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CAPÍTULO 2 A AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL E A REGULAÇÃO PELO

2.2 O Exame Nacional de Cursos (ENC)

O exame nacional de cursos (ENC), introduzido pelo governo federal através da Lei 9.131/95, constituiu o principal instrumento do modelo brasileiro de avaliação das Instituições de Educação Superior (IES) até meados de 2004. Foi um dos mecanismos de interação direta entre o Estado e essas Instituições avaliadas. Essa interação nem sempre foi cercada de cordialidades e cortesias, ocorrendo numa vertente de caráter vertical.

Foi o instrumento de avaliação institucional que mais provocou reações nos diversos setores da sociedade. A implantação do Exame Nacional de Cursos pelo

Estado avaliador representou mais uma medida polêmica de política de educação superior que veio recolocar o problema da avaliação institucional das universidades na agenda nacional de discussão àquela época.

A introdução dos Exames Nacionais de Cursos provocou um importante processo de reordenação do modelo brasileiro de avaliação institucional, redefinindo sua política de ação nesse setor. Para o desenvolvimento desse modelo, não poderiam ser ignoradas as contribuições relevantes da experiência internacional, nem as experiências pioneiras de avaliação institucional realizadas pela UNB em 1987 e pela UNICAMP em 1992, e nem mesmo experiências de menor repercussão conduzidas por outras universidades brasileiras foram relevantes para sua práxis (BELONI, 2000).

De acordo com BELONI (2000), a avaliação de rotina realizada pelo Estado brasileiro até o final da década de 1980 se restringiu às tarefas de autorização e reconhecimento de cursos e credenciamento de instituições de educação superior. Em geral, inicialmente eram efetuadas avaliações preliminares, a partir de projetos ou relatórios, seguidas de visitas in loco por comissões de especialistas nomeadas pelo MEC.

Um segundo momento, a avaliação final cabia ao antigo Conselho Federal de Educação, que em todo este processo de expansão recente do ensino superior se enredou numa teia de tráfico de influência e de corrupção, o que em conseqüência levou à sua extinção na metade desta década e à criação de um novo Conselho, o Conselho Nacional de Educação (CNE).

Nessa tarefa de atuação do avaliar das IES, a única história a se consolidar como de relativo sucesso tem sido a da CAPES, que, desde 1977, vem avaliando periodicamente os programas de pós-graduação do país. Esta recentemente

modificou seu modelo de avaliação e passou a avaliar os programas de pós- graduação quase exclusivamente a partir de indicadores de desempenho de expressos em relatórios, alguns nem sempre completos e outros com certeza parcialmente verdadeiros.

A análise desses relatórios por comissões avaliadoras, na prática estabelecida pela CAPES, era seguida de visitas in loco para checagem, observação e entrevista com estudantes de pós-graduação e responsáveis pelo programa. Na mudança recente de sistemática, possivelmente em decorrência do elevado número de programas a serem avaliados e da pouca disponibilidade de recursos financeiros, a instituição dispensou esta segunda etapa importante do processo avaliativo e na apreciação de alguns programas e teve o trabalho de algumas de suas diferentes políticas de promoção de avaliação institucional e/ou de realização direta de avaliação externa do desempenho institucional através da avaliação do desempenho dos estudantes (exames de cursos) devem ser compreendidas, interpretadas, apreciadas e por meio de meta-avaliações (SANTOS FILHO, 2000).

Porém, o ENC foi o exame que mais se destacou nesse processo avaliativo/regulador da educação superior no Brasil. Foi alvo de intensas pesquisas e objeto de inúmeras reportagens pela mídia no Brasil. Numa análise documental do ENC, percebe-se um caráter regulador muito forte, notadamente pela sua metodologia de aplicação e principalmente pelo uso de seus resultados pelas IES e pela sociedade.

O sistema de ranking instituído, ainda que não aceito oficialmente pelo Estado, à época, foi o lado cruel dessa regulação. As IES passaram a ser classificadas conforme o resultado final de provas aplicadas aos alunos da

graduação após a conclusão do seu curso, sem levar em consideração vários aspectos, notadamente à particularização regional e os currículos adotados pelas IES nacionalmente (DIAS SOBRINHO, 2000).

Ainda, essa regulação fez-se sentir com mais força nas IES privadas, havendo uma verdadeira caça às bruxas em termos de qualificação do alunado, baseado apenas em um resultado de uma prova.

Apesar de ter provocado alguns efeitos positivos no sistema de educação superior, vários aspectos negativos e limitantes daquela forma de avaliação pelo extinto ENC não podem ser ignorados. Entre os principais, destacaram-se os abaixo elencados por BELLONI (2000):

1. Tendência à homogeneização dos currículos de cada tipo de curso; 2. Desconsideração do contexto local e institucional dos cursos;

3. Desconsideração da multiplicidade de fatores determinantes do desempenho do estudante;

4. Potencial pouco diagnosticador do sistema de exame,

5.Valorização da aprendizagem superficial em prejuízo da aprendizagem profunda;

6. Concepção tecnocrática de educação superior;

7. Consideração fragmentada dos indicadores de desempenho, e 8. Ausência de dimensões atitudinais e práticas na forma de avaliação. Autores diversos como DIAS SOBRINHO (2000, 2003), BELLONI (2000) e RISTOFF (1999, 2000) foram críticos contumazes do ENC. Esses autores integraram por certo tempo o governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva em funções no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Desses, BELLONI (2000) tem uma ácida crítica ao ENC, abaixo:

(...) A preocupação das instituições em se desempenharem bem nesses exames pode levá-Ias equivocadamente a abandonar suas características diferenciadas e originais e privilegiar as características demandadas pelos exames nacionais, reforçando a homogeneidade do currículo e dos profissionais formados. Perde-se a riqueza da diferença e da variedade de perfis humanos e de profissionais em troca de melhor desempenho em exames massificantes da pessoa humana. A preservação da pluralidade, da diferença, do espírito criativo e inovador das instituições em suas propostas curriculares e pedagógicas é até mesmo essencial à sua sobrevivência como instituição educacional (BELLONI, 2000, p.167).

Não há dúvida que o ENC pautou-se por medidas notadamente regulatórias e verticalizadas. Isso é um fato razoável de se aceitar. Entretanto, há algumas ações merecedoras de louvor, pois no mínimo, retirou as IES do país do torpor acomodado em que se encontravam à época em que vigorou. Nesse sentido, foram mais eficientes para mobilizar as instituições do que o próprio processo por elas enfrentado para obter autorização e reconhecimento de seus cursos. Outro fato inegável é que o ENC proporcionou ao país um banco de dados em termos educacionais que nenhum outro país possui.