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O texto da exortação é muito longo, com abordagem de uma miríade de assuntos, ainda que focada na temática da nova evangelização. As análises da Evangelii Gaudium estão em andamento e, certamente, levarão um bom tempo para se conseguir uma visão mais ampla e menos conjuntural sobre seu significado. O texto compreende cinco capítulos e uma introdução. Na introdução, o Papa denuncia a tendência de isolamento que a sociedade atual proporciona e convida os católicos a uma renovada experiência de encontro com Cristo. Cita

203 VIDAL, J. M.; BASTANTE, J. As mudanças (presentes e futuras) da primavera de Francisco. In: SILVA, J.

M. (Org.). Papa Francisco: perspectivas e expectativas de um papado. Petrópolis: Vozes, 2014.

204 No dia 5 de julho de 2013, foi publicada a encíclica Lumen Fidei sobre a fé. O próprio Papa Francisco disse que a

encíclica é fruto do trabalho “a quatro mãos”, pois o documento inicialmente foi trabalhado por Bento XVI durante vários meses antes de renunciar. Alegou o atual pontífice que tem a intenção de reconhecer no papel, a contribuição de seu predecessor. (TORNIELLI, A. Vatican Insider, 13 jun. 2013). “Sairá uma encíclica a quatro mãos”, afirma o Papa Francisco. Disponível em: <http://www.ihu.unisinos.br/noticias/520989-saira-uma- enciclica-a-quatro-maos-afirma-o-papa-francisco>. Acesso em: 30 jul. 2014).

205 SANSON, C.; LANGER, A. Conjuntura da semana: Evangelii Gaudium: o programa de um pontificado.

Disponível em: <http://www.ihu.unisinos.br/cepat/cepat-conjuntura/526592-conjuntura-da-semana-evangelii-ga udium-o-pontificado>. Acesso em: 8 jul. 2014.

várias passagens bíblicas deixando transparecer a alegria e a sublimidade da tarefa evangelizadora.

O Capítulo 1, intitulado: “A transformação missionária da Igreja”, entra “em cheio” no tema conversão pastoral, que no fundo é a busca da Igreja para viver a fidelidade à própria vocação.206 Nesse capítulo, o Papa Francisco faz a defesa da paróquia, afirmando que ela não é uma estrutura caduca, pois tem muita capacidade de adaptação.

No Capítulo 2, foi abordado o tema crise do compromisso comunitário. O papa inicia denunciando a idolatria do capital que tende a subverter a ordem natural das coisas, se colocando no centro em vez de estar a serviço da pessoa humana e da justiça entre os povos. Apresenta algumas tentações dos agentes pastorais, e a primeira tentação é a do fascínio do gnosticismo, promovendo uma fé fechada no subjetivismo e que busca somente experiências prazerosas, mas que é incapaz de se expressar através do ardor missionário ou do empenho pela transformação do mundo. Uma segunda tentação relaciona-se ao comodismo egoísta, com fechamento para um empenho na atividade apostólica. Outra tentação é a do

neopelagianismo autorreferencial que se fecha ao primado da graça, considerando os frutos

apenas da capacidade humana e não da atuação divina. Por último, o papa discorre sobre a tentação de dividir que enfraquece a ação evangelizadora, pois priva a missão do testemunho da comunhão.

O Capítulo 3, intitula-se: “O anúncio do Evangelho” e traz vários aspectos sobre a atividade evangelizadora da Igreja. O papa volta-se à Igreja que se apresenta como a totalidade dos Batizados, e todos são chamados, a partir de seu próprio carisma, a evangelizar que tem no querigma seu alicerce. E, para que a Igreja se componha de discípulos missionários, o querigma precisa ser aprofundado por meio da catequese. Há destaque para o empenho da dimensão da inculturação do Evangelho na tarefa evangelizadora. A homilia é destacada por sua importância na evangelização e como ponto de comparação para avaliar a fecundidade do encontro do pastor com seu povo (EG 135).

No Capítulo 4, foi considerada “a dimensão social da evangelização”. São abordados ainda: inclusão social dos excluídos; o trabalho político de longo prazo; e o diálogo social: o diálogo entre a fé e a razão, o político, o ecumênico, o inter-religioso e o social amplo.

O Capítulo 5, intitulado: “Evangelizadores com Espírito”, aborda a espiritualidade dos evangelizadores,207 quando retoma o encontro pessoal com Cristo, pois é a partir desta experiência que se sente uma verdadeira necessidade de falar da pessoa amada.208

2.3 AS FONTES

As fontes bibliográficas do documento mostram que a nova etapa evangelizadora da Igreja, como projeto pastoral do pontificado do Papa Francisco, é, na realidade, uma retomada vigorosa do Concílio Vaticano II.

A exortação apostólica Evangelii Gaudium remete à XIII Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, que, em 2012, discutiu “A nova evangelização para a transmissão da fé

cristã”. Várias vezes, o papa mencionou o Sínodo (EG 14; 16; 73; 112; 245), mas seu texto

não se resume a materiais herdados; o que se percebe é um escrito autônomo e programático de seu papado.209 Expressa nele seu sonho de “uma opção missionária capaz de transformar tudo, para que os costumes, os estilos, os horários, a linguagem e toda estrutura eclesial se

tornem um canal proporcionado mais à evangelização do mundo atual que à autopreservação”

(EG 27).

“Poderíamos dizer que Evangelii Gaudium é uma mescla de Gaudium et Spes e Evangelii Nuntiandi, os dois documentos de maior transcendência no contexto da renovação conciliar”.210 O primeiro abriu a Igreja para o mundo, através de uma postura de serviço e

diálogo; “o segundo envia a Igreja a uma sociedade emancipada da tutela eclesial, para

depois, explicitar a Boa-Nova, na gratuidade, numa relação propositiva. Na evangelização não

há destinatários; há interlocutores”.211 A exortação apostólica Evangelii Nuntiandi (1975),

sobre “a evangelização no mundo contemporâneo”, escrita por Paulo VI, foi citada 12 vezes

na Evangelii Gaudium.

207 “A Evangelii Gaudium, a exemplo da Evangelii Nuntiandi e da Redemtoris Missio se encerra com um capítulo

sobre a espiritualidade evangelizadora”. (SIQUEIRA, D. L. Evangelii Gaudium: por um novo dinamismo evangelizador na Igreja. 13 de maio de 2014. Disponível em: <www.diocese.sjc.org/evangelii-gaudium-por-um- novo-dinamismo-evangelzador>. Acesso em: 6 jul. 2014).

208 Ibid.

209 SUESS, P. [Papa Francisco]: vinho e vinagre na alegria do Evangelho. 6 de dezembro de 2013. Disponível

em: <http://www.adital.com.br/site/noticia_imp.asp?lang=PT&img=N&c...>. Acesso em: 16 mar. 2014.

210 BRIGHENTI, A. Intuições básicas do perfil da Igreja que o Papa Francisco sonha. Disponível em:

<http://www.diocesetb.org.br/detalhes_artigos/223>. Acesso em: 8 jul. 2014.

Sem sombra de dúvidas, está muito presente o Documento de Aparecida,212 que o próprio Bergoglio ajudara a compor, não só nas discussões e decisões da V Conferência do CELAM, mas principalmente como presidente da redação do mesmo documento. Aliás, a presença e a reflexão latino-americanas na exortação aparecem em mais de 15 citações explícitas ou em notas do texto. Várias citações implícitas também são encontradas no documento.213