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2 A REFORMA DO ENSINO DA GESTÃO DE GOVERNO DE VIDAL RAMOS: AS CARACTERÍSTICAS LEGISLATIVAS, ESTRUTURAIS E

2.3 Escola Normal Catarinense

Em anos anteriores, alguns governos reclamaram da má qualidade da educação e da falta de professores adequados, comprometidos e aptos para o importante trabalho de formar os cidadãos catarinenses, como vimos nas mensagens de Felipe Schmidt e Vidal Ramos, citadas nas páginas anteriores. Por conta disto, a importância da Reforma do Ensino da gestão de Vidal Ramos, para a educação primária, foi fundamental, na tentativa de modificar a vida de muitas crianças e também da comunidade escolar. Para isto, investiu-se na construção de alguns “Grupos Escolares”, na compra de mobiliários adequados para algumas Escolas Isoladas e na produção de obras didáticas escritas pela moderna pedagogia republicana. Mas estes investimentos estruturais, por si só, não eram suficientes para remodelar a educação de Santa Catarina, pois o ponto crucial do projeto de educação estava também centrado na figura do professor. Assim, para que realmente esta especificidade do projeto fosse atingida com sucesso, era necessária a qualificação dos profissionais já existentes e dos profissionais que iriam lecionar nas escolas estaduais. Desta forma, buscou-se, principalmente, remodelar a Escola Normal, instituição onde se ensinava a ensinar. O decreto 572, de fevereiro de 1911, teve o papel da regularização das normas que integrariam a Escola Normal ao novo modelo republicano de educação.

No decreto citado, de nº 572, o governo considerava que a organização em que se encontrava a Escola Normal era composta de lacunas na distribuição prática das disciplinas que eram indispensáveis para aqueles que pretendiam dedicar-se ao magistério do estado, e que também o sistema de administração vigente daquele estabelecimento escolar não correspondia às necessidades do ensino. Afirmava que o curso da instituição deveria ser de frequência obrigatória, e que haveria modificações no artigo 215 do regulamento daquela escola, onde se falseava o principio da obrigatoriedade da frequência, estabelecendo que o aluno somente seria eliminado do curso após transcorrer 50 faltas consecutivas, facultando ao aluno interromper as 50 faltas com um dia de presença, e tornar a faltar tantos dias consecutivos. Além disso, o decreto visou a alterar a idade mínima para o ingresso na escola (DESCRETO, 1911, p. 68, 69). Instituindo as novas mudanças, o governo tratou de atingir a espinha dorsal da instituição, a grade escolar. Acreditava-se que as novas disciplinas, conteúdos e práticas escolares, ancorada nos valores republicanos da ciência, da moral, dos valores cívico- patrióticos, deveria modelar um moderno professor com a competência para instruir e educar.66

66 Para a compreender o papel da Escola Normal Catarinense no projeto modernizador desencadeado no Estado de Santa Catarina ver Gladys Mary G. Teive (2012): Civilização e Progresso: O papel da Escola Normal

Esta nova grade estabeleceu nove cadeiras (disciplinas), distribuídas ao longo do curso normal, e regidas, individualmente, por nove lentes ou professores: a 1ª cadeira era o português e princípios de literatura da língua; a 2ª era composta pelo francês e pelo alemão; a 3ª cadeira condizia às noções de história natural, física e química; a 4ª era de geografia e história; a 5ª, pedagogia e noções indispensáveis de psicologia; a 6ª cadeira englobava aritmética, álgebra e geometria plana; a 7ª abordaria desenho e ginástica; a 8ª era de música (abundância de canto e hinos); e a 9ª era referente a trabalhos manuais (RELATÓRIO, 1911, p. 73; DECRETO, 1911, p. 69). Nota-se que as disciplinas foram separadas por áreas, e não se repetiam ao longo do curso, assim o currículo passou a ser regrado e linear. Também destacamos a importância da língua estrangeira, francês e alemão, compondo a segunda cadeira, para a formação adequada dos professores bilíngues, que foram utilizados nas zonas de imigração (como veremos mais adiante). Sobre este assunto, o secretário geral Caetano Costa comentou que boa parte da população falava alemão, e por isso a inclusão dessa disciplina na grade da Escola Normal era importante para que o professor pudesse ensinar adequadamente os alunos das zonas de imigração (RELATÓRIO, 1911, p. 75).

A partir da grade apresentada, podemos concluir que houve a Constituição de áreas específicas de conhecimento que uniam determinadas matérias (disciplinas) dentro da mesma cadeira, lecionada pelo mesmo professor. Este método talvez não possibilitasse a socialização do conhecimento multidisciplinar entre as áreas diferentes. O modelo apresentado pela gestão do governo Vidal englobava muitos conteúdos, dentro de 9 cadeiras, sendo que cada uma delas era lecionada, na Escola Normal, por um professor diferente, entretanto, cabe lembrar que o aluno desta instituição – futuro profissional das escolas do estado: Escolas Isoladas, Escolas Complementares ou “Grupos Escolares” – teria de lecionar todas as disciplinas aprendidas em sua formação, e provavelmente reproduziria o conhecimento de modo fragmentando, fruto do modelo de ensino que vivenciou. Este mesmo esquema de formação do professorado foi utilizado nas reformas dos sul-riograndenses e de Nereu Ramos, com modificações de algumas disciplinas da grade escolar, como a exclusão da disciplina de alemão, já que a partir do Estado Novo não se utilizaria o professor bilingue.

De todo modo, o incremento no currículo escolar do ensino normal – tendo como premissa máxima do currículo escolar moderno “manter, imprimir e reprimir, mas com suavidade”, ou “com o coração e o cérebro” (TEIVE, 2009, p. 214) – foi fundamental para a formação adequada dos professores que o estado queria ter. E calcado nas disciplinas da nova

grade apresentada a partir de 1911, se estabeleceram novas regras para o ingresso de candidatos naquela escola. Estabeleceram-se exames de admissão mais rigorosos que os existentes até 1910. Considerou-se, conforme o decreto nº 572, que o sistema de admissão na Escola Normal não correspondia às necessidades do ensino, e por isso os exames de ingresso deveriam ser elaborados de acordo com os conteúdos do primeiro ano do curso normal, composto por:

Português – Leitura expressiva, sinonímia e exposição oral de um trecho mínimo de vinte e cinco linhas. Exposição oral de um trecho. Princípios de análise lexicológica. Aritmética – Resolver quatro problemas fáceis nos quais entrem simultaneamente as operações sobre os inteiros, fracções ordinárias e decimais. Conhecer praticamente os caracteres da divisibilidade. Achar praticamente o máximo comum, conforme os diversos processos. Decompor um número em seus fatores primos. Fracções – Reduzir frações ao mesmo denominador. Simplificá-las e extrair os inteiros. Tudo praticamente. Geografia – ideia geral sobre a Terra. Conhecimento dos mapas do Estado, Brasil, América e Europa. Brasil – superfície, população, limites, portos principais, rios principais, sistema de montanhas, regiões e suas produções típicas. Estudo elementar do Estado. Desenho – Construir conforme as regras – ângulos, triângulos, polígonos em gerais. Combinações de formas geométricas ao redor de um centro. Estrelas e suas inscrições (DECRETO, 1911, p. 70; RELATÓRIO, 1911, p. 74).

Segundo Caetano Costa, a partir do momento em que se instituíram os novos exames de admissão, se passou a exigir maior qualidade dos candidatos que iriam ingressar na Escola Normal, com reais objetivos da preparação para o magistério, e não mais para (re)aprenderem matérias já vistas no ensino primário, como se fazia até aquele momento (RELATÓRIO, 1911, p. 75). Observando a quantidade de conhecimento que o aluno deveria possuir, torna-se evidente que os exames eram difíceis, e dependiam de uma boa educação primária. Provavelmente para os alunos das melhores escolas, que eram os Grupos Escolares, os exames se tornavam mais prováveis de sucesso, se comparados aos alunos que tiveram o ensino primário em escolas de menor qualidade. Cabe ressaltar que apesar de todo o ideal de padronização do ensino, e dos profissionais de educação, ainda havia diferenças estruturais e formativas dos indivíduos, condicionando as escolas a níveis diferentes de qualidade.

Segundo Guimarães, pôr em prática os exames de seleção para ingresso na Escola Normal era uma medida muito importante para selecionar aqueles candidatos que mais se destacavam com capacidade de acompanhar o ensino da instituição. O modelo anterior de ingresso, baseado no decreto nº 348, de 7 de dezembro de 1907, era compulsório, determinando aos alunos concluintes da escola primária o direito de matrícula no ensino normal. Contudo, muitos não tinham condições de acompanhar o ensino ministrado naquele estabelecimento escolar, dado o fato de que o ensino na escola de ensino primário era considerado ruim. Portanto, era necessário um novo modelo que exigia exames de seleção para qualquer candidato

às vagas da Escola Normal, salvo os casos daqueles que tinham cursado os três anos da Escola Complementar (RELATÓRIO, 1914, p. 125).

As novas normativas se estendiam também ao direito e ao dever da frequência dos alunos nas aulas ministradas na escola. Considerando que o curso da Escola Normal – um estabelecimento de ensino profissional – deveria ser de frequência obrigatória, o governo visou a alterar a legislação, mais precisamente o art. 215, já mencionado, que exigia dos alunos uma obrigatoriedade de frequência escolar reduzida. Diante dos fatos, novas regras estabeleceram que a matrícula seria findada após 40 faltas justificadas e 15 não justificadas, sendo elas consecutivas ou não (RELATÓRIO, 1914, p. 125). Assim, o governo estreitava e diminuía a possibilidade dos alunos dispersos concluírem o ensino normal. Este fator nos leva a pensar que o regramento era condição primeira para a absorção, por parte dos alunos, do comportamento que deveriam possuir, quando em suas atuações profissionais, ou seja, o compromisso com a educação era instituído através da imposição de normas rígidas. As regras estabelecidas, e eram muitas, serviam para formar um aluno/professor afinado com os métodos modernos da educação estadual, submissos aos superiores, “ordeiro, obediente e disciplinado”.67 Também se alterou o art. 212 do Regulamento da Instrução Pública, que se referia à idade do aluno para ingresso na Escola Normal. Passou-se a permitir a matrícula de alunos do sexo masculino com 16 anos e do sexo feminino com 14 anos completos (RELATÓRIO, 1911, p. 73, 74; RELATÓRIO, 1914, p. 125). Segundo Caetano Costa, anteriormente à resolução deste decreto, a idade mínima para homens ingressarem na Escola Normal era de 18 anos e para mulheres 16 anos, fato que gerava um tempo de ociosidade maior dos indivíduos que terminavam o ensino primário aos 13 ou 14 anos, e precisavam esperar até a idade de 18 anos para iniciar sua formação profissional (RELATÓRIO, 1911, p. 75). Em 1935, quando Nereu Ramos já havia se estabelecido no governo de Santa Catarina, se criaram as Escolas Normais Primárias, que se constituíram em um fracasso, visto que tentavam substituir as Escolas Complementares, formando alunos de 11 a 13 anos em um curso para professores (veremos novas discussões no segundo capítulo). Pretendemos ressaltar que a estrutura educacional elaborada na gestão Vidal Ramos serviu de base para as reformas posteriores, além de demonstrar um avanço intelectual e racional na elaboração de um sistema sólido, que perdurou por muitos anos.

O que se pode observar no ambiente da Escola Normal, foi a diminuição da idade de ingresso, e ao mesmo tempo, o objetivo de um melhor aproveitamento do tempo de formação escolar dos alunos, gerando a possibilidade da continuidade dos estudos sem um intervalo de

espera, fato que, possivelmente, modificou o pensamento dos recém-formados no ensino primário em continuar os estudos, ou procurar um emprego sem diplomação profissional. Ou seja, o tempo de ociosidade escolar poderia gerar o desinteresse dos indivíduos em continuar seus estudos. Por outro lado, os alunos da Escola Normal passaram a ser mais jovens e com responsabilidades maiores, com deveres de frequência, rigidez nas normas e exames de seleção mais exigentes. Tudo isso sugere a intromissão do aparelho do Estado na vida cotidiana dos seus alunos, mantendo um relativo controle do tempo biológico, cronológico e social, dos saberes escolares e dos indivíduos que o integravam.

Complementando o conjunto das normativas da Escola Normal, o governo Vidal Ramos sancionou o decreto nº 586, de 22 de abril de 1911, que aprovou e mandou observar as regras impostas pelo decreto nº 572, referentes ao horário geral que regulamentava a quantidade de horas letivas para cada turma do ensino normal. “Tudo deveria ser cronometrado, racionalizado, planejado minuciosamente pelo professor de modo a garantir a qualidade do tempo empregado” (TEIVE, 2009, p. 219). Neste novo quadro, os alunos do 1º ano teriam 27 aulas por semana, os do 2º ano teriam 30 aulas por semana, e os do 3º ano teriam 27 aulas por semana (RELATÓRIO, 1911, p. 75; DECRETO, 1911, p. 82, 83). Segundo Guimarães, o número de horas trabalhadas por semana na Escola Normal anterior a 1910 era de 44 horas, enquanto na Escola Normal de 1911 a quantidade aumentou para 66 horas semanais (RELATÓRIO, 1914, p. 126). Portanto, é certo afirmar que tanto o número de aulas quanto o número de horas trabalhadas foi ampliado. Outro aspecto a destacar é o fato de que essa comparação feita pelo governo considera apenas os três primeiros anos de duração da Escola Normal, anterior à reforma da gestão de Vidal Ramos e posterior a ela, fato que significa que a comparação não determina o tempo das aulas do último ano (4º) da escola. Deste modo, o somatório final do número de horas poderia ser ainda maior. E sugerimos que o número de horas poderia ser maior devido à proporcionalidade dos números que são apresentados em relatório: antes da reforma, em 1910, o 1º ano era composto por 12 horas, o 2º por 16 horas e o terceiro por 16 horas; posteriormente à reforma, em 1911, o 1º ano era composto por 21 horas e 30 minutos, o 2º ano por 23 horas e 30 minutos e o 3º ano por 21 horas, o 4º ano não foi especificado (RELATÓRIO, 1914, p. 126).

Outra comparação feita pelo Inspetor Geral do Ensino, Orestes Guimarães, gira em torno da Escola Normal catarinense e das escolas do Chile, da Argentina e de São Paulo. Nos dois países estrangeiros, o número de horas de aulas era de mais ou menos 38 e 39 horas por semana, e, provavelmente, por turma, enquanto em Santa Catarina as horas seriam em torno de 21 horas e 30 minutos. Dizia Guimarães que, se em todas as escolas citadas o número de dias

letivos fossem de 220, por exemplo, os normalistas chilenos estudariam 5.720 horas, os argentinos 5.280 horas, os catarinenses 2.475 horas, e os paulistas 3.833 horas (RELATÓRIO, de 1914, p. 126). A conta se torna incompreensível quando dividimos o número de dias letivos (220) pela quantidade de dias estudados por semana (5), resultado que nos leva ao número de 44 semanas estudas por ano. Com o número estabelecido de semanas, basta multiplicá-lo pelo número de horas trabalhadas em uma turma da Escola Normal, que no caso catarinense poderia ser de 21 horas e 30 minutos ou apenas 21 horas, se optarmos pelo 3º ano daquela escola. O cálculo final para apenas uma turma da Escola Normal varia de 937,2 horas a 924 horas por ano, valor que, ao ser multiplicado por 3 (número de turmas da Escola Normal, a que se referia Guimarães na sua comparação), teremos o número final de 2.798,4 horas, o que não equivale àquilo que foi exposto no relatório. Os dados para o estado catarinense não conferem, de forma que o governo poderia estar manipulando-os. Não é possível calcular as horas dos países citados, pois não temos dados suficientes e sólidos relativos àquelas escolas.

Ainda referente à aplicação das normativas para a educação, no mesmo ano de 1911, em decreto nº 593, o governo Vidal Ramos considerou que na Escola Normal o regulamento da gestão anterior não preenchia seus objetivos, pois ainda não estavam inclusas diversas disposições detalhadas no decreto nº 572, que reorganizava aquele estabelecimento. Também considerava inadequada a falta de disposições claras e coerentes que regulavam os deveres do pessoal administrativo da escola, seus lentes, seus professores e alunos, fato que prejudicava a boa ordem disciplinar e os objetivos do estabelecimento (DECRETO, 1911, p. 87). Desta forma, o governo, ao passar do tempo e utilizando dos seus órgãos administrativos, sancionava decretos após decretos regulamentando de forma gradual o seu projeto educacional, o que, certamente, determina que foi aprimorado ao longo da gestão de 1911-1914.

Compreendemos através da análise dos documentos oficiais utilizados que, além da imposição das normas educacionais e dos avanços que se produziram, também havia no corpo administrativo do estado indivíduos com opiniões críticas em relação aos fatos que se desenrolavam. É preciso relevar a ideia de que havia reconhecimento dos pontos positivos da Reforma do Ensino, e também da realidade ainda precária. É certo afirmar, baseado nas críticas feitas pelo secretário geral de 1911, Caetano Costa, que a reforma da instrução pública trouxe melhorias para o aparelho de ensino do estado de Santa Catarina, entretanto muitas dificuldades continuaram existindo: sejam elas por má qualidade dos professores, que de certa forma resistiam às mudanças; dos diretores, que reclamavam falta de melhoramento de suas escolas; e dos alunos que ainda utilizavam salas inadequadas. No entanto, ao mesmo tempo em que o governo reconhecia a situação de dificuldades na educação, reafirmava, constantemente, seu

esforço em construir novos prédios escolares, em reformar ou ampliar alguns outros que poderiam ser aproveitados, e proporcionar um melhoramento das condições de convívio social e educacional (RELATÓRIO, 1911, p. 76, 77). “O governo parecia disposto a investir muito de suas energias para não ver fracassado este projeto, que, mais que escolarizar a população, alimentava sonhos, o sonho de ascensão social, de alcance da modernidade, de inserção no mundo das luzes” (SILVA, 2006, p. 181).68

No começo do corrente ano, foram realizados diversos melhoramentos no edifício da Escola Normal. Fez-se a substituição do assoalho em parte de uma das salas, a caiação e pintura de todas elas, a construção de compartimentos para toalete e para privadas, assim como a cimentação de todo o pátio interno. Ficaram também como dependência da Escola, as duas salas anteriormente ocupadas pela Inspetoria de Saúde, que foi removida para outro prédio. Com esses melhoramentos foi despendida a quantia de 4:560$626 (quatro contos, quinhentos e sessenta mil e seiscentos e vinte e seis reis)69. O diretor reclama, e com justos motivos, a construção de um telheiro ou galpão de abrigo para o recreio dos alunos, pois durante o tempo intermédio das suas lições, eles são forçados a permanecerem nas próprias salas onde funcionam aulas, ou nas suas imediações, com evidente prejuízo da disciplina escolar, pela falta de sossego e pelo desvio de atenção indispensável a quem ouve ou dá lições (RELATÓRIO, 1911, p. 76, 77).

É evidente a situação do melhoramento escolar, e ao mesmo tempo, da necessidade de maior investimento, pois ainda se investia pouco em relação às necessidades de todas as escolas estaduais, uma realidade ainda presente na atualidade catarinense. Provavelmente, muito ainda teria de ser feito naquela década de 1910, devido ao descaso com a educação das classes menos favorecidas da população brasileira, que durante séculos esteve às margens das preocupações governamentais.

O descaso com a educação catarinense é repensado a partir do momento em que se discute o papel formador da escola, e a transformação dos indivíduos em mão de obra qualificada, para atender tanto ao mercado produtivo quanto ao meio intelectual. A partir do momento em que o estado catarinense se interessou por este ramo, se investiu em educação, primeiramente com a reformulação do colégio de Joinville70, por Abdon Baptista, que objetivava modificar as relações entre patrões e empregados de colonização alemã, e integrar

68 Vera Lucia Gaspar Silva, nesta passagem, refere-se aos Grupos Escolares da reforma de 1911-1914, portanto, parte do mesmo projeto educacional do governo de Vidal Ramos. Acreditamos que a passagem escrita pela autora também descreve o objetivo do estado em relação à Escola Normal.

69 A moeda brasileira até 1942 se chamava mil-réis. A unidade monetária era um mil-réis (1$000). Um conto de réis era o equivalente a mil vezes a importância de mil-réis (1:000$000). Todo o valor a esquerda do símbolo : é chamado de contos, o que vem a esquerda do símbolo $ é mil réis, e o que vem a direita do símbolo “$” é réis, o valor divisionário do mil-réis.

70 Por conta da Lei nº 636, de 12 de setembro de 1904, a reformulação do colégio de Joinville tornou-se possível, pois o estado acenava com subvenções às iniciativas municipais que organizassem escolas nos moldes dos Grupos Escolares, modelo presente na retórica governamental como sinônimo de modernidade e progresso (SILVA, 2006, p. 182)

estes indivíduos ao mercado industrial do norte do estado,71 e em seguida por Vidal Ramos, que parece ter acreditado que investindo na escola se formariam cidadãos regrados, que poderiam contribuir com o crescimento de uma cultura uniforme, calcada nos princípios lusitanos. Integrando os diversos indivíduos ao seu programa educacional, ele estaria ampliando seu curral eleitoral, e construindo uma rede de relações culturais, que se ampliava a cada ano, com o incremento de novas escolas e seus professores formados na Escola Normal. A construção do imaginário uniforme de princípios culturais luso-brasileiros trouxe à oligarquia Ramos a