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3. ENSINO JURÍDICO E MEDIAÇÃO

4.2 A mediação e os Núcleos de Prática Jurídica de Fortaleza – Ceará

4.2.1 Escritório de Prática Jurídica da Universidade de Fortaleza

O Escritório de Prática Jurídica (EPJ) da Universidade de Fortaleza (UNIFOR) foi criado em agosto de 2000 – anteriormente e já se antecipando a legislação que exigia a existência de um Núcleo de Prática Jurídica nos cursos de graduação em Direito, Resolução nº 9 de 2004 - e é um meio para que os alunos possam pôr em prática o conteúdo teórico aprendido nas outras disciplinas regulares do currículo. Ele abriga quatro disciplinas de estágio supervisionado – Estágio I ao IV -, que passam por um período de experiência simulada, nas duas primeiras disciplinas e por um período de experiência real, nas duas últimas.

É possível notar, como ponto positivo, a extensão da experiência que os estudantes possuem durante o período que estagiam no Escritório de Prática Jurídica, há cerca de dois anos, uma vez que todos os seus recursos são muito bem explorados ao longo de extenso período acadêmico.

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Cumpre destacar, também, a necessidade do longo período simulado vivenciado pelos alunos, uma vez que é aí que são capacitados para atender a população durante o vindouro estágio real. Muitos recursos são utilizados para preparar os alunos enquanto ainda nas disciplinas de estágio I e II, como o Manual do Aluno do Escritório de Práticas Jurídicas, que situa, desde o início, os estudantes no que é necessário, como se portar, que decisões devem ser tomadas e a melhor forma de atender um assistido nas situações que virão a existir no período de estágio real – as quais são, na realidade, uma verdadeira prévia do mercado de trabalho e da atuação como profissionais formados.

É obrigatório para todos os alunos do Centro de Ciências Jurídicas da UNIFOR e, de acordo com o Manual do Aluno do EPJ (2008.1, p.7), o escritório possui como objetivos: proporcionar aos discentes adequada formação profissional, a partir do conhecimento técnico jurídico, com bases humanísticas, especialmente através de prática advocatícia judicial e extrajudicial gratuita; oferecer gratuitamente assistência judicial e extrajudicial gratuita, com a observância de elevado padrão profissional, respeitados os limites de sua capacidade de atendimento. (ALVES, 2008, p. 75)

Desse modo, desde a metade do curso, os alunos são iniciados em vivências práticas, para que tenham a melhor preparação acadêmica e pessoal, podendo perceber os anseios da sociedade – que constantemente se transforma – e exercendo, assim, um pensamento crítico sobre a ciência que estudam e aplicam.

Citados diplomas legais permitem ao corpo discente a vivência, ainda na universidade, de situações com as quais irá se deparar em sua futura profissão, através do atendimento à comunidade carente, no que se refere ao direito fundamental de acesso à justiça. Quanto ao estágio, houve uma série de avanços no texto da Portaria MEC nº 1886/94. (ALVES, 2008, p. 77)

O EPJ atua, principalmente, por meio de convênio com a Defensoria Pública – é necessário frisar que também é conveniado com a OAB -, que detém a capacidade postulatória das petições iniciais produzidas pelos alunos e necessariamente supervisionada pelos professores e por um defensor público, designado especificamente para atender as crescentes demandas do Escritório de Práticas Jurídicas.

A Universidade de Fortaleza firmou convênio com a Defensoria Pública do Estado do Ceará e com a Ordem dos Advogados do Brasil, no sentido de uma melhor implementação da Portaria

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1.886/94, fazendo com que seus alunos participem ativamente do atendimento judicial e extrajudicial à população menos privilegiada. O EPJ dispõe da presença obrigatória de um defensor público designado pela Defensoria Pública do Estado do Ceará, com carga horária determinada pela Defensoria Pública para atuar junto ao Escritório, sem qualquer subordinação entre ele e coordenação do EPJ. (ALVES, 2008, p. 76)

Desse modo, é possível realizar um atendimento completo, amparado por um órgão competente para responder à altura a todas as demandas que são apresentadas ao EPJ. Também é possível, se utilizando de todos os recursos do Escritório de Prática Jurídica, realizar atendimentos preventivos e extrajudiciais, como é o caso da mediação, que são essenciais para a melhor resolução de grande parte dos conflitos e trazem inúmeros benefícios às partes, ao Poder Judiciário e à sociedade.

Esse convênio abriu as portas da Universidade para o atendimento jurídico comunitário de forma preventiva, litigiosa e extrajudicial, oferecendo uma assessoria jurídica ao necessitado como exemplos de ensino e de participação social. (ALVES, 2008, p. 77)

O Escritório de Prática Jurídica conta, ainda, com a atuação de outras ciências em correlação com o Direito, agregando à capacitação dos estudantes a interdisciplinaridade e aperfeiçoando o atendimento feito no EPJ, seja ele qual for.

O Serviço Social aplicado ao Escritório de Prática Jurídica e ao atendimento com assistidos foi implantado em 2004, se destacando pela realização de atividades que o Direito não tem como realizar, mas que são essenciais para a sua plena aplicação, como a orientação socioeducativa sobre benefícios e direitos dos assistidos – como funcionam, como obtê-los, qual os procedimentos, entre outros- e o devido encaminhamento aos órgãos públicos competentes, garantindo que haja uma distribuição da informação e fazendo uma ponte entre usuário e provedor do serviço público, maximizando sua eficiência.

O serviço social prima pela socialização das informações, ação que proporciona ao assistido o acesso ao conhecimento de seus direitos e que poderá até possibilitar, ou não, o processo de mudança da realidade na qual o cliente do EPJ se insere. O serviço social atua muitas vezes como um elo entre os serviços públicos e as demandas apresentadas, disponibilizando um atendimento através de uma linguagem simples e direta. Dessa forma, o papel deste profissional é no sentido de privilegiar a prática cidadã, através da informação,

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educação e atuação em conjunto, com o objetivo de contribuir para a redução de situações de exclusão social, tudo isso no intuito de ampliar a função social do EPJ no acesso à justiça pela população. (COSTA, 2004, p.39 apud ALVES, 2008, p.73)

A Psicologia foi implantada após o Serviço Social e veio agregar imenso valor as atividades do Escritório de Prática Jurídica, uma vez que suas atividades – tanto emergenciais quanto padrões -, tem diversas utilidades, auxiliando o estudante de Direito a aplicar sua ciência da forma mais adequada possível.

Foi implantado no EPJ o setor de Psicologia, para uma adequação entre o Direito e a realidade social, que tem como atribuição (Manual do Aluno, 2008.1, p.9): a realização de atendimento psicológico emergencial, uma intervenção psicológica que acolhe o assistido no exato momento de sua de sua necessidade, ajudando-o a lidar melhor com seus recursos e limites. Referido aconselhamento visa a facilitar o melhor ajustamento do indivíduo, ajudando-o na tomada de decisões. O setor de psicologia é composto por uma psicóloga, uma professora – orientadora e estagiários do curso de Psicologia da Universidade de Fortaleza disponíveis em todos os horários de funcionamento do Escritório de Prática Jurídica e intervêm nos atendimentos realizados no EPJ, quando o conflito necessitar de apoio desses profissionais. (ALVES, 2008, p. 77)

As inúmeras atividades da Psicologia dentro do EPJ são extremamente necessárias para o bom, eficiente e fluido funcionamento do Escritório, tais atuações, como viabilizar a prevenção e solução de conflitos, muitas vezes embasados por crises sentimentais ou psicológicas, transtornos, promover saúde aos assistidos por meio de acolhimentos, conter possíveis surtos ou descontroles através de atendimentos emergenciais e realizar intervenções psicológicas em situações aparentemente sem resolução, por exemplo, podem contribuir para a melhor aplicação do Direito e da mediação.

A atuação do psicólogo no Escritório de Prática Jurídica da UNIFOR é de grande valia, pois nem sempre o estudante de Direito está preparado para um atendimento que busque a descoberta do que está verdadeiramente por detrás daquelas expressões faciais fechadas ou desesperadas. (ALVES, 2008, p.74)

Dessa forma, a presença da interdisciplinaridade e a importância da interação com outros cursos e até mesmo outras instituições, com o objetivo de melhorar a experiência dos estagiários dos Núcleos de Prática Jurídica e a qualidade do atendimento aos assistidos.

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Quanto à prática da mediação, o Escritório de Prática Jurídica possui um Núcleo de Mediação, alocado dentro do Serviço de Solução Extrajudicial de Disputas (SESED). O projeto de mediação foi implantado em 2002, pela Profª Drª Lília Maria de Morais Sales, expoente das práticas de mediação.

Ademais, compõem a estrutura do EPJ espaços lúdicos e entradas com acesso humanizado, havendo, também, um horário de atendimento diferenciado, que inclui o sábado, permitindo, assim, que grande parte da população que necessite dos serviços oferecidos seja assistida.

Os participantes são alunos que estão nas disciplinas de estágio e alunos de outros semestres que participaram de seleção para integrar o SESED. Em todas as sessões, há um professor orientador que realiza a mediação enquanto os alunos o observam, auxiliando-o quando necessário e ficando responsáveis por redigir a termo os acontecimentos da sessão e os pontos do acordo proveniente dela.

Em consonância com os princípios da mediação, não há necessidade de sempre se obter um acordo entre as partes. Caso não seja alcançado entendimento comum ao final da sessão de mediação, as partes podem procurar o Escritório de Prática Jurídica para ajuizar uma demanda judicial, com base em petição inicial feita pelos estagiários do EPJ e protocolada pelo Defensor Público responsável.

O processo seletivo para a escolha dos alunos é feito pela análise do histórico escolar e entrevista, então, esses se juntam aos estagiários do EPJ para acompanhar as sessões de mediação.

A capacitação é feita, basicamente, por meio do Manual do Aluno do Escritório de Prática Jurídica. Todavia, embora os recursos do EPJ auxiliem o aprendizado do estagiário ao longo das realizações das sessões, seria interessante se eles passassem por processos preparativos e capacitantes para atuar como mediadores, vivendo a experiência de mediar um conflito entre partes.

É possível perceber que o Escritório de Prática Jurídica da Universidade de Fortaleza possui muitos recursos, principalmente estruturais, para

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complementar a experiência acadêmica e prática do graduando em direito e elevar a qualidade do atendimento aos assistidos. Contudo, se faz necessário melhorar, principalmente quanto à capacitação dos estagiários que realizam sessões de mediação – a qual pode ser feita por meio de palestras, oficinas, e cursos sobre o método -, buscando se adequar aos novos rumos que a mediação está tomando no cenário nacional e legislativo, principalmente com a Resolução nº 125 do CNJ, o marco legal da mediação (2015) e o NCPC.

A atuação do mediador, caso não seja adequada, também pode constituir outra limitação material da mediação. Este profissional deve estar capacitado de maneira contínua para a realização de mediações, uma vez que trabalha com relações humanas. Sem a devida capacitação, corre-se o risco do mediador interferir no mérito, realizando, dessa maneira, uma conciliação. Conscientizar os mediadores dessa necessidade constitui um dos grandes desafios dos estudiosos sobre o assunto. (SALES, 2005, p. 95)

4.2.2 Núcleo de Prática Jurídica da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará

O NPJ – UFC foi criado em 2009, com o objetivo de atender as demandas legais que estruturam o curso de graduação em Direito – à exemplo da Resolução nº 9 de 2004 – e proporcionar aos alunos da graduação diversas oportunidades para pôr em prática a teoria aprendida ao longo de vários semestres da faculdade.

O Núcleo de Práticas Jurídicas é equipamento colocado à disposição do corpo discente, sendo fundamental para o currículo do curso de Direito, porquanto viabiliza a formação prática do aluno ao unir a teoria aprendida no decorrer dos oito primeiros semestres da faculdade com o estudo e resolução de casos concretos. Tal formação é efetivada por intermédio das disciplinas de Estágio Supervisionado de Prática Jurídica I e Estágio Supervisionado de Prática Jurídica II, estimadas, respectivamente, aos alunos do 9º e do 10º semestres, onde em ambas se realiza a aplicação científica do Direito. (SILVA, 2012)

De acordo com seu regulamento (Fortaleza, 2009), O Núcleo de Prática Jurídica é vinculado à Diretoria da Faculdade de Direito e é administrado por um Coordenador Geral e um colegiado composto por um coordenador do curso de graduação, três professores, representantes de cada um dos departamentos da Faculdade de Direito, escolhidos pelos respectivos chefes e um aluno indicado pelo Centro Acadêmico Clóvis Beviláqua.

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Estruturalmente, o Núcleo é acomodado no andar térreo de um prédio dentro da Faculdade de Direito, possuindo total acesso a pessoas com deficiência – requisito fundamental para que o acesso ao direito, à justiça e à métodos como a mediação sejam disponibilizados para toda a população. O NPJ possui uma recepção, juntamente à sala de espera e objetos lúdicos para dois amplos salões equipados com cabines de atendimento, computadores e uma máquina de impressão, cópia e digitalização, há, ainda, uma sala destinada à secretaria, que organiza os atendimentos realizados pelos estagiários e os processos existentes no Núcleo.

Embora haja estrutura – salas e equipamentos – planejados para a atuação de outras ciências dentro do NPJ – UFC, na realidade a interdisciplinaridade se encontra ausente no Núcleo, fator determinante, em muitos atendimentos, para o alcançar – ou não -, o objetivo ali proposto de gerar atendimento de qualidade à população assistida.

Nesse sentido, verifica-se uma ausência dos cursos de Psicologia, Pedagogia e Serviço Social na atuação no Núcleo de Prática Jurídica. Tais ciências são essenciais para uma melhor aplicação do Direito nesse contexto, e no entanto, não há aparente interesse em sua colaboração junto ao Núcleo, restando à população e ao NPJ a impotência e a tentativa de solucionar as demandas com seus próprios - e muitas vezes limitados – recursos.

A mediação no NPJ – UFC passa por um momento de extremo crescimento. Com o advento do Novo Código de Processo Civil de 2015, foi criado o projeto Dialogar – principal motivador desta pesquisa -, numa acertada tentativa de trazer os métodos de solução adequada de conflitos consensuais não violentos para a realidade universitária e auxiliar a população que deseja resolver seus conflitos evitando o máximo de desgaste econômico, físico e mental com questões procedimentais.

O projeto Dialogar conta com diversas iniciativas inovadoras, uma vez que procura, por meio de palestras, capacitar seus alunos para realizarem sessões de mediação entre os assistidos e aqueles com que conflitam, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas.

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Apesar de existirem diversos assuntos presentes nas sessões do projeto Dialogar, os mais frequentes estão relacionados ao Direito de Família e, quando obtêm sucesso – realizados por mediadores devidamente capacitados, interessados no serviço que prestam e atentos aos princípios da mediação -, há uma alta taxa de cumprimento de acordos e solução dos conflitos apresentados, com feedback positivo dos usuários do serviço prestado.

No entanto, existem caminhos a serem percorridos – no sentido de buscar a presença da interdisciplinaridade e aperfeiçoar, juntamente com as melhoras no currículo do curso, a capacitação dos estagiários - uma vez que o projeto é muito recente, não conta com muitos recursos estruturais e humanos à sua disposição e procura firmar seu espaço dentro da Universidade e da sociedade.