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Entre a arte e a história: a imaginária guarani no MARGS, 1963

4 A IMAGINÁRIA GUARANI ENTRE O MUSEU JÚLIO DE CASTILHOS E O

4.1 Entre a arte e a história: a imaginária guarani no MARGS, 1963

Conforme narrado no segundo capítulo deste trabalho, o percurso museal das esculturas sacras missioneiras em Porto Alegre iniciou no ano de 1903, por ocasião da transferência ao então denominado Museu do Estado de três imagens que haviam sido expostas na Primeira Exposição Agropecuária e Industrial do Rio Grande do Sul. Com o término do evento, que fora inaugurado em 1901, as esculturas de São Francisco Xavier e dois anjos permaneceram no pavilhão do evento onde foram expostas até o ano de 1903, quando a

Comissão de Organização do evento efetivou a transferência das três esculturas para o recém- criado e então denominado Museu do Estado, atualmente Museu Júlio de Castilhos. A quarta escultura missioneira que pertence ao acervo desta instituição é uma imagem de Senhor dos Passos, cuja proveniência é duvidosa, pois cogita-se que a entrada da peça, em 1903, tenha acontecido através de uma doação feita pelo diretor da Secretaria de Obras Públicas372. Por fim, a quinta escultura sacra é a imagem de Nossa Senhora da Conceição, comprada em 1937 pela Administração Estadual como um “exemplar histórico de alto valor”373, conforme afirmou à época o então diretor do Museu Júlio de Castilhos, Alcides Maya. Com a compra dessa última escultura, o percurso museal das cinco imagens sacras missioneiras do Museu Júlio de Castilhos iniciado em 1903 foi encerrado em 1937 (THIELKE, 2014).

A partir dessa breve rememoração de alguns detalhes tratados no capítulo 2 deste trabalho, pretende-se demarcar o ano de 1963 como o ponto de partida do que será narrado a seguir. Resta, porém, elucidar o processo de criação do Museu de Arte do Rio Grande do Sul e, para isso, será necessário mobilizar o pensamento através de um breve recuo no tempo da narrativa até o ano de 1954.

A Praça da Alfândega, em Porto Alegre, é o cenário escolhido para a devida apresentação do MARGS, posto que este é o local onde, atualmente, está situado. Um olhar lançado para a fachada da edificação reconhecerá seu estilo eclético; imponente, a sede atual do museu foi projetada pelo arquiteto alemão Theo Wiederspahn e construída entre 1913 e 1914 e nela funcionou entre 1916 e 1972 a Delegacia Fiscal da Fazenda (MONTEIRO, 2012). Finalmente, pode-se dizer, um endereço merecido para um museu criado em 1954 sem ter sede própria e que, tal como os santos missioneiros, peregrinou por diferentes endereços entre os anos de 1954 e 1974, quando se deu a mudança definitiva para o edifício da Praça da Alfândega, sua terceira e última sede.

Naquele ano de 1954, no contexto de uma mudança na estrutura administrativa da Secretaria de Educação e Cultura do Estado do Rio Grande do Sul, operacionalizada a partir da criação da Divisão de Cultura no interior daquela, regulamentada pelo Decreto número 5.065 de 27 de julho de 1954, o Museu de Arte do Rio Grande do Sul foi criado com um acervo inicial composto por pinturas que pertenciam ao Museu Júlio de Castilhos e sua direção foi exercida

372 Arquivo institucional do Museu Júlio de Castilhos. Livro de Ofícios Recebidos. Rio Grande do Sul, 1903. Porto

Alegre, RS

373 Arquivo institucional do Museu Júlio de Castilhos. Livro de Ofícios Recebidos. Rio Grande do Sul, 1937. Porto

por Ado Malagolli374. Com aquela alteração administrativa, o Museu Júlio de Castilhos teve seu acervo desmembrado e destinado a outras instituições recém-criadas, tais como o Museu de Ciências Naturais, que recebeu as coleções de ciências naturais; também o Arquivo Histórico que funcionava no Museu Júlio de Castilhos foi separado deste, do que resultou a formação de uma instituição própria que recebeu o acervo documental que estava no museu. Nesse processo, a maioria das obras de pintura custodiadas pelo Museu Júlio de Castilhos foram transferidas para o MARGS. Esse processo de transferência de partes do acervo de uma instituição para as outras foi lento, e sua consolidação se deu no início da década de 1960, aproximadamente (SILVEIRA, 2011). Já neste ponto poder-se-ia interrogar o motivo pelo qual as esculturas missioneiras não foram transferidas em 1954, mesmo que a resposta não possa ser formulada.

A primeira sede do Museu de Arte do Rio Grande do Sul foi o foyer do Theatro São Pedro, onde esteve instalado até o ano de 1973, quando outra mudança de sede levou o museu para dois andares do Edifício Paraguay, situado na avenida Salgado Filho, no centro de Porto Alegre375. Foi no foyer do Theatro que a partir de 1963 as três esculturas missioneiras foram expostas como parte do acervo artístico do MARGS, cuja direção na época, era ocupada pelo artista Francisco Stockinger376. Aqui, a primeira visão opaca do fenômeno: nenhum documento de transferência das peças foi localizado até o presente momento. Nenhum ofício, nenhuma reportagem veiculada em jornal, nenhuma correspondência, bilhete, fotografia, enfim, nada que documente o fato e exponha a motivação do mesmo. O que permite saber que as esculturas foram transferidas são as informações registradas nas fichas de acervo das esculturas, consultadas no Setor de Documentação e Pesquisa do MARGS. As fichas apresentadas abaixo (imagens 04, 05, 06, 07) referem-se à escultura Anjo, e são iguais às fichas das outras duas esculturas – São Francisco Xavier e Senhor dos Passos – com as informações respectivas.

374 Ado Malagoli ocupou o cargo de diretor do Museu de Arte do Rio Grande do Sul até 1963, quando foi sucedido

por Francisco Stockinger. Cf. MARGS, 2004.

375 O MARGS esteve sediado neste edifício entre os anos de 1973 e 1978. Cf. MARGS, 2004.

376 Francisco Stockinger assumiu a diretoria do MARGS em 1963, cargo desempenhado por aproximadamente um

ano. Em 1967 foi novamente diretor do museu, quando dirigiu também a Divisão de Artes do Departamento de Cultura da Secretaria de Educação e Cultura do Rio Grande do Sul.

Fonte: Museu de Arte do Rio Grande do Sul / Setor de Documentação e Pesquisa.

Fonte: Museu de Arte do Rio Grande do Sul / Setor de Documentação e Pesquisa.

Fonte: Museu de Arte do Rio Grande do Sul / Setor de Documentação e Pesquisa.

Fonte: Museu de Arte do Rio Grande do Sul / Setor de Documentação e Pesquisa.

Figura 6 - frente da ficha de registro de acervo da escultura Anjo

Figura 6 - frente da ficha de registro de acervo da escultura Anjo

Figura 6 - frente da ficha de registro de acervo da escultura Anjo

Figura 6 - frente da ficha de registro de acervo da escultura Anjo

Figura 6 - frente da ficha de registro de acervo da escultura Anjo

Figura 6 - frente da ficha de registro de acervo da escultura Anjo

Figura 6 - frente da ficha de registro de acervo da escultura Anjo

Fonte: Museu de Arte do Rio Grande do Sul / Setor de Documentação e Pesquisa.

Fonte: Museu de Arte do Rio Grande do Sul / Setor de Documentação e Pesquisa.

Figura 7- verso da ficha de registro de acervo da escultura Anjo

Figura 7- verso da ficha de registro de acervo da escultura Anjo

Figura 7- verso da ficha de registro de acervo da escultura Anjo

Figura 7- verso da ficha de registro de acervo da escultura Anjo

Figura 7- verso da ficha de registro de acervo da escultura Anjo

Figura 7- verso da ficha de registro de acervo da escultura Anjo

Figura 7- verso da ficha de registro de acervo da escultura Anjo

Na primeira ficha (imagens 04 e 05), no campo “modo de aquisição”, consta que a referida escultura fora transferida em 1963 do Museu Júlio de Castilhos para aquela instituição. Esta informação se aplica às demais imagens, em cujas fichas lê-se igual informe. É desconhecido o ano em que o documento em questão foi produzido pela equipe técnica do MARGS. Já no documento de Registro de Acervo (imagens 06 e 07), produzido 25 de junho de 1986, além das características materiais da escultura, tais como dimensões e técnica de produção, consta que não existe documentação sobre a aquisição da peça. Esta mesma informação, que se repete nos documentos referentes às esculturas São Francisco Xavier e Senhor dos Passos, entretanto, é questionável já que nos assentamentos administrativos do Museu Júlio de Castilhos é possível acessar informações sobre o modo de aquisição das mesmas.

Na ficha de acervo da escultura de São Francisco Xavier, localizada nos arquivos do Museu Júlio de Castilhos, produzida no ano de 1996, no campo destinado à descrição do histórico da peça consta a informação de que “em 1963, o ofício nº. 176/63, da Divisão de Cultura, solicitou o envio desta imagem para o Museu de artes do Rio Grande do Sul”377. Logo, é possível afirmar que a transferência das três esculturas de um museu para o outro resultou na produção de um documento que, até o presente momento, não pôde ser localizado. No momento em que a citada ficha de acervo da imagem de São Francisco foi feita, possivelmente houve uma consulta à documentação arquivada nos assentamentos internos do museu para que o histórico da referida peça fosse redigido e descrito tal detalhamento. Na burocracia da administração pública o que não falta são ofícios e se uns desaparecem, outros se tornam conhecidos.

Ainda no ano de 1963, Francisco Stockinger redigiu uma correspondência remetida ao diretor do Departamento do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Rodrigo Melo de Andrade, na qual solicitou pelo prazo de trinta dias o empréstimo de “40 a 50 esculturas” missioneiras pertencentes ao acervo do Museu das Missões, com o intuito de expô-las no MARGS378, ainda sediado no foyer do Theatro São Pedro. De acordo com Stockinger, “a escultura sacra missioneira, tão frequentemente comentada e discutida, constitui para nós, intelectuais e artistas do Rio Grande do Sul, motivo de grande orgulho”, embora, segue o diretor do MARGS, poucas pessoas conhecessem esse “grande patrimônio artístico” do estado, devido às dificuldades de acesso ao Museu das Missões.

377 Arquivo Institucional do Museu Júlio de Castilhos. Fichas de acervo. Porto Alegre, RS.

378 Correspondência redigida em 19 de abril de 1963, assinada por Francisco Stockinger. Fonte: Instituto do

A resposta ao pedido de empréstimo foi datilografada em 26 de abril de 1963, assinada por Alfredo Rusins, conservador do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Ao escrever para Stockinger, Rusins afirma ser justa a pretensão de seu interlocutor, uma vez que a coleção do Museu das Missões, sendo “rica e preciosa do ponto de vista da escultura missioneira”379, estava muito distante da capital gaúcha. Além disso, afirma o mesmo servidor, era do “espírito moderno da museologia os museus fazerem tudo ao seu alcance, dentro das garantias de segurança de seus acervos, para mostrar parte de suas coleções a um número maior de pessoas”380. Entretanto, o número de esculturas que Stockinger sugeriu serem emprestadas pareceu “algo exagerado, pois o local do Teatro São Pedro em Porto Alegre, não comportaria tantas esculturas sem que ficassem prejudicadas na apresentação”381.

Em sua correspondência, Rusins afirma que “em caso do Senhor Diretor concordar na cessão das peças do Museu das Missões”382, seria interessante que “fossem expostas também as peças missioneiras do Museu Estadual Júlio de Castilhos, e as que se encontram em poder dos padres jesuítas no Estado383”. Em 24 de maio de 1963384, Rodrigo Melo Franco de Andrade respondeu a Francisco Stockinger, solicitando que este aguardasse que o Dphan estivesse habilitado “a iniciar em São Miguel os serviços de grande vulto incluídos em seu plano de trabalhos para o exercício corrente”. De acordo com Andrade, essa medida era necessária a fim de, “nessa oportunidade, poder a cessão das esculturas desejadas ser feita sem a inconveniência de desfalcar demasiadamente a parte do acervo do Museu das Missões em exposição”385.

Aqui, novamente a opacidade permite apenas uma imagem turva do fenômeno: não foram localizados documentos ou informações sobre a realização ou não do empréstimo das peças. Nos documentos da Série Inventário do Museu Júlio de Castilhos, preservados no Arquivo Noronha Santos, no Rio de Janeiro, não foram localizados outros escritos sobre o pedido de empréstimo; o mesmo se aplica às instituições porto-alegrenses consultadas. Uma pesquisa realizada em diferentes edições de jornais locais veiculadas naquele ano também não

379 Correspondência redigida em 26 de abril de 1963, assinada por Alfredo Rusins. Instituto do Patrimônio

Histórico e Artístico Nacional. Arquivo Noronha Santos, Rio de Janeiro.

380 Correspondência redigida em 26 de abril de 1963, assinada por Alfredo Rusins. Arquivo Noronha Santos, Rio

de Janeiro.

381 Correspondência redigida em 26 de abril de 1963, assinada por Alfredo Rusins. Instituto do Patrimônio

Histórico e Artístico Nacional. Arquivo Noronha Santos, Rio de Janeiro.

382 Correspondência redigida em 26 de abril de 1963, assinada por Alfredo Rusins. Instituto do Patrimônio

Histórico e Artístico Nacional. Arquivo Noronha Santos, Rio de Janeiro.

383 Correspondência redigida em 26 de abril de 1963, assinada por Alfredo Rusins. Instituto do Patrimônio

Histórico e Artístico Nacional. Arquivo Noronha Santos, Rio de Janeiro.

384 Ofício número 583, de 24 de maio de 1963, assinado por Rodrigo Melo Franco de Andrade. Instituto do

Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Arquivo Noronha Santos, Rio de Janeiro.

385 Ofício número 583, de 24 de maio de 1963, assinado por Rodrigo Melo Franco de Andrade. Instituto do

trouxe resultado sobre a exposição das esculturas em Porto Alegre. Não é improvável que por falta de orçamento destinado ao transporte rodoviário das peças de São Miguel até a capital, ou mesmo a exiguidade do espaço do foyer do Theatro São Pedro tenham impedido que o empréstimo fosse feito. Quanto à sugestão de Rusins sobre a exposição das esculturas missioneiras do Museu Júlio de Castilhos, ao que os documentos indicam, foi aceita por Stockinger, uma vez que a transferência das mesmas ocorreu em seis de junho de 1963386.

Poder-se-ia conjecturar, aliás, que as três imagens tenham sido emprestadas ao MARGS pelo prazo de 30 dias, para a realização da exposição planejada por Stockinger, e sua devolução no prazo indicado foi negligenciada. Entretanto, na listagem completa de exposições e mostras artísticas realizadas no MARGS entre 1955 e 2005, publicada na obra “MARGS 50 Anos”387 não há referência à exposição específica sobre arte missioneira organizada no ano de 1963388, conforme a tabela abaixo, elaborada a partir das informações constantes na referida documentação.

Quadro 3- Exposições e mostras artísticas - MARGS

Exposições Período

Escolinha de Artes da SEC 27/11/62 a 04/01/63

Acervo MARGS 04/04/1963

Coletivo de artistas do Rio Grande 07/06/63 a 28/06/63 Gravura em metal, parceria com o MAM, Rio

de Janeiro

02/07/63 a 30/07/63 Gravuras e desenhos do Museu Oswaldo

Goeldi

01/08/63 a 13/08/63

Exposição de colecionadores 16/08/63 a 30/08/63

14 artistas gaúchos, exposição na Galeria Macunaíma, RJ

21/08/63 a 01/09/63

Pintura contemporânea no México Setembro de 1963

Pintura de tecido: Hilda Campofiorito 18/09/63 a 24/09/63 Danúbio Gonçalves: pinturas, desenhos e

gravuras

27/09/63 a 29/10/63

15 artistas gaúchos em Curitiba 14/10/63 a 30/10/63

1º Salão Cidade de Porto Alegre 05/11/63 a 16/11/63

Marcelo Grassmann 19/11/63 a 01/01/64

Escolinha de arte da SEC 12/12/63 a 18/02/64

Oswald de Andrade: pinturas 10/12/63 a 20/12/63

386 Ofício número 101/93, de 17 de novembro de 1993, assinado por Ernani Behs. Fonte: Arquivo institucional do

Museu Júlio de Castilhos. Livro de ofícios recebidos. Porto Alegre, RS.

387 Obra organizada por Paulo César Ribeiro Gomes e Vera Regina Luz Grecco, em homenagem aos 50 anos da

instituição

388 Em 1976 as esculturas missioneiras do acervo do MARGS foram expostas ao público durante a exposição “Arte

Gaúcha no MARGS”. Em 1979 foi organizada uma exposição intitulada “Acervo do MARGS: arte sacra”, conforme será discutido no decorrer deste capítulo.

Neste ponto, é preciso voltar o pensamento novamente ao Museu Júlio de Castilhos. Entre 1960 e 1967 Derly de Azevedo Chaves esteve na direção do Museu Júlio de Castilhos, antecedido neste cargo por Dante de Laytano, diretor do Museu Júlio de Castilhos entre 1952- 1960, e sucedido pelo General Antonio da Rocha Almeida. Em discurso proferido por ocasião de sua despedida da diretoria do museu389, Chaves menciona que o acervo da instituição se encontrava desorganizado quando do início de seu trabalho na direção, sem que houvesse qualquer critério na disposição dos objetos pelas salas da instituição, pelo que as coleções estavam misturadas umas às outras. Nas palavras de Chaves, “peças de real valor histórico, como mobiliário, indumentária, relíquias das missões e outros” distribuíam-se pelas diferentes salas “sem nenhum sentido didático”390. Diante disso, o diretor e sua equipe de trabalho realizaram a organização do acervo, conforme é registrado no referido discurso, de modo que em 1967 Chaves afirmou que as salas estavam “dispostas didaticamente”391.

A organização do acervo realizada ao longo da gestão de Derly Chaves contava com 15 salas de exposição e as peças de procedência missioneira foram dispostas na sala 2, hall de entrada, juntamente com quadros retratando a antiga Porto Alegre. Especificamente, estavam nessa sala as duas esculturas que não foram transferidas – ou emprestadas - para o MARGS em 1963 e os sinos em ferro fundido392. Supõe-se que antes do empréstimo das três esculturas para o Museu de Arte, as esculturas Senhor dos Passos, São Francisco Xavier e Anjo também estivessem expostas nesta mesma sala. Em 1965, Chaves comunicou à Secretaria de Obras Públicas o desabamento do forro do hall de entrada do museu393, e possivelmente os objetos que lá estavam tenham sido reorganizados em outras salas.

O que se percebe, a partir dessas situações em torno do Museu Júlio de Castilhos e do MARGS, é um quadro onde as duas instituições empreendem esforços para legitimarem-se social, política e culturalmente. De um lado, um museu recém-criado cujo acervo é paulatinamente constituído a partir do desmembramento do acervo pertencente a outra instituição, de doações e de aquisições. De outro, um museu já reconhecido socialmente, mas com um longo histórico de dificuldades financeiras, de problemas de infraestrutura em sua sede,

389 Discurso pronunciado pelo professor doutor Derly de Azevedo Chaves em 05 de junho de 1967. Fonte: Arquivo

institucional do Museu Júlio de Castilhos. Porto Alegre, RS.

390 Discurso pronunciado pelo professor doutor Derly de Azevedo Chaves em 05 de junho de 1967. Fonte: Arquivo

institucional do Museu Júlio de Castilhos. Porto Alegre, RS.

391 Discurso pronunciado pelo professor doutor Derly de Azevedo Chaves em 05 de junho de 1967. Fonte: Arquivo

institucional do Museu Júlio de Castilhos. Porto Alegre, RS.

392 Museu Júlio de Castilhos. Documento redigido em espanhol, sem assinatura e datado de 05 de outubro de 1965.

Fonte: Arquivo institucional do Museu Júlio de Castilhos. Livro de Ofícios Remetidos. Porto Alegre, RS.

393 Ofício número 40, de 11 de maio de 1965. Fonte: Arquivo institucional do Museu Júlio de Castilhos. Livro de

que repercutiam na organização do acervo e nos trabalhos de exposição. Foi nesse contexto que as três esculturas foram transferidas de um museu para o outro, sem que a documentação desse trâmite – se existe - tenha sido localizada até o presente momento.

Ao longo dos trinta anos em que estiveram no Museu de Arte do Rio Grande do Sul, três pedidos de devolução dessas imagens foram encaminhados por diferentes diretores do Museu Júlio de Castilhos, conforme será tratado em pormenores no decorrer deste capítulo, sob alegação de que as esculturas missioneiras eram objetos históricos e deveriam estar expostas em um museu de tipologia histórica. Algumas respostas formuladas pelos diretores do MARGS, no entanto, colocaram em questão o aspecto estético das imagens em referência, fato que justificaria sua permanência em um museu de arte. Afinal, o que seriam as esculturas sacras missioneiras, objetos de história ou objetos de arte?

Conforme Aloïs Riegl definiu, o valor histórico de um monumento e, neste caso, dos objetos, pertence ao conjunto dos valores de memória, do qual participa, também, o valor de antiguidade. Este último, apresenta-se em função dos aspectos decorrentes do transcurso do tempo e enfatiza o desgaste, a decomposição, o efeito estético da degradação que se percebe nas superfícies das coisas. Por sua vez, o valor histórico “repousa sobre uma base científica”