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ENTRE COMENTÁRIOS, INVESTIGAÇÕES E CRÍTICAS:

1 PROBLEMATIZAÇÃO DA PESQUISA

1.4 ENTRE COMENTÁRIOS, INVESTIGAÇÕES E CRÍTICAS:

Após a análise de textos de mídia impressa de massa – revistas Veja e

Super Interessante - e do mercado editorial, que comentam a auto-ajuda, e, após as

reflexões sobre as pesquisas acadêmicas e críticas na área, dada a vasta gama de possibilidades de leitura, a partir da auto-ajuda, buscamos encontrar uma

perspectiva, que, além de acrescentar-se às investigações acadêmicas anteriores, permitiria um desvendamento do discurso, da argumentação e do gênero auto-ajuda numa perspectiva lingüística de cunho dialógico.

O discurso da mídia impressa de massa sobre a auto-ajuda é confirmado no âmbito do corpus desta tese – parte da obra de Roberto Shinyashiki. A auto-ajuda é considerada como um fenômeno, enquanto desempenho de vendas, de edições, de quantidade de títulos. Na obra analisada de Shinyashiki, tem-se:

Quadro 3 - Números de edições das obras do corpus e as respectivas edições

atuais

Título Edição do corpus Edição atual (2005)

A carícia essencial 1985 – 121ª edição 148ª edição

Pais e filhos:

companheiros de viagem 1992 – 16ª edição 55ª edição

Sem medo de vencer 1993 – 1ª edição Edição ampliada, com

exemplos de Ronaldinho, Papa João Paulo II e Tsunami

O sucesso é ser feliz 1997 – 47ª edição 90ª edição

O poder da solução 2003 – 19ª edição 19ª edição

O corpus é constituído num intervalo de dezoito anos de produção de Roberto Shinyashiki. As editoras não divulgam a tiragem de exemplares, caracterizando a estratégia de vendas de seus sucessos, por meio de números elevados de edições.

Destaca-se, na análise, a obra Pais e filhos: companheiros de viagem, cujo número de edições aumentou 343%, em treze anos. Também o livro O sucesso

é ser feliz teve um aumento de 191%, em número de edições, no período de oito

anos.

A primeira obra escrita por Shinyashiki – A carícia essencial – teve um aumento de 22% em dez anos. Ela divide espaço mercadológico com A carícia

essencial – uma psicologia do afeto – Bolso17. A diferença de performance de aumento de edições da obra, em relação às demais, deve-se ao fato de que o autor tem uma produção significativa, lançando, no mercado, em média, um livro a cada dois anos e relançando as obras anteriores, por meio de ampliações que lhes garantem a atualização. É o caso de Sem medo de vencer.

Os títulos das obras, que também expressam uma estratégia editorial, são apresentados por meio de uma escolha lexical de termos que conduzem o leitor a uma perspectiva emocional, que sugere um olhar para si mesmo, para sua

transformação. Em A carícia essencial, a palavra carícia remete a um aspecto mais

emotivo, mais sentimental. O termo essencial qualifica a carícia como específica, determinada; não se trata, portanto, de qualquer carícia, mas da carícia que será apresentada pelo autor. Shinyashiki fala ao leitor que se insere nas condições de carente. Em Pais e filhos: companheiros de viagem, a temática que trata da relação familiar já se mostra persuasiva e atrativa, se observados os conflitos familiares contemporâneos. O termo companheiros promove a articulação com os demais termos do título e faz a associação com outras idéias como a união, a fraternidade e a cumplicidade. Em Sem medo de vencer e também em O poder da solução, o autor reúne termos motivacionais, desafiadores e otimistas. As palavras-chave medo e

vencer produzem um compromisso com o leitor no desafio de suas limitações,

independentemente das forças sociais que se apresentam contrariamente ao indivíduo. O mesmo ocorre na relação poder e solução. Por fim, em O sucesso é ser

feliz, Shinyashiki faz associação de idéias com as demandas sociais atuais,

orientando o entendimento do que é ter sucesso que deixa de articular-se diretamente com valores materialistas para associar-se a valores mais sentimentais, como é o caso de ser feliz.

Nos textos produzidos pela mídia impressa de massa, numa abordagem mercadológica, a auto-ajuda é apresentada como gênero popular, de fácil consumo, e que, legitimado pelos números (desempenho em vendas), é mercantilizado. Em Shinyashiki, a faixa de preços dos livros varia de R$ 18,00 a R$ 29,00, em torno de 6 a 10% do salário mínimo estabelecido no Brasil, em 2005. Pode-se, então, afirmar que não se destinam, portanto, às classes D e E, mas tem como público-alvo as classes A, B e C.

A mídia impressa de massa afirma que os autores de auto-ajuda são reconhecidos socialmente. É o caso de Roberto Shinyashiki, que é psiquiatra, escritor, palestrante, e cujo nome foi difundido ainda mais por ocasião das Olimpíadas de Sidney, porque foi contratado para trabalhar com os competidores brasileiros, em orientações terapêuticas, no referido evento esportivo, transmitido, via mídia televisiva, para o mundo inteiro.

O discurso editorial sobre a auto-ajuda mostra a formação profissional dos autores, porque é uma forma de agregar valores às obras. Roberto Shinyashiki está inserido, em uma das áreas – a psiquiatria - que mais se destaca na produção de textos de auto-ajuda.

Assim como o discurso da mídia impressa de massa, o discurso editorial, em Shinyashiki, demonstra, como se viu, um apelo persuasivo na elaboração dos títulos e na apresentação de fórmulas de transformação em todas as obras analisadas, no mesmo sentido do exposto em Sem medo de vencer:

Neste livro, o psiquiatra Roberto Shinyashiki mostra-nos, com objetividade, alguns dos mecanismos que levam o ser humano a realizar-se. O sucesso de uma pessoa tem sido avaliado por padrões de reconhecimento social. A pessoa de sucesso é aquela admirada pelos outros, ainda que isto custe a sua própria felicidade. A realização de uma laranjeira é produzir laranjas, e não procurar uma forma de criar maçãs. Também para o ser humano, o verdadeiro sucesso baseia-se em realizações que emanam de sua essência, e não simplesmente atender às expectativas dos outros. Sem medo de vencer comprova que a vitória está dentro de cada um de nós. E mostra como é possível obter êxitos que desejamos no trabalho, no amor e na vida espiritual, a partir do respeito por nossa capacidade interior. O sucesso é a realização de sua essência. VENCER É SER (1993, contracapa).

O emprego de termos como mostra, objetividade, mecanismo, padrões

de reconhecimento, comprova e obter êxito confirmam o direcionamento por meio de

fórmulas. Observa-se, ainda, em “E mostra como é possível obter êxitos que desejamos no trabalho, no amor e na vida espiritual, a partir do respeito por nossa capacidade interior” a imagem de sujeito fragmentado, cujas realizações são operadas, de maneira estanque, em áreas diversas e não de forma integrada. O discurso editorial em Shinyashiki não é assinado, o que leva ao entendimento de que a ausência do aval, ao mesmo tempo em que exime a editora da responsabilidade pela publicação, gera uma percepção de mera indicação da obra, feita por um sujeito oculto e, justamente por isso, muito próximo do sujeito-leitor. A publicação ganha credibilidade popular e perde o caráter mercantil.

A leitura do discurso editorial, presente no corpus, permite-nos observar a apresentação de um cenário, em que o leitor potencial deve ser levado à

ação, após sua apreciação do referido discurso, ou seja, passe à leitura do texto de auto-ajuda.

Tanto no discurso da mídia impressa de massa, quanto no discurso editorial, a constituição da auto-ajuda, enquanto construção argumentativa, a partir de seus interlocutores, não é avaliada. Deve-se ressaltar, no entanto, que a análise dos referidos discursos tem sua utilidade, para nós, apenas para o entendimento de como o gênero e o discurso são divulgados. Portanto, em nenhum momento, servem de fundamentação teórica para esta tese.

Quanto às investigações acadêmicas e críticas estudadas, verificou-se que não têm, como recorte, o estudo dos gêneros e do sujeito, numa perspectiva dialógica, mas deixam antever uma discussão sobre os valores divulgados pelo discurso da auto-ajuda e que constituem o sujeito, podendo ser observados no

corpus da presente tese, nas discussões seguintes. Também não há uma referência

à constituição argumentativa do discurso da auto-ajuda que emerge, de forma significativa, nas obras analisadas de Roberto Shinyashiki.

As considerações anteriores confirmam a pertinência dos questionamentos e das hipóteses de que parte este trabalho, que constituem outras possibilidades para investigação, por meio do estudo do gênero, do discurso e da argumentação da auto-ajuda.