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1 A SOLIDARIEDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO

V, e a invasão de Constantinopla pelos turcos otomanos, no século X segundo Cáceres (1996).

3 EM BUSCA DE CAMINHOS COLABORATIVOS

3.4 Estratégias de Análise

Para efetivar a nossa análise selecionamos determinados aspectos que integram o nosso objeto de estudo, construindo totalidades relativamente autônomas mas que permitam a sua compreensão. Nesse processo, procuramos traçar o percurso da nossa formação tentando captá-lo em sua singuralidade, conectando-o com a universalidade na qual se integra.

Ibiapina (2004), interpretando Orlandi, afirma que é necessário um artefato teórico para se efetivar qualquer leitura, como também para se construir os dispositivos de análise. Nesse sentido, é que buscamos para a análise do processo de elaboração conceitual apoio teórico nos estudos de Vigotski (2005), Guetmanova (1989), Koppnin (1978) e Ferreira (1995).

O conceito para Guetmanova (1989) é a forma de pensamento abstrato que reflete os indícios (propriedades e relações) substanciais e distintivos de um objeto ou classe de objetos homogêneos, a partir da utilização dos métodos lógicos essenciais como a análise, a síntese e a comparação, até atingir graus mais evoluídos de abstração e generalização. Segundo Koppnin (1978, p. 191), “[...] o conceito é a confluência, a síntese das mais diversas idéias, o resultado de um longo processo de conhecimento.” Ele expressa características e relações que o distingue de outros e, não sendo estático, deve representar na sua síntese, o estado atual do seu processo de conhecimento se constituindo num degrau do sucessivo movimento do pensamento. É, portanto, historicizado.

A formação de conceitos para Vigotski (2005, p. 72) “[...] é o resultado de uma atividade complexa, em que todas as funções intelectuais básicas tomam parte”. No entanto adverte o autor, é o uso do signo, ou da palavra que propicia as operações necessárias para a sua elaboração em direção à solução de problemas que nos defrontamos.

Sua importância resulta do papel fundamental que desempenha no processo ensino-aprendizagem, uma vez que são os conceitos um dos componentes mediadores desse processo e responsáveis pela elevação do nível de ensino.

Vygotski (2005), a partir de estudos e pesquisas acerca da formação e desenvolvimento de conceitos propõe uma ampla classificação desse processo distinguindo duas modalidades – conceitos espontâneos e conceitos científicos.

Para esse autor conceitos espontâneas são formulações não conscientes e assistemáticas do pensamento da criança, expressando uma atitude não mediada em relação ao objeto, resultante do próprio esforço mental da criança de forma irrefletida e espontânea. Já os conceitos científicos são formulações mediadas, se configurando numa sistematização mental a qual se submete a consciência e ao controle deliberado. Podemos afirmar então, baseado em Vigotski (2005, p. 144) “[...] que a ausência de um sistema é a diferença principal que distingue os conceitos espontâneos dos conceitos científicos.”

Segundo as idéias desse autor existe uma interação entre esses dois tipos de conceito durante o desenvolvimento intelectual da criança. Inicialmente os conceitos científicos e espontâneos da criança se desenvolvem em direções contrarias, mas a evolução destes permitem que se encontrem. Estes se relacionam e se influenciam constantemente pois, fazem parte de um único processo – desenvolvimento da formação de conceitos – que é afetado por condições externas e internas e tem no aprendizado a força que direciona e determina o seu desenvolvimento. Traduz assim, uma relação entre o aprendizado escolar e o desenvolvimento mental da criança.

A complexidade dessas operações indica que para se evoluir dos denominados conceitos espontâneos – que são os aprendidos na experiência cotidiana – para os conceitos científicos que se originam de um conhecimento sistematizado, é necessário um estímulo intelectual para gerar esse processo. “O mecanismo que resulta na formação de conceitos se situa nas relações intrínsecas entre as situações sócias vivenciadas pelo sujeito e a dinâmica do seu desenvolvimento, mediado pela palavra utilizada especificamente para esse fim, o que lhe configura um novo significado”. (FERREIRA, 1995, p 164). A palavra se torna, nesse sentido, instrumento do pensamento na elaboração de conceitos em níveis mais evoluídos de abstrações e generalizações.

Nessa perspectiva, a aprendizagem desempenha um papel singular. Como evidencia Vigotski (2005), existe uma estreita relação entre a aprendizagem e a formação de conceitos científicos. Mesmo considerando que conceitos não são absorvidos prontos, a sua aquisição tem no ensino e na aprendizagem um papel fundamental. Assim a escola, no seu processo interativo, permite a evolução da percepção interior dos alunos, ampliando, sobremaneira, novas formas de ver os objetos, ao mesmo tempo em que amplia a possibilidade de conscientização dos próprios atos mentais. Esse processo contribui, portanto, para a evolução dos conceitos em níveis maiores de abstração e generalização na direção do conhecimento científico.

Para Ferreira (1995, p. 165),

[...] a formação dos conceitos é entendida como apropriação pelo sujeito, do conhecimento acumulado pela humanidade, ao longo de sua história social, por um processo de mediação simbólica, interativa (com signos e outros sujeitos). Esse processo ocorre pela internalização do conhecimento via aprendizagem.

Partindo dessa premissa – da formação do conceito como apropriação do conhecimento produzido pela humanidade – ressaltamos o papel fundamental dos professores na apropriação desse referencial para subsidiar suas ações pedagógicas, rompendo dessa maneira com uma perspectiva de educação baseada na repetição e memorização.

E se os conceitos são formulações históricas, por conseguinte, dinâmicas, e a condição precípua da docência é o ato de ensinar – que envolve a relação dialética aprende- ensina-aprende – podemos concluir que a formação de conceitos deve fazer parte do compromisso acadêmico dos professores, autoformando-se e ensinando em bases conceituais científicas que exigem a constante reelaboração conceitual.

Para a análise do processo de elaboração conceitual, nos fundamentando nesses autores, construímos o quadro a seguir, caracterizando as modalidades e os significados que podem ser atribuídos a um fenômeno, e que são nossos indicadores nessa análise.

INDICADORES CARACTERÍSTICAS

Descrição

– Enumera os traços exteriores do objeto e distingue-o de outros semelhantes.

– Representa a imagem sensitiva e concreta do objeto que se pode compor.

– Inclui indícios substanciais e insubsistentes do objeto. Caracterização – Enumera as propriedades internas e substanciais do objeto. – Apresenta qualidades, critérios morais, sociais e políticos,

Quadro 2 – Indicadores para identificar o processo de elaboração conceitual a partir de Guetmanova (1989) complementado por Koppnin (1987) e Vigotski (2005).

A reflexão da dimensão pedagógica das aulas-laboratório se fundamenta nos saberes ver, esperar, dialogar, amar e abraçar, que segundo Mariotti (2000), constitui, como temos afirmado continuamente, o pensamento complexo e que poderá criar as condições, para a estruturação do aprender a ser, conviver, conhecer e fazer solidário.

O Saber Ver

O saber ver indica uma primeira abertura em direção ao outro. Para Mariotti (2000) é, antes de mais nada, saber ver os nossos semelhantes, ressaltando, porém, que a unidimensianalização do olhar pela cultura dominante se constitui um dos fenômenos mais alienantes do nosso cotidiano. É a produção imagética padronizada fornecendo um mínimo de palavras escritas, o que conduz a uma diminuição do contato com a razão, resultando a restrição das pessoas ao imaginário. Portanto, é uma das formas de dificultar a formação de consensos derivados da experiência e perpetuar a unidimensinalização.

Como saída para um ver pleno, o autor aponta a necessidade da palavra, das imagens, dos sons e das sensações táteis e olfativas caminharem juntas como meio de percepção e integração de nossa experiência no mundo, representando a proposta do pensamento complexo que é a retomada da plurisensorialidade, uma das formas de ver e

traços de caráter e temperamentos quando referentes ao ser. – Assinala aspectos subjetivos substanciais, envolvendo

valores, funções e propriedades do objeto.

Definição

– Estabelece o conteúdo ou significado do termo.

– Revela o conteúdo ou significado do termo de um conceito. – Estabelece os indícios substanciais de um objeto ou classe

de objetos generalizados.

– Assinala de forma clara a essência dos objetos.

Conceituação

– Responde a pergunta que objeto é esse e em que consiste a sua essência.

– Reflete o universal, o essencial e o necessário do objeto. – Abstrai os indícios substanciais (propriedades e relações) do

objeto.

– Apresenta os indícios substanciais e distintivos de um objeto ou classe de objetos homogêneos.

– Reflete as propriedades essenciais e seus aspectos, laços, relações, a lei do movimento, da evolução do objeto.

– Utiliza para a sua formulação os métodos lógicos essenciais: análise, síntese, comparação, abstração e generalização. – Usa as palavras como meio para centrar a atenção, abstrair

entender o mundo. Assim se expressa Mariotti (2000, p. 299): “[...] saber ver é saber ver o outro, único ponto de partida realmente humano para começar a enxergar o mundo.” E nós acrescentamos: e a nós mesmos.

Realmente, tudo começa pelo olhar de acordo com a emocionalidade que o expressa, aflorando sentimentos variados de aceitação ou rejeição, alegria ou tristeza, adesão ou indiferença. É a sua leitura prescritiva desvelando as aparências que pode sedimentar uma sensibilidade amorosa para sair do seu eu interior e abrir-se ao mundo dos outros. Isso exige um olhar profundo para além da intenção virtualizante das imagens, entrando nas raízes da sensibilidade solidária: do sair de si para o ver a outrem. E essa experiência é corporalizada, processando saberes do campo corporal-cinestésico nessa vivência de vida e, paralelamente, ampliando os saberes pessoais que edificam o “seu eu” individual, abrindo-se para as dinâmicas das relações interpessoais. São esses saberes, portanto, que dão suporte à construção das inteligências “pessoais” e “corporal-cinestésica” para um viver sabiamente de um ser plenamente realizado.

Portanto, ver é enxergar os outros com suas singularidades, vendo suas semelhanças e diferenças, é vencer a sensação desse vazio, a barreira de um muro invisível entre uma pessoa e outra, o eu e o mundo. É fazer uma viagem introspectiva ao seu eu interior e retornar daí com a sabedoria que o autoconhecimento traz para o conviver mais harmônico.

O Saber Esperar

O esperar nas atuais condições existenciais é um dos atributos humanos que mais recorre a outras capacidades do ser para vencer a angústia e o atropelo dessa condição, instaurando-se a temporalidade como essencial condição humana, especialmente na nossa cultura que privilegiou a dimensão quantitativa do tempo, herança da sua concepção linear.

E essa linearidade, para Mariotti (2000, p. 301), traz pressões, cobranças e advertências, instalando em nós o pavor a este marco, o tempo, que não volta, levando-nos à desvalorização do cotidiano, dificultando muito a prática da tolerância, da serenidade e da compaixão. Também nos estimulou a competitividade: o mais, o melhor, o menor tempo, trazendo status, lucro, posição, conduzindo-nos ao que o autor nomeou de “desaprendizado da espera.”

O significado do tempo também não se esgota aí, no sentido quantitativo e objetivo, mas por critérios qualitativos, que é caracterizado, segundo Bacal (1988, p. 13), “[...]

pela intensidade de cada momento, pela densidade das emoções, pela gradação da afetividade de que esta carregada [...]”, importando a qualidade dos instantes vividos.

Compreendemos que mesmo que algumas esferas da nossa vida exijam um tempo linear, é necessário que encontremos o tempo circular como nas dinâmicas dos ciclos dos sistemas da Natureza: o dia, a noite, o sol, a lua, as estações do ano, as marés, a chuva, que nos ensinam que saber viver é saber esperar. Esse tão bem expresso pelo senso comum: quem espera sempre alcança.

Para Mariotti (2000, p. 303), o saber esperar traz à tona características essencialmente femininas, como um ser lunar que aguarda grandes ciclos no seu universo orgânico, e esse saber esperar é uma “biologia da espera.” É essa sabedoria do viver que nos capacita naturalmente para a sabedoria do conviver.

Para nós, dentre outras categorias do solidarizar-se, o esperar é uma que exige outras capacidades básicas da “corporeidade sábia.” Pode ser compreendida como a capacidade de se aquietar, de dar o tempo necessário para o reequilíbrio de uma situação ou a maturação de uma idéia ou ação em gestação. É não atropelar o processo criativo gestacional da vida que a Natureza nos mostra, como por exemplo, o desabrochar de uma flor, o casulo de uma lagarta que virará borboleta, o eclodir do ovo que aos poucos vai se tornando um pintinho e tantos outros exemplos que a Natureza nos mostra.

É não deixar que essa espera seja um vazio, ao contrário, seja espaço de edificação deste, seja realmente um espaço de construção para o devir. E toda e qualquer espera é corporalizada. É a corporeidade que com a sua energética propulsora saberá ir graduando as inquietações do ser nesse esperar; ora aquietando o ser em uma emocionalidade de relaxamento, ora a “corporeidade sábia” do esperar, resguardando-se para logo em seguida abrir-se para o mover-se com outra intensidade energética, como fluxo de vida em direção ao convívio humano.

O Saber Dialogar

Talvez tenha sido uma das capacidades humanas que mais tenha se perdido na sociedade atual. Apesar da comunicação ter se intensificado com as novas tecnologias virtuais predominando, o homem tem se afastado do diálogo oral ou escrito, afastando as possibilidades do convívio humano, negando as chances do frente a frente, do olhar no olhar, do dialogar, do tocar, enfim, restringindo as interações sensoriais que se plenificam na corporeidade cultivada.

Nossa dificuldade de conversar decorre, segundo Mariotti (2000), do tipo de alteridade que estamos culturalmente determinados, gerando cautela e desconfiança, não nos deixando à vontade para conversar abertamente sobre nossas intenções. Sempre estamos avaliando o outro pelas suas ações e não por suas intenções, limitando nossas percepções dos acontecimentos, pois somos inclinados a reagir a comportamentos e não a interagir com intenções e condutas.

Vivemos numa sociedade de aparências, de uso de máscaras e de papéis que assumimos em diferentes funções e espaços, sempre nos posicionando em função do que é socialmente esperado pela sociedade, não mostrando a nossa verdadeira essência com suas potencialidades para o construir ou destruir. Por isso mesmo, não compreendemos o erro que nos ensina o caminho do recomeçar com a crítica construtiva sobre as falhas ou acertos, enfim, não nos mostramos de corpo e alma, evitando o aprofundamento das relações sociais, negando o conversar, o dialogar, ou não sabendo usar a arte da conversação, que é a dialética.

Reaprender a conversar significa segundo Mariotti (2000), aprender de novo a utilizar nossos espaços de criação, fazendo perguntas que produzam alterações no questionamento, propondo questões mobilizadoras, mantendo uma expectativa respeitosa diante da resposta. Por isso, Mariotti (2000, p. 308) assegura que, “[...] saber questionar conduz ao saber ouvir.” Portanto, saber conversar é o preparar-se para receber o retorno, é desencadear um processo de co-educação, pois saber conversar é saber construir um universo cultural.

E é a linguagem, para Maturana (1998, p. 115), que promove modificações estruturais nos nossos comportamentos, sendo as interações, os encontros que geram as mudanças nos sistemas vivos e “[...] o que está envolvido no aprender é a transformação de nossa corporalidade, que segue um curso ou outro dependendo de nosso modo de viver.”

Portanto, o saber conversar sábio vai depender das possibilidades de aprendizagem que os campos educacionais (escola, lazer, comunidade e família) propiciem em encontros criativos de trocas, diálogos corporalizados, pois essa (a corporeidade) é a nossa condição existencial.

O Saber Amar

Talvez um dos sentimentos mais sublimes e ao mesmo tempo mais desvirtuados da sua verdadeira essência, seja “o amar aos outros como a si mesmo.” As contingências do modelo societal que vivemos, dando ênfase as relações materiais, obstaculizam a introspecção

e a socialidade que são a construção do conhecer a si para aprender a convivialidade com o outro, o campo, portanto, das emoções.

São as emoções que constituem as condutas que resultam em interações recorrentes, segundo Maturana (1998). Se essa emoção não se dá, não há interações recorrentes, mas somente encontros casuais e separações. Para esse autor, duas emoções tornam a recorrência possível: a rejeição e o amor. A rejeição constitui o espaço de condutas que negam o outro como legítimo outro na convivência; o amor constitui o espaço de condutas que aceitam o outro como um legítimo outro na convivência. No entanto, não são opostos, porque a ausência de um não leva ao outro, sendo seus opostos a indiferença. E a indiferença é o sentimento que destrói todas as possibilidades de edificação humana.

O amor para Maturana (2001) é eminentemente biológico, um fenômeno da natureza, pois já nascemos com a capacidade de amar, sendo as relações culturais vividas que nos leva ao desamor. A vida amorosa é, portanto, a forma de exercemos essa emoção, o que o autor denomina de biologia do amor. Viver a biologia do amor, para Mariotti (2000), é viver inteligentemente, fazendo dessa inteligência brotar o amor, estendendo a mão, preparando-se para o abraçar.

E o amar, na sua energética vivencial, é a síntese do fato de cada “eu” estar inserido no “nós”, que é a corporeidade transcendente, do vencer o individual na construção da convivialidade humana, no fluxo e refluxo da vida, construindo e dando sentido ao processo civilizatório da humanização do homem.

O Saber Abraçar

Saber abraçar é uma conseqüência do saber amar, que envolve todos os outros saberes solidários, porque quem ama é capaz de ver, diferenciar o outro passando a enxergá- lo, não sendo indiferente ao seu existir. Quem ama aprende mais que falar, abrindo-se ao diálogo como fonte de dar e receber, construindo juntos novas sínteses de conhecimento para dar sentido e vida ao seu amor e ao seu amar. E quem ama cria e conserva a vida, dando-se ao outro, vivendo sabiamente, estendendo a mão, preparando-se para o abraço que é a grande síntese do tornar-se solidário.

Para abraçar, segundo Mariotti (2000), primeiro é preciso ver a si mesmo para não projetar nele o que vejo em mim, ou seja, trabalhar o meu ego, ultrapassando um modo de viver não apenas mecânico. Trata-se, portanto, de uma dimensão participante, redimensionando nossas possibilidades e limitações pelo autoconhecimento e

autocrescimento, construindo uma totalidade. E é essa compreensão e sentimento de inteireza que faz o ser poder e precisar partilhar com o outro, isto é, com o mundo, essa comunhão.

Nesse contexto, a corporeidade passa a ser vivida como uma intercorporeidade, que para Mariotti (2000, p. 316) significa nos darmos conta que “[...] o corpo é o lugar onde se fundem o morador e a morada, a teoria e a prática, o abstrato e o concreto. Da intercorporeidade emerge a espiritualidade, que é a atitude de respeito pelo mundo, começando pela relação com o outro.”

Abraçar exige, portanto, uma primeira viagem ao eu interior, viajando nas asas da transcendência, entendida como superação das amarras do ego em direção à construção dos outros “eus” que se fazem presente nos outros, na acolhida da aceitação desse outro, tornando-nos então um ser neste mundo. Estendendo a mão com sabedoria, que é o início do abraço e o desencadear do longo e sábio caminho da solidariedade.

Com esse caminho, entre outros possíveis, que envolve uma preocupação e um compromisso com a construção de saberes solidários na Educação Física, surge como resultante uma corporeidade que vai se humanizando na busca de uma corporeidade plena. Com base nessa compreensão construímos o corpus teórico que subsidiou o processo reflexivo ação-reflexão-ação, pois essa pressupõe mudanças através da colaboração e do controle reflexivo que acontece no contexto real em que a prática é constantemente atualizada, segundo Desgagné (1998), através do diálogo.

Requer, portanto, que o pesquisador se coloque na posição de ator, percebendo seu mundo, sua linguagem, seus sonhos e devaneios, seus conflitos e suas esperanças para poder identificar e compreender suas ações, e no diálogo reflexivo, busque soluções possíveis para a problemática da prática docente, conseqüentemente, produza conhecimentos para a reconstrução dessa prática em uma perspectiva emancipatória, no sentido da educação solidária corporalizada.

Para apreender o nível de colaboração e reflexão por nós alcançados tomamos como parâmetro o nosso envolvimento coletivo na busca da realização das ações reflexivas. Para isso, consideramos os resultados obtidos nos nossos encontros como grupo, referendando-nos na contribuição de cada um de nós no desencadear do processo reflexivo.

Nessa direção, utilizamos os indicadores propostos por Ibiapina (2004, p. 95), pois segundo a autora “[...] representam o nível que os professores conseguem alcançar quando descrevem, informam e confrontam [...].” Esses indicadores se encontram expressos no quadro a seguir.

Ações Ações Colaborativas dos professores

Descrição Estímulo a descrição de regularidades, fatos relevantes do contexto da aula.

Informação Estímulo a análise da descrição, identificando a relação entre as práticas e as teorias.

Confronto Estímulo a identificação de pressupostos, valores, crenças e de onde eles procedem.

Reconstrução Estímulo a reelaboração conceptual e a introdução de mudanças na prática docente.

Quadro 3 – Ações de reflexão. Fonte: Ibiapina, 2004, p. 95.

Por conseguinte, a análise a que estamos nos propondo busca desvelar as relações dinâmicas implícitas nos processos vivenciais na tentativa não só de descrevê-las, mas, também, explicá-las. Considerando o caráter histórico do processo de elaboração conceitual apontado por Koppnin (1978), a reconstrução da evolução do conceito de solidariedade se constitui também, parâmetro para análise do processo de reelaboração desse conceito por nós vivenciado. Assim iniciaremos, nos situando no contexto em que a experiência foi vivenciada.