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2. Revisão de literatura

2.1. Estudo da caracterização molecular de Giardia spp e Cryptosporidium spp

O desenvolvimento e avanço de ferramentas moleculares para o estudo da diversidade genética de Giardia spp. e Cryptosporidium spp. vem permitindo conhecer a ampla gama de hospedeiros desses protozoários, além de possibilitar a compreensão da dinâmica e padrões de transmissão desses parasitos contribuindo para o melhor entendimento da epidemiologia desses patógenos (THOMPSON e ASH, 2016).

Para a caracterização genética de Giardia spp. há inúmeros genes alvo que podem ser estudados como a pequena unidade ribossomal (SSU-rDNA), espaçador transcrito interno (ITS1-2), beta-giardina (β-giardin), triose fosfato isomerase (TPI) e glutamato desidrogenase (GDH) (CACCIÒ et al., 2002; HOPKINS et al., 1997; LALLE et al., 2005; READ et al., 2004; SULAIMAN et al., 2003).

Ressalte-se ainda que para Giardia duodenalis, esses marcadores genéticos diferem quanto à identificação de grupos e subgrupos genéticos e quanto às relações filogenéticas sugeridas (WIELINGA E THOMPSON, 2007). Os genes TPI, GDH e beta-giardina são os marcadores mais comuns para a determinação de grupos genéticos e subtipos enquanto que o gene SSU rDNA é mais indicado para a determinação de espécies e grupos genéticos (WIELINGA E THOMPSON, 2007). Por outro lado, o estudo de um único locus não fornece informações suficientes para compreender um possível elo zoonótico. Assim, a maioria dos estudos epidemiológicos de Giardia duodenalis emprega a genotipagem multilocus para uma melhor caracterização de isolados de Giardia oriundos de diversos hospedeiros (LIU et al., 2014b) cujos resultados podem contribuir para um melhor entendimento da relação entre humanos e animais como hospedeiros e reservatórios, como também a elucidação das rotas de transmissão da giardiose (LIU et al., 2014b).

Hopkins et al., (1997) avaliando o gene SSU-rDNA de Giardia, proveniente de amostras clínicas de humanos e de cães, verificaram que as sequencias de DNA de 4 grupos de Giardia eram distintos, sendo que os grupos 1 e 2 eram de cistos recuperados de humanos enquanto 3 e 4 foram oriundos exclusivamente de cães, sugerindo novos grupos genéticos de G. duodenalis, já que não havia relatos sobre as sequências obtidas desses isolados de cães. A partir desse estudo com o gene SSU rDNA, foi possível vislumbrar a existência de grupos genéticos (A-H) de Giardia

duodenalis confirmando o potencial zoonótico do parasito (THOMPSON E ASH, 2016;

RYAN e CACCIÒ, 2013).

Em relação ao potencial zoonótico de Giardia, THOMPSON E ASH (2016) relataram que o protozoário é mantido por uma série de ciclos entre hospedeiros independentes, bem como ciclos provenientes de duas espécies zoonóticas. Entretanto, a frequência dessas transmissões é desconhecida fazendo com que a epidemiologia dessas infecções permaneça controversa, mesmo que o emprego da biologia molecular tenha confirmado a natureza zoonótica de Giardia spp (FLETCHER et al., 2011; THOMPSON e SMITH, 2011). Diante do fato de que animais podem abrigar Giardia duodenalis zoonóticas e específicas, FENG e XIAO (2011) afirmam que a biologia molecular é requerida para o rastreamento da origem desse parasito.

Quanto ao protozoário Cryptosporidium spp. a aplicação das ferramentas moleculares tem sido importante para a determinação da diversidade genética do parasito, contribuindo também para o rastreamento da origem de contaminação do protozoário, já que oocistos de diferentes espécies são morfologicamente semelhantes (THOMPSON E ASH, 2016). Diversas espécies e genótipos do parasito podem estar envolvidos na ocorrência de surtos de criptosporidiose por veiculação hídrica já que a contaminação da água com oocistos pode ser proveniente de diversas fontes (ROCHELLE e DI GIOVANI, 2014; XIAO et al., 2006).

O termo genótipo refere-se a um nível taxonômico inferior ao de espécie, sendo constituído por um conjunto de marcadores genéticos cujas sequências são diferentes do gene SSU rRNA, apresentando assim características que não o elevam para o

status de espécie.

O gene SSU rDNA é amplamente difundido na identificação de espécies do parasito devido à presença de regiões semi-conservadas e variáveis do DNA as quais facilitam a criação de primers específicos ao gênero-espécie. Outra característica

desse gene é a natureza multi-cópia permitindo gerar vários templates na PCR (RYAN et al., 2014; THOMPSON E ASH, 2016).

Outro gene que também tem sido empregado como alvo na identificação de subtipos de Cryptosporidium é o gene 60 kDA glicoproteína (gp60), um marcador molecular cuja heterogeneidade reside na variação no número dos nucleotídeos TCA, TCG ou TCT na extremidade 5’ (gp40), embora o polimorfismo também esteja presente no restante do gene (RYAN et al., 2014).

O termo subtipo inclui a variação dentro das espécies de Cryptosporidium a partir da investigação de vários locus (gene gp60) de uma população específica do parasito proveniente tanto de humanos como animais (RYAN et al., 2014). A nomenclatura desses subtipos foi baseada conforme SULAIMAN et al., (2005); XIAO,2010; Feng et al. 2011 (Tabela 4), no qual o nome do subtipo se inicia com a espécie e a designação de família sendo seguida pelo número repetido de TCA (representado pela letra A), número de TCG (pela letra G) ou TCT (letra T). No caso do nome IeA11G3T3 esse indica que C. hominis pertence à família subtipo Ie, possuindo 11 cópias de TCA repetidos, 3 cópias repetidas de TCG e 3 cópias repetidas de TCT.

Tabela 3. Subtipos de Cryptosporidium spp.

Espécies Subtipos Nucleotídeos

C. hominis Ia Ib Id Ie If Ig Ih Ii Ij TCA TCA, TCG, TCT TCA, TCG TCA, TCG, TCT TCA, TCG TCA TCA, TCG TCA TCA

C. parvum IIa TCA, TCG

IIb TCA IIc TCA, TCG IId TCA, TCG IIe TCA, TCG IIf TCA IIg TCA

(Continuação da tabela 3)

Espécies Subtipos Nucleotídeos

C.parvum IIh IIi IIk IIl IIm IIn IIo TCA, TCG TCA TCA TCA TCA, TCG TCA TCA, TCG C. meleagridis IIIa IIIb IIIc IIId IIIe IIIf IIIg TCA TCG TCA TCG TCA TCA TCA TCG TCA TCG TCA TCG C. fayeri IVa IVb IVc IVd IVe IVf TCA, TCG, TCT TCA, TCG, TCT TCA, TCG, TCT TCA, TCG, TCT TCA, TCG, TCT TCA, TCG, TCT

Genótipo de gambá XIa TCA, TCG, TCT

C. cuniculus Va

Vb

TCA TCA Genótipo de cavalo VIa

VIb

TCA, TCG

C. wrairi VIIa TCA, TCT

Genótipo de ferret VIIIa TCA, TCG

C. tyzzeri IXa

IXb

TCA TCA

Genótipo de visom Xa TCA, TCG

Genótipo I de gambá XIa TCA, TCG, TCT

C. ubiquitum* XIIa XIIb XIIc XIId XIIe XIIf

(Continuação da tabela 3)

Espécies Subtipos Nucleotídeos

C. erinacei XIIIa TCA

Fonte: Adaptado de Ryan et al., (2014).

* C. ubiquitum não apresentam tri nucleotídeos repetidos, não podendo ser considerado como subtipo conforme nomenclatura.

Na América do Norte, Europa e Austrália, os subtipos IIa de C. parvum encontrados em bovinos também foram relatados em humanos nesses continentes (XIAO, 2010). O subtipo IIaA15g2r1 de C. parvum que foi encontrado em bovinos em Portugal, é também o subtipo mais relatado em humanos no mesmo país.

Na República da Irlanda e Nordeste da Irlanda, indivíduos foram infectados com os mesmos subtipos (IIaA18g3r1) encontrados em bovinos. Em Portugal, o potencial de transmissão zoonótica foi observada no subtipo IId de C. parvum, já que quatro subtipos foram encontrados em indivíduos com HIV, sendo que dois desses subtipos já foram registrados em bovinos e caprinos (XIAO, 2010).

Alves et al., (2006) e Soba e Logar (2008) relataram que a diversidade genética de C. parvum foi mais alta em humanos do que em bovinos, sendo que dos três subtipos de C. parvum, relato do subtipo IIc em animais não foi registrado. Além desses estudos, a natureza antroponótica do subtipo IIC tem sido demonstrada em várias pesquisas que compararam os subtipos do parasito em criptosporidiose humana e bovina ocorrente nos EUA, Canadá, Portugal, Eslovênia, Reino Unido e Irlanda (XIAO, 2010).