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3 METODOLOGIA

3.2 ENTREVISTA COM OS SUJEITOS DA PESQUISA

Para atingir os objetivos específicos da pesquisa, julgamos pertinente estabelecer a entrevista como técnica de pesquisa. Porém, antes de abordá-la especificamente, faz-se necessário apresentar os pressupostos epistemológicos que fundamentaram sua escolha e aplicação.

Segundo González Rey (2005), ao se pensar em realizar uma pesquisa qualitativa em ciências sociais é imprescindível que uma reflexão epistemológica seja feita. Caso não seja, corre-se o risco de manter a posição instrumentalista característica das pesquisas quantitativas, as quais consideram os instrumentos e técnicas de pesquisa como “via de produção direta de resultados na pesquisa (GONZÁLEZ REY, 2005, p. 3)”.

Nessa perspectiva, o autor fez a seguinte crítica. Pesquisas sociais que a princípio consideram-se qualitativas têm assumido diante dos dados de pesquisa uma postura positivista, considerando os dados coletados através dos instrumentos fins em si mesmos, como se fossem a direta representação dos conhecimentos que se pretende alcançar. Fato que tem ocasionado a incorreta compreensão de que o que define o tipo de pesquisa são os instrumentos utilizados. Instrumentos quantitativos gerarão dados quantitativos e instrumentos qualitativos gerarão dados qualitativos.

No entanto, González Rey (2005) tem uma compreensão contrária. Para o autor, o que caracteriza uma pesquisa não é o tipo de instrumento, mas a forma como são considerados. Numa pesquisa qualitativa a etapa de coleta de dados deve

passar a ser considerada como uma etapa de construção da informação, e os instrumentos ao invés de serem considerados os responsáveis pela descoberta das informações (conhecimentos), são na verdade, apenas, ferramentas que auxiliam o pesquisador a construir informações e produzir conhecimento referente a determinado fenômeno.

Assim, o autor convoca o pesquisador social a assumir o seu papel, no qual deve reconhecer e aplicar as características que o diferenciam dos pesquisadores das ciências naturais. Ou seja, a função de um pesquisador social é diferente de um das ciências naturais, pois seu campo de estudo é particular. Nele, as informações não se encontram prontas e, portanto, os dados que os instrumentos permitem coletar não expressam por si só a realidade. Dessa forma, o pesquisador social tem o papel de construtor da informação, devendo, a partir de seus conhecimentos sobre o campo que pretende estudar, estabelecer uma relação dinâmica com seu objeto e/ou sujeitos de pesquisa, para que, assim, possa não coletar, mas interpretar e construir informações/conhecimentos.

Portanto, é com base nessa compreensão quanto ao que vem a ser a pesquisa social que os instrumentos e procedimentos desta pesquisa foram estabelecidos. Ou seja, para refletir sobre os fatores que têm influenciado a permanência ou ausência dos alunos surdos nas escolas regulares municipais da cidade de Salvador durante seus primeiros anos escolares, foram definidos os instrumentos e procedimentos que possibilitariam o pesquisador relacionar-se dinamicamente com seu objeto e sujeitos, de forma a construir informações que o auxiliem na compreensão do fenômeno pesquisado.

Nesse sentido, optamos em realizar com os sujeitos da pesquisa uma entrevista fundamentada na proposta de sistemas conversacionais de González Rey (2005). Conforme o autor, a comunicação é uma via privilegiada para se conhecer o sujeito, através dela, a partir do uso de diferentes formas de expressão simbólica, o sujeito expressa seus processos de sentido subjetivo.

3.2.1 Sujeitos das entrevistas

Como sujeitos das entrevistas, inicialmente, planejávamos entrevistar três pessoas em cada escola, o coordenador pedagógico, o professor e o familiar

responsável pelo aluno surdo. No entanto, durante as visitas às escolas identificadas, não foi possível entrevistar todos os sujeitos previstos. Em algumas todos os sujeitos planejados foram entrevistados, porém em outras só foram o coordenador e o professor, ou o professor e o familiar, ou, ainda só o professor. Além disso, em algumas escolas no lugar do coordenador pedagógico foi entrevistado o diretor ou vice-diretor da escola.

Acreditamos que esse fato não afetou a pesquisa. Os casos presentes em cada escola foram semelhantes. Com relação ao coordenador pedagógico ou diretor, nas escolas em que foram entrevistados, suas falas eram parecidas com a dos professores. Quanto aos familiares, um maior número de entrevistados enriqueceria o trabalho, porém, os que foram entrevistados, apresentaram posições similares quanto à educação de seus filhos. No total foram entrevistados: 13 professores; 3 coordenadores; 4 diretores; 1 vice-diretor e 14 familiares.

Complementando o grupo de sujeitos participantes das entrevistas, almejávamos, também, entrevistar representantes das Secretarias de Educação, Municipal e Estadual, a fim de conversar sobre as informações obtidas nas entrevistas realizadas nas escolas. Todavia, só foi possível entrevistar o representante da Secretaria Estadual de Educação, técnico da área da surdez da Coordenação de Educação Especial do Estado da Bahia.

É importante ressaltar que nosso trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública, sob o protocolo nº. 071/2010 (ANEXO A), tendo adotado como procedimento anterior a todas as entrevistas a apresentação do termo de consentimento livre e esclarecido (APÊNDICE A), documento que apresenta aos sujeitos informações pertinentes sobre a pesquisa e sua participação.

3.2.2 Roteiro das entrevistas

Para o planejamento das entrevistas, recorremos mais uma vez a González Rey (2005), o qual faz uma interessante pontuação sobre as diferentes formas de se considerar a entrevista. Conforme o autor, a entrevista em muitos momentos tem sido utilizada a partir da epistemologia da resposta, a qual influenciada pelo princípio estímulo – resposta é compreendida como um instrumento que possibilitará o

pesquisador a partir de um estímulo (pergunta) extrair do entrevistado as informações desejadas.

Porém, González Rey (2005) chama atenção para algumas questões. Nessa concepção, as respostas obtidas tendem a serem cognitivas, socialmente constituídas e isentas de sentidos subjetivos. Geralmente, os sujeitos não se encontram implicados no processo, já que as perguntas os omitem, dificultando a comunicação e não permitindo que eles se expressem de forma autêntica.

Em contrapartida, a epistemologia qualitativa proposta pelo autor considera a entrevista não como um instrumento determinista utilizado para obter respostas lineares e pontuais, mas sim como um meio pelo qual a expressão do sujeito pesquisado pode ser provocada. Nessa perspectiva, as informações que pretendemos alcançar são de cunho subjetivo, não sendo possível atingi-las através de instrumentos impessoais, rígidos e impostos. Uma entrevista nos moldes da epistemologia qualitativa busca oferecer indutores (questões) significativos ao entrevistado, possibilitando um cenário favorável à sua participação, construção e expressão de sentidos subjetivos.

Rompendo com a epistemologia da resposta, González Rey (2005) apresenta como metodologia de entrevista os sistemas conversacionais:

“[...] os quais permitem ao pesquisador deslocar-se do lugar central das perguntas para integrar-se em uma dinâmica de conversação que toma diversas formas e que é responsável pela produção de um tecido de

informação o qual implique, com naturalidade e autenticidade, os

participantes (GONZÁLEZ REY, 2005, p. 45, grifo do autor)”.

Uma entrevista baseada em sistemas conversacionais objetiva estabelecer um processo dinâmico de co-participação tanto do sujeito como do pesquisador, pois mesmo sendo este quem, a princípio, estabelece as questões para discussão (indutores), os dois podem apresentar suas experiências, dúvidas e tensões.

González Rey (2005) informa que as conversações devem ser estimuladas por temas gerais que impliquem o outro, que desperte nele o desejo de ser ouvido, de expressar sua experiência, representando um momento significativo de sua vida. Pois, é o entrevistado quem deve se situar de onde nos falará.

Assim, é nesse sentido que nossa pesquisa pretende desenvolver a entrevista com os sujeitos, tendo construído, para tanto, diferentes roteiros de sistemas conversacionais, abordando temas condizentes com cada grupo de sujeitos

(APÊNDICE B, C, D, E, F e G). Tais roteiros constituem-se como indutores, os quais foram estabelecidos no intuito de facilitar a conversação e construção de informações a respeito das experiências de cada sujeito durante o processo de inclusão das crianças surdas nos seus primeiros anos escolares.

Os roteiros de entrevista elaborados, apesar de se diferenciarem uns dos outros pela sua estrutura, assemelham-se pelo conteúdo abordado. Ao produzir tais roteiros, buscamos abarcar as seguintes categorias de análise: aspectos pedagógicos da educação do surdo e política inclusiva, opiniões dos sujeitos envolvidos.