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Entrega de produtos ao PAA, modalidade “compra e doação simultânea”, em aldeia indígena urbana Marçal de Souza Foto feita em 2012, e cedida por Edilson Soares.

Sobre a criação da Assol a pesquisa, organizada pelas estudantes do Curso de Ciências Sociais da UFGD, pelo Programa Nacional de Educação nas áreas de Reforma Agrária (Pronera)21 mostra:

[...] ainda no que diz respeito às estratégias para permanecerem no sítio foi criada a Assol – uma associação com a finalidade de negociar melhores condições de comercialização da produção, bem como criar projetos que possam incluir também os jovens e mulheres do grupo no processo produtivo. Como é o caso de um subgrupo que está sendo criado no intuito de fazer o aproveitamento do buriti, um fruto típico do cerrado. A experiência envolverá aspectos não só econômicos, mas de agregação de valores pessoais e coletivos, interação social. Através da associação conseguiram uma parceria com a prefeitura de Terenos e Conab – Companhia Nacional de Abastecimento, através do programa PAA Programa de Aquisição de Alimentos e doação simultânea, em que a prefeitura compra os alimentos dos assentados e assentadas e doa a um grupo/comunidade ou entidade carente (SOUZA; RODRIGUES, 2012, p. 21).

A criação da Assol motivou o grupo a encaminhar parcerias, uma delas foi à tentativa de criar um banco de adubação verde, com apoio do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa), no ano de 2011, além da compor as discussões do Fórum Estadual de Economia Solidária desde sua fundação. Em relação à infraestrutura, a Assol conseguiu uma área para construção da futura sede, e recebeu a doação de um pequeno trator do patrimônio

do Mapa, e também adquiriu um caminhão pequeno e usado, para realizar o transporte de produtos na localidade. Pela análise dos documentos da associação, observamos que nela existe um subgrupo ou núcleo de agroecologia, composto por seis famílias, vinculado à Associação de Produtores Orgânicos de Mato Grosso do Sul (Apoms), que por um período de aproximadamente um ano (2011 e 2012), teve participação na feira semanal de orgânicos, organizada pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), em Campo Grande. Vale salientar que no ano de 2014, a APOMS22 conseguiu aprovação de um projeto na Petrobrás, o que consequentemente levou-a a um acompanhamento mais sistemático das famílias, com assistência técnica, insumos e articulação para troca de experiências, visando fortalecer a produção agroecológica e a certificação da produção.

1.4 O processo de infraestrutura no assentamento: o sistema de Educação

Em relação à educação no assentamento Émerson Rodrigues, de uma população de 166 famílias, segundo levantamento realizado em 2008, pela parceria entre a Aesca, a Caixa Econômica Federal e o Incra, para construção das casas do Projeto de Habitação do Governo Federal, o assentamento contava com 334 crianças no ensino fundamental, 90 no ensino médio, além de dez pessoas assentados com nível superior. Mesmo diante do elevado número de crianças, o assentamento não conta com escola e nem mesmo no Complexo Santa Mônica. O acesso das crianças até a escola é realizado pelos ônibus escolares, percorrendo, para isso, 15 km até chegarem à escola Salustiano da Motta, localizada no Assentamento Patagônia, espaço que atende o maior número de crianças do assentamento. Há, ainda, crianças com idade inferior, que estudam na escola do assentamento Campo Verde, localizado a cerca de 15 km do Émerson Rodrigues. Já em relação ao Ensino Médio, os alunos dessa fase são atendidos pelo Estado, numa extensão da escola da cidade de Terenos, com a estrutura da escola municipal, emprestada no período noturno. Essa extensão funciona dentro da Escola Municipal Salustiano Correia da Motta, também há 15 km do assentamento.

Em virtude do elevado número de estudantes no ensino médio, há uma reivindicação antiga pelo seu oferecimento durante o dia, sendo que para essa demanda as famílias têm se reunido e encaminhado solicitações, como a de 2010, quando um grupo de mães e pais entregou um abaixo-assinado na Secretaria de Estado de Educação, quando pautaram a

preocupação com jovens e adolescentes expostos a envolvimentos com drogas e alcoolismo, mais frequentes no período noturno. Sobre a realidade vivida na escola e no transporte escolar pelas crianças do assentamento, encontramos o seguinte diagnóstico:

[...] desde este período as crianças saem do assentamento de ônibus e vão para três escolas que existem na região. De ônibus as crianças chegam a percorrer entre 15 e 50 km para chegar à escola. O trajeto até a escola: os ônibus são precários, velhos, estão sempre com problemas mecânicos. Normalmente estão cheios, não cabendo todas as crianças. As estradas normalmente estão esburacadas, e péssimas para o trajeto. Não há nenhum adulto que se responsabilize pelo cuidado com as crianças, desta forma, há violência no interior dos ônibus. As crianças brigam, disputam espaço, machucam-se, agridem-se fisicamente e emocionalmente também. Há vários relatos deste tipo de violência. Outra realidade vivenciada pelos educandos do assentamento diz respeito a conteúdo do processo educacional. O modelo de escola e educação é altamente urbano. Nem um pouco voltado para a realidade do campo. Não dialoga com esta realidade, não parte desta realidade. Copia um sistema de ensino ’comprado’ pelo município, onde o mais importante é ‘preparar os alunos para competir no mercado’. Sobre os professores, há muito que se refletir também. Falta capacitação adequada, de acordo com a realidade do campo, e de acordo com as necessidades dos educandos. Falta material didático e pedagógico de acordo. Falto incentivo salarial, para que eles não necessitem de sobrecarga de horário de trabalho. Falta que os professores se desafiem a estudar e produzir novos conhecimentos, de acordo com a realidade. Alguns professores também conseguem seus ‘cargos’ em troca de voto, desta forma, é comum os professores serem cargos de confiança, Enfim, falta também a liberdade da tutela da secretaria de educação que os trata como seres sem capacidade de produção de conhecimentos23.

Ainda em relação à educação escolar, a Prefeitura organizou o trajeto colocando pontos de ônibus para as crianças, embora haja várias reclamações de que estes estão localizados distantes das casas, o que causa medo quanto à segurança das crianças. Existe um ônibus que circula nos três períodos do dia: manhã, tarde e noite. Quando chove os ônibus raramente passam, e/ou atolam nas estradas com condições nem sempre próprias para circulação nos dias de chuva. Isso provoca atraso na chegada das crianças nas escolas e nas casas, sofrendo inúmeras vezes de fome e frio. Nos períodos de inverno, com frio intenso, com os dias curtos, as crianças têm que sair de casa ainda escuro (quem estuda pela manhã) e retornam à noite (quem estuda pela tarde). Os que estudam à noite, em geral, os mais velhos, também sofrem problemas semelhantes, saindo de suas casas no meio da tarde e só retornando no início da madrugada.

23 Parte de um trabalho elaborado pela autora para o Curso de Especialização em Educação do Campo pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, no dia 12/2/2010.

No que se refere à habitação, é preciso destacar que esta recebeu mais atenção a partir das mobilizações por direitos sociais, acontecidas em todo o país e batizado pela imprensa de “Abril Vermelho”, especialmente aquelas de 2009, quando famílias do assentamento acessaram o “crédito habitação”, no valor de onze mil reais para a construção das casas. Este direito pela moradia no campo decorreu da criação de um programa no âmbito nacional, resultado de históricas e intensas negociações entre governo e sociedade civil.

É preciso destacar que, até então, não havia projeto de construção massiva, de casas populares na zona rural, mas os investimentos na área eram escassos e pouco permitia quanto à construção de casas isoladas e de tamanho pequeno. A partir de 2009, com as mobilizações realizadas pautando a importância de moradias no campo, resultou numa parceria entre governo federal, através da Caixa Econômica Federal, e as entidades locais dos movimentos sociais organizados. Segundo reflexão do MST no MS, junto aos assentados,

[...] a construção das nossas casas é muito importante. A reforma agrária, enquanto conceito está definido desde a criação do Estatuto da Terra como ‘um conjunto de medidas que possibilite o desenvolvimento econômico, social e cultural de um determinado território e, consequentemente, de um determinado grupo social’. Por isso, os movimentos sociais têm lutado por crédito, energia elétrica, escolas, saúde, centros comunitários, quadras poliesportivas e, principalmente, construção de moradias com um mínimo de decência para que as famílias tenham conforto e satisfação familiar. Essa conquista deve ser valorizada, pois as melhorias das casas no meio rural nunca apareceram como um problema social a ser resolvido pelos governos (MST/MS, 2009, p. 3).

Este projeto de construção das moradias foi coordenado pela Aesca, que tem como organização o trabalho em mutirão, realizado em grupo de famílias beneficiadas com casas, associando uma gestão dos recursos adequada pela aquisição de materiais com baixos custos, e de qualidade. Isso rendeu à Aesca um prêmio da Caixa Econômica Federal, na modalidade de tecnologia alternativa de baixo custo, empregada na construção das casas nos assentamentos do MST, em MS. De acordo com a planta orientada pela equipe de arquitetura da Aesca, cada casa possui 71 m2, e segue um projeto padrão, com três quartos, varanda, cozinha e sala conjugada. São casas de padrão médio, confortáveis, fazendo com que as famílias tenham moradias adequadas, como podemos observar nas imagens que apresentamos a seguir:

Foto 14: Casa em construção, localizada ao lado do antigo barraco de madeira. Fotos registradas pela