• Nenhum resultado encontrado

ESPECIALIZADO: PARA ALÉM DE UM DIREITO, UM ATUAL E NECESSÁRIO OBJETO DE

PESQUISA

Marcos Cezar de Freitas

Introdução

Este capítulo aborda o Atendimento Educacional Especializado (AEE) e faz referência às Salas de Recursos Multifuncionais (SRM).

As bases políticas e jurídicas que configuraram o AEE e uma de suas expressões materiais mais significativas, que é a SRM, serão mencio-nadas e explicitadas no decorrer deste texto. Mas, antes disso, quero destacar brevemente como tem sido possível pesquisar o tema de modo a apresentar aqui, neste capítulo, um aspecto que considero relevante, dentre tantos possíveis e necessários no complexo universo da escolari-zação de pessoas com deficiência.

Desde 2009, coordeno o projeto EDUCINEP: Educação Inclu-siva na Escola Pública que é certificado no Diretório de Pesquisas do CNPq e responde às demandas para formação de pesquisadores susci-tadas no âmbito dos cursos de graduação da Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Unifesp, com a presença de alunas/os de Ini-ciação Científica e, predominantemente, às demandas para formação de pesquisadores/as suscitadas na Linha de Pesquisa Educação: Desi-gualdade, Diferença e Inclusão do Programa de Pós-Graduação em Educação da mesma Escola, acolhendo mestrandos/as, doutorandos/

as e pós-doutorandos/as.

O EDUCINEP proporciona aos seus participantes uma for-mação em pesquisa baseada na contribuição da Antropologia para a

Educação, mantendo conexões com pesquisadores/as do Brasil e do exterior em cujas obras reconhecemos perspectivas importantes para compreender o “sentido dado” à presença “do diferente” e “da diferença”

em cenários escolares, de modo singular quando isso se refere às corpo-reidades que se configuram nas experiências de crianças cronicamente enfermas ou com deficiência. Diversidades reverberam complexidades para o cotidiano escolar.

A pesquisa etnográfica tem lugar relevante na maior parte dos projetos conduzidos no EDUCINEP, especialmente porque a escola não é um ente evocável na segurança da distância. O chão da escola só se deixa conhecer de perto, desde dentro, e com muitas, muitas páginas de anotações em cadernos de campo para registrar o detalhe.

Por isso, foi necessário desde os primeiros momentos conduzir pesquisas não somente sobre escolas públicas, mas, principalmente,

“com” escolas públicas. Atuar em rede com as Redes públicas de ensino tem sido a marca distintiva das ações acadêmicas do Projeto EDUCI-NEP e, desde as primeiras aproximações, foi possível perceber que nas interações entre profissionais das escolas, familiares, crianças e tantas outras personagens do cotidiano escolar, constantemente, cumulati-vamente, o Atendimento Educacional Especializado é mencionado, problematizado, elogiado, criticado, desejado, defendido e, ao mesmo tempo, reconhecido como insuficiente. Trata-se de matéria complexa, profunda e potente no que tange a proporcionar um encontro com a materialidade daquilo que (não) estamos fazendo em termos de Edu-cação Inclusiva.

Isso fez com que o EDUCINEP assumisse a responsabili-dade de institucionalizar um processo de pesquisa que efetivamente escutasse atentamente as personagens do Atendimento Educacional Especializado. Disso decorreu a configuração do LAPEAEE que é o Laboratório de Pesquisa e Escuta do AEE e que organiza matéria ana-lisável que se consubstancia nessa dinâmica de interação.

Nesse processo contínuo de pesquisa e escuta, o AEE confir-mou-se como objeto de pesquisa desafiador, principalmente porque não se restringe às premissas que o reduzem à condição de “adaptador”

de recursos e materiais. Sua potência diz respeito à possibilidade de interferir na ossatura, na alma da educação quando praticada na forma escolar que é o binômio tempo-espaço. E é com essa potência que o AEE pode ser percebido como parte fundamental na formulação de uma igualmente potente crítica que a Educação Inclusiva tem a ofe-recer ao mundo que estamos construindo (ou destruindo). A potência desse tema, o AEE, como objeto de pesquisa é a base argumentativa deste capítulo.

Como aspecto estruturante da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva o AEE, aqui, é reconhecido em sua importância.

O objetivo principal deste capítulo é o de associar este tema ao debate mais amplo que tem formulado críticas ao desenvolvimento econômico como indutor da “razão de ser” das dinâmicas de escolarização.

O AEE como objeto de pesquisa diz respeito ao esforço por investigar, propor e efetivar não somente técnicas e tecnologias assis-tivas (reconhecidas e respeitadas na importância inconteste que têm), mas diz respeito também ao esforço para reconhecer que tempo e espaço são categorias passíveis de pesquisa específica, pois têm relação direta com os modos de fazer da escola e são, estruturalmente, as bases da educação na forma escolar.

Por isso, o AEE é pensado nos termos do Pluriverso que é o modo como tem sido designado o repertório crítico do mundo cen-trado na elaboração do Homo Oeconomicus, o sujeito do desenvolvimento econômico, aquele que a escola projeta com provido de habilidades e competências para “empreender”.

Este enquadramento suscita contextos, cenários e cenas que podem ser descritos com a categoria “deficientização”, recolhida junto aos disability studies (DAVIS, 2010), os estudos críticos da deficiência e que permite reconhecer que dispositivos pedagógicos como, por

exem-plo, o AEE devem ser pensados e pesquisados não como “lugares de alguns” dentro da escola, mas sim como “espaço” escolar de um trabalho pedagógico intenso de todos e com todos.

Um dispositivo pedagógico fundamental, mas complexo

O Atendimento Educacional Especializado (AEE) é um direito conquistado pela sociedade brasileira no seu todo, não somente por pes-soas com deficiência, ainda que para essas a consolidação desse direito tenha aspectos inseparáveis de outros direitos, como aqueles relaciona-dos à escolarização, por exemplo.

O AEE responde às demandas legais que têm expressiva força estruturante, como a Constituição Federal de 1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990, a Lei de Diretrizes e Bases da Edu-cação Nacional, LDB 9394/1996, a Política Nacional de EduEdu-cação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI) de 2008.

Em relação à PNEEPEI, o AEE foi/é peça chave para a superação de uma perspectiva defendida pela Política Nacional de Educação Especial, de 1994, que almejava instalar classes de separadas em todas as escolas.

O AEE consta também da Meta Nº 4 do Plano Nacional de Educação.

Diz respeito a um léxico próprio da Educação Pública uma vez que o AEE é, na sua forma e no seu conteúdo, inseparável das dinâ-micas que definiram o chamado público alvo da Educação Especial e marco de referência para a materialidade de importantes serviços como as Salas de Recursos Multifuncionais. Portanto, o AEE tem um repertório próprio e lugares, no universo da Educação Básica, que são reconhecidos como “seus”.

Escrevi há pouco tempo (Freitas, 2022) que em toda malha documental relacionada à Educação Especial e à Educação Inclusiva é possível perceber que a palavra inclusão na maioria das vezes é usada como se fosse autoexplicativa. A menção à inclusão seria suficiente para indicar o que pode ser, e só o que pode ser a Educação Inclusiva.

Trata-se de um equívoco com expressivas consequências políti-cas e este equívoco repercute também quando está em questão elucidar o AEE como objeto de pesquisa. Na realidade, no que diz respeito ao manejo da categoria inclusão temos dois equívocos sobrepostos. Por um lado, reiteradamente se observa este uso desvinculado da necessidade de expor o que se entende por inclusão. Por outro lado, percebe-se que inclusão é utilizada com o sentido de acessibilidade, como se a men-ção a esta já contivesse aquela. Trata-se de um equívoco que repercute muito negativamente no entendimento e na construção da Educação Inclusiva. E isso repercute na apropriação do sentido e razão de ser do AEE.

Os marcos legais que desenham a arquitetura normativa para a Educação Inclusiva são importantíssimos uma vez que expressam e delineiam direitos e garantias inalienáveis. Mas a menção à inclusão indica muitas vezes um sentido que, ao termo, pode acrescentar difi-culdades de grande porte à concretização de algo tão complexo quanto exigente como é a Educação Inclusiva.

A Lei Brasileira de Inclusão (LBI), que é de 2015 e que res-ponde a inúmeros anseios e a problemas historicamente acumulados, ao mesmo tempo em que expressa ganhos, garantias e conquistas indi-viduais e coletivas, mostra-se também vulnerável à equiparação entre acessibilidade e inclusão. Há um ganho argumentativo na LBI que se mostra já em seu preâmbulo quando afirmar que:

A (...) deficiência (...) agora não é mais entendida como uma con-dição estática e biológica da pessoa, mas sim como resultado da interação das barreiras impostas pelo meio com as limitações de natureza física, mental, intelectual e sensorial do indivíduo (...). A deficiência deixa de ser um atributo da pessoa e passa a ser o resul-tado da falta de acessibilidade que a sociedade e o Esresul-tado dão às características de cada um (...). Ou seja, a LBI veio mostrar que a deficiência está no meio, não nas pessoas (preâmbulo inclusivo da LBI, p. 12).

Esse ganho argumentativo, porém, já se apresenta inibindo seus propósitos mais elevados, pois sintetiza a deficiência como resultado da falta de acessibilidade, tomando no conjunto amplo de documentos (nacionais e internacionais) que incidem no mesmo equívoco, ou seja, não mencionam falta de acessibilidade “e de” inclusão”. A falta de aces-sibilidade parece ser o mesmo que ser a falta de inclusão. Acesaces-sibilidade é descrita no Artigo 3º da LBI explicitando como se deve assegura o

(...) alcance para utilização, com segurança e autonomia, de espa-ços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privado de uso coletivo (...) por pessoa com defi-ciência ou com mobilidade reduzida.

O texto, no todo, evoca a importância da adaptação de insta-lações e enfatiza a “quebra de barreiras” como estratégia fiadora da presença de pessoas com deficiência naquilo que a LBI denomina de sistemas educacionais inclusivos, especialmente nos artigos 27 e 28. O argumento central daquilo que a LBI denomina direito à educação é o argumento em defesa da “igualdade de oportunidades”, e as metáforas de transformação pessoal que permeiam o texto aludem aos talentos e às habilidades que devem ser estimuladas a despeito dos impedimentos ocasionados pela deficiência.

E nos incisos do Artigo 28, principalmente o III e o VII, a exigência de projetos pedagógicos específicos explicita o AEE como direito reconhecido também na LBI. Incide sobre serviços e adapta-ções, suscita a elaboração de estudos de caso que demonstrem como agir nos casos de impedimento ou limitação e defende planos de ação atentos às especificidade de cada questão.

Ao todo, o texto da LBI, incluindo os preâmbulos organizados pelas instâncias de tramitação parlamentar e do Ministério da Educa-ção, utiliza a palavra inclusão trinta e quatro vezes. Em todas, o sentido

de inclusão e seus desdobramentos como, por exemplo, na menção à Educação Inclusiva, equipara inclusão ao acesso, à acessibilidade e ao provimento de tecnologias assistivas e espaços adaptados e sem bar-reiras (pessoais ou materiais). A LBI é importantíssima e estratégica.

Mas expressa, a seu modo, as mesmas contradições da sociedade que a concebeu e gerou. Quero abordar, na sequência, os efeitos de tudo isso na configuração do AEE como objeto de pesquisa.

A pesquisa e a apreensão dos sentidos de AEE cotidianamente construídos

No “chão da escola” é possível registrar não somente a circula-ção de ideias, de princípios pedagógicos legalmente expressos e de conteúdos formatados pelo currículo. De perto e por dentro, é possível entrever aspectos da permanente reelaboração de tudo, o que faz com que o cotidiano para além de ser permanentemente inventado (CER-TEAU, 2000), expresse (contraditoriamente) uma estabilidade instável.

Essa estabilidade instável diz respeito a um aspecto antropologicamente importante que é a produção de sentido para as regras e finalidades com base nas dinâmicas do seu uso. Ou seja, não é suficiente que o conteúdo de uma regra seja descrito e prescrito formalmente para que seus efeitos sejam uniformes. Faz parte da dinâmica de apropriação das regras no cotidiano a porosidade que permite que o sentido atribuído a um serviço resulte tanto dos modos como é suposto este serviço (em sua concepção) quanto dos modos como é usado (em sua apropriação diária).

O diálogo com professores/as, demais trabalhadores/as das escolas, com familiares e também a escuta de crianças em meio ao ala-rido dos pátios e corredores tem permitido reconhecer uma imagem recorrente quando é mencionada a Sala de Recursos Multifuncionais (SRM), um dos resultados efetivos da disseminação do AEE.

Para além da tensão permanente que permeia o território escolar delimitado como SRM, tensão porque este espaço é interpretado simul-taneamente como instância da escolarização comum em andamento e

também como instância de entretenimento para alguns “enquanto” as atividades em sala de aula acontecem, é possível reconhecer uma repre-sentação de finalidade compartilhada por muitos.

Independentemente dos conteúdos e das prescrições das bases normativas, constantemente se percebe que o “sentido próprio” urdido no tecer do dia a dia atribuído à SRM (o sentido derivado do seu uso, do modo como é usado) é o de que ela existe exclusivamente para guar-dar, manter, garantir e oferecer tecnologia para alunos/as com deficiência.

Sobressai a imagem da “caixa de ferramentas” ou “almoxarifado inclusivo”.

Pode parecer lógico e inquestionável que um local associado ao provimento e guarda de recursos como é uma SRM seja enredado por representações da ferramentaria. Mas para além da importância con-tida na racionalização que destina recursos para demandas específicas (como, por exemplo, softwares ou regletes), é importante também per-ceber a força de uma naturalização.

Fica evidente no modo como reduzimos inclusão às garantias de acessibilidade e também no modo como interpretamos o corpo com deficiência como “presença da incompletude”1, que o trabalho escolar seja permanentemente assimilado como “canteiro de tarefas” (McDER-MOTT, 1996) e que, por isso, certo estoque de tecnologias possa ser mantido para suprir tecnologicamente o “que falta naturalmente” nal-guns corpos (MCKINNON; SILVERMAN, 2020). A relação de causa e efeito se instala como se a falta de eficiência de alguns pudesse ser

1 Essa “presença da incompletude” lembra a importância estratégica da categoria ca-pacitismo. Como escrevi recentemente: “Essa referência é necessária, pois “capacitismo”

é o modo como se expressa, com palavras e atitudes, uma “natural” hierarquização entre pessoas conforme “um” modelo de capacidade funcional. A pessoa com deficiência é percebida como se fosse um todo incapaz, em razão de uma impossibilidade específica.

Quando se critica o “capacitismo” não se pretende recusar a incapacidade biológica em si mesma (o não conseguir escutar, o não conseguir andar etc.) conforme destaca Anahi Mello (2016). Trata-se de perceber como é considerado natural e definitivo o conjunto de tarefas relacionado “aos que conseguem”. Dessa naturalização decorre a inferioriza-ção de pessoas com deficiência com base na preeminência de um fator, o de que essa pessoa e sua existência devem ser explicadas com base no que não se consegue. Assim, abordá-la “eficientemente” muitas vezes significa encontrar um modo de compreender

“a fundo” o que caracteriza sua(s) impossibilidade(s)”. (Freitas, 2022, p. 53).

atenuada de modo a suscitar uma participação (mais ou menos intensa conforme o caso), apoiada nos recursos tecnológicos, didáticos e peda-gógicos disponíveis.

Delineando deste modo a razão de ser das Salas de Recursos Multifuncionais e, em certo sentido, todo o AEE, a eficiência dos eficientes é enquadrada como ponto de chegada que as pessoas com deficiência devem almejar. A noção de inclusão é reduzida a dar acesso para “estar com”. Inclusão deixa de ser intervenção pedagógica no todo e com todos e passa a significar, concretamente, o registro da presença de quem foi “contemplado com o acesso” e que recorre a tecnologias específicas2.

Por isso, foi enfatizada ao início a importância de elucidar o que se entende por inclusão quando se articulam processos sob a égide da Educação Inclusiva. Isso é fundamental para não permitir que seu con-teúdo seja subentendido no que é específico do acesso (a quebra de barreiras), nem esteja subsumido nas técnicas e tecnologias de acessibili-dade quando essas não são consideradas aspecto fundamental do direito à educação escolar, mas consideradas ferramentas de “eficientização”.

Nessa perspectiva, cabe perguntar: como é possível (re)pensar inclusão e, em decorrência, perguntar também como o trabalho aca-dêmico e científico se investe da responsabilidade de delinear o AEE como objeto de pesquisa?

Este é um questionamento que absolutamente não deixa de reconhecer a importância do trabalho que caracteriza o AEE e seus prolongamentos com as SRM. Mas o que é possível ampliar, adensar e possibilitar se tomarmos o AEE como objeto de pesquisa afeito não somente às imprescindíveis demandas da acessibilidade, mas também como efetivo articular da Educação Inclusiva?

Desponta a oportunidade de levar a efeito, no universo dos debates relacionados à Educação Especial na Perspectiva da Educação

2 Não é casual o uso corrente da expressão altamente estigmatizante “criança de in-clusão”.

Inclusiva, um esforço analítico e interpretativo semelhante àquele que, no âmbito de um movimento denominado “Pluriverso”3, acumulou sólida crítica à naturalização do conceito de desenvolvimento.

Com a categoria “pós-desenvolvimento” elaborada com impres-sionante pluralidade e abrangência acadêmica, temos um exemplo da plausibilidade que novos (e necessários) parâmetros podem ter para a (re)configuração deste objeto de pesquisa que não é da Educação Especial “ou” da Educação Inclusiva, mas, efetivamente, da Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva. Vou explicar.

O AEE nos termos do Pluriverso

Antes de adentrar os termos do Pluriverso, é importante tecer algumas considerações sobre AEE e SRM que podem acrescentar com-plementos importantes às comparações que serão feitas logo adiante.

São exemplos baseados em questões complexas que despontaram no âmbito de duas referências na multiplicação de serviços especializados com base nas matrículas de alunos/as com deficiência, refiro-me aos municípios do Rio Grande do Sul e, no Estado de São Paulo, a cidade de São Paulo. E se o decênio 2010-2020 for tomado como referência cronológica, importantes dados de pesquisa podem ser citados.

Desde a experiência do Estado do Rio Grande do Sul, Baptista (2011, p. 60) destacou a importância de (...) “compreender como ocor-reram alterações políticas que resultaram no avanço da sala de recursos como serviço prioritário no AEE”. Interessado em afirmar e reforçar a “deriva pedagógica (da SRM ) nas relações com o currículo e com a ação docente em geral” (p.60) indagou com propriedade sobre as carac-terísticas pressupostas especificamente para a atuação docente nesse espaço que materializa a presença institucionalizada do AEE.

3 Pluriverso é a designação do conjunto de argumentos que tem reforçado a im-portância de buscar alternativas sistêmicas à lógica do desenvolvimento econômico e que dá nome ao “Dicionário do Pós-Desenvolvimento” organizado a partir da Índia e traduzido no Brasil em 2021.

Baptista e Haas (2019) reforçaram que o AEE de modo geral deveria ser descrito como “dispositivo pedagógico central para a imple-mentação da PNEEPEI” (p.3) e é com base na sólida apresentação de argumentos derivados de pesquisa de campo que os autores propõem des-locar o AEE da condição de “lugar” para a condição de “espaço” (p. 20).

Esse não é um simples jogo de palavras (deslocar de lugar para espaço), mas uma ressignificação de radical importância, tomando aqui o sentido de radical como aquilo que foi expresso por Antonio Candido (1990) quando se referiu a argumentos que vão à raiz dos problemas.

Isso será retomado a seguir discutindo o conteúdo político/pedagógico do Pluriverso.

Antes, é importante lembrar que Oliveira e Prietto (2020) apre-sentaram importante e densa investigação feita com professoras/es das SRM da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo e consta-taram que 84% das/os que responderam às questões de pesquisa não se consideravam preparadas/os para atuar com “todas as categorias” de deficiência (p. 343).

Foi problematizada a percepção de que a SRM “trouxe consigo a interpretação de que seu regente deva ser um professor multicategorial”

(p.344) e, ao final, com base no conjunto de respostas obtido foi possí-vel às autoras argumentar que:

“Atender à diversidade na sala de aula e às necessidades do Público Alvo da Educação Especial requer mudança na forma de ensi-nar e organizar o trabalho pedagógico, caso contrário, fica deslocada para a SRM a responsabilidade integral pela garantia da permanência dessas/

es estudantes na classe comum e pelo seu acesso a níveis mais elevados de ensino, com direito à aprendizagem” (Oliveira; Prietto, 2020, p. 356).

E esta importante, importantíssima observação, para o que se conecta com a argumentação que se apresenta aqui, neste texto, tem um complemento imprescindível àquilo que será discutido a seguir, que é o de que “o ingresso não esgota o compromisso com a garantia do direito à educação de qualidade para todos” (p. 356).

O ingresso não esgota o compromisso com as garantias que expressam direitos à educação porque o ingresso é uma dimensão do acesso, não da Inclusão. É uma dinâmica de adensamento democrático, mas inclusão é uma dinâmica da convivência, demandante dos esforços associados à complexidade da permanência.

Para a pessoa com deficiência, esta, a permanência, entra em

Para a pessoa com deficiência, esta, a permanência, entra em