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Os esforços de cooperação do Brasil no contexto do enfrentamento ao tráfico de seres humanos

1 O TRÁFICO DE SERES HUMANOS: A HISTÓRIA DIALOGANDO COM A CONTEMPORANEIDADE

3 O TRÁFICO DE SERES HUMANOS NO CONTEXTO DAS POLÍTICAS MIGRATÓRIAS DA UNIÃO EUROPÉIA E DO BRASIL

3.3 Os esforços brasileiros no enfrentamento ao tráfico de seres humanos

3.3.3 Os esforços de cooperação do Brasil no contexto do enfrentamento ao tráfico de seres humanos

A Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional estatui algumas diretrizes acerca da cooperação técnica entre seus países membros, estabelecendo em seu artigo dezoito que:

1. States Parties shall afford one another the widest measure of mutual legal assistance in investigations, prosecutions and judicial proceedings in relation to the offences covered by this Convention […] and shall reciprocally extend to one another similar assistance where the requesting State Party has reasonable grounds to suspect that the offence is transnational in nature, including that victims, witnesses, proceeds, instrumentalities or evidence of such offences are located in the requested State Party and that the offence involves an organized criminal group. 2. Mutual legal assistance shall be afforded to the fullest extent possible under relevant laws, treaties, agreements and arrangements of the requested State Party with respect to investigations, prosecutions and judicial proceedings.

A prioridade 11 do Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas também asseverava esta máxima: “11. A. Propor e elaborar instrumentos de cooperação bilateral e multilateral na área de repressão ao tráfico de pessoas; [...] 11.A.3. Fomentar a utilização de instrumentos internacionais de base para a cooperação jurídica para enfrentar o tráfico de pessoas” 98. Assim, de acordo com o que pode ser observado pelo artigo acima sublinhado, as formas de assistência mútua para se combater as diversas formas de crimes transnacionais deveriam abranger todos os artifícios cooperativos possíveis, objetivando facilitar o desmonte de tais redes criminosas.

Acordos bilaterais de auxílio jurídico mútuo em matéria penal, os quais possibilitam coordenar e facilitar a execução das atividades de combate aos crimes transnacionais pelas autoridades competentes pela investigação, estão vigentes com dez países, dentre estes França, Itália, Portugal e Ucrânia. Já os ajustes nesta matéria com Espanha, Reino Unido e Suíça estão aguardando promulgação, enquanto que o relativo à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) está no estágio de tramitação no Congresso Nacional.

Com respeito à cooperação jurídica em matéria civil que objetiva a consecução dos atos e procedimentos mais céleres e eficazes dos judiciários envolvidos, encontram-se vigorando com Espanha, Itália e França99. Também merece destaque a recente parceria com a Alemanha, visando combater o crime organizado mediante um intercâmbio de experiências sobre a modernização das políticas de combate dos dois países, prevendo ações como estudos na área de inteligência,

98 Decreto Nº 6.347. Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico. Exposição de motivos, 2008. Prioridade 11. 99 Cooperação internacional. Ministério da Justiça. Disponível em:

http://www.mj.gov.br/data/Pages/MJ5B0F1FEFITEMID2F2B31895C9F4779A21E7BBFE1D18A69PTBRIE.htm. Acessado em: 12 jan. 2009.

reaparelhamento das corporações, aperfeiçoamento e treinamento de profissionais que objetivam maior eficácia na repressão de crimes como o tráfico de pessoas100.

Saliente-se que, mesmo na inexistência de um acordo bilateral ou multilateral constituído na seara a qual necessita esforços de cooperação, ainda assim se pode implementar acordos de assistência para determinada situação específica. No tocante ao combate ao tráfico de seres humanos pelo Brasil, a referida hipótese pode ser exemplificada pelo fato de o Ministério Público Federal receber e enviar pedidos de assistência jurídica mútua quando o caso abranja um país com o qual o Brasil ainda não possua tratado cooperativo, na área, de modo que esses pedidos devam ser analisados de acordo o paralelismo entre os tipos penais nos dois países, além da reciprocidade de um eventual pedido do outro país. O procurador da República, Patrick Salgado Martins101, afirmou que ao investigar um caso de tráfico de pessoas envolvendo o Brasil e a Suíça, em virtude da falta de um acordo bilateral entre os dois países, nesta área, o qual apenas agora será adotado, a cooperação judicial tão necessária para a eficácia da investigação foi implementada nestes termos.

No âmbito da Procuradoria Geral da República, a Assessoria de Cooperação Jurídica Internacional é o órgão especializado no tema e que centraliza todas as cooperações (ativas e passivas). Já no contexto do Ministério da Justiça, o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional é a autoridade central brasileira para gerenciar quase a totalidade do recebimento e o envio dos pedidos de assistência jurídica internacional (bilateral ou multilateral), valorando sua adequação ou não ao caso. Possui um escopo especializado e ampliado, pois atende aos pedidos do Poder Executivo (polícias) e de outros ramos do Ministério Público. As requisições de acordos para auxílio relativo a algum caso específico devem ser enviadas ao referido departamento.

Caso exista um acordo bilateral ou multilateral de cooperação jurídica internacional, o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional, por ser a Autoridade Central, encaminhará a requisição ao Estado em questão. Na hipótese da inexistência

100 Cooperação internacional. Ministério da Justiça. Disponível em :

http://www.mj.gov.br/data/Pages/MJ5B0F1FEFITEMIDE9D1427A85B6449F9E6AA35589B3933BPTBRIE.htm. Acessado em: 12 jan. 2009.

101 Procuradoria da República de Minas Gerais. As informações foram obtidas mediante conversações informais

de acordo, o mencionado órgão deverá remeter o pedido à Divisão Jurídica do Ministério das Relações Exteriores, para que sejam utilizados os meios diplomáticos.

O Secretário Nacional de Justiça, Romeu Tuma Junior, afirmou que: “O Brasil tem o maior número de pedidos de cooperação jurídica com base na Convenção de Palermo. Somos pró- ativos e temos tradição na área de cooperação jurídica internacional”. Ressaltou que, além da condenação às pessoas envolvidas em atividades desta natureza, também se afigura importante combater a lavagem de dinheiro e recuperar os ativos de origem ilícita provenientes desse crime. Representa a cooperação internacional, um papel preponderante neste contexto, uma vez que, além de provar a ocorrência do crime, também imobiliza o fluxo financeiro dessas organizações criminosas102.

No cenário das iniciativas bilaterais do governo brasileiro, para combater o tráfico, a parceria luso-brasileira deve ser ressaltada. O Acordo Luso-Brasileiro de Prevenção e Repressão ao Tráfico de Pessoas, realizado em 2003, estatuiu a promoção de seminários entre autoridades de ambos os países, para uma reflexão mais aprofundada sobre estes temas e o intercâmbio de experiências e informações, a fim de prevenir e reprimir a ação das organizações criminosas que atuam nesta área.

O primeiro deles foi o I Seminário Luso-Brasileiro sobre Tráfico de Pessoas e Imigração Ilegal, o qual ocorreu em duas etapas. A primeira delas foi sediada em Cascais (Portugal) e resultou a Declaração de Cascais, enquanto que a segunda ocorreu em Brasília, também havendo sido elaborada a Declaração de Brasília.

Buscou-se como objetivo principal, a troca de informações sobre as possibilidades de se enfrentar o fenômeno do tráfico de pessoas. Dessa forma, pretendeu-se fomentar a partilha de conhecimentos e experiências entre Portugal e o Brasil, de modo a identificar alvos e campos de atuação, bem como ações, quer na área governamental, quer na sociedade civil, que possam ou devam ser objetivamente desenvolvidas.

102

Discurso na IV Conferência das partes da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Transnacional ocorrida em Viena, Áustria, no mês de outubro de 2008. Disponível em:

http://www.mj.gov.br/data/Pages/MJ5B0F1FEFITEMIDB6FE2D262CAF4842B10AE648ECB8E862PTBRIE.htm.

Assim sendo, esse projeto intenta avaliar a situação de tráfico em ambos os países, objetivando a melhoria dos métodos de investigação e de repressão ao crime. Parte dessa estratégia inclui a formação de uma consciência pública sobre a questão, além da criação de banco de dados estatísticos fidedignos, com respeito à rota de tráfico entre esses dois países.

No contexto da presidência portuguesa da União Européia, a temática do tráfico continua na pauta de esforços bilaterais com o Brasil, apontando a realização, na Embaixada Portuguesa em Brasília, no mês de Outubro de 2007, de uma Reunião sobre tráfico de pessoas, possuindo como objetivo principal, reunir representantes das mais diversas embaixadas com o intuito de propagar o assunto e incentivar iniciativas semelhantes advindas de outros países.