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2 O PAPEL DAS POLÍTICAS PÚBLICAS INTENTADAS NO CENÁRIO

2.1 CONTORNOS E CARACTERÍSTICAS DOS MODELOS DE ORGANIZAÇÃO DO

2.1.2 Estado de Bem-estar Social (Welfare State)

Como visto, a igualdade aplicada exclusivamente no campo formal aliada a não intervenção estatal no domínio econômico, é prejudicial às questões sociais, sobretudo porque se presta apenas a expandir o capitalismo, acarretando no agravamento da situação da classe proletariada que, de uma forma quase generalizada, passa a experimentar uma vivência situada no campo da miserabilidade.

Este descompromisso com as questões sociais, típico do liberalismo, que submete a classe proletariada a viver em condições desumanas e degradantes, forçou os trabalhadores do Século IXX a se organizarem com o intuito de resistir à famigerada exploração. Essa organização representou uma verdadeira possibilidade de rompimento com o Estado Liberal. A burguesia, porém, no intento de evitar a expansão dos ideais pregados por estes movimentos, buscou utilizar mecanismos que distanciassem os trabalhadores de uma opção revolucionária, dando origem, então, ao Estado Social.

Segundo Bonavides (1980), em vista destes processos que deram azo ao surgimento do Estado de Bem-estar Social, novas diretrizes passaram a delinear a organização do Estado, notadamente: (a) a autorização conferida ao Estado para intervir no domínio econômico; (b) a aplicação da igualdade também ao campo material e, ainda; (c) a realização da justiça social, acarretando em uma melhora substancial na qualidade de vida da população.

Para além da igualdade abstrata de todos perante a lei (igualdade em sentido formal), a igualdade material (ou substancial) preocupa-se com as condições de isonomia no campo fático, isto é, preocupa-se em conferir aos desiguais um tratamento também desigual, na medida de sua desigualdade, como forma de garantir às pessoas que possam desenvolver as oportunidades que a igualdade formal lhes assegura, a fim de que seja alcançada a justiça social.

Verifica-se, assim, uma equivalência entre o Estado de Direito e o Estado Social, tendo em vista que àquele, como visto anteriormente, acarretou no surgimento do conceito de direito público subjetivo, cabendo a este delinear a dimensão de seu alcance, fixando, de maneira mais efetiva, as atividades políticas estatais.

Conforme ensina Gordillo (1977, p. 74):

A diferença básica entre a concepção clássica de liberalismo e a do Estado de Bem-Estar é que, enquanto naquela se trata tão-somente de colocar barreiras ao Estado, esquecendo-se de fixar-lhe também obrigações positivas, aqui, sem deixar de manter as barreiras, se lhes agregam finalidades e tarefas às quais antes não sentia obrigado. A identidade básica entre o Estado de Direito e o Estado de Bem-Estar, por sua vez, reside em que o segundo toma e mantém do primeiro o respeito aos direitos individuais e é sobre esta base que constrói seus próprios princípios.

Portanto, em que pese o Estado Social possua objetivo distinto daquele estabelecido no Estado de Direito, por certo que faz uso deste o respeito ao reconhecimento dos direitos individuais, primordialmente o da liberdade, para erigir os sustentáculos que embasam a gênese dos direitos sociais.

É deste modo que surgem os direitos de segunda geração, situados não mais no plano do ter, mas agora do ser, que, imbuídos de conteúdo social e econômico se voltam a aprimorar a qualidade de vida e de trabalho das pessoas, exigindo do Estado, em razão de sua reconfiguração, uma atuação positiva no sentido de promover em benefício dos até então explorados, entre outros, o direito ao trabalho, ao lazer, à educação e à moradia (Bonavides, 1980).

Destarte, ampliam-se os direitos subjetivos materiais, impondo ao Estado um compromisso em face da sua população, com a finalidade de a ela proporcionar e garantir um mínimo de bem-estar. É assim que o Estado Social diligencia para efetivar o ideário de que é necessário ter, no sentido material, um mínimo de direitos e garantias realizadas para que a pessoa possa, de fato, ser cidadã. Do contrário, por exemplo, de que adiantaria uma pessoa ter garantido constitucionalmente o direito à inviolabilidade do seu domicílio se esta mesma pessoa não possuir uma casa?!

Esse novo estágio de evolução do Estado, que se reestrutura a partir dos princípios da isonomia e da justiça social representa, em grande medida, o alastramento das lutas sociais provenientes do processo de revolução industrial, de

sorte que passa a redistribuir a igualdade por intermédio de prestações positivas do Estado (Bonavides, 1980).

Importante destacar, que esse novo modelo de organização social onde o Estado, que tem como paradigma a materialização da igualdade, passa a assegurar aos seus cidadãos um mínimo existencial, sem, de outro lado, perder o seu perfil capitalista, consagra a existência de um Estado que não garante apenas a concretização dos direitos sociais, mas, sobretudo, os instrumentos necessários para garantir que a sadia qualidade de vida e o bem-estar da população de fato se efetivem. Não obstante as tentativas empreendidas pelo Estado Social no intuito de corrigir as desigualdades concebidas do passado, inclusive equiparando os direitos sociais ao mesmo grau de importância dos direitos individuais, a verdade é que as prestações positivas estatais começam a se mostrar insuficientes para conferir o suporte adequado de todas as demandas pretendidas pela população, levando também à crise deste modelo de organização estatal.

Alia-se à insuficiência estatal em prover, mediante prestações positivas, o mínimo existencial necessário para uma vida com dignidade, também a incapacidade de contemplar o princípio da democracia de forma completa, o que acarreta na inobservância do princípio da dignidade da pessoa humana. Se, no Estado Liberal, o propósito do direito é o indivíduo isoladamente considerado, no Estado Social o direito, embora atribuído a toda coletividade, é construído a partir de imposições estatais.

Constata-se nitidamente, portanto, que sequer o Estado Social – que absorve a sociedade e, por consequência, impossibilita a implantação da democracia –, tampouco o Estado Liberal – que, ao defender o individualismo, afasta a sociedade do Estado –, conseguiram atingir o ideal democrático, de modo que foi necessário aperfeiçoar ainda mais as características básicas de organização do Estado para tentar corrigir as falhas e omissões das suas estruturas antecessoras e promover a dignidade da pessoa humana em toda a sua amplitude, bem como garantir o exercício completo da cidadania.