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3 ECONOMIA E MEIO AMBIENTE.

3.2 ESCOPO TEÓRICO

A interdisciplinariedade é uma abordagem marcante no tratamento dos problemas relacionados ao meio ambiente. Afinal ela envolve diferentes campos de estudo comuns entre as ciências da natureza e as ciências sociais.

A ecologia23 ocupa naturalmente um lugar de destaque. Ela se afigura hoje como uma história da co-evolução da natureza e da espécie humana. Além dela, outras correntes de pensamento estão explorando territórios menos limitados, caminhando para uma “ecosocioeconomia” de cunho interdisciplinar no horizonte mental dos cientistas sociais - os condicionantes biofísicos dos processos socioeconômicos - e culmina no conceito normativo de “desenvolvimento sustentável”: a equidade social e a prudência ecológica que devem andar juntas, delimitando no universo de atividades economicamente viáveis o subconjunto daquelas que promovem o desenvolvimento genuíno (ROMEIRO at al.,1996).

Do ponto de vista especifico da economia, ela não se distingue por seguir um único paradigma ao longo da evolução da ciência econômica, mas ao contrário, seu tratamento atual foi moldado pela dominância dos diversos paradigmas que se seguiram na evolução dessa ciência. Como assinala Pearce (1995), é mais frutífero pensar a inserção da variável ambiental na ciência econômica como uma conjunção de teorias conectadas ou “programas de pesquisa científicas”

23 Segundo Pianka (1975), ecologia é o estudo das relações entre os organismos e a totalidade de todos os fatores físicos e biológicos que os

afetam ou são afetados por eles. E que, por meio ambiente se inclui tudo, desde a luz solar, chuva até os solos e outros organismos. O ambiente de, por exemplo, um organismo, não só está formado por outras plantas e animais que se encontram diretamente, como também por processo puramente físicos e substâncias inorgânicas como as flutuações diárias da temperatura, concentrações de oxigênio e dióxido de carbono. Evidentemente, essas concentrações podem estar afetadas por outros organismos, que, por conseguinte, forma de modo indireto uma parte do ambiente do primeiro organismo. Assim, qualquer conexão ou interação remota entre as unidades orgânicas significa que cada unidade é parte do ambiente da outra.

que competem entre si.

A divisão, em geral, feita na ciência econômica se restringiu à distinção entre economia dos recursos naturais (ou economia ecológica) e economia ambiental. O primeiro campo concerne à alocação intertemporal de recursos renováveis e não-renováveis, enquanto que a segunda se concentra a dois temas principais: a regulação das atividades econômicas e a valoração dos bens ambientais (CROPPER ; OATES, 1992).

Por outro lado, sob a égide do paradigma da economia neoclássica, a natureza do problema ambiental para a ciência econômica tem vinculação direta com a chamada “Economia do Bem-Estar” (PIGOU, 1920), que incorpora os elementos que compõem o meio ambiente como bens, especificamente bens de características particulares – bens públicos ou de consumo coletivo. Assim, enquanto bens devem ser tratados dentro dos princípios que norteiam as decisões dos agentes econômicos na busca de resultados eficientes, individual e socialmente, conduzindo a economia a atingir um equilíbrio geral, enquanto o melhor resultado que pode ser obtido sob um conjunto de condições estabelecidas previamente.

Entretanto, uma questão metodológica básica que vai dominar o tratamento dos “bens ambientais” pela Ciência Econômica é exatamente o seu caráter particular, diferenciados dos bens privados, quanto à aplicação da estrutura teórico-conceitual base da Economia do Bem- Estar, que posteriormente, quanto a esse objeto específico de estudo, deu origem a chamada Economia Ambiental.

Sob o campo teórico da Economia do Bem-Estar os assuntos relativos ao meio ambiente são considerados como externalidades. Originalmente Pigou (1920), definiu externalidades como um efeito que em vez de reverter-se em primeiro lugar a pessoa que investiu uma dada unidade, reverte-se como uma partida positiva ou negativa para outros que não são produtores daqueles, de forma que não se pode requerer um pagamento pelas partes beneficiadas ou prejudicadas.

Este conceito foi depois aperfeiçoado passando a designar toda forma de efeitos paralelos (side effects) decorrentes das decisões no consumo e/ou produção que extrapolam as avaliações marginais dos agentes (individualmente).

Num sentido de complementariedade a análise de Pigou (1920) sobre externalidades ambientais e as diferenças entre custos (ou benefícios) privados e sociais dentro do fenômeno das externalidades, Dasgupta (1990), acrescenta queos problemas ambientais têm que levar em conta as dificuldades analíticas relacionadas com o tempo, incertezas, e a difusão de informações

assimétricas, e aquelas envolvendo um pequeno número de agentes econômicos. Os problemas ambientais têm suas próprias características, refletidas não só pelas próprias especificações naturais dos recursos estudados, mas também por sua locação, no tempo em questão e no contexto sócio-econômico em que ele ocorre.

Entretanto, focando sobre a definição de externalidade - para que exista uma externalidade, não basta que haja interdependência entre a atividade realizada por um agente e o nível de utilidade de outro, é preciso que esta atividade não seja acompanhada por uma compensação para aquele que fora prejudicado.

Assim, segundo Baumol e Oates (1988), para que realmente haja uma externalidade, duas condições devem ser cumpridas:

I) Uma externalidade está presente quando as relações de produção ou utilidade de algum indivíduo (digamos A) incluem variáveis reais cujos valores são escolhidos por outros (pessoas, empresas, governo), sem uma particular atenção ao efeito provocado no bem-estar do indivíduo A;

II) O tomador de decisão, cuja atividade afeta outros níveis de utilidade ou entra em suas funções de produção, não recebe (paga) uma compensação por esta atividade, em um montante igual, em valor, ao resultado (marginal) dos benefícios ou custos para os outros.

A segunda condição enfatiza o fato de que a não compensação pelo agente gerador do efeito externo conduz a uma perda de bem-estar por outrem. Daí, quando cumpridas as duas condições, poderia haver algum ganho de troca entre os indivíduos, ainda que estejam em equilíbrio.

No caso dos “bens ambientais” (fauna, flora, água, ar...), uma vez que assumem características de bens (males) públicos: consumo “não-rival”, ou seja, a quantidade do bem que uma pessoa consome em nada afeta a quantidade disponível para outros; e/ou não aplicação do “princípio da exclusão” que significa que, um indivíduo não pode ser excluído de consumir um bem (MARGULIS, 1996), tem como conseqüência, uma deficiência na aplicação dos direitos de propriedade sobre os mesmos, o preço não se torna mais uma boa medida da avaliação marginal dos benefícios do consumo desses bens, ocorrendo assim, uma falha no sistema de preços de mercado.

O mercado24 falha exatamente porque os consumidores não precisam mais revelar suas preferências para poder se beneficiar do consumo do bem. O consumo dos “ativos ambientais”25, são, por essa via, considerados “non-market goods”, uma vez que a “disposição a pagar” não é revelada. Ou, melhor dizendo, o sistema de preços na economia de mercado não capta os custos ambientais da atividade econômica. A racionalidade privada não é coerente com a racionalidade social (SOUZA, 1993).

Por outro lado, devido à deficiência no direito de propriedade, o que cria “local commons” (DASGUPTA, 1990), acaba provocando um overuse dos bens ambientais, de modo a se constituir em fonte permanente de externalidades. No caso, em externalidades ambientais, tais como quaisquer formas de poluição: hídrica, do solo, atmosférica entre outras.

O grande problema envolvido quanto à análise do meio ambiente pela a economia é que nem sempre uma externalidade esta presente quando esta ocorrendo qualquer tipo de poluição ambiental. O entendimento desta questão requer a utilização de uma estrutura conceitual ecológica como faz Pearce (1976, 1985).

A característica do problema ambiental como falha de mercado, cria espaço para que haja uma intervenção institucional no sentido de corrigir tal falha, ou a função que o mercado não realizou a contento. Entretanto, pode-se inferir que o mercado possui suas “formas de aprendizado”. Em primeiro lugar, ele cria mecanismos diretos ou indiretos, formais ou não de atribuir valor aos “non-markets–goods”, de tal forma que ocorra uma precificação (artificial) ao bem. Em segundo lugar, existem formas pelas quais o poder institucional formal ou não acaba induzindo os agentes a revelar sua preferência pelo bem ambiental. Nos dois casos a teoria econômica tenta encontrar recursos metodológicos que permitam mensurar como os agentes avaliam benefícios e custos relacionados “ao consumo” dos bens ambientais. Efetivamente, existem muitos casos em que o mercado não funciona, ou mesmo não existe. Algumas vezes eles não existem por razões históricas e acidentais. Os recursos que são usualmente chamados de recursos ambientais (ativos ambientais) são, particularmente, vulneráveis a esse problema, isto é, ou não têm um mercado, ou existe um mau funcionamento deste (DASGUPTA, 1990).

Ainda, segundo Dasgupta (1990), o mercado, não significa necessariamente instituições

24 No Protocolo de Kyoto, originado da ECO-92, foram definidas as operações e as Instituições que administram o chamado “Mecanismo de

Desenvolvimento Limpo – MDL”. A idéia de poder “comprar” cotas de emissão de CO2 mediante a implantação de Programas no Terceiro Mundo está criando uma nova forma de transações comerciais, como uma bolsa de valores direcionada a “ativos ambientais” (MOREIRA, 2006).

25 Os efeitos externos do consumo dos “ativos ambientais”, como por exemplo a fumaça, acaba por torná-la um mal público, visto que todos os

de preços. Os mercados são “instituições que estão disponíveis para afetar as oportunidades de negociar os cursos das ações”. E qualquer mau funcionamento de um mercado, ou seja, circunstâncias onde essas oportunidades não existem, eles só estão presentes parcialmente, ou estão de apenas um lado.

Por outro lado, a existência de um mercado competitivo pressupõe, muitas vezes, somente um conjunto de acordos institucionais no qual tais negociações podem tomar lugar. Os acordos crescem no decorrer do tempo através da criação de normas sociais e as associações sociais que impõem sanções para aqueles que violam tais normas.

É importante reconhecer que as normas sociais podem ser contratos sociais implícitos, ou por outro lado, estratégias de comportamentos. Estratégias estas, que são sustentadas pelo próprio esforço, e não por leis. O contrato poderia ser imposto se cada pessoa fosse ameaçada de ser retirada de sua atividade quando violasse o contrato. Assim então, muitos recursos gerenciados nas tradicionais sociedades teriam sido sustentados pelas normas de comportamento. Devido a isso, as normas podem falir durante período de mudanças, e se elas não são re-elaboradas em função de novas situações, a sociedade começa a sofrer as “falhas de mercado”.

A ausência de um preço apropriado para alguns recursos escassos (como o ar puro e água potável) levou a uma superutilização desses recursos. Assim, em função dessa falha de mercado, o Estado, órgãos públicos ou instituições nacionais e internacionais devem, através de regulamentações, legislações e normas, fazer com que produtores e consumidores, igualmente, sejam obrigados a suportar custos que suas atividades impõem a terceiros (OATES, 1989, apud, SOUZA, 1993).

Assim, a partir da década de 80, foram criados alguns instrumentos legais com o objetivo de solucionar a pressão do crescimento econômico sobre a natureza. Os principais instrumentos adotados foram: Imposto sobre Poluição; Cotas sobre Emissão de Poluentes; Conversão da Dívida em Investimentos na Natureza; e, Contabilização dos Recursos Naturais.

O imposto sobre poluição serve para corrigir a imperfeição de mercado – ausência de um preço que retrate corretamente o custo de recursos esgotáveis empregado na produção de bens e serviços – reprimindo o uso excessivo dos recursos ambientais escassos (OATES, 1989, apud SOUZA, 1993).

Em termos de análise microeconômica, se o imposto sobre poluição for fixado em nível igual ao do valor dos prejuízos decorrentes de uma unidade adicional de emissão, as fontes

emissoras terão incentivos adequados para controlar suas descargas poluidoras. A Teoria Econômica então sugere a necessidade de tributar a poluição para que se corrija esta falha do sistema em mercados competitivos.

A idéia do imposto sobre poluição parte da concepção básica de que os agentes poluidores devem ressarcir a sociedade pela destruição provocada. Se não se evita a poluição, pelo menos, evita-se que os custos de produção sejam encobertos, ou melhor, os custos advindos dos impostos sejam internalizados pelas empresas. Paralelamente, cria-se uma fonte para financiar novas pesquisas e subsidiar o uso de formas alternativas menos poluentes e economicamente viáveis.

A cota de emissão de poluentes é um mecanismo que emite um número limitado de permissão para poluir. Cada país, região ou indústria teria uma taxa de emissão predeterminada. Essa taxa poderia ser negociada, ou seja, as fontes poluidoras estariam livres para comprar e vender as permissões de emissões.

A conversão da dívida em investimentos na natureza significa a compra de parte da dívida externa de alguns países em desenvolvimento, por organizações conservacionistas, com deságio, para resgatá-lo em títulos ou em moeda local junto ao Tesouro do país, a ser investido em projetos de conservação da natureza26. Importante é a possibilidade das organizações de conservação, nacionais ou internacionais, passarem a ter um poder de pressão maior junto aos governos locais. Isso pode gerar uma fiscalização mais rigorosa nas empresas.

O quarto mecanismo, contabilidade dos recursos naturais, foi criado com o objetivo de deduzir os impactos ambientais das contas nacionais, que conduzem ao Produto Interno Bruto – PIB. O PIB calculado pelos países não considera a escassez dos recursos naturais, assim como o sistema de contas nacionais das Nações Unidas, adotado pela maioria dos paises. Como resultado disso, um país pode exaurir suas reservas naturais, derrubar suas florestas e levar à extinção da vida silvestre sem deduzir os danos ambientais na contabilidade nacional. É um mecanismo em estudo para sua implementação.

Esses dois últimos mecanismos contribuem para a importância da questão ambiental para o setor público. Conseqüentemente, os organismos públicos de controle ambiental de cada país que participa desses mecanismos, podem cobrar das empresas medidas efetivas de proteção ao meio ambiente.

26 Até junho de 1991, o WWF, fundo para a Vida Selvagem Mundial, juntamente com outras organizações de conservação, já haviam feito a

conversão de parte da dívida em projetos ambientais dos seguintes países: Bolívia, Equador, Costa Rica, Filipinas, Republica Dominicana, Madagascar, Polônia, Zâmbia e Sudão (MAIMON, 1992, apud SOUZA, 1993)