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2 O PAPEL DAS POLÍTICAS PÚBLICAS INTENTADAS NO CENÁRIO

2.1 CONTORNOS E CARACTERÍSTICAS DOS MODELOS DE ORGANIZAÇÃO DO

2.1.3 Estado Democrático de Direito

características estruturais do Estado, para melhor contemplar os interesses das sociedade, teve origem o Estado Democrático de Direito, como alternativa para tentar corrigir algumas falhas e omissões verificadas no Estado Liberal e no Estado de Bem- estar Social, de forma que ao longo deste processo de constante evolução necessário para a formação da identidade desta terceira forma de estruturação de Estado, alguns componentes passaram a integrar o conceito atual de Estado, ao passo que outros componentes foram eliminados.

Como visto, a igualdade defendida pelo Estado Liberal fundada puramente no campo formal e abstrato não detém sustentação material para que se realize na vida concreta, de modo que nunca possuiu capacidade (afinal, essa nem é a sua finalidade) para atacar de frente as desigualdades sociais que tatuam a sociedade e cuja eliminação simboliza umas das principais responsabilidades do Estado Democrático de Direito.

Na tentativa de corrigir esta situação, o Estado de Bem-estar Social desenvolve e passa a aplicar a tese da igualdade substancial que, por seu turno, não tem êxito suficiente ao garantir a justiça social e, tampouco, ao garantir a efetiva participação democrática do povo no processo político, de sorte que não atende efetivamente aos anseios democráticos, prejudicando a salvaguarda da dignidade humana e o exercício da cidadania.

Em face dessas lacunas verificas nos dois principais modelos que marcam a evolução histórica e os paradigmas nas formas de organização do Estado surge o Estado Democrático de Direito que, em que pese se submeta ao império da lei, é de uma lei que assegura a igualdade tanto no campo formal quanto no campo material, subsidiando ao Estado condições de equilibrar entre os setores públicos e os privados, e dos setores privados entre si.

Convergem-se, desta maneira, as diretrizes do Estado de Direito e do Estado Democrático, haja vista que instituem uma relação de interdependência. Essa constatação é trazida por Bobbio (1986, p. 20), nos seguintes termos:

Estado Liberal e estado democrático são interdependentes em dois modos: na direção que vai do liberalismo à democracia, no sentido de que são necessárias certas liberdades para o exercício correto do poder democrático e, na direção oposta que vai da democracia ao liberalismo, no sentido de que

é necessário o poder democrático para garantir a existência e a persistência das liberdades fundamentais. Em outras palavras: é pouco provável que um estado não liberal possa assegurar um correto funcionamento da democracia, e de outra parte é pouco provável que um estado não democrático seja capaz de garantir as liberdades fundamentais.

Dessa maneira tem origem um vetor interpretativo marcado pela dualidade: o direito fundamental à liberdade, apregoado pelo Estado Liberal, é indispensável para conduzir o correto exercício da democracia a qual, por sua vez, é condição ímpar de existência, continuidade e expansão desse direito, motivo pela qual tem origem o Estado Democrático de Direito.

Consoante ensina Bobbio (1986), esse modelo de organização do Estado deu origem aos direitos de terceira geração, que se posicionam no campo do respeito e fraternidade, abarcando direitos fundamentalmente coletivos, ou seja, os conhecidos direitos difusos e coletivos strictu sensu, razão pela qual o Estado passa a tutelar, para além dos direitos individuais e sociais, igualmente os direitos transindividuais, que englobam, dentre outros, o apreço ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, à paz, à moralidade administrativa, etc.

Convém ressaltar, ainda, que o Estado Democrático de Direito está fundamentado nas bases dos direitos fundamentais e da democracia, de modo que no seu contexto coexistem harmoniosamente os Princípios da Soberania Popular e da Legalidade, buscando, desta forma, estabelecer a plena incorporação do povo nos aparelhos de controle das decisões políticas, propiciando o exercício pleno da cidadania.

Proclamado no Brasil através do artigo 1º da Constituição Federal de 1988, valioso perceber que embora receba posição de destaque, o Estado Democrático de Direito não se restringe a garantir a participação do povo no processo político, buscando, em igual medida, preservar a integridade dos direitos essenciais da pessoa humana. Com base nessa afirmação é possível perceber que a figura estatal também deve garantir os direitos sociais e, indo além, deve atribuir ao cidadão a possibilidade de exigir esses direitos.

Tal situação é perceptível no cenário nacional quando o texto constitucional enuncia, em seu art. 6º, alguns direitos sociais que são oponíveis em face do Estado,

como a moradia, a educação, a saúde, o lazer, o trabalho, entre outros.

A despeito de possuir redação acalentadora, o texto constitucional não tem o condão de, por si só, empreender em uma mudança social capaz de erradicar a pobreza, por exemplo. Embora a Carta Cidadã seja de extrema importância neste processo, o fenômeno da mudança social está diretamente relacionado com os movimentos sociais e com a consciência política acerca da necessidade de mudança, manifestada mediante a atuação do Estado e da participação ativa da sociedade.

Percebe-se, portanto, que a relação entre a sociedade e Constituição, no modelo de Estado Democrático de Direito é marcada pela dialética, ou seja, são componentes que se retroalimentam e se influenciam, ao mesmo tempo em que moldam uma à outra.

Pelo exposto, é possível inferir a que organização vigente da República Federativa do Brasil alberga alguns dos fundamentos presentes nas três formas de estruturação de governo analisados até aqui: a) Liberal, quando respeita e proclama os direitos individuais, bem como quando defende a soberania da Constituição, que limita e regula o poder estatal; b) Social, quando reconhece e garante direitos sociais oponíveis contra o Estado, exigindo-lhe prestações positivas; e c) Democrático, quando busca garantir a efetiva participação polar nas decisões políticas.

É crível então, em síntese, reconhecer que à medida em que o Estado Liberal experimentou a fase declaratória de direitos, o Estado Social vivenciou a fase garantista dos direitos e, o Estado Democrático, por seu turno, no qual se insere a sociedade contemporânea, tem experimentado uma fase concretista de direitos, através da qual se pretende, verdadeiramente, construir uma sociedade plural, onde sejam respeitadas as diferenças de todas as ordens.

Essa fase atual é de extrema importância, pois não é suficiente declarar os direitos, como ocorre no liberalismo, nem mesmo apenas garanti-los, como ocorre no Estado Social, de fato, urge que os direitos sejam efetivamente concretizados, motivo pelo qual a sociedade moderna experimenta uma fase de verdadeiras transformações. Com a finalidade de materializar essas transformações, aplicando os preceitos constitucionais, não é dado ao Estado ou a própria sociedade olvidar dos postulados referentes ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, que representa

um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito Brasileiro e que, em condensado resumo, se traduz na seguinte equação: direitos individuais + direitos sociais + direitos fraternais = dignidade da pessoa humana.

Todavia, conforme já verificado no capítulo anterior, para que a Princípio da Dignidade da Pessoa Humana seja, de fato, materializado, é necessária a existência de leis não apenas programáticas, mas leis que possuam eficácia social, as quais apenas são atingíveis se obtidas através da participação da sociedade e dos operadores do direito na sua criação, a exemplo do que preconiza a Constituição Federal e o próprio Estatuto das Cidades, conforme será demonstrado a seguir.

2.2 Proposta de políticas públicas no Brasil a partir da Constituição Federal de