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A ESCOLHA PELA EDUCAÇÃO INFANTIL

No documento MARISLEUSA DE SOUZA EGG (páginas 108-112)

5 O PROFESSOR KLAUS: CONTEXTOS DE FORMAÇÃO E ATUAÇÃO

5.3 A ESCOLHA PELA EDUCAÇÃO INFANTIL

As primeiras experiências de Klaus como professor foram ministrar aulas particulares de violão, de teclado e canto. Quando trabalhava numa creche particular com aulas de música, durante seis meses teve seus primeiros contatos com crianças pequenas. Em 2006, ainda na graduação, cursando Licenciatura em Música, começou a assumir turmas no Projeto de Música das escolas municipais. Klaus foi um dos primeiros professores a ser contratado, e assumiu turmas num dos Centros de Educação Infantil, trabalhando lá por cinco anos consecutivos. Entretanto, ficou fora de sala de aula por quase três anos, e o motivo da sua desistência foi a desmotivação financeira, pelo fato de ainda não ter terminado a graduação e ganhar menos que os demais professores. Klaus relata que nessa época começou a construir o seu perfil de professor e, ao mesmo tempo, seu perfil acadêmico. Depois de ter trabalhado com musicalização no CEI tentou trabalhar em outras áreas, por considerar que a profissão não lhe trazia segurança financeira.

A questão salarial foi o segundo fator apontado por estudantes na pesquisa de Gatti et al (2010), ao justificarem as razões para não escolherem o magistério como profissão. O objetivo da referida pesquisa foi investigar a questão da atratividade financeira e de status da carreira docente no Brasil e, para isso, estudantes concluintes do Ensino Médio

responderam a um questionário com informações e características incluindo dados como: idade, sexo, escolaridade dos pais, período em que estuda, se trabalha, indicadores sobre o nível socioeconômico, escolha profissional e carreira docente. Entre os investigados, poucos escolhem a profissão docente nesta fase. Outra parte da pesquisa foi realizada com os mesmos estudantes numa entrevista em grupo, que tinha o

objetivo de analisar a percepção que eles têm do que é ser professor e da possibilidade de ingressar na carreira docente.

As referidas autoras sugerem dois conjuntos de medidas para incentivar a adoção da profissão docente pelos alunos (p. 203): o primeiro grupo de medidas diz respeito à dimensão cultural relacionada à docência que representa socialmente o ideal brasileiro. O segundo refere-se a mudanças de ordem estrutural e institucional que poderiam contribuir no caso de o professor tornar-se um profissional de valor social destacado. Tais medidas são necessárias, principalmente, devido à falta de professores bem formados para os diferentes níveis de ensino e a ausência de professores para algumas áreas disciplinares dos últimos anos do Ensino Fundamental e do Ensino Médio. Embora seja um assunto bastante discutido, tem sido pouco investigado no Brasil.

As pesquisadoras Gatti et al. apontam algumas questões, como atrair, formar e manter bons professores. Citam como exemplo vários países, mesmo aqueles em que a carreira docente não está em declínio, que apresentam um movimento de valorização de ações que vão “desde iniciativas para melhorar a imagem social e o status da docência, passando pelos salários e condições de emprego, programas de iniciação à docência, reestruturação da formação inicial e continuada, até incentivos especiais para atrair e manter professores”. (GATTI et al., 2010, p. 152).

Entretanto, se a profissão de professor é problemática como carreira, em termos de remuneração, no Brasil o cenário também apresenta estas dificuldades em outras profissões. Muitas vezes, um jovem que escolheu outra área levando em conta a remuneração encontra decepções na carreira e acaba retornando à docência. Isso é muito marcado na profissão específica de professor de música, que tem atrativos em relação à docência em outras áreas. Isto aconteceu com o professor Klaus que, depois de trabalhar em outros setores, voltou à

atividade de professor de música. Percebe-se que outros fatores, além da questão financeira, acabaram pesando nas escolhas profissionais de Klaus – principalmente fatores ligados à realização profissional e às memórias afetivas. Depois de deixar o CEI ele resolveu trabalhar na área de administração de empresas. Um desses lugares foi a área do teatro, onde podia ficar mais perto da música trabalhando com eventos culturais. Klaus relata:

Organizava eventos de música tanto quanto de teatro e de dança. Então, ali voltei a ter contato com a cultura, de novo. Ali foi uma experiência muito interessante, muito valiosa para mim, como pessoa. Por outro lado, você não tem o contato com o artista, mas com toda a produção em torno do artista. (Klaus, entrevista, 13 de abril de 2015)

Ele trabalhou nessa empresa durante um ano e continuou tocando na banda. Nessa época faziam muitos shows, confirmou Klaus durante a entrevista. Ele ficou fora do Projeto de Musicalização por dois anos. O professor Klaus não estava satisfeito trabalhando na área de administração e ficou sabendo, pela coordenadora que uma professora mudaria de cidade, e que precisariam de professor de música em um dos CEIs. Klaus já havia comentado com a coordenadora que não estava feliz trabalhando na área do teatro, então ela lhe perguntou se não queria voltar a ser professor, ao que ele logo respondeu de forma afirmativa: “eu não pensei duas vezes”. Ficar longe da sala de aula fez com que ele pensasse muito nas crianças, como relata:

[...] nesses três anos, eu confesso que, não digo toda noite, mas nesses três anos que fiquei longe da sala de aula eu sonhava quase todo dia que estava dando aulas, que eu estava em aula,

que as crianças me chamavam, e isso foi algo que ficou em mim. (Klaus, entrevista, 13 de abril de 2015)

Durante o período em que trabalhou em outra área, Klaus terminou a universidade e, quando retornou para a sala de aula, percebeu que além de ter tido experiências em outros ramos, tinha feito a sua reflexão: “O que eu gostava e queria para minha vida era mesmo a educação, era trabalhar com crianças pequenas na educação infantil”. Quando lhe pedi para descrever como e porque escolheu atuar na Educação Infantil, Klaus contou:

Eu tenho a minha infância bem forte em mim, tenho muitas recordações e eu lembro uma coisa que me marcou muito. Eu tenho uma irmã que é oito anos mais nova do que eu, então quando eu tinha nove a dez anos de idade ela ia na creche e [era] eu que levava, e recordo como se fosse hoje, eu levava ela pra creche, mas eu queria ficar lá. Não só para brincar no parquinho, não só por isso. Me lembro que um dia eu entrei na sala de aula e a professora na época viu, e me permitiu, umas duas ou três vezes, que eu auxiliasse ela no que estava desenvolvendo com as crianças. Isso foi uma lembrança muito forte em mim. Isso foi bem positivo em querer ser professor. E parece que ficou dormente em mim, adormeceu na minha adolescência, mas só ficou adormecido. (Klaus, entrevista, 13 de abril de 2015)

Essa é a visão que o professor Klaus tem sobre si mesmo. Percebo em seu relato o desejo e o entusiasmo pela profissão docente. O descobrir-se professor veio a partir da maneira como ele se envolveu com o ensino musical e com as crianças. Ao ouvir as declarações dos pais e dos colegas do CEI

sobre o seu trabalho, sentiu-se motivado, confirmando assim um sonho adormecido: “Eu era reconhecido pelo meu trabalho, muitas professoras e pais diziam: 'você tem o dom para isso, você cativa as crianças, cativa as professoras’, só que parece que eu não me valorizava na época. Então, como eu tinha outras formações, eu pensei: vou tentar trabalhar nessas outras áreas”. (Klaus, entrevista, 13 abril de 2015).

Esse reconhecimento parece ter sido fundamental para Klaus sentir-se professor. Nesse sentido, Nóvoa (2009, p.17) afirma que por meio dos “movimentos pedagógicos ou das comunidades de prática, reforça-se um sentimento de pertença e de identidade profissional”. Klaus assumiu a identidade de professor e, de alguma forma, sentiu-se membro da comunidade escolar onde trabalhava por meio do reforço positivo dado pelos pais das crianças.

5.4 O CANTO NA FORMAÇÃO E NAS PRÁTICAS

No documento MARISLEUSA DE SOUZA EGG (páginas 108-112)