• Nenhum resultado encontrado

Esclarecimento e redenção: autoctonia e maldição em Édipo em Colono

No documento AS SEMENTES DE CADMO: Alessandro Eloy Braga (páginas 147-154)

PARTE 2 – AUTOCTONIA E CIDADANIA NAS TRAGÉDIAS DO CICLO TEBANO

9.2. Esclarecimento e redenção: autoctonia e maldição em Édipo em Colono

Édipo em Colono é uma peça marcada pela negação da autoctonia mediante uma

tomada de consciência, pelo esclarecimento do protagonista, a fim de obter a paz de espírito e a sublimação, ao contrário das demais tragédias do ciclo tebano, onde vemos a busca da reconciliação com a terra-mãe, a permanência nesta e, assim, a afirmação do ‘sentimento de pertença’ mútua com a patris multifacetado em diferentes situações333. Sófocles oferece a Édipo a remição da maldição de sua estirpe, após ter experimentado uma sucessão de enormes desgraças e profundo sofrimento.

Como que ao fim dessa experiência trágica, no curso de um trajeto que o leva a um amadurecimento do olhar sobre o que lhe cerca, Édipo passa a ser o único entre os cidadãos tebanos a ter consciência de que sua autoctonia – seu nascimento e sua permanência no solo pátrio, sua ligação congênita com a terra-mãe – é a origem de todo o seu mal (v. 212): “Sou de uma raça hedionda”, a raça de Édipo, de Laio, de Lábdaco, de Penteu, de Agave, enfim, a raça de Cadmo. O velho cego ironicamente vê que alguma paz apenas seria possível longe do solo tebano de que brotou, na terra justa e próspera que encontrou na Ática.

É após sua saída de Tebas e sua chegada a Colono que a ele é revelado que os deuses, que outrora o derrubaram e agora o erguem (v. 394), lhe ofereceram a expurgação de suas impurezas e o descanso do espírito, vencendo a própria morte; como acontece de forma semelhante ao próprio Cadmo334 e sua esposa Harmonia. De alguma maneira singular, ao fim de sua vida, Édipo é recebido por um (v. 1660) “emissário dos deuses”, senão é o próprio mundo dos mortos que de forma benevolente se abre para ele de maneira completamente indolor e tranquila (vv. 1662-1663): “[...] os sombrios fundamentos da terra, o reino dos mortos que se abriram diante dele, num acto de benevolência”. Como relata o Mensageiro na parte final da peça (vv. 1663-1664), “é que o ancião não partiu no meio de gemidos ou de sofrimentos e

333 Sobre estas expressões multifacetadas da autoctonia nas tragédias do ciclo tebano, ver a Segunda Parte deste trabalho de tese.

334 Segundo estudos de Grimal (2005b, 68), na tradução de Jabouille, ao fim de sua vida mortal, “Cadmo reinou então sobre os Ilírios e teve um filho a quem deu o nome de Ilírio. Pouco depois, porém, tanto ele como Harmonia foram transformados em serpentes e alcançaram os Campos Elísios”. Assim, Cadmo, após carregar o

miasma de assassino e ser provocador da nemesis de Ares, recebe a redenção divina e uma nova existencialidade

de paz e tranquilidade nos Campos Elísios. Segundo Burkert (1993, 386), na tradução de Loureiro, “entrar no Elísion significa evitar a morte. Este é o destino dos eleitos. ‘Elísion’ tornou-se o nome misterioso e imperscrutável que designa o local ou a pessoa que foi atingido por um raio, enelysion, enelysios. A morte por fulminação é ao mesmo tempo destruição e eleição. Com ela se encontra entrosado o motivo mítico do transporte miraculoso para uma ilha pura e distante [...]”.

| 147 |

doença, mas de uma forma prodigiosa, se a algum mortal o é possível”. Como compreende Szondi335 acerca da trajetória trágica do herói Édipo, “é apenas no final do caminho para a ruína que estão a salvação e a redenção”, após ter sucumbido e amargado toda a sorte de infortúnios e ter vivido sua experiência trágica fundamental.

Tal como Cadmo, que, após chegar à Beócia onde assassinou o dragão, só conheceu a prosperidade e mesmo a paz após abandonar o solo de Tebas e encaminhar-se para a Ilíria, deixando no trono tebano o neto Penteu, filho de Agave e Equíon336, Édipo, da mesma maneira, somente encontra sua redenção ao distanciar-se de Tebas, após ter cumprido seu desafortunado destino em solo Tebano, após ter vivido a parte que lhe cabia na maldição que poluía a sua linhagem autóctone. “Na morte, heroicizado e imortalizado, Édipo faz o caminho inverso ao de

Édipo Rei: é sua ascensão”337.

Negar o retorno a Tebas para morrer junto à patris e com sua morte proteger a cidade mediante a presença de seu corpo sepultado, é negar também a sua autoctonia. A iluminação de Édipo em relação a Tebas, em grande medida, coloca em jogo a ideia aristotélica de que a pátria é o único lugar onde o cidadão pode ter assegurada a “vida boa”338, concepção que não se aplica à Tebas representada nas tragédias. Em Édipo em Colono, a ideia de autoctonia como bem maior do autochthon é subvertida, e a autoctonia, no caso Tebano, configura-se como o mal maior do autochthon. Nesta perspectiva, a visão de Zeitlin339 de que Tebas é um reflexo negativo de Atenas ganha força mais uma vez, haja vista que, se na Ática Édipo encontra o consolo e a auto reconciliação que desejava, é porque este solo ático, especialmente, oferece aos indivíduos o bem, mesmo para um estrangeiro, como atestam as palavras de Édipo (vv. 260-262): “E dizem que Atenas é um modelo de piedade, a única cidade a proteger um hóspede em apuros, a única a poder defendê-lo!”, e como o próprio velho cego vai constatar no desenvolvimento da peça.

Por outro lado, a negação de seu retorno a Tebas, sob as mãos de Creonte ou de Polinices, pode ser também entendida como uma vingança de Édipo contra todo o mal que sua cidade o fez viver, bem como uma vingança contra aqueles que o expulsaram: Creonte e

335 Szondi (2004, 89), na tradução de Süssekind.

336 Vide Grimal (2005b, 68). O relato constituído por Grimal é diferente da história contada por Eurípides em As Bacantes, tragédia na qual Cadmo já teria passado o trono para o neto Penteu, mas ainda continuava a viver em Tebas, tendo ainda presenciado a morte de Penteu pelas mãos da própria mãe, Agave, sob os encantos de Dioniso.

337 Hirata (2002, 13).

338 Vide Aristóteles (Pol. 1252b28-29). 339 Vide Zeitlin (1986, 144-149).

| 148 |

Polinices – o filho contra quem Édipo passa a nutrir um forte ódio340, expresso em suas próprias palavras (vv. 1173-1174): “o meu odiado filho, cujas palavras me seria mais odioso suportar para os meus ouvidos do que as de qualquer outro homem” –, e que ainda continuam humilhando-o, ao planejar sepultá-lo nas imediações da cidade e não no exato solo tebano. “Tebas prepara-se para converter o corpo do cego numa espécie de talismã, sem que o deixe de tratar como um proscrito e impuro”341. Em Édipo em Colono, neste sentido, Sófocles faz com que a dialética trágica recaia não sobre Édipo, mas sobre Polinices, Creonte e a própria Tebas, representada na figura de seus tiranos como anuncia Creonte (vv. 737- 738): “não represento um cidadão, mas encontro-me aqui por ordem de todos eles”. Tebas, pela voz de Creonte, reclama a volta de seu autochthon (vv. 759-760): “[...] a tua cidade natal reclama com maior razão o teu respeito: foi ela quem te alimentou outrora”, apelando à dívida que o autochthon teria com o solo que lhe deu à vida e o alimentou.

O trágico realiza-se no momento em que os tiranos e a cidade percebem que a ação de expulsar Édipo com intuito de salvarem-se do miasma que julgam ser por ele carregado, por pensarem ser ele portador de males, converte-se em destruição, quando o Oráculo profetiza que o insepultamento do filho de Laio em Tebas faria cair males sobre a cidade. O destruidor converte-se em salvador e protetor e a ação tida como salvação converte-se em aniquilação. Nas revelações de Ismena a Édipo representadas no passo abaixo, instaura-se a dialética trágica central da peça (vv. 410- 411):

ÉDIPO:Pois de mim jamais hão-de dispor!

ISMENA: Isso virá então a custar caro aos filhos de Cadmo. ÉDIPO: Em que circunstâncias, minha filha?

ISMENA: Por ação da tua cólera, quando estiveram próximo do teu túmulo.

Vingança ou apenas esclarecimento, o fato é que Édipo nega sua autoctonia ao perceber que seus males advêm da linhagem que nasceu do solo amaldiçoado. Édipo abandona sua origem tebana para assumir agora o papel de um cidadão ateniense, pelas mãos de Teseu.

340 Wallace (1979, 44-45) chama a atenção para a hostilidade, mesmo que inconsciente, que caracteriza as relações entre Édipo e seus dois filhos e que se estende a seus outros parentes masculinos (Laio e Creonte), em oposição ao amor com que sempre recebe e acolhe seus parentes do sexo feminino; comportamento que pode ser observado tanto em Rei Édipo quanto em Édipo em Colono. Em relação a esta hostilidade, parece-nos interessante lembrar que a maldição de Ares contra Cadmo e sua linhagem real, cuja existência defendemos neste trabalho de tese, tem como alvo principal os parentes masculinos, são eles que experimentam geração após geração a hostilidade que gera enfrentamentos verbais, desavenças e mesmo à aniquilação de uns pelos outros, desde os

Spartoi até Etéocles e Polinices. 341 Fialho (1996, 14).

| 149 |

Na interpretação de Knox342, Édipo pediu por refúgio, mas a ele é dado muito mais, porque Teseu faz dele um cidadão da Ática e assegura a ele a plena proteção pela sua nova cidade, como ouvimos nas palavras do rei de Atenas no seguinte passo (vv. 635-639):

Tomando isto em conta [as promessas de benesses de Édipo], de modo algum irei rejeitar o favor que ele oferece, mas proporcionar-lhe moradia nesta terra como cidadão.

(Dirigindo-se ao Coro)

Se apraz ao estrangeiro permanecer aqui, ficas destacado para lhe servir de guarda.

Os últimos momentos de Édipo são de consciência acerca de sua vida, de seu destino e do mal que recai sobre a estirpe autóctone de Tebas. Tal consciência parece ser o que faz com que ele peça a Teseu que não permita que suas duas filhas voltem à cidade natal, para que permaneçam em segurança na Ática. Contudo, tomada pelo instinto fraternal que lhes é próprio, Antígona e Ismena, por fim, após do desaparecimento do pai, decidem retornar à pátria para evitar o fratricídio dos irmãos (vv. 1770-1771) na luta pelo trono tebano e quiçá cuidar do irmão Polinices que lhes rogou proteção após a morte (vv. 1405-1410).

As filhas repetem a mesma ação equivocada tomada pelo pai na juventude e agora também pelo irmão Polinices: retornam à amaldiçoada cidade depois de terem a oportunidade de viver livres dos males rogados pela divindade, em outra cidade onde foram bem acolhidas. O resultado do retorno de Antígona e Ismena, Sófocles já o revelara anos antes em Antígona, a primeira peça de sua trilogia tebana: o sofrimento marcado pela dor, pela desilusão e a morte da primeira pelo suicídio. Quanto aos seus dois filhos, a estes Édipo profetiza um fim amaldiçoado sob os olhos da divindade que agora estão fixos nos dois irmãos: o fratricídio como resultado da disputa pelo poder em Tebas, como lemos nas palavras de Édipo (vv. 1370-1378):

É por isso que a divindade tem os olhos fixos em ti – e não ainda como o fará em breve, se é verdade que os teus exércitos avançam sobre Tebas. É que não te será possível arrasar aquela cidade: pelo contrário, tu hás-de cair, manchado por crime de sangue, e teu irmão cairá de igual maneira.

| 150 |

Estas maldições sobre vós ambos, já eu as havia soltado antes, mas agora convoco-as a acorrer em meu auxílio, para que aprendais que é necessário honrar os progenitores e não votá-los ao desprezo, lá porque, tal como sois, nascestes de um pai cego.343

Sófocles, em sua última peça, escreve sobre um herói envelhecido e a recompensa que ele recebeu por seus sofrimentos344. Na morte que Édipo tanto ansiava, ao seu herói que sofreu mais intensamente e por mais tempo, presenteia-o com uma imortalidade e poder, como protetor da Ática, a cidade que o acolheu e o salvou da maldição transmitida pelo solo tebano que poluía sua família345. Mas sua redenção na morte apenas tornou-se possível pela negação de sua autoctonia por meio do prêmio dado pelo tragediógrafo a Édipo ainda em vida e longe do maldito solo tebano: o esclarecimento.

343 Consideramos, no corpo deste trabalho de tese, que tal maldição não tem Édipo como origem, mas apenas como transmissor do destino, tal qual um oráculo. O fratricídio é parte, na verdade, da maldição de Ares que poluiu a terra tebana e a descendência de Cadmo.

344 Vide Knox (1966, 143).

345 Vide Knox (1966, 162). Knox (1966, 143-144) entende ainda que a peça é uma espécie de ode a Atenas, pois, para o estudioso, o Édipo envelhecido desta peça representa uma Atenas cansada das batalhas dos últimos anos da Guerra do Peloponeso, mas que, mesmo derrotada e fisicamente destruída, ainda florescerá em sua força imortal, conferindo poder àqueles que a amam, porque a cidade, assim como Édipo, pode morrer, mas apenas para tornar-se imortal.

| 151 |

C

APÍTULO

10

O

S

S

ETE CONTRA

T

EBAS E O TRIUNFO DE

A

RES

Os Sete contra Tebas é a única das peças compostas por Ésquilo346 como parte de sua trilogia sobre a cidade de Cadmo, da qual também são parte Laio e Édipo, que chegou até o nosso tempo. Encenada em 467 a.C., a trilogia rendeu ao tragediógrafo o primeiro prêmio nas Grandes Dionísias daquele ano, na qual também apresentou Esfinge, um drama satírico ambientado em Tebas. Ésquilo é, assim, o primeiro dos poetas trágicos a revisitar a saga dos mitos de Édipo, Laio e Jocasta, anteriormente referenciados por Homero, na Ilíada e na

Odisseia347. Mais tarde, Sófocles e depois Eurípides também revisitariam estes mitos da cidade de Cadmo, o que, ao que sabemos, faria com que o ‘processo trágico’ tebano se tornasse num dos mais frutíferos temas entre as tragédias atenienses.

10.1. A propósito da peça

O episódio retratado nesta tragédia por Ésquilo equivale àquele também representado por Eurípides em As Fenícias e ao qual Sófocles faz referência em Antígona, que trata do problema do insepultamento de Polinices após o fim da guerra entre Tebanos e Argivos. Este filho de Édipo empreita uma luta para retomar Tebas, após ser ultrajado, como afirma Antígona, em Os Sete contra Tebas (v. 1049), por seu irmão Etéocles348, respondendo com a guerra aos atos daquele que havia usurpado o trono que outrora pertenceu ao pai.

346 Ésquilo é um tragediógrafo nascido em Elêusis, a oeste da Ática, por volta de 525/4 a.C. Sua primeira peça foi escrita em 499 a.C., porém sua primeira vitória foi em 484 a.C. Sabe-se que foi lutou nas batalhas de Maratona (490 a.C.) e provavelmente também em Salamina e Plateias (480/79). Morreu na cidade de Gela, por volta de 456/5. Diz-se que seu epitáfio celebra-o como um guerreiro que lutou em Maratona, não como poeta – vide Sommerstein (2002, 33).

347 Vide Fialho (1996, 9-10).

348 Lloyd-Jones (1959, 85), em um artigo posteriormente questionado por Dawn (1967), considera que, do ponto de vista da cidade, o tirano Etéocles era o herói, enquanto seu irmão Polinices era o traidor da cidade, ao passo que para os outros membros do oikos Polinices poderia ser considerado o que apresentava a menor culpa entre os irmãos sobre os acontecimentos que se desencadeavam; o que se reflete na postura de Antígona. Talvez, porque a guerra era uma resposta de Polinices pela traição cometida pelo irmão ao usurpar o trono, rompendo o

| 152 |

Nesta peça, em que Ésquilo fala sobre os horrores da guerra, os quais o escritor, soldado que era, deve ter presenciado várias vezes, Etéocles é o herói trágico que domina a cena de forma intensa e brilhante pensada pelo dramaturgo. Seu discurso o transforma de suplicante aos deuses349 a guerreiro impávido. Ele assume seu lugar de soberano para defender com sua espada, à frente dos seus, a cidade ameaçada pela destruição da guerra iminente. Mas tal como deve ser para a tragédia, ele é um herói dialético, em cuja figura misturam-se a grandeza da bravura e a fraqueza da ganância e do orgulho, além da aspereza e da soberba com que subjuga os direitos do irmão e fragilidade das mulheres da maldita cidade de Cadmo350. A complexidade e a integralidade deste personagem e a importância que delas resulta tem seu valor salientado por Kitto351, para quem “Os Sete contra Tebas é a nossa primeira tragédia de uma personagem e Etéocles o primeiro Homem do palco europeu”. Por outro lado, a construção do caráter e as ações deste rei tebano fazem dele também um dos mais terríveis e solitários personagens das tragédias352. Fritz353, por sua vez, entende que Etéocles é o primeiro exemplo de um grande personagem trágico completamente individualizado, um modelo de personagem que, sem dúvida, serviria de modelo para Sófocles, que foi aprimorado e tornou-se próprio da tragédia sofocliana.

Para Fialho354, nesta peça, Ésquilo concebeu uma ligação intensa e forte entre o herói trágico e o Coro, formado pelas mulheres da cidade. Uma ligação revelada com vigor na amplitude das funções que cada personagem desempenha no enredo, estabelecendo um antagonismo entre os dois355, em que um é caracterizado como o líder que tenta acreditar com

acordo feito entre ambos. Contudo, para o estudioso, aos olhos das Erínias ambos eram igualmente malditos. Temos, no entanto, que considerar que a visão das Erínias está voltada para a maldição que baseia-se na existência do miasma hereditário que ambos carregam desde o nascimento e não para uma culpa relacionada a quem agiu para provocar a guerra que alcança os portões de Tebas.

349 Fialho (1996, 77) observa como e curiosa a maneira como Etéocles associa deuses Olímpicos e Ctônicos em sua invocação das divindades com o intuito de proteger a cidade, referindo-se a entidades protetoras e perseguidoras.

350 Vidal-Naquet, na tradução de Guinsburg (2008, 247), no que se refere a atuação do Coro formado pelas mulheres tebanas, considera que Etéocles parece enfrentar dois perigos, pois além da ameaça externa, o tirano também precisa conter um possível perigo interno, que consiste na tentativa das mulheres de penetrarem no terreno da política da polis, o que é imediatamente reprimido por ele (vv. 200-202): “Diz respeito ao homem – que a mulher não palpite – / os assuntos externos: esteja em casa e não atrapalhe! / Compreendeis ou não compreendeis? Ou falo a uma surda?”.

351 Kitto, na tradução de Coutinho e Castro (1990a, 106). 352 Vide Fialho (1996, 48).

353 Vide Fritz (2007, 173). 354 Vide Fialho (1996, 23).

355 Em relação ao confronto de gêneros que se estabelece entre o tirano e o Coro formado pelas mulheres tebanas, Zeitlin (1990, 104) considera que a interação entre os sexos proposta por Ésquilo funciona como um importante espaço em que não apenas são mostradas questões sobre as relações entre o masculino e o feminino, mas também discussões acerca das relações entre o eu e o outro, o indivíduo e a sociedade, construindo uma

| 153 |

todo o ímpeto em sua vitória sobre a ameaça iminente e o outro pelo temor da horrenda violência que se aproxima a ameaçar a ordem da cidade e a dignidade dos cidadãos; temores que se confirmam no fratricídio final que vem satisfazer a ira de Ares que lança sobre a estirpe de reis

autochthones e a polis seu sopro violento (v. 64).

No documento AS SEMENTES DE CADMO: Alessandro Eloy Braga (páginas 147-154)