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3 O PAPEL PARENTAL NO DESENVOLVIMENTO DA AUTONOMIA: UM

3.1 ESTILOS E PRÁTICAS EDUCATIVAS PARENTAIS

Discutir o papel parental no desenvolvimento da autonomia de filhos adolescentes, na contemporaneidade, nos convida a adentrar no universo da literatura especializada com relação aos estilos e práticas educativas adotadas por pais e mães. Isto porque, o desenvolvimento da autonomia dos indivíduos está intimamente articulado ao contexto familiar, por meio do modelo de educação ofertado pelos pais.

A respeito dos estilos e práticas educativas parentais15, a literatura científica

aponta como sendo duas dimensões distintas, entretanto, intrinsecamente

relacionadas na complexidade da interação pais e filhos. Conforme Gomide et al (2005

apud MACARINI e cols., 2010), ao conjunto de práticas educativas utilizadas pelos

pais na interação com os filhos dá-se o nome de estilo parental, ou seja, as práticas educativas, combinadas de diferentes formas, resultam em estilos parentais diversos.

Abordando a questão com uma maior amplitude, Hoffman (1975) apresenta a seguinte distinção acerca destas duas dimensões: as práticas educativas referem-se a situações cotidianas específicas de interação pais-filhos que revelam as estratégias utilizadas pelos pais na educação de seus filhos. Normalmente ocorrem frente às interações que se destinam a socialização, chamadas pelo autor, de encontro disciplinar. São exemplos dessas práticas: o uso de afeto, explicações, regras, punições ou de recompensas para o monitoramento do comportamento dos filhos.

Já os estilos parentais, de acordo com o autor supracitado, envolvem dimensões da cultura familiar, como a dinâmica da comunicação familiar, do apoio emocional e de controle presentes nas interações pais e filhos. Ou seja, relacionam-se ao padrão global de características da interação dos pais com os filhos em diversas situações. Estas envolvem também crenças, valores e aspectos relativos à hierarquia das funções e papéis familiares, expressos no exercício da disciplina, autoridade e tomada de decisões (HOFFMAN, 1975).

15 Há diferentes termos conceituais para caracterizar e explicar o conjunto complexo de

comportamentos exercidos por mães e pais em relação aos filhos: práticas parentais, práticas educativas, práticas de cuidados, cuidados parentais (MACARANI, et al, 2010).

Nesta área de interesse, Baumrind (1966) é apontada como a precursora dos estudos sobre estilos parentais, na década de 60, ao integrar aspectos comportamentais e afetivos envolvidos na educação dos filhos. O grande diferencial do trabalho desta autora, e que muito tem auxiliado na compreensão dessa temática, foi à formulação de três modelos de estilos parentais:

1. O autoritário: pais rígidos e autocráticos, com maior controle, regras impostas

e pouco apoio aos filhos, caracterizado por ordens impositivas, estabelecimento de regras que não podem ser discutidas e castigos severos. Normalmente ocorre uma atitude de submissão por parte dos filhos que acatam momentaneamente as regras, ainda que discordem delas.

2. O autoritativo ou autorizante: alto envolvimento, controle e apoio parental,

com limites e regras claras, comunicação aberta entre filhos e pais. Estes incentivam a autonomia, independência e a individualidade dos filhos. Do mesmo modo, se mantêm disponíveis ao diálogo, trocas e discussões sobre os modelos e regras estabelecidas, estimulando condutas maduras, a análise das consequências de seus atos, promovendo valores positivos.

3. O permissivo: pais que tendem a identificar e satisfazer as necessidades e

exigências dos seus filhos, podendo ocorrer altos níveis de comunicação e afeto, mas com pouco controle, exigência e supervisão.

Muitas pesquisas, até a década de 1980, permaneceram nesta formulação em relação aos estilos apresentados, sem outros estudos sistemáticos de possíveis dimensões subjacentes aos estilos parentais.

A partir deste período, Maccoby; Martin (1983) redefiniram a tipologia apresentada por Baumrind (1966) e organizaram uma nova classificação pautada nas dimensões de exigência e responsividade, e desmembraram o estilo permissivo em negligente e indulgente. Para esses autores, exigência é a atitude dos pais de impor limites e regras. A responsividade refere-se às atitudes de compreensão em relação aos filhos e engloba características como reciprocidade, comunicação, afetividade, apoio, concordância parental, reconhecimento e respeito à individualidade do filho.

A despeito desta nova categorização das famílias indulgentes e negligentes, Reichert (2006) aponta que as primeiras apresentam atitudes parentais mais tolerantes sem fazerem muitas demandas por comportamentos maduros, permitindo

que os filhos se autorregulem. São famílias que apresentam um alto envolvimento afetivo, mas com baixo monitoramento e controle parental. Neste sentido, fomentam a autonomia e a independência (autodireção) e inibem valores pró-sociais (de solidariedade e justiça). Já nas famílias negligentes, de acordo com a autora, os pais são voltados para os seus próprios problemas e objetivos, não se responsabilizam, monitoram ou oferecerem suporte aos filhos, não sendo consideradas nem exigentes e nem responsivas.

Em vista disso, pais autoritários apresentam alto nível de exigência e baixa responsividade; os pais permissivos apresentam baixa exigência e alta responsividade. Por sua vez, os pais autoritativos demonstram alta exigência e alta responsividade; e os negligentes, baixa exigência e baixa responsividade (BAUMRIND, 1966; MACCOBY; MARTIN, 1983).

Desta maneira, com o intuito de ampliar a compreensão sobre o alcance das práticas educativas parentais, de modo geral, identificamos quatros estilos parentais mais utilizados na literatura: autoritativo, autoritário, negligente e indulgente.

Vale dizer que qualquer prática educacional depende de acordos realizados com outras pessoas e envolvem alguns elementos. Dentre eles, Baumrind (1966) relaciona o calor humano, a maturidade, o envolvimento, a demanda dos filhos e supervisão dos pais como fatores que influenciam na maneira do filho responder às influências parentais.

Cabe, ainda, mencionar, os dois tipos de estratégias apontadas por Hoffman (1975) que os pais utilizam para interagirem, conduzirem e/ou monitorarem o comportamento dos filhos: as estratégias coercitivas ou as indutivas.

As estratégias coercitivas compõem o uso de intervenções externas com aplicação direta da força, incluindo punição física, privação de privilégios e afeto ou a utilização de ameaças destas atitudes. Fazem com que o filho controle seus comportamentos em função das reações punitivas dos pais e provocam emoções intensas, tais como medo, raiva e ansiedade, reduzindo a possibilidade de compreensão acerca da situação e a necessidade de modificação do seu comportamento (HOFFMAN, 1975; CASSONI, 2013). Com isso, dificulta a internalização das regras sociais e padrões morais necessários para o ajustamento psicológico. Tendem a acarretar repercussões negativas ao desenvolvimento psicossocial de crianças e adolescentes em diversas áreas (ajustamento social, psicopatologia, desempenho escolar, dentre outras). (HOFFMAN, 1975; CASSONI, 2013).

Com relação às estratégias indutivas, diferentemente, os pais buscam atingir o objetivo disciplinar indicando para os filhos as consequências do seu comportamento para as outras pessoas, chamando a sua atenção para os aspectos lógicos da situação. Proporcionam a compreensão das implicações de suas ações e, portanto, dos motivos que justificam a necessidade de mudança comportamental. Por conseguinte, tendem a favorecer o desenvolvimento da autonomia e a internalização de regras e padrões morais, na medida em que os filhos utilizam dessas informações para controlar seu próprio comportamento (HOFFMAN, 1975; CASSONI, 2013).