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Capítulo I – Realidade Portuguesa da Descentralização da Administração Educativa

1. Resenha Histórica

1.5 Estado Novo

Encontrando-se numa situação de instabilidade a vários níveis o país deparava-se com a necessidade de uma mudança radical. Iniciando-se esta mudança a 28 de Maio de 1926 com o golpe militar, tendo como objetivo o derrubamento do regime republicano. Com esta procuravam uma mudança assente na imposição de ordem e de respeito (Carvalho, 1996, p.720). Apesar de ainda não terem um projeto político claro que expressasse os objetivos deste novo poder político, procurou- se recorrer a personalidades com capacidades para implementarem a mudança tão necessária. Um desses elementos era António Oliveira Salazar15, “um modesto professor de Economia e Finanças da Universidade de Coimbra” (Carvalho, 1996). Porém, Salazar acabou por regressar à vida académica, ainda em 1928.

A situação política vivenciada neste período começava a exigir cada vez mais uma mudança, a implementação de um novo modelo governativo que sucedesse à ditadura militar vivida. A direção, o caminho que as circunstâncias foram tomando acabaram por se afastar do ideal de regenerar a República democrata, assumindo os contornos de um regime autoritário que se prolongou por mais de 40 anos (Carvalho, 1996).

António Oliveira Salazar volta em 1930, passados dois anos, a aceitar um novo convite, para uma vez mais, ocupar a pasta das finanças16. Iniciou-se assim, a partir de 1933 com esta tomada de posse, um novo regime designado de Estado Novo, que por sua vez seguirá uma trajetória que perduará até abril de 1974 (Carvalho, 1996).

O plano salazarista não se cingia apenas à situação financeira e económica do país, a escola portuguesa era também um aspeto que pretendia trabalhar. Este plano, a nível da instrução pública passaria pela alteração dos comportamentos, adequando-os aos da doutrina social, ou seja, através da crença ou pela própria adaptação submissa ao regime. Para obedecer a esta proposta, a instrução pública sofreu diversas alterações, desde a imposição do livro único por classe, da escola e seleção dos professores primários, à imposição de um modelo único, na alteração estrutural do ensino primário, até à extinção da escolaridade complementar, entre outas (Carvalho, 1996 & Nóvoa, 2005). No entanto tal como realça Nóvoa (2005, p.73)

15 Para Salazar a situação em que o país se encontrava era gravíssima, nessa medida tornava-se fundamental começar-se a trabalhar

e a implementar medidas para combatermos esses problemas. No entanto, as instabilidades governativas impediam um trabalho sem “condescendências nem hesitações”, como ele próprio o era, o que o fez afastar do seu cargo numa fase inicial (Carvalho, 1996).

16 Impedindo o que se tinha sucedido anteriormente, Salazar propõe um conjunto de exigências para aceitar o cargo de Ministro. Devido

à urgência de implementação de medidas, o governo acaba por aceita-las levando a uma submissão de todos os ministérios ao ministro das Finanças (Carvalho, 1996).

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«As preocupações com a formação moral e cívica dos alunos atravessam todo o currículo, prolongando-se numa vertente curricular autónoma (Educação Moral e Cívica, Organização Política e Administrativa da Nação, Religião e Moral) e, sobretudo, nas actividades da Mocidade Portuguesa. A força do Estado Novo reside na capacidade para se apropriar de “valores atemporais” que, uma vez reintegrados no ideário nacionalista, traduzem uma efectiva “invenção da tradição”»

Mesmo antes de assumir o poder, Salazar já tinha implementado uma reforma que alterava a estrutura da instrução pública que até então se tinha tentado construir. Nesta nova fase, a escola passaria a estar assente nas ideologias da “exaltação nacionalista”. Prova desta é a publicação, a 30 de Março de 1933, de um diploma onde

“são reorganizados os serviços de direcção e administração, orientação pedagógica e aperfeiçoamento do ensino, e inspecção e serviços disciplinares dependentes da Direção- Geral do Ensino Primário” (Carvalho, 1996, p. 735).

“Nas classes sociais mais privilegiadas vive-se uma realidade bem diferente”, isto é, as classes mais altas optam por uma instrução/educação domiciliária ou “por uma escolha criteriosa de colégios privados, protegendo os seus “herdeiros”” (Nóvoa, 2005, p.73). Desta forma, e tendo em conta a opinião de Salazar era “mais urgente a constituição de vastas élites do que ensinar o povo a ler. É que os grandes problemas nacionais têm de ser resolvidos, não pelo povo, mas pelas élites enquadrando as massas” (Carvalho, 1996, p.728).

Em 1936 António Salazar vê-se forçado à escolha de um novo ministro para a instrução pública, um que concordasse com ele e apoiasse o regime. Posto isto, Salazar opta por escolher António Carneiro Pacheco, professor na faculdade de direito de Lisboa para ministro da Instrução pública. Tornando-se uma das figuras mais marcantes do Estado Novo, Carneiro Pacheco propõe poucos meses depois de assumir a função de ministro da instrução pública, uma Remodelação do Ministério da Instrução Pública. Esta foi estruturada em 12 bases determinando em primeiro lugar a alteração do Ministro da Instrução Pública para Ministério da Educação Nacional ; em segundo institui uma Junta Nacional de Educação “destinado ao ‘estudo de todos os problemas que interessam à formação de carácter, ao ensino e à cultura’”; em quinto torna-se expresso o uso de um “único compêndio para cada ano ou classe”; em decimo primeiro “será dada à mocidade portuguesa uma

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organização nacional e pré-militar que estimule o desenvolvimento integral da sua capacidade física, a formação de carácter e a devoção à Prática” e ainda no decimo terceiro a imposição de um “crucifixo, como símbolo da educação cristã determinada pela Constituição” (Carvalho, 1996, p.754– 756).

Na perspetiva de Nóvoa (1996) este novo plano da política educativa era assente em três grandes perspetivas: uma compartimentação do ensino, realçada na separação dos sexos das classes sociais, bem como nas medidas opostas aos princípios defendidos pela proposta de escola única, ou os da coeducação; a defesa de uma política de centralismo administrativo do sistema educacional, na medida em que reforçam os mecanismos de inspeção e controlo do profissionalismo dos professores; e estruturação de um realismo pragmático, que por sua vez, procuraria adaptar a oferta institucional à procura social da educação, acabando por existir um grande investimento nas aprendizagens escolares.

De acordo com Fernandes (1992) é partindo desta “normatização do sistema de ensino” que o Estado reforça a seu objetivo de centralização do sistema de ensino face ao controlo social, desenvolvendo assim uma “educação para a passividade” (Formosinho, 1987). Nesta medida, esta nova perspetiva da educação assentava numa conformidade entre o modelo social existente com a lei estabelecida (Formosinho, 1987).

Quase 20 anos mais tarde, quando Pires de Lima assume a função de Ministro da Educação Nacional em 1952 emerge de novo uma iniciativa de extinção do analfabetismo. Intitulada de Plano de Educação Popular era composta por diversos processos, abrangendo desde as crianças aos adultos. Pela primeira vez, deparamo-nos com iniciativas de instrução além da tenra idade, como a “Campanha Nacional de Educação de Adultos”, e as propostas de Cursos de Educação de Adultos. A obrigatoriedade do ensino primário elementar levou a um aumento de crianças entre os 7 e 12 anos a frequentar as escolas. Sendo assim, no decorrer dos anos em que Pires de Lima assumiu a pasta da educação verifica-se um “inegável progresso conseguido”, ou seja, uma análise positiva no combate ao analfabetismo (Carvalho, 1996).

Na década seguinte foram várias as personalidades que assumira a pasta da educação e aos poucos começamos a observar uma vez mais um maior investimento na educação. Neste processo a educação foi sofrendo uma evolução passando com o mandato de Francisco Leito Pinto (1955) onde a escolaridade obrigatória estendeu-se para quatro anos. Pela criação dos Estudos Gerais Universitários por Lopes Almeida (1961). E Galvão Teles (1962) com o aumento progressivo da

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escolaridade obrigatória para 6 anos, levando a uma reestruturação do ensino, criando dois ciclos: o elementar composto pelos 4 anos, e o complementar por mais dois (Carvalho, 1996).

Em Agosto de 1968 António Oliveira Salazar, com cerca de 80 anos, foi vítima de um acidente que o forçou o seu afastamento do governo. Acabando por morrer em 1970, foi sucedido por Marcelo Caetano, figura de destaque da política nacional e professor catedrático da Faculdade de Direito de Lisboa. Ainda no mês de setembro José Hermano Saraiva assume a pasta da educação substituindo Galvão Teles. No entanto, ocupou o cargo por um período curto, devido à continuação da situação de degradação em que se encontrava o ensino. No decorrer do seu mandato enquanto ministro da educação as taxas de analfabetismo continuavam sem grande evolução, assim como o índice de frequência escolar e o aproveitamento escolar, além do que o número de professores era escasso para as necessidades (Carvalho, 1996).

Deparando-se com esta situação, Marcelo Caetano convida Veiga Simão, em 1970, com o intuito de alterar e reformular a situação em que a educação se encontrava. A introdução de um novo lema assente na participação leva Veiga Simões a utilizar regularmente expressões como a democratização do ensino. Na perspetiva de Formosinho e Machado (1998) a democratização do ensino procurava uma política de alargamento da escolaridade obrigatória, assim como a expansão dos estabelecimentos de ensino, de forma a permitir que todos os cidadãos tivessem acesso à escolarização sem ter a necessidade de se mudarem para os polos metropolitanos. Além destas iniciativas procurava que esta nova escola estivesse baseada numa “concepção liberal e meritocrática de igualdade de oportunidades que deveria permitir o acesso dos melhores a níveis mais elevados de escolarização” (Formosinho e Machado, 1998, p.101). Seguindo estes ideias de modernização e renovação do ensino o ministro da educação apresenta em 1971 dois projetos de reforma denominados de “Projeto de Sistema Escolar e Linhas Gerais da Reforma do Ensino Superior” (Carvalho, 1996, p.808). Porém, só em julho de 1973 é que sucedeu à aprovação das bases da reforma do sistema educativo. Estas assentavam na

“institucionalização da educação pré-escolar, extensão da escolaridade obrigatória de seis para oito anos, polivalência do ensino secundário e acréscimo de um ano na sua duração, expansão e diversificação do ensino superior, criação dos cursos de pós-graduação, novo enquadramento da formação profissional, estruturação da educação permanente” (Carvalho, 1996, p. 809).

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Porém, os constrangimentos que advêm do regime político, não permitiam grandes espaços para a participação condicionando assim a implementação da reforma. Neste sentido historicamente, o papel do Estado no campo educativo foi frágil, limitado, bem como a ação das famílias, das igrejas, das autoridades locais, das empresas, entre outras (Nóvoa, 2005).