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Eu sei que um filme de bandido mesmo, que eu nunca VI MATAR tanto (FLP 05, L236)

CAPÍTULO V PRETÉRITO MAIS-QUE-PERFEITO VERSUS PRETÉRITO PERFEITO: AS MOTIVAÇÕES EM FOCO

F. Eu sei que um filme de bandido mesmo, que eu nunca VI MATAR tanto (FLP 05, L236)

(33) Àí fui ajudar a trocar ela. Ai meu Deus, eu nunca TINHA VISTO assim uma coisa- Nunca TINHA ENTRADO naquela coisa ali. (FLP 03, LI309)

1,2.1.2 - Resultados e discussão

Este grupo de fatores foi o quarto grupo selecionado. No âmbito dós fatores semântico-estruturais testados, foi o primeiro grupo. Os resultados aparecem a seguir: Tabela 05 - Advérbio da situação è uso do pretérito mais-que-perfeito

Fator Total/N°de dados 'Percentagem mÊBIÊBBBMÊÊÊm hêdmgbio dejgempi> ®raçao teniponü Tota/

56/30

25/10

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37/06

72/11

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209/59

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•■n m . " «-"i "V? O advérbio já favorece o pretérito mais-que-perfeito. Parece que, em português, há uma forte tendência no sentido de associar o advérbio já ao pretérito mais-que- perfeito; um leva ao outro. Esse parece ser também o caso do inglês. Normalmente, o

past perfect associasse ao advérbio already. Talvez, seja possível falar em

especialização de uso em direção a um processo gramaticalização decorrente da recorrência de certas construções.

O advérbio de negação não parece ser semelhante ao advérbio nunca, já que ambos indicam que o verbo que os acompanha é de estado, porém o peso associado ao advérbio nunca é maior que o peso do advérbio não. Isso se explica porque o advérbio nunca, diferentemente de não, pode negar todo o período passado, não apenas um período no passado. Associar o advérbio nunca ao pretérito mais-que- perfeito implica marcar a terminação dessa situação antes de outro tempo passado. O fato de o advérbio não favorecer ou pelo menos mostrar que tende ao uso do pretérito mais-que-perfeito pode ser justificado pelo interesse do informante de marcar a situação negada, enfatizado, assim, o não acontecimento.

O peso atribuído aos advérbios temporais indica que tais expressões favorecem o pretérito perfeito, o que se justifica pela não necessidade de marcar uma situação já marcada temporalmente. O comentário acima se aplicaria também para os casos de oração temporal, no entanto este último resultado não confirma nossa hipótese.

A partir desta análise, é possível prever uma tendência de uso dos pretéritos mais-que-perfeito e perfeito. O pretérito mais-que-perfeito ocorre quando associado aos advérbios já e nunca; o pretérito perfeito quando associado a outros advérbios temporais.

1.2.2 - Tipo de ponto de referência 1.2.2.1 - Caracterização e hipóteses

Por ser de grande valia na determinação do dado variável, nesta pesquisa, acreditamos que o ponto de referência tenha um papel importante na escolha entre os pretéritos perfeito e mais-que-perfeito. Consideramos os seguintes tipos de ponto de referência, quanto à sua codificação: forma verbal flexionada, locução verbal, forma não flexionada, inferência pela negação e discursivo.

O fator denominado forma verbal flexionada engloba tanto o verbo explícito (a maioria) quanto verbo implícito (dois dados). Nossa expectativa é que o ponto de referência codificado por urna forma verbal simples deve levar à escolha do pretérito perfeito porque dois verbos de tempo absoluto expressos em um enunciado, ou pela organização ou pelo próprio item lexical, já indicam seus papéis temporais (qual é anterior e qual é posterior), não havendo necessidade de uma forma ser mais marcada do que a outra. Observem-se os exemplos, a seguir, em que o último traz um ponto de referência com verbo implícito (disse):

(34) E até saiu sem camisa e tudo que TIRARAM. (FLP, Andreza/4) (35) Aí contou, né? que TINHA se QUEIMADO e tudo (FLP 03, L916)

(36) Ai eu vim embora. A gente, assim, já TINHA se DISCUTIDO, aí ele [_____] assim: “É, Preta, não tem mulher, não.” Primeiro, ele já TINHA DITO que tinha tudo... (FLP 03, L956)

b) Locução verbal

A previsão de que os pontos de referência do tipo locução verbal influenciem a marcação do passado anterior deve-se basicamente ao fato de um dos elementos da locução possuir tempo relativo. Apesar de haver uma relação entre a forma não flexionada da locução com a flexionada, ou seja, a forma não flexionada é relativa à flexionada e normalmente capta o tempo desta, o processamento requer um pouco mais de esforço mental.

Note-se que, nesses casos, uma das tarefas postas ao ouvinte é a de decodificar o tempo relativo como simultâneo, anterior ou posterior à forma flexionada. Feita esta interpretação temporal, cabe ainda ao interlocutor entender que a forma codificada depois do ponto de referência é, em tempo real, anterior ao conjunto de auxiliar mais forma não flexionada. Sendo, então, o processo mais complexo, a forma predominante para apresentar o tempo anterior deve ser o pretérito mais-que-perfeito. A forma marcada, neste caso, pode facilitar o processamento, demandando, assim, menos esforço.

130 Consideramos como locução as formas nominais acompanhadas tanto de verbos auxiliares quanto de verbos aspectuais e modais. Vejam-se os exemplos:

- Auxiliar

(37) ... aí fui contar pra elas que não, que eu estava era grávida, que eu TINHA FEITO os exames, que FOI DADO positivo (FLP 20, L1055)

y

- Aspectual

(38) Aí, depois desse tempo aí, ninguém mais comecou andar de bicicleta, depois que eu TTVE a minha quase ninguém começou a andar... (FLP, Everton/9)

(39) Qual a minha surpresa, que nesse ínterim, tá? comecou a aparecer várias dívidas que o Osni TINHA CONTRAÍDO. (FLP 23, L205)

- Modal

(40) E aí, de repente, durante esses vinte e quatro anos, eu consegui fazer a minha casa lá em Itaguaçu. COMPREI um terreno lá, que foi uma luta muito grande porque a mulher já estava me pedindo o apartamento... (FLP 23, L328)

(41) Eu consegui comprar um terreno. Ali TINHA SIDO ABERTO o loteamento. (FLP 23, L339)

c) Forma não flexionada

Este fator deve favorecer o uso do pretérito mais-que-perfeito pelas mesmas razões apontadas para os casos de ponto de referência do tipo locução verbal. A forma não flexionada apresenta tempo relativo, então, tem de captar o tempo de outra forma verbal que, diferentemente dos casos de locução, nem sempre está próxima. Este processo pode pôr em dúvida, para o interlocutor, alguns casos de pretérito perfeito, por isso a expectativa de que a preferência deve ser dada ao pretérito mais-que- perfeito. Considerem-se alguns exemplos:

hospitalar pra procurar pelo maios não surpreender negativamente aqueles que HAVIAM me CONVIDADO pro cargo. Até porque não PEDI pra ser. (FLP 21, L238)

(43) ...muito sábado e muito domingo a família saiu pra passear e eu ficava em casa estudando, pra não decepcionar nem a mim mesmo, nem os que me CONVIDARAM e os que me ELEGERAM.

(FLP 21, L249)

(44) Eu me lembro bem que ainda em mil novecentos setenta e oito, antes do Esperidião sair da prefeitura, primeiro mandato dele de prefeito, eu FIZ um ofício pedindo a abertura ali... (FLP 21,

L839)

Incluímos no fator forma não flexionada tanto as formas nominais seqüenciais à forma flexionada anterior mais próxima como ocorre com surpreender e decepcionar nos exemplos (42) e (43) como aquelas de infinitivo que especificam uma referência temporal (exemplo 44).

Inicialmente, identificamos o caso (44) como inferência pela referência temporal, porque a oração em que a forma sair aparece especifica a referência temporal passada em que ocorre a situação expressa por fiz. Esta identificação fica mais clara quando colocada em um esquema temporal como o que segue:

(45)

...antes do Esperidião sair da prefeitura

— - s ---...™ R --- F---

FIZ (sair)

A especificação da referência temporal passada (...antes do Esperidião sair da prefeitura) faz com que o interlocutor pressuponha um momento, ainda no passado, em que o Esperidião realmente saiu. Como no exemplo (44) a forma não flexionada sair ganha, contextualmente, uma nuance de tempo passado, passamos a considerar, então, esta forma não flexionada como ponto de referência. Não abrimos uma categoria exclusivamente para tal tipo de dado porque, no total, encontramos apenas dois casos.

132

d) Inferência pela negação no passado

Considerem-se os exemplos a seguir:

(46) Ah, tem um monte assim, porque assim, tem samba, um samba. Eu nunca VI aquela brincadeira. Nunca VI, eu acho que era... (FLP Andreza/08)

(47) F. Eu nasci em setenta e quatro então - E. Não existias35 ainda?