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Apresentação e Análise dos dados

O DESAFIO DA PRECEPTORIA NA ATENÇÃO BÁSICA: COMPETÊNCIAS E ESTRATÉGIAS DEMANDADAS DESSA PRÁTICA.

5.2.3 Exercício da preceptoria como obrigação.

As modalidades de preceptoria são diversas, como já fora abordadas na fundamentação teórica. Há as que estão atreladas a projetos e são remuneradas, e outras que não são remuneradas

fazendo parte da rotina da unidade o recebimento de alunos devido a convênios com Instituições de Ensino Superior, podendo os alunos estar acompanhados ou não do docente.

Sabe-se que participar do processo de formação de recursos humanos para o SUS é um dever de cada profissional, a despeito de participação ou não de projetos, considerando o Artigo nº 200, inciso III, da Constituição Federal de 1988 que estabelece que a formação de recursos humanos para a saúde é atribuição do Sistema Único de Saúde (BRASIL, MS, 2004)

Apesar de tal conhecimento alguns profissionais não estão plenamente sensibilizados e elucidados acerca de seu papel enquanto agente de mudanças e demonstram desmotivação ou pouca seriedade nos processos educativos.

Os relatos abaixo apontam esta realidade:

“Tem enfermeiros que não querem receber alunos, não são hostis, mas não querem receber. Isto sobrecarrega os colegas que acabam se sensibilizando com a situação do aluno e ficam com excesso, enquanto outros não se importam.” (COBRE)

“Há o questionamento do profissional a respeito de ter que receber o aluno e não ganhar nada por isto. Entende? Eles sabem que alguns estão vinculados ao PET.” (ZINCO)

Segundo Laranjeira (2006, p.178), nem sempre os profissionais de enfermagem consideram que seja seu dever contribuir para formação clínica dos alunos. Ou, por outro lado, apesar de existirem disposições e motivações para a colaboração na formação dos alunos, os serviços não dispõem dos recursos suficientes para que esta seja uma realidade.

A tarefa de ensinar a pensar, requer dos educadores o conhecimento de estratégias de ensino e o desenvolvimento de suas próprias competências do pensar. Libâneo (In: PIMENTA E GHEDIN, 2002, p. 36), com base nos estudos de Perrenoud, afirma que “Se o professor não dispõe de habilidades de pensamento, se não sabe aprender a aprender, se é incapaz de organizar e regular suas próprias atividades de aprendizagem, será impossível ajudar os alunos a potencializarem suas capacidades cognitivas”.

Schön (2000) preconiza que é necessária uma formação profissional que integre teoria x prática x reflexão, baseado no processo de reflexão-na-ação, ou seja, um ensino em que aprender através do fazer seja prioridade, um processo de construção cuja capacidade de refletir seja estimulada pela interação. O autor enfatiza que somente uma nova epistemologia [grifo da autora] da prática, guiada na reflexão do profissional [grifo da autora] sobre a sua prática, é que

orientará para uma possível mudança de um profissional reflexivo, capaz de encontrar respostas aos dilemas encontrados na prática cotidiana.

[...] envolvimento dos profissionais do SUS com atividades de supervisão/orientação de estudantes de graduação da área da saúde exige o acréscimo de uma formação /aculturação pedagógica para além das funções técnicas que lhe são atribuídas. (TRAJMAN et al, 2009, p. 25)

Zinco discorre sobre a situação de alguns preceptores vinculados à preceptoria por questões normativas, que recebem alunos sem desejarem. Segundo ele, alguns nem sabem que têm esta incumbência pré-estabelecida antes de assumir o vínculo empregatício. Sobre esta questão traz uma contribuição significativa para este diálogo analítico:

“[...] E daí, o que acontece, você não vê o profissional da ponta entendedor do que é ser preceptor porque ele não foi avisado, vamos dizer assim, de que ele receberia aluno lá no concurso, por exemplo, mas isso aí eu acho que é mais profundo, pois teria que ter uma política da própria fundação municipal de saúde ou da própria secretaria de saúde ou do gestor, prefeito que fosse. Teria que fazer parte do planejamento para ficar como política pública, daí você teria no edital de concurso público, então ele seria saber disto.” (ZINCO)

Penso que Zinco traz uma questão que deva ser salientada, quando refere que não há nos editais de concurso públicos de forma explícita, que o servidor tem a atribuição de participar ativamente da formação do graduando em campo prático em saúde. No entanto, a lei orgânica do SUS 8080/90 prevê esta incumbência, além da portaria que regulamenta a Política de Educação Permanente na Saúde e outros documentos, que definem com clareza esta atribuição.

Acredito na necessidade eminente de sensibilização destes profissionais atuantes no SUS, com espaço para escuta ativa dos mesmos, a fim de diagnosticar os motivos que os levam a recusar o exercício da preceptoria ou a exercê-la de forma desmotivadora, apenas por mera obrigação. Segundo Abreu (2003) é essencial que sejam erigidos programas específicos de formação para os tutores e docentes com a finalidade de desenvolver as suas competências pedagógicas, visando à formação de qualidade dos novos profissionais.

É de suma importância que os graduandos sejam recebidos pela equipe, principalmente pelos preceptores, com entusiasmo, pois estão iniciando suas atividades ligadas a futura profissão. Fomentando esta discussão menciona-se Dewey (1989) que descreve o entusiasmo como a predisposição para enfrentar com curiosidade, energia, capacidade de renovação e

espírito de luta, a rotina estabelecida. Relaciona-se a não acomodação perante o que está dado como certo e coerente, examinando-se continuamente os próprios conceitos, crenças e finalidades das ações que realiza, permanecendo sempre aberto a novas posições.

Nesta etapa identificamos os seguintes achados:

● Cobre e Zinco foram os únicos que comentou a pouca receptividade que alguns preceptores veiculam aos graduandos;

●Cobre comentou como tal conduta é prejudicial ao graduando e aos demais preceptores, pois acabam ficando sobrecarregados;

●Zinco refere que alguns preceptores fazem questionamento sobre a obrigatoriedade em participar da formação sem remuneração adicional;

●Zinco ponderou que os editais de concursos deveriam explicitar tal incumbência dos profissionais relativa ao acompanhamento dos graduandos em serviço.

Após discussão sobre a temática em voga, identifico a necessidade do desenvolvimento/aprimoramento das seguintes competências por alguns dos preceptores:

►Aprender e ensinar a trabalhar junto e a trabalhar com equipes.

-Respeitar o trabalho dos demais preceptores e não sobrecarregá-los com a própria falta de vontade de trabalhar com alunos. O preceptor que se posiciona de maneira não receptiva ao graduando e ainda sobrecarrega seus colegas precisa desenvolver esta competência;

► Administrar sua própria formação e enriquecimento contínuo.

-Estar disponível para vencer os impasses que o afasta da vontade de compartilhar conhecimentos. Quando se posiciona contra a participação do processo formação para o SUS, evidencia-se falta de conhecimento ou sensibilização, demonstrando necessidade de agir proativamente rumo ao seu aprimoramento para que sua atuação seja consonante com as expectativas de consolidação do SUS.

- Desenvolver a consciência de sua profissão e o sentimento de responsabilidade, solidariedade e justiça. Apesar de muitas insatisfações que o preceptor possa ter em função do trabalho, não pode deixar-se resvalar na atuação da preceptoria, realizando-a de maneira irresponsável.