• Nenhum resultado encontrado

2.8. Marcos históricos da Educação e Formação de Adultos em Portugal

2.8.1. Do Estado Novo ao 25 de abril

No período correspondente à Primeira República (1910-1926), o associativismo popular foi alargado aos grupos cénicos, associações filantrópicas, entre outras, e atinge grande relevância, algumas com grande atividade no campo da Educação Popular e alfabetização. Com a instauração do regime ditatorial (1926-1974), as iniciativas de Educação Popular são interrompidas e impõem-se medidas restritivas quanto às iniciativas associativas. A ausência de democracia e o controlo da sociedade civil limitaram de forma radical as iniciativas cívicas e culturais. Como refere Fernandes:

Privados da democracia política, a perseguição, o isolamento e a luta pela simples sobrevivência vão afectar a vocação inicial das associações a sua dimensão cívico-cultural. Porque resistir é difícil, são sobrevalorizadas as actividades recreativas e desportivas em detrimento das atividades de educação cívica e da perspectiva emancipatória que animava a vida e o projeto das associações. Mais, mecanismos de controlo interno, ditados pelos órgãos de direcção, vão em nome da sobrevivência sufocar ou impedir manifestações minoritárias de resistência e inovação. É a instalação de um conservadorismo generalizado no seio das associações a par da alienação provocada na sociedade portuguesa pela cultura oficial (Fernandes, 2003, pp. 169-170).

De certa forma, o analfabetismo era visto como um aliado do sistema vigente, a política educativa manteve as populações rurais isoladas a todos os níveis. Das várias medidas tomadas após o golpe de estado de 1926 assinalam-se o encerramento das escolas que asseguravam a formação dos professores do ensino primário, a escolaridade obrigatória de seis anos implementada sob os auspícios da República que é reduzida para três anos e as escolas primárias com um número inferior a quarenta e cinco alunos são encerradas. Estas medidas educacionais tomadas durante o governo totalitário, agravaram o

64 isolamento cultural das populações rurais e mantiveram a população portuguesa no geral, num nível escolar bastante baixo (Melo e Benavente,1998).

De acordo com Melo e Benavente (1998), a Educação Popular regressa nos anos de 1950 com o Plano de Educação Popular dirigido à Educação de Adultos, através da Campanha de Educação de Adultos. Esta campanha tem início em 1952 e prolongou-se até 1956, sendo um dos objetivos adaptar o analfabeto à vida moderna e defendê-lo de falsas ideias e perigosos mitos (Melo e Benavente, 1998, pp. 28-29).

Segundo Candeias (2001), com o desenvolvimento das indústrias surgem novos polos de atividade económica e política que atraem homens e mulheres em busca de um futuro mais promissor. Assim, ir para a cidade, Colégio, e para as Américas, eis o que cada vez mais se encontra por detrás e como resultado das escolas e da alfabetização informal do antigo regime (Candeias, 2001, p. 30).

Esta Campanha de Educação de Adultos era dirigida por várias comissões que estavam divididas em várias seções. Esta iniciativa era apoiada sobretudo pela Igreja católica que manteve ações de Educação e Formação e contemplou áreas como, a educação moral e religiosa, a formação cívica, familiar e sanitária e a História de Portugal. No entanto, o resultado deste ensino de princípio endoutrinador teve pouca incidência na solução do problema relativo ao analfabetismo da população portuguesa. Estes resultados não são de admirar, visto serem objetivos de um governo pouco ou nada interessado na promoção cultural dos trabalhadores, pois através destas ações poder-se-á por em perigo a ordem fascista (Melo e Benavente,1998, pp. 28-29). Neste processo e de acordo com Rothes (2004),

o Estado centraliza em si as atividades neste domínio, claramente marcado por um paradigma escolar, visível não só nos programas ministrados, idênticos aos do ensino primário para crianças, mas também no recurso aos seus agentes de ensino, muitas vezes de forma coerciva e sem nenhum enquadramento formativo (Rothes, 2004, p.61).

A problemática da Educação de Adultos em Portugal só é reconhecida com a reforma Educativa de Veiga Simão, quando em 1971 é criada a Direção Geral de Educação Permanente. Esta política educativa teve a finalidade de promover a democracia,

65 desenvolvimento, liberdade e igualdade de oportunidades e é nitidamente influenciada pela proposta de Educação Permanente instituída pela UNESCO.

De acordo com o Decreto-Lei n.º 408/71 de 27 de Setembro, Art. 17.º - 1:

Incumbe à Direcção-Geral da Educação Permanente promover, coordenar e difundir, em colaboração com os demais serviços do Ministério e outras entidades públicas ou privadas, a educação extraescolar e as atividades de promoção cultural ou profissional, tendo nomeadamente em consideração a população adulta.

Compete ainda a esta Direcção-Geral uma acção supletiva do ensino básico, fomentar a criação de bibliotecas educativas e de casas de cultura que contribuam de modo especial para o progresso social e cultural do meio e promover a difusão generalizada de obras literárias e artísticas.

Para Rui Canário (2008), os ideais proclamados pelo movimento de Educação Permanente não surtiram os efeitos esperados. Para o autor, a não concretização dos ideais deve-se a três efeitos “perversos”, não deixando que o conceito de Educação Permanente atinja o pressuposto de princípio reorganizador. Em primeiro lugar, isto acontece devido à redução da Educação Permanente ao período pós escolar, como sinónimo de Educação de Adultos; em segundo lugar, devido a má interpretação do processo de formação permanente e a perpetuidade da escola, e finalmente devido à desvalorização dos saberes não adquiridos pelas vias formais, o que contraria o conceito de “aprender a ser” (Canário, 2008, pp.88 -89).

Na opinião dos autores de Rothes (2004) e Canário (2008), estas iniciativas, além de tardias, reforçam a ideia da educação permanente com uma lógica escolar, a qual podemos associar ao modelo recetivo alfabetizador de Sanz Fernández (2008). O modelo recetivo alfabetizador poderá ter sido uma das principais razões para o insucesso. De acordo com Sanz Fernández,

este modelo que por estar ligado à escola, confunde, a alfabetização como promoção académica com a promoção social. (…) segundo este modelo tem estado focada em facilitar a possibilidade de ser educado mais que a possibilidade de aprender (Sanz Fernández, 2008, p. 81).

66 O contexto das iniciativas descritas anteriormente demonstrou ser pouco aliciante, e os resultados obtidos foram pouco significativos.