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Entre unidade e diversidade: o papel das línguas na sociedade contemporânea

Capítulo 2 Diversidade linguística: tempos e espaços de renovação

1. Entre unidade e diversidade: o papel das línguas na sociedade contemporânea

Retomando a problemática da pós-modernidade e da mudança com que iniciámos o capítulo precedente, parece-nos evidente que a escola não se pode colocar à margem da era planetária ou do “estádio da mundialização” (Morin, 2002) em que nos encontramos, resultante da crescente mobilidade dos indivíduos e do desenvolvimento das novas tecnologias que alimentam a globalização e que esbatem as fronteiras existentes (Morin, Motta & Ciurana, 2004). Neste sentido, torna-se inevitável o contacto entre diferentes povos com diferentes línguas, culturas e religiões, sendo que “cada parte do mundo faz

parte do mundo, e o mundo, enquanto todo, está, cada vez mais, presente em cada uma das suas partes” (Morin, 2002: 71).

O fenómeno da globalização, como vimos, traz consigo um conjunto de novas exigências ao nível político e legislativo (Santos, 1995), isto é, ao nível da própria organização da sociedade que se assume diversa e plural. Assim, pensamos que gerir a globalização e alguns problemas da sociedade pós-moderna passa, antes de mais, pelo respeito dessa mesma diversidade e pluralidade. Como expressa o Relatório do desenvolvimento humano do Programa das Nações Unidas de 2004 “para que o mundo

de enfrentar primeiro, com êxito, o desafio da construção de sociedades culturalmente diversificadas e inclusivas” (PNUD, 2004: V).

No presente trabalho partimos do pressuposto de que a educação ocupa um lugar preponderante na construção de uma sociedade mais democrática e defensora dos direitos humanos. Como vários estudos têm referido, importa que a instituição escola se sinta comprometida com valores éticos como a integridade, a imparcialidade, a coragem moral, o respeito, a humildade, a tolerância, a confiança, a responsabilidade, a justiça social, a sinceridade, a solidariedade e a equidade (Kaur, 2012; Santomé, 2006).

Nesta linha de pensamento, gerir a globalização no espaço educativo é igualmente promover a compreensão entre os indivíduos, reconhecendo, valorizando e respeitando a diferença, incluindo-a no currículo. Esta é, aliás, uma preocupação comum a vários autores que afirmam que uma maior e mais frequente comunicação entre os sujeitos não tem significado uma maior compreensão (Ataíde, 2001; Bauman, 2001; Boaventura, 2001; Morin, 2002). Dito de outra forma, compreender (no sentido de discernir em conjunto, pressupondo empatia, entreajuda, identificação, abertura, sinceridade e generosidade) tem sido um dos pontos fracos da sociedade atual. Se, por um lado, a abertura à diferença e o contacto com o Outro podem permitir uma maior aproximação dos sujeitos; por outro, podem aumentam a competitividade e o confronto. Usando as palavras de Morin (2002):

“a comunicação triunfa (…) e, no entanto, a incompreensão continua geral. Na verdade, existem grandes e múltiplos progressos da compreensão, mas os progressos da incompreensão parecem ainda maiores. O problema da compreensão tornou-se crucial para os humanos. E, a este título, deve-se uma das finalidades da educação do futuro” (p. 99).

O autor aponta, ainda, como obstáculos a essa compreensão, a indiferença, o egocentrismo, o etnocentrismo e o sociocentrismo que reduzem o Outro a algo secundário, insignificante ou mesmo hostil. Na nossa perspetiva, esses comportamentos e atitudes fazem da sociedade atual uma “sociedade líquida” (Bauman, 2001), isto é, uma sociedade na qual os códigos estáveis de comportamento são escassos e na qual se valoriza o consumo em detrimento de uma cidadania plena e sólida.

Admite-se, desta forma, que, se a mobilidade e as tecnologias aproximam os sujeitos, a competitividade, o individualismo e o confronto com a diferença parecem distanciá-los uns dos outros, conduzindo ao isolamento e ao individualismo. Tal fenómeno faz com que o discurso educativo busque incessantemente a compreensão e a concretização

dos valores democráticos (Delors, 1996; Hargreaves, 1998; Morin, 2002; Santos, 2001) numa harmoniosa relação com o Outro, o diferente e o diverso.

Estamos, assim, convictos de que

“só a compreensão da diversidade cultural, religiosa e étnica, com respeito e espaço para a construção de subjectividades comprometidas com a ética e a solidariedade afastará o terror, permitindo a todos os seres humanos a construção de uma vida digna e uma convivência pacífica para a construção conjunta do futuro planetário” (Ataíde, 2001: 45).

Por outras palavras, julgamos que educar numa era planetária implica educar para uma compreensão e uma solidariedade planetárias. A este propósito, refere Boaventura (2001) que:

“como corrente de pensamento e ação, a educação na perspectiva planetária repousa em convicções e crenças fiéis a valores humanos e possibilita uma compreensão internacional do mundo atual e futuro, de seus problemas e desafios” (p. 28).

Face ao exposto, e segundo a perspetiva de vários autores, a educação precisa de passar por um processo de humanização, traduzido na defesa dos direitos humanos (Delors, 1996; Morin, 2002; Pinho et al., 2009) e tornando os indivíduos mais compreensivos, solidários e, por isso, mais capazes de exercer a cidadania. Nas palavras de Morin (2002), “a educação do futuro deverá ser um ensino primeiro e universal centrado

na condição humana” (p. 51), enquanto “aventura comum” que leva a reconhecer o que há

de diverso e de comum.

Desta forma, à interrogação “como criar novos laços de humanidade?” (Martins, 2008), poderíamos responder que tais laços se criam na conjugação da unidade com a diversidade. Considerando a sociedade como um todo que alberga várias partes inter- relacionadas, parece ser fundamental que se trabalhe no sentido de favorecer a diversidade, uma diversidade inscrita na unidade (Morin, 2002). Nesta ótica, conhecer e educar o ser humano pressupõe que se ajude a situá-lo no universo sem por isso ter que suprimir a sua identidade. Dito de outra forma, importa zelar pela unidade da espécie humana sem por isso aniquilar ou ignorar a diversidade nela existente e, simultaneamente, sem permitir que a diversidade apague a unidade.

Nesta linha de pensamento, julgamos que a educação tem um importante papel na gestão da diversidade e da unidade, em particular (e tendo em conta a temática do nosso trabalho), a educação em línguas. A este propósito, afirma Strecht-Ribeiro (1998) que:

“a grande expansão das relações internacionais nas últimas décadas, associada ao progresso científico e tecnológico, à mobilidade de pessoas e bens e à evolução vertiginosa dos meios de comunicação, gerou a necessidade de re-equacionar o papel das L.E.s [línguas estrangeiras] na sociedade actual” (p.19).

Como veremos posteriormente, sobretudo a partir dos anos 90, assiste-se a uma valorização das línguas em que a aprendizagem das mesmas é vista como condição indispensável ao diálogo intercultural e à coesão social, isto é, ao exercício de plena cidadania e, no nosso contexto em particular, à (re)construção europeia (Andrade, Martins & Moreira, 2001; Araújo e Sá & Melo, 2004; Beacco & Byram, 2003; Martins, 2008; Starkey, 2002, entre outros). Procura-se, assim, valorizar a diversidade linguística que passa ainda pelo respeito das particularidades de cada cultura/nação (Belo, 2006). A pluralidade apresenta-se, desta forma, como uma componente do exercício da cidadania, enquanto valor fundador da ação humana e da própria educação em línguas, não dizendo respeito somente a uma nacionalidade específica, mas a um sentimento de pertença ao mundo, baseado nos direitos e nas responsabilidades do cidadão. Ademais, assumindo-se como uma aprendizagem ao longo da vida num processo participativo, a cidadania resulta de vários contextos e concebe o ser humano como um ser social ativo, preparando-o para interagir com e na sociedade multicultural (Starkey, 2002).

Estas temáticas têm estado cada vez mais presentes nos discursos da educação, nomeadamente, da educação em línguas que tem procurado, nos últimos anos, modos de preparar os alunos para respeitar e preservar a diversidade linguística em presença, apelando aos valores democráticos (Alarcão, 2008; Andrade & Araújo e Sá et al., 2003; Andrade, Martins & Moreira, 2001; Audigier, 2000; Beacco & Byram, 2003; Conseil de l’Union Européenne, 2001; Conselho da Europa, 2001a; De Pietro, 2008; Gomes, 2006; Martins, 2008; Perregaux, 1998; Puig, 2004; Sá, 2007; Santomé, 2006; Starkey, 2002).

Embrenhado nestas questões, afirma Ouellet (2002) que a diversidade linguística “c’est maintenant une thématique omniprésente, les sciences humaines et sociales et les publications sur le sujet ont littéralement explosé au cours des dernières décades. Ces développements ont bien sûr eu un impact sur l’éducation. On a vu apparaître plusieurs mouvements éducatifs visant à promouvoir une plus grande ouverture à la diversité culturelle et religieuse et à lutter contre la discrimination et le racisme: l’éducation multiculturelle/interculturelle, l’éducation antiraciste, l’éducation au développement, l’éducation dans une perspective mondiale (global education), l’éducation à la paix, l’éducation bilingue, l’éducation à la démocratie, l’éducation à la citoyenneté” (p. 146).

Este recente desafio da educação é também claramente realçado na Declaração Universal dos Direitos Linguísticos, quando se afirma que “o ensino deve estar sempre ao

serviço da diversidade linguística e cultural, e das relações harmoniosas entre as diferentes comunidades linguísticas do mundo inteiro” (Unesco, 1996, ponto três do 23.º

artigo). Neste contexto, podemos servir-nos das palavras de Gonçalves (2011), afirmando que, nos dias de hoje, “aprender e/para compreender são palavras-chave da educação em

línguas” (p. 94) na medida em que – tendo finalidades práticas/instrumentais, culturais,

políticas e sociais – a educação em línguas constitui um terreno fértil para a intercompreensão e para o exercício da cidadania, abrindo os sujeitos à pluralidade.

Na sequência do que dissemos anteriormente, a necessidade de a educação em línguas contribuir para uma maior humanização dos sujeitos prende-se não só com a consciência atual da carência de compreensão entre os indivíduos, mas também com a constatação de uma crescente perda de línguas e do património que elas encerram. Sabemos que “a língua não acontece num vazio” (Strecht-Ribeiro, 1998: 27), estando sempre associada uma cultura, a hábitos, a modos de viver e a formas de ver o mundo (Conselho da Europa, 2001a, 2005; Mendes, 2005; Strecht-Ribeiro, 1998). Nesta linha de pensamento, aceder a uma língua é uma forma privilegiada de aceder a uma cultura, porém, julgamos que não basta saber falar a língua do Outro para o compreender efetivamente. Como afirma Garabédian (1991), “la communication ne se suffit pas des

mots” (p. 96) pelo que é preciso que a educação em línguas procure essencialmente que os

aprendentes estejam abertos à diferença para que sejam capazes de estabelecer uma relação intercultural baseada na intercompreensão, encarando a língua como aspeto fundamental da cultura e, por isso, como um meio atingir um verdadeiro entendimento entre os sujeitos, contribuindo para a construção de um futuro que visa o bem comum (Conselho da Europa, 2005; Leif, 1981).

Entendemos aqui que educar em línguas atualmente pressupõe que se encare a língua como algo que não se limita a um conjunto de vocábulos, de sintagmas com significados vários, mas antes como sinónimo de identidade e expressão das relações que os seus falantes estabelecem consigo mesmos, com os outros e com o mundo. A este propósito, refere Mendes (2005) que:

“as línguas constituem de facto mais do que instrumentos de comunicação, são indissociáveis da cultura de que são veículo e agentes, comportam dimensões históricas que se traduzem em pertenças identitárias e, como tal, criam comunidade. Atravessam, suportam, interpretam e ultrapassam o tempo. As

línguas são a expressão da humanidade e da sua diversidade, das múltiplas maneiras de olhar o Mundo, de o pensar, de o sentir, de o sonhar e construir. Transportam memórias e constroem futuros. Designam, nomeiam, contêm e libertam os segredos partilhados da existência humana, esta nossa condição de nos sermos, reconhecermos e criarmo-nos outros; de sonharmos e edificarmos o Mundo; de dialogarmos e sentirmos no Outro” (p. 53).

Por tudo o que acabámos de afirmar, e de acordo com vários estudos, julgamos que perder uma língua significa perder a riqueza que lhe é inerente, traduzida num conjunto de formas de comunicar, de agir, de pensar e de estar. Perder uma língua significa, assim, perder uma cultura, perder uma identidade, na medida em que ela é “uma realidade

constituída colectivamente e é no seio de uma comunidade que ela está disponível para o uso individual como instrumento de coesão, identificação, comunicação e expressão criadora” (UNESCO, 1996). Os estudos publicados acerca da diversidade linguística do

mundo, sobretudo divulgados pelo Ethnologue (www.ethnologue.com) e pela Unesco (www.unesco.org.), colocam-nos perante algumas preocupações, nomeadamente, o crescente desaparecimento de línguas.

Pelas estatísticas, apercebemo-nos de que o monolinguismo é mais raro do que o plurilinguismo, contudo, sabemos igualmente que, até aos dias de hoje, se perderam cerca de 3.000 das 10.000 línguas que se falaram no mundo. Face a estes dados, vários especialistas se mostram preocupados com a acelerada extinção das línguas (Hagège, 2000; PNUD, 2004; Skutnabb-Kangas, 2000, 2002; Wurm, 1996, entre outros). Estima-se que metade das línguas atualmente faladas corra riscos de desaparecer e/ou se encontre ameaçada, podendo as 7.000 línguas ainda existentes sofrer uma redução de 50% (numa visão mais optimista) a 90%, durante os próximos 100 anos (PNUD, 2004, Skutnabb- Kangas, 2000, 2002). Tendo em conta estas estatísticas, parecem desaparecer 25 línguas anualmente, isto é, uma língua em cada quinze dias (Hagège, 2000).

Como principais fatores do desaparecimento das línguas, assinalam-se sobretudo a redução do número de falantes (por vários motivos, desde catástrofes, epidemias e decisões políticas que levam à não aprendizagem de uma determinada língua) e as atitudes de intolerância, negativas e destrutivas das culturas dominantes (Wurm, 1996: 3-4). Também na Introdução à Declaração Universal dos Direitos Linguísticos se esclarece que

“diversos factores de natureza extralinguística (políticos, territoriais, históricos, demográficos, económicos, socioculturais, sociolinguísticos e relacionados com comportamentos colectivos) geram problemas que provocam o desaparecimento, a marginalização e a degradação de numerosas línguas, e que se torna portanto necessário que os direitos linguísticos sejam considerados sob uma perspectiva

global, para que se possam aplicar em cada caso as soluções específicas adequadas” (UNESCO, 1996).

É, neste sentido, que se tem apelidado o século XX de um século de “genocídio

linguístico” (Skutnabb-Kangas, 2000), sendo, consequentemente, um século em que urge

preservar a diversidade linguística.

No Discurso de abertura do III Congreso Internacional de la Lengua Española, Carlos Fuentes (2004) refere-se precisamente ao valor que a língua tem para o ser humano: “Nos instalamos en el mundo, nos recuerda Emilio Lledó. Pero el mundo también se instala en nosotros. La lengua es nuestra manera de modificar al mundo a fin de ser personas, y nunca cosas, sujetos y no sólo objetos del mundo. La lengua nos permite ocupar un lugar en la comunidad y transmitir los resultados de nuestra experiencia” (s.p.).

Neste contexto, o autor afirma que, se a terra existirá sem nós, enquanto realidade física, o mesmo não se pode dizer do mundo que é uma criação verbal, que não existe sem palavras, uma vez que só o compreendemos através delas. Assim, só poderemos zelar pelo bem comum se todos respeitarmos as diferentes línguas como seres vivos, numa perspetiva ecológica que considera que as mesmas evoluem enquanto seres inacabados, sofrendo influências de vária ordem. Para reforçar a necessidade de todos (de cada um de nós) respeitarmos e preservarmos a diversidade linguística, refere Martins (2008) que “só o

muito pode salvar o um” (p. 108) e vice-versa.

Se tomarmos como exemplo o contexto europeu, no qual nos situamos, verificamos que se têm movido inúmeros esforços no sentido de reforçar a ideia de que a construção da Europa e a sua coesão cultural se definem na unidade e, simultaneamente, na diversidade (Mendes, 2005: 55).

Nesta linha, e tendo em conta o enfoque do nosso trabalho, julgamos que é no respeito da unidade e, simultaneamente, na preservação do “laço vital com a diversidade” (Morin, 2002: 116) que poderá residir o principal contributo da educação em línguas. Como veremos mais adiante, a propósito das políticas linguísticas europeias, parece-nos que através de uma educação que respeite e zele pela diversidade linguística, enquanto “valiosa fonte comum”, poder-se-á contribuir para uma verdadeira concertação europeia e mundial (Conselho da Europa, 2001a: 20; Martins, 2008; Mendes, 2005). É neste sentido que o Conselho de Europa (2001a) tem defendido que “são necessários esforços

obstáculo à comunicação, se torne numa fonte de enriquecimento e de compreensão recíprocos” (p. 20; ver também Delors, 1996).

À luz destas ideias, tem-se vindo a defender que a construção da casa comum da Europa (Comission des Comunnautés Européennes, 2003) implica o reconhecimento de uma dimensão europeia da didática das línguas (Alarcão et al., 2004; Ferrão-Tavares, 2000, entre outros), capaz de resolver a tensão existente entre a unidade e diversidade, entre valores universais e valores diferenciais. É nesta linha que se tem procurado pôr em prática uma educação em línguas mais plural, isto é, uma educação em línguas direccionada para o plurilinguismo que promova a unidade dos membros que habitam essa mesma casa, através de uma ação comum que não prejudique a identidade de cada um. Nas palavras de Starkey (2002), “la construction d'une Europe pacifique, démocratique et

multiculturelle demande des citoyens plurilingues” (pp. 33-34). Porém, não podemos

esquecer que importa, simultaneamente, abrir as portas dessa mesma casa a outras realidades, isto é, importa não fechar a Europa ao resto do mundo, sendo que a educação em línguas deve preparar os sujeitos para o diálogo com o Outro, numa perspetiva de educação (inter)planetária. Assim, neste trabalho, assumimos que aprender línguas atualmente ultrapassa o domínio de uma ou mais línguas, consistindo sobretudo num saber comunicar, compreender e relacionar-se com os outros e com a diferença.

Nesta perspetiva, assumimos que as línguas (e a sua aprendizagem) podem ser “importantes factores mediadores do desenvolvimento de um cidadão capaz de participar numa sociedade cada vez mais marcada pela diversidade linguística e cultural, na medida em que contribuem para promover atitudes e competências favoráveis ao contacto intercultural” (Andrade & Araújo e Sá et al., 2003: 489). Em jeito de síntese, entende-se que a educação em línguas deve assumir diferentes dimensões (nomeadamente, uma dimensão política, social, ética e humana), não contemplando apenas a dimensão meramente instrumental, funcional ou comunicativa que perdurou durante algumas décadas no ensino das línguas (Alarcão, 2008; Alarcão et al., 2004, 2009; Andrade & Araújo e Sá, 2001; Andrade & Araújo e Sá et al., 2003; Martins, 2008; Mendes, 2005; Phipps & Gonzalez, 2004). Nesta perspetiva, a educação em línguas assenta essencialmente numa abordagem mais alargada das línguas, operacionalizada por uma didática capaz de responder aos desafios das sociedades atuais e de preparar um futuro melhor para todos. Alguns autores apelidam esta didática de didactique plurielle (Dabène, 2000) ou, utilizando expressões no plural, didactiques des langues (Coste, 2000) ou ainda

didactiques du plurilinguisme (Candelier, 2008). Ela assume-se, assim, como uma didática

mais preocupada com a aproximação entre as pessoas, com o respeito pela diferença, com a tolerância e com a democracia por meio da comunicação (Melo, 2006). Ademais, postula uma nova visão da educação em línguas que vem opor-se ao ensino compartimentado das línguas (incluindo a língua materna), procurando mostrar que a coexistência de experiências linguísticas variadas é positiva para os sujeitos (Andrade & Araújo e Sá, 2001; Andrade & Sá, 2010; Beacco & Byram, 2003).

Como explicitaremos no ponto que se segue, é com este propósito que se foram delineando determinadas medidas políticas e educativas capazes de tornar concretizável uma educação em línguas que zele pela preservação da diversidade linguística, pela cidadania democrática e pela intercompreensão entre os sujeitos e os povos.