• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO III – APLICAÇÃO DO MÉTODO DA TEORIA SEMIÓTICA NO

3.3 Nível Discursivo

3.3.1 A Espacialização

Para a análise da categoria espacial do capítulo 1 de João, necessita-se antes de tudo distinguir dois modos possíveis de conceituá-la. Desse modo, é necessário observar uma organização da espacialização tendo em vista um espaço linguístico e um espaço tópico. No espaço linguístico está-se diante de um espaço constituído tendo como referência os actantes da enunciação em relação aos do enunciado. Não se estabelece, portanto, um espaço geométrico. O espaço tópico, por sua vez, permite observar corpos dispostos

em relação a um ponto de referência, instituindo uma direcionalidade aos movimentos em uma determinada dimensão espacial.

Nota-se, porém, a particularidade do espaço linguístico por ordenar-se em função do discurso. Tal organização faz-se a partir do hic, isto, do lugar do

ego que é expressa “pelos demonstrativos e por certos advérbios de lugar. O

espaço linguístico não é o espaço físico, analisado a partir das categorias geométricas, mas é aquele onde se desenrola a cena enunciativa” (FIORIN, 2003, p. 174). Por sua vez, em oposição ao aqui está o alhures, que estabelece o espaço do enunciado, ou seja, um ponto marcado no texto.

O espaço tópico, no entanto, pode ser descrito nos moldes de uma programação espacial desenvolvida pela semiótica para averiguar “os procedimentos de programação espacial que permite a realização de uma disposição linear dos espaços parciais, conforme a programação temporal dos programas narrativos” (GREIMAS e COURTÉS, 1983, p. 155).

Os procedimentos de debreagem e embreagem são compreendidos como mecanismos que aplicam no discurso uma organização espacial que “serve de quadro para a inscrição dos programas narrativos e de seus encadeamentos” (GREIMAS e COURTÉS, 1983, p. 155)

Ainda sobre a debreagem espacial:

A debreagem espacial apresenta-se como um procedimento que tem por efeito expulsar da instância da enunciação o termo não-aqui da categoria espacial e lançar, assim, ao mesmo tempo, os fundamentos tanto do espaço “objetivo” do enunciado (o espaço de alhures) quanto o espaço original _ que só é reconhecível como pressuposição tópica _ da enunciação. Se se considera o espaço de alhures como um espaço enuncivo, vê-se que a projeção do termo aqui, que simula o lugar da enunciação, é igualmente possível, e que a partir dessa posição pode ser constituído um espaço de aqui, de ordem enunciativa.

(GREIMAS e COURTÉS, 2008, p.114).

Por meio de uma debreagem espacial enunciva, tem-se no conto em análise a ancoragem espacial determinada pela instalação do alhures figurativizado pelo topônimo Judeia, Betânia, Jerusalém que são os lugares onde se passam os programas narrativos dos sujeitos. Um alhures que constitui os espaços da cena enunciativa e se firmam nas cidades supra- citadas.

Betânia Jerusalém

1. Movimentação do ator (Jesus) pelo espaço da cidade Judeia; 2. Movimentação do ator (Jesus) pelo espaço da cidade Betânia; 3. Movimentação do ator (Jesus) pelo espaço de Jerusalém.

Jesus, seja em Judeia, Betânia ou Jerusalém exerceu sua performance cumpriu seu percurso. Esses lugares representam o lugar de sua aquisição e conjunção bem como das oposições dos que representam os que não o aceitaram.

Isso posto, é possível inferir que o predomina naquele espaço o eufórico para Jesus, pois ele sujeito de estado e de fazer opera os milagres e sinais. Esse espaço para Jesus constitui o lugar da aquisição. Nesse espaço vão ocorrer privação e punição para os que não o recebeu, por outro lado vai o lugar do prêmio para os que o recebeu. Luz para os que o aceitaram “a luz do mundo”; o espaço das trevas para os que o rejeitaram, havendo, então sanção e recompensa.

3.3.2 A Actorialização

Para o exame da actorialização do capítulo 1 de João, deve-se ter em mente que tal componente da discursivização está fundado nos procedimentos de debreagem e embreagem. Esses mecanismos instalam a pessoa em ator do discurso. O ator é, então, o ponto de convergência de investimentos semânticos do subcomponente sintáxico e semântico. O restante, o uso dos recursos enunciativos e enuncivos de instalação das pessoas no discurso direcionam-se para a percepção de criação de determinados efeitos de sentidos. No capítulo 1 de João em exame, nota-se a presença da debreagem enunciva aquela que privilegia a eliminação das marcas de pessoas, criando efeitos de sentido de objetividade e a enunciativa em que aparecem as marcas

de pessoa-lugar-agora. O enunciador nesse evangelho se esconde em um tipo de narrador-obsevador, revelando um ethos 10crítico.

A noção de ethos na análise desse evangelho é aquela instituída por Mainguenaou que serve para entender certos posicionamentos ideológicos do autor e sob que pontos de vista a narrativa bíblica possibilita a leitura. Assim por meio da análise do ethos ajuda compreender a organização actorial de Jesus. Pois toda enunciação pressupõe um eu que se projeta no enunciado, ora assumindo a primeira pessoa, ora na terceira pessoa, como salienta Fiorin (2002, p. 104) "na medida em que o narrador pode intervir a todo instante como tal na narrativa, toda narração é virtualmente feita em primeira”.

No capítulo 1:1 prioritariamente é iniciado em terceira pessoa pela projeção do eu sob a forma de um ele, as vezes, na forma do discurso indireto. Percebe no texto que a utilização desse recurso possibilita o autor direcionar o seu discurso para onde ele quer. Esta escolha pressupõe que este que fala é um observador dos fatos que vai ser narrados, deixando aparecer um conjunto de apreciações feitas pelo narrador e que se ligam diretamente à enunciação, instância pressuposta da qual fazem parte enunciador/enunciatário.

As sequências de descrição do Logos bem como a disposição das ideias e sequência dos fatos infere-se que o narrador é altamente sabedor de tudo que se vai narrar, pois a forma com está organizado seu texto deixa claro que as escolhas cumpriu-se a um propósito: aumentar a fé daqueles que aceitaram Jesus.

Documentos relacionados