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Fonte: Pesquisa de campo, 2010.

Esses centros de irradiação do conhecimento engendram a presença da técnica, não só pelos objetos, mas, também, pelas ações, pois são geradoras de ensino, de pesquisa e extensão e assim fazem parte do motor que move o realinhamento das técnicas e das tecnologias. No entanto, uma pergunta continua pertinente: quem são os grandes beneficiários do que é produzido nessas instituições? São também os homens lentos, mas em parcela ainda pequena, pois quando a esses o acesso é permitido, eles passam a fazer parte da construção de um produto que, na maioria das vezes, não se reverte para as comunidades mais pobres, ou seja, as instituições de ensino superior tanto privadas como públicas, detentoras de técnicas e tecnologias não cumprem a rigor o seu principal papel, que seria o melhoramento do lugar, talvez porque a força do globaritarismo continue ainda ditando a regra no âmbito desses “centros do saber”. Assim sendo, a relação lugar-mundo-lugar acaba por privilegiar resultados que nem sempre se coadunam com a realidade local.

Temos, também, como lócus nos quais as técnicas estão presentes de forma intensa, as instituições financeiras, no caso da cidade de Caicó, os bancos, os quais do mesmo modo se apresentam, como fazendo parte das duas esferas: a rede pública e a rede privada. No urbano caicoense, esse tipo de instituição é a que mais revela presença da técnica, mas todo este avanço também se reverte, em grande monta, a favor destes bancos – agentes hegemônicos – que, no contexto atual de globaritarismo, aparecem como estabelecendo os “espaços que mandam”, pois mesmo que o cliente seja de certa forma também beneficiado, e não poderia ser diferente, o maior beneficiário são estes bancos, principais intermediários da “tirania do dinheiro” (SANTOS, 2001). No entanto, não podemos negar a contribuição que estas instituições trazem para a condição que a cidade de Caicó assume em relação ao seu entorno, como também na relação

“lugar-mundo-lugar” e para a expansão urbana, ou seja, tal processo de expansão que se apresenta, especialmente, desde a década de 1970, é corroborado por estes agentes financeiros, pois são eles que oferecem os serviços bancários para a grande maioria dos habitantes de Caicó e de muitas cidades da região a qual esta é o centro.

Fora do “lócus da produção do conhecimento” e das instituições financeiras, as técnicas que sugerem a luminosidade, a densidade e a fluidez aparecem em algumas empresas (comércio e serviços especializados) que operam no circuito urbano da cidade. São estabelecimentos que, por exigência do tempo e de suas demandas, ofertam ao cliente serviços e produtos que são equiparados aos mesmos serviços e produtos oferecidos em outros pontos mais desenvolvidos do que a cidade de Caicó. Estamos nos referindo, por exemplo, a clínicas particulares, lojas de revenda de automóveis, algumas poucas indústrias têxteis, já citadas, supermercados, laboratórios de óticas, como, também, algumas lojas mais sofisticadas45.

Estabelecimentos que revelam fortes evidências em relação à “presença do mundo” em Caicó. São marcas como Mercedes Benz, Fiat, Chevrolet, Ford, Yamaha, Honda, além de outras que representam uma gama de mercadorias que se pode comprar na cidade.

Figura 10: Objetos Sofisticados em Áreas Luminosas Fonte: Pesquisa de Campo, 2010.

45 Na cidade de Caicó existem algumas clínicas que estão muito bem equipadas com objetos técnicos de ponta, como é o caso de alguns aparelhos destinados ao atendimento à saúde daqueles que podem pagar. É visível também a revenda de automóveis (destaque para as revendas da FIAT, da Mercedes Benz e da Ford) que disponibilizam carros populares e de luxo aos habitantes locais quase ao mesmo tempo que são lançados no centro-sul do país. Em alguma das indústrias de bonés (merece destaque a empresa Só Boné) da Caicó atual, é comum a utilização de equipamentos de última geração, principalmente, no feitio dos bordados. Caicó ganhou recentemente um supermercado (LIGZARB) que pode ser apontado como lócus da presença de técnica e onde o “mundo no lugar” aparece de forma evidente, pois a metodologia de venda e atendimento não deixa a desejar se comparada a similares da capital do Estado. Existe, também, no urbano caicoense um laboratório ótico (Ótica Graciosa) que utiliza a mais recente tecnologia alemã de manipulação de lentes. O referido laboratório atende a várias óticas da cidade, como também a óticas de toda a região do Seridó e áreas do Estado vizinho da Paraíba. A cidade atual também tem em seu tecido urbano lojas que trazem para uma parcela pequena da população (homens rápidos) produtos de vestimenta e adornos de última geração. Também no ramo dos elétrico-eletrônicos temos empresas que estão na ponta do sistema técnico, vendendo produtos como TVs LCD e LED, só para citar alguns exemplos.

Os subespaços da sofisticação estão, em sua maioria, voltados para uma parcela ínfima da população, revelando assim como a “tirania do dinheiro” e a “tirania da informação” se estabelecem nas áreas urbanas, gerando uma ruptura cada vez mais cruel entre os homens rápidos e os homens lentos, deixando se sobressair, portanto, algumas poucas áreas de luminosidade. O território, então, se constitui em um instrumento de exercício das diferenças do poder (SANTOS, 2001). As várias “Caicós” acusam tais diferenças e se perfazem em um “cenário maldito” das contradições, ao mesmo tempo em que se expõe ao debate e à luta pela liberdade, pois, como nos aponta Santos (1991, p. 59), as cidades, desde o Feudalismo, “aparecem como semente de liberdade, possibilidade do homem livre” e assim continuam até hoje.

Os subespaços caicoenses, que apresentam as características acima analisadas, apresentam brutais diferenças em relação aos subespaços opacos e diferenças mais amenas em relação aos subespaços intermediários ou “luminosos marginais”. Nestes, também chamados de lugares rápidos, há uma grande quantidade de vias, cuja fluidez é a regra. Algumas delas, mais importantes, que cortam esses subespaços e que servem de artérias principais, revelam, em si, um “deslocamento líquido”, pois a maioria das ruas pavimentadas e/ou asfaltadas facilita o fluxo, por isso são reveladoras de privilégios sociais, como o acesso em tempo hábil e resolução mais rápidas dos problemas do dia-a-dia, mas é verdade que também existe a viscosidade.

Os homens rápidos não precisam, como fazem os homens lentos, burlarem e/ou criarem artimanhas ou alternativas porque em meio a um território fluido, transitam em parte da cidade, onde promovem um encontro com eles mesmos em seus subespaços, praticando a exclusão de outras parcelas da população, como também de outros subespaços citadinos, como um todo, a não ser quando estes outros subespaços – dos homens lentos – perfazem os seus interesses. Os meios de transportes característicos do contexto da fluidez são eficientes, rápidos e trazem em si, um misto de conforto e de “isolamento” em relação ao externo. São automóveis de importantes marcas, muito caros e completamente equipados. Na maioria das vezes, luxuosos e importados, o comércio desses carros corrobora para o crescimento ainda maior das já gordas classes dos privilegiados46 e para o empobrecimento da maioria da população que

não tem acesso a essa rapidez, mas vive no dia-a-dia o exercício da mera sobrevivência.

46 Aqui, nos referimos aos donos de empresas concessionárias de automóveis e a uma pequena cama da população caicoense.

A fluidez tão alardeada é privilégio de uma minoria, mas o discurso globaritarista ratifica todos os dias a ideologia de que esta é necessária a todos os homens. Na verdade, aí está o lastro para a violência da informação e do dinheiro. A Caicó da atualidade vive esse dilema como as demais cidades médias brasileiras. No entanto, mostra uma especificidade curiosa, qual seja: a cidade em seu período atual e contemporâneo, mesmo sendo de porte médio, tem sua economia apoiada no setor terciário, amparado por uma massa salarial de funcionários públicos federais, estaduais e municipais, como, também, em uma restrita elite de médios empresários, revelando-se fragmentada/articulada em subespaços da luminosidade e da opacidade, sendo que este primeiro surpreende quando tomamos como análise a economia da cidade e a “cara” de pobreza que a esta mostra na maioria de seus subespaços.

1.5 OS EIXOS DA FLUIDEZ: OS FIXOS QUE GERAM IMPORTANTES FLUXOS Toda essa diversidade de subespaços, toda massa de pobres e a pequena parcela de “ricos”, que adensam o território caicoense, estão de uma ou de outra forma ligada a dois eixos de fluxos principais, que são, na verdade, o motor do território caicoense. Três importantes fixos – BR 427 e RN’s 118 e 28847 – são, na atualidade, responsáveis pelo grande

movimento que além de dinamizar a cidade em si, ainda liga-a como já anotamos neste capítulo com outras tantas cidades da Região do Seridó Ocidental e Oriental, bem como, cidades dos vizinhos Estados da Paraíba e Ceará, e as duas principais área urbanas do Estado – Natal e Mossoró.

O fluxo, que acontece diariamente nestas vias, impressiona não só pelo movimento, mas pela circulação de mercadorias e pessoas. São vãs, caminhões, carretas e automóveis outros que imprimem na cidade um ritmo e um desempenho de trocas que coloca Caicó na rota de um interessante “boom” de comércio e serviços. A cidade se abastece ao mesmo tempo em que é fornecedora de produtos e serviços. A noção de fluidez se faz clara, quando, ao observar essas vias de fluxos intensos, percebemos a entrada e saída de pessoas, de serviços e de produtos, perfazendo o ciclo: produção-consumo-circulação. No que concerne ao fluxo de pessoas, a saída se dá em direção às cidades mais importantes,

47 A BR 427 corta a cidade de oeste a leste e é responsável pelo mais importante fluxo de transportes, pedestres e mercadorias ligando a cidade de Caicó com outras do Estado da Paraíba. Já a RN 118 faz a ligação de Caicó com cidades do mesmo Estado, mas é também o elo com a BR 304 que possibilita por sua vez a ligação com a parte oeste do Rio Grande do Norte e com o Estado do Ceará. Por último, a RN 288 liga Caicó a cidades menores que nela se abastecem-se de vários produtos e serviços e é o principal elo com Natal, a capital do deste Estado, quando esta se liga a BR 427, que, por sua vez, desemboca na BR 226.

principalmente para a capital do Estado, como, também, para Mossoró (RN), Campina Grande e Patos (PB). São centenas de pessoas que buscam fora de Caicó, principalmente, aquilo que a cidade não oferece. Já a chegada de pessoas que é muito mais intensa do que a saída representa o potencial que a cidade revela, especialmente, em relação aquelas localizadas em seu entorno.

Tabela 10 – Fluxo de pessoas que vêm a Caicó diariamente