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Em seu terceiro capítulo de Teaching Literature, Elaine Showalter discute os métodos de ensino da literatura na educação superior.

Primeiro dado levantado, bastante óbvio: quase sempre, ou sempre, a preparação do conteúdo do curso esbarra nas pressões externas relacionadas a tempo, recursos financeiros, espaço, datas de matrícula, competições departamentais e acesso às fontes de pesquisa.

Com tantos fatores externos de pressão, os professores (principalmente os que se iniciam na profissão) tendem a preparar seus cursos pelo menos um semestre antes do início das aulas, fator que tende a comprometer a qualidade de ensino. O intervalo entre a preparação e o início do curso pode distanciar o professor dos conteúdos escolhidos, caso não haja um sério trabalho de revisão de material imediatamente antes e durante o decorrer do semestre. Muitas vezes, uma preparação de aula “em cima da hora”, pode ser até mesmo mais eficiente que uma preparação com uma antecedência “tão segura” de tempo.

Part of the question is whether we teach from our area of research specialization, and make teaching a subset of research, or whether we make teaching an exploration for us as it is for our students. There are advantages and disadvantages to each approach. All of us have had the experience of reading a book the night before class, just one breathless step ahead of the students, and discovering that our teaching suddenly seems electric and the students are lit up with excitement. Teaching new material works, because we are teaching a way of reading, and modeling the way a trained professional thinks about understanding and analyzing literary texts. (SHOWALTER, 2003, p. 45) 18

Um outro problema apontado por Showalter é que uma grande familiaridade com o material a ser ensinado pode também ser uma faca de dois gumes: o professor está tão mergulhado na obra que pode não acompanhar a visão e os questionamentos que brotarão de um primeiro contato com a mesma. Para exemplificar esta dificuldade, Showalter cita o depoimento de uma professora do King’s College de Londres, Ann Thompson, especializada em Shakespeare, sobre ensinar Hamlet:

18 Parte da questão é se ensinamos a partir da nossa área de especialização, e fazemos do ensino uma subárea

da pesquisa, ou se fazemos do ensino uma exploração para nós, como é para os alunos. Existem vantagens e desvantagens em cada abordagem. Todos nós já tivemos a experiência de ler um livro uma noite antes da aula, apenas um passo à frente dos alunos, e acabar descobrindo que nossa aula de repente parece vigorosa e os estudantes ficam mais estimulados. Ensinar material novo funciona, porque nós estamos ensinando uma forma de ler, e moldar a maneira que um profissional treinado pensa sobre o entendimento e a análise de textos literários (Tradução da autora).

I find that I know it almost too well for the purpose, it is virtually impossible for me to imagine what it must be like to read the play for the first time, and I am capable of becoming impatient with students’ perfectly reasonable desires to discuss topics which for me have become tedious through over familiarity. (SHOWALTER, 2003, p. 45) 19

Outro tópico discutido por Showalter é a condução da primeira aula. Muitos professores a utilizam somente para explicar qual será o conteúdo do semestre, a metodologia em aula, as formas de avaliação etc., e até mesmo dispensam o aluno antes do término regular. Showalter acredita que esta é uma abordagem equivocada, pois é justamente na primeira aula que o professor deve estimular o aluno para o que virá a seguir. Entre as fórmulas de estímulo, Showalter sugere trabalhar com um fragmento “poderoso”, memorável, de uma das obras inclusas no programa do semestre. A primeira aula pode ser, também, uma oportunidade de engajar os alunos de forma mais participativa no curso, procurando saber quais são as suas expectativas em relação ao semestre e se gostariam de fazer sugestões de atividades em sala. Desta forma, o aluno poderá sentir que também representa uma parte ativa do processo de aprendizagem.

Sobre a “retórica do ensino”, Showalter divide sua discussão em três tópicos: aula expositiva, discussões e modelos. Abordaremos brevemente tais pontos.

Showalter volta a insistir nos aspectos negativos da aula sustentada apenas pela aula expositiva: é preciso lidar com problemas de falta de atenção, memória e incapacidade de foco. Tais problemas não são, necessariamente, relacionados ao desestímulo de alguns alunos, mas à baixa capacidade de reter as informações de uma aula expositiva, por um longo período, inerente a qualquer pessoa. Pesquisas apontadas pela autora revelam que o tempo de retenção de informações começa a cair rapidamente depois de dez minutos e, por isso, é sempre necessário estimular

19 Eu acho que sei a peça tão bem que é impossível para eu imaginar como deve ser lê-la pela primeira vez, e

sou capaz de ficar impaciente com os desejos mais que justos dos alunos de discutir tópicos que para mim se tornaram tediosos devido à tamanha familiaridade (Tradução da autora).

de alguma forma a atenção dos alunos — através de intervalos ou de uma mudança na abordagem do assunto, por exemplo. Além disso, tais pesquisas também concordam que a retenção de informações é muito maior quando surgida a partir de discussões. Outro problema é que, se as aulas forem somente expositivas, os alunos jamais serão capazes de resolver ou refletir sobre questões ou dificuldades individuais.

Entretanto, muitas vezes, a aula expositiva parece ser a solução mais adequada, como, por exemplo, quando o número de alunos é muito elevado. Neste caso, para um melhor aproveitamento, Showalter (2003, p. 51-52) aponta os principais conselhos encontrados nos livros de pedagogia pesquisados por ela: uma estrutura clara e um roteiro; uma lista de objetivos; avisos freqüentes; handouts, especialmente com espaços para os alunos responderem perguntas, resolverem problemas ou incluir suas próprias anotações; uma mudança de material ou abordagem a cada quinze minutos; estratégia para participação dos alunos — pequenos grupos, resolução de problemas, dar exemplos, perguntas e respostas; uso de material audiovisual, com instruções sobre o que procurar; alunos deliberam sobre várias propostas.

Se há um consenso de que a aula orientada por discussões seja mais eficaz do que a aula expositiva, isso não quer dizer que tal aula, magicamente, tenha resultados. É preciso igualmente prepará-la, ponderar seus objetivos e criar uma atmosfera de respeito, confiança e parceria em sala. Showalter recolheu, de suas entrevistas com inúmeros professores, algumas técnicas de discussão que se diferenciam do estilo mais comum, o debate entre professor e alunos: abrir a aula com uma pergunta em foco e deixar que os alunos reflitam e escrevam sobre ela, ou propor discussões em pares ou em pequenos grupos de alunos. É preciso haver sensibilidade para que o professor descubra o meio mais eficiente de fazer a discussão aflorar.

Outro ponto em que Showalter verifica um grande despreparo pedagógico dos professores universitários sustenta-se no que a autora nomeia de modelo, ou seja, a preocupação em guiar os alunos no momento em que devem produzir bons textos ou análises. Showalter recomenda que os professores disponibilizem trabalhos de qualidade de análise literária — de ex-alunos ou até mesmo próprios — para que os estudantes possam adquirir a consciência sobre os modelos de estrutura e de conteúdo que devam almejar. Apesar de ser esta uma técnica quase óbvia, a autora aponta que, para alguns professores, esta é uma possibilidade nunca utilizada, ou mesmo cogitada.

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