todo um esforço qualificativo, em especial das personagens envolvidas.

Veja-se, por exemplo, o caso da narração de Abreu e Lima também dos acontecimentos relacionados ao fim do domínio holandês nas áreas da região nordeste da América portuguesa nos seiscentos. Nela são bastante freqüentes as referências aos constantes atos heróicos da população de Pernambuco, com destaque para o papel desempenhado por aqueles que figuraram na condição de líderes do movimento, como Henrique Dias, descrito, em nota de rodapé, da seguinte forma:

(...) de origem africana e natural de Pernambuco, patenteou durante esta ação uma intrepidez digna de ser posta em paralelo com o que a história refere de mais assombroso. Uma bala lhe atravessa o punho; manda sem demora que lhe façam a amputação da mão para se desembaraçar do aparelho, que impediria seus movimentos, e voando de novo ao combate: “Basta-me uma mão, disse ele, para servir a meu Deus e ao meu rei (...)”. (I, p. 142).

Ou, deslocando o foco individual, percebido na situação do confronto entre os colonos e os holandeses que contou com a participação de Henrique Dias e outras pessoas retratadas com pinceladas de heroísmo, como Felipe Camarão e João Fernandes Vieira, para uma ação em que se destaca o coletivo, tal qual se observa na narração do mesmo autor a respeito dos episódios imediatamente anteriores à independência, como a represália da população – no seu entender já brasileira – ao levante, ocorrido em 11 de janeiro de 1822, de militares portugueses no intuito de ocupar o morro do Castelo em resposta ao anúncio da permanência do regente D. Pedro no Brasil (dia do Fico – 09/01/1822), destacando que

conhecido o movimento, e antes de romper o dia seguinte, o campo de Santa Anna achou-se cheio de gente armada; a maior parte constava de cidadãos, pouco aptos para se arrostarem com os veteranos portugueses, mas eram superiores em número, bem providos de artilharia e dispostos a acabar com a ditadura, que até aí tinha exercido a divisão auxiliadora. (II, pp. 07 – 08).

Enfim, seja sob a forma da ação individual ou enquanto atitudes coletivas

de cidadãos, como gostaria de sublinhar, – evidencia-se, afinal, uma narrativa em que o ensinar significava transmitir noções sobre condutas, tanto as exemplares, quanto as dignas de repúdio, como se percebe na seguinte descrição, agora extraída do texto de Macedo, já que, tratando dos primeiros donatários de capitanias hereditárias no Brasil, esse escritor menciona o caso de Vasco Fernandes Coutinho, quem, segundo ele, teria recebido “cinqüenta léguas do rio Itapemirim ao rio Mucuri” (I, p. 96), local marcado por uma situação em que

as intrigas e a ambição de Duarte de Lemos por um lado, a insubordinação dos fidalgos degradados e a desmoralização dos colonos por outro enfim as hostilidades em que de novo se lançaram os selvagens prognosticavam a ruína da capitania: Vasco Fernandes Coutinho velho, pobre, aleijado, recebendo para viver socorros dos moradores das suas próprias terras, certamente que não tinha mais a força moral necessária para se fazer obedecer (...). (I, p. 98).

A História enquanto modelo, de como agir e do que não fazer; era esta uma das intenções dos indivíduos, como Abreu e Lima e Macedo, imbuídos da escrita de uma história pátria, orientando, é claro, esses comportamentos, retratados sob o invólucro de modelares, pelo eixo do patriotismo e, por conseguinte, pela apreciação de seus vínculos com a nacionalidade que os autores pretendiam difundir.

Algo perceptível em mais um trecho de Lições de História do Brasil, relacionado, nesse caso, ao episódio da expulsão dos holandeses104, com ênfase no resultado, no entender de Macedo, positivo e que termina com a descrição da recompensa aos esforços dos membros mais aguerridos na defesa da região de Pernambuco contra os invasores, sob a forma da apresentação de uma lista de

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Curioso notar como tal acontecimento foi altamente valorizado pelos letrados, como podemos perceber não só com as referências às obras dos dois escritores dos manuais didáticos que, por ora, analiso, mas também pelas considerações de Varnhagen, que serão apresentadas em outra parte desse capítulo, sobre “como se deve entender a nacionalidade na História do Brasil”. Cf. VARNHAGEN, Francisco Adolfo de. "Como se deve entender a nacionalidade na História do Brasil", Anuário do Museu Imperial, Petrópolis, nº 9, 1948.

“prêmios” atribuídos pelo governo português aos mesmos e sobre os quais o autor tece o seguinte comentário:

tais foram os prêmios com que o governo galardoou o patriotismo, a dedicação, a constância, e a heroicidade desses ilustres varões (os envolvidos na expulsão dos holandeses, tais como André Vidal de Negreiros, João Fernandes Vieira, Francisco Barreto de Menezes e Henrique Dias); a História porém lhes reservou outros no seu panteão, e perpetua a sua memória, e a lembrança de seus feitos gloriosos, para admiração e exemplo das gerações que se tem ido, e se irão sucedendo. (II, p. 138. Grifos meus).

Gerações como aquela composta de alunos-leitores dos textos de Macedo e de Abreu e Lima e que, freqüentando as aulas de história do Brasil do Colégio de Pedro II, deveriam não apenas aprender com o passado, mas reatualizá-lo por meio da reprodução daqueles comportamentos, tidos por exemplares. Devidamente selecionados e narrados, eles eram encarados, então, como um modo de proporcionar, no momento presente da experiência escolar e educativa, a reunião das épocas pregressas com as que estavam por vir.

Seleção rigorosa, aliás, tendo em vista que a constante aproximação entre o passado e o futuro, da nação, implicava a possibilidade de participação do (aluno) leitor na tal “comunidade imaginada”, o que significava inseri-lo em uma forma específica de imaginação, ou melhor, de organização.

Possibilidade constantemente reafirmada ao longo da narrativa que preenchia as páginas dos manuais didáticos, tanto o de Abreu e Lima quanto o de Macedo, visto que, no bojo das estratégias discursivas, era igualmente constante a preocupação desses escritores no sentido de apresentar aos seus leitores as variadas formas de manifestação da brasilidade que acompanharam de perto os episódios mais importantes, segundo, insisto, a seleção acima mencionada.

É o caso, por exemplo, da narração, presente nas Lições de Macedo, a respeito das transformações ocorridas na política portuguesa no fim do século XVIII e, portanto, é válido salientar, às vésperas do que o próprio autor classifica como “transmigração da família real de Bragança para o Brasil; sede da Monarquia portuguesa no Rio de Janeiro” (II, p. 228), título, aliás, de abertura da Lição XVIII.

Nessa lição, o letrado fluminense aborda o reordenamento da referida política após a substituição da rainha D. Maria I por seu filho, D. João, que, em 18 de julho de 1799, assumiu a condição de regente de Portugal. E Macedo apresenta aos seus

leitores como primeiro fato marcante da regência de D. João a decisão do mesmo em convocar D. Rodrigo de Sousa Coutinho, futuro conde de Linhares, para aconselhá-lo quanto à administração do Império português.

Fato que tal autor procura realçar através da referência ao papel de D. Rodrigo de Sousa Coutinho no episódio que dá título à Lição e que, por isso, deve ser considerado de extrema relevância na narrativa que ele elabora acerca da história do Brasil, sendo que, a respeito desse papel, o escritor de Itaboraí pondera:

Dir-se-ia que o conde de Linhares adivinhava os estrondosos acontecimentos que em breve tornaram necessária a transmigração da família real portuguesa para a terra de Cabral, e que conseqüentemente ia pondo em tributo a gratidão e amor dos brasileiros entre os quais tinha de ir assentar-se a monarquia. (II, p. 229).

Mesclando tempos verbais, Macedo recorre ao uso do futuro do pretérito para inserir em sua narrativa do passado uma hipótese – expressa pelo “dir-se-ia” que inaugura o parágrafo – de modo a encadear os sucessivos eventos que estiveram relacionados com a tal “transmigração da família real” e, assim, dotá-los de sentido; um sentido que se apresenta ao leitor por meio de uma construção narrativa cujo desdobramento lógico – sinalizado pelo sugestivo advérbio “conseqüentemente” – é o resultado daquela ação hipoteticamente atribuída ao ministro Sousa Coutinho, ou seja, “a gratidão e o amor dos brasileiros entre os quais tinha de ir assentar-se a monarquia”.

Mescla, portanto, que revela o esforço do autor com vistas a aproximar duas épocas distintas que conformaram a história que ele procura narrar aos seus alunos- leitores, pois ao destacar a “transmigração da família real”, Macedo toma esse episódio da história do Brasil enquanto elo entre a fase colonial, ligada ao passado e indicada pelo recurso sugestivo à expressão “terra de Cabral”, e o futuro, que se coloca no texto macediano através da referência à forma de governo adotada após a independência e, portanto, à citada “transmigração”.

Momento que, aliás, era, de fato, o presente daqueles que liam suas Lições, os jovens estudantes de uma das importantes instituições do país e, ressalte-se, vinculada à Monarquia.

Jovens que, dessa forma, estavam diante de uma história com a qual eles deveriam se identificar, primeiramente, por conta de vivenciarem as conseqüências da ação daquele indivíduo perante o qual os que lhe eram contemporâneos se

mostraram gratos. Em segundo lugar, devido ao fato de estes serem brasileiros, condição semelhante à deles e que, mais relevante ainda, também era, em certa medida, a do próprio D. Rodrigo de Sousa Coutinho, pois, conforme aponta Macedo, tal ministro era “descendente de uma brasileira” e obteve a reputação de “zeloso protetor dos filhos do Brasil” (II, p. 229).

Desse modo, o vínculo com a terra tornava-se, nas páginas do manual didático escrito por Joaquim Manuel de Macedo, elemento de identificação ao longo do tempo, expressando, assim, o esforço da elite letrada oitocentista no sentido de construir identidades por meio da fixação das mesmas na história do país, ou melhor, na narrativa que eles engendravam para essa.

Daí a preocupação de Macedo em definir já nas primeiras lições justamente a adequada designação que acompanha o termo brasileiro, ressaltando que

por brasileiros se designou a princípio aqueles que se davam ao tráfico dessa madeira (“preciosa”, segundo ele; o chamado pau-brasil); finalmente porém brasileiros ficaram sendo chamados todos os habitantes e naturais da terra, que perdeu desse modo o nome de Santa Cruz. (I, p. 32).

Mas, não apenas Macedo ocupou-se do tema da brasilidade, procurando inseri-lo no âmbito da narrativa que ele buscava construir para aquilo que considerava a história do Brasil.

Também José Ignácio de Abreu e Lima dedica várias passagens de seu

Compêndio para tratar desse tema, utilizando com freqüência o termo brasileiro. Por

exemplo, ao narrar outros acontecimentos relacionados com a, já citada, luta contra os holandeses que marcou algumas capitanias e povoações da região nordeste da América portuguesa, sobretudo Pernambuco, no século XVII.

Verifica-se no contexto dessa narração o recurso do letrado pernambucano ao referido termo quando menciona a participação de Filipe Camarão na luta de resistência contra a tentativa de domínio holandês naquela região, já que, logo após mencionar a articulação de um núcleo destinado a organizar as forças de oposição à presença holandesa, o “Campo Real de Bom Jesus” (I, p. 124), Abreu e Lima destaca a frustrada iniciativa dos holandeses com vistas a atacar tal “Campo”. Frustação que representou, segundo ele, o primeiro “sucesso feliz” (I, p. 125) daqueles que resistiam aos ataques das armas holandesas.

foi seguido de outro, em que o chefe brasileiro Filipe Camarão com trezentos homens da sua tribo logrou surpreender o General Loncq no seu trânsito do Recife para Olinda, matando, dispersando, e fazendo prisioneira quase toda a sua escolta, composta de seiscentos holandeses. (I, p. 125).

Dado interessante que se observa a partir dessa narração de Abreu e Lima é que tal autor atribuiu o termo brasileiro não apenas a um indivíduo cujos atos foram, no seu entender, relevantes para o país – ou pelos menos, aquilo que está na origem deste, a colonização portuguesa na América – e, portanto, para a sua história, mas ele promove essa atribuição tendo como referência o “chefe” de uma “tribo”.

E, com base nessa observação, é válido salientar, quanto a esse aspecto, uma clara diferença entre esse letrado pernambucano e o fluminense Joaquim Manuel de Macedo, visto que enquanto este procura identificar os indígenas, implícitos na categoria tribo citada na narração do primeiro, por meio das expressões “gentio do Brasil” ou “selvagens”, Abreu e Lima recorre a conjunto mais abrangente de definições, tais como “Brasileiros” (I, p. 32), “selvagens” (I, p. 32), e “nações brasileiras” (I, p. 27).

Ademais, a própria forma de abordar o tema dos indígenas e sua relação com a pretensa história do Brasil revela, da parte dos dois autores, perspectivas diferentes na medida em que mesmo tendo dedicado, cada um deles, um capítulo inteiro de seus manuais didáticos para tratar do referido tema, já o título que abre esses capítulos indica essa diferença, pois Abreu e Lima procura descrever para os seus leitores o “caráter, usos e costumes dos habitantes naturais do Brasil” (I, capítulo 1, parte V), ao passo que Macedo parece preocupado em estabelecer certa distância entre o local e o indígena, ao tratar do “Brasil em geral: povos que o habitavam na época de seu descobrimento” (I, lição V).

Ressalte-se, entretanto, que o escritor pernambucano não optou por manter uma vinculação exclusiva entre o termo brasileiro e os indígenas, como se nota em outra passagem de seu Compêndio, passagem destinada à narração de episódios bastante posteriores ao momento inicial da presença portuguesa no continente americano e em relação ao qual a necessidade de compreender os tais costumes decorria não somente de exercício historiográfico, como era o dos autores desses manuais, mas das demandas da ação colonizadora propriamente dita.

Passagem que, para ser mais preciso, menciona o episódio conhecido como “noite das garrafadas” (13 e 14 de março de 1831) e que ficou marcado pelos conflitos de rua envolvendo, supostamente, partidários do imperador D. Pedro I e seus oposicionistas105, retratando Abreu e Lima tal episódio como o impulso a outros embates, pois, naquele momento, “a ofensa da nacionalidade, e por consequência do amor próprio dos nascidos no país, fez reunir então todos os brasileiros, clamando que era mister reprimir a insolência dos estrangeiros”. (II, p. 71).

Acerca desse episódio, Abreu e Lima procura ainda alertar seu leitor quanto ao papel desempenhado pelo próprio imperador em toda a situação que originou os tais conflitos, visando, nesse sentido, isentá-lo de responsabilidade em relação aos mesmos, o que se percebe no seguinte trecho do capítulo VII de seu manual

No documento A NAÇÃO COMO POSSIBILIDADE: (páginas 65-81)