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Quando o profeta Muhammad morreu, ocorreu um dilema, pois o

mesmo não havia deixado um sucessor em seu testamento, dois grupos

manifestaram suas escolhas, o primeiro grupo com a intenção de honrar

a linhagem do profeta, apoiava o seu genro e primo Ali ibn Abi Talib,

marido da então única filha do profeta. (DEMANT, 2005, p. 38). Esses

apoiadores de Ali eram um grupo minoritário entre os seguidores do

profeta, e segundo Arantes, eram liderados por quatro indivíduos que

passaram a chamar a si mesmos de Shiat Ali, “Partidários de Ali”,

expressão que mais tarde iria dar origem ao termo “xiita”. (Ibid. 2005, p.

40). O outro grupo que surgiu após a morte do profeta entendia que

qualquer fiel poderia ser um candidato para assumir a liderança do Islã,

desde que fosse apoiado pela maioria da comunidade. Esse segundo

grupo era maioria, e apoiava Abu Bakr, amigo, companheiro e pai da

esposa favorita do profeta. Abu foi o primeiro sucessor de Maomé,

tornando-se o primeiro Khalifa do Islã.

As sucessões dos califados após a morte do profeta Muhammad, a

expansão, conquistas, derrotas e acontecimentos que marcaram parte da

história do Islã, foram registradas primorosamente na obra de Farah

33

.

33 FARAH, Paulo Daniel Elias. Islã: Arte e Civilização. Rio de Janeiro, RJ: Centro Cultural Banco do Brasil, 2011.

Em 632 o profeta Muhammad morre, assumindo o seu lugar o Califa Abu Bakr, que mantém a unidade de todas as tribos da Arábia. Em 634 surge o califado de Umar ibn al-khattab; em 638 Jerusalém é conquistada; em 644 assume o califado Uthman; em 656 após o assassinato de Uthman, assume o califa Ali, que também é assassinado em 661 por um kharidjita

(dissidente), seus partidários aclamam o filho Hassan como seu sucessor, mas ele não aceita, surge então a dinastia de Omiada34, tendo seu primeiro califa Muawiyah I, que estabelece a sua capital em Damasco e governou de 661-680; em 680 Hussain, filho do califa Ali é proclamado califa pelos xiitas, onde é assassinado em Kerbala pelos Omiadas. Entre 713 a 756, surge a Dinastia Abássida35. No ano de 909 acontece uma significativa fragmentação política. Em 969 é fundada a dinastia

Fatimida na África do Norte e em 972 eles conquistam o Egito. Em 1147 acontece a primeira cruzada, onde os cruzados conquistam Jerusalém e estabelecem estados cristãos na Palestina, Anatólia e Síria. No ano de 1174, Saladino funda um sultanato na Síria e no Egito, iniciando a dinastia aiúbida. No ano de 1187, Saladino derrota os cruzados e recupera Jerusalém para o Islã. De 1189 a 1192 acontece a Terceira Cruzada. De 1205 a 1287 uma dinastia de soldados escravos instala na Índia o sultanato de Délhi. De 1254 a 1258, outra dinastia de soldados escravos, os mamelucos, funda um sultanato no Egito e na Síria. Em 1291, os mongóis destroem Bagdá e executam o Califa Al-Mutassim, dando fim ao califado Abássida; 1404 o líder militar Tamerlão revitaliza o poder mongol. Cria um império na Ásia Central e Ocidental, que se desintegra depois de sua morte; em 1453 nasce o império Otomano, o sultão Mhmet II toma Constantinopla, pondo fim ao império Bizantino. No ano de 1492, os reis católicos conquistam Granada, último reino muçulmano na Península Ibérica. Nos anos de 1516 a 1517 acontece a conquista otomana da Síria e do Egito; em 1520 começa o reinado de Solimão I, o magnífico; em 1526 um descendente de Tamerlão Babur, cria o império Mogol na Índia. Em 1609 ocorre a expulsão dos últimos mouros da Espanha; em 1699 acontece o 2º. Cerco de Viena; 1798 a paz de Carlowistzconcede a

34 Omiada: O Califado estabelecido em 661, durou cerca de um século. [...]. O fundador da dinastia Omíada, Muawiya, e seus dois sucessores pertenciam ao ramo

sufyaní (descendentes de Abu Sufyan) da família Omíada, enquanto os demais califas

omíadas eram marwanidas, descendentes de Marwan Ibn al-Hakam, que tomou posse do califado em 684. O califa Omíada mais conhecido é provavelmente Abd al-Malik (685-705), que construiu a Mesquita da Copula da Rocha de Jerusalém, emitiu a primeira moeda muçulmana e adotou a utilização do árabe como a língua oficial da

administração. Disponível em:

<http://www.islamemlinha.com/index.php/artigos/historia/item/os-omiadas>. Acesso em: 9 de novembro de 2017. (Grifo nosso).

35 Dinastia Abássida: A revolução abássida estabeleceu no poder uma nova dinastia, que igualou os direitos de todos os muçulmanos árabes e não árabes. Tal virada produziu amplas consequências. [...]. Os dois primeiros séculos abássidas, até 945, foram um período de prosperidade e florescimento cultural sem precedentes: a clássica época de ouro da civilização muçulmana. (DEMANT, 2015, pg. 43, grifo nosso).

Hungria otomana a Áustria, acontecendo o primeiro revés importante do Império Otomano; 1801 acorre a expedição de Napoleão e ocupação francesa do Egito; 1925 tropas francesas ocupam a Síria. Entre os anos de 1943 e 1945 por

consequência da 2ª. guerra mundial, o ciclo das

independências define o perfil do mundo árabe e islâmico que perdura até os dias atuais (FARAH, 2011, p. 42-43).

A primeira fase da religião islâmica foi a dos califas, (seguidores da

mensagem do profeta), homens dotados de capacidade política e militar,

que por algumas décadas fortaleceu e manteve unido o mundo árabe, o

qual estigmatizado de nação primitiva, foi elevada a poderosa nação que

conquistou todo o Oriente Médio, África do Norte e, no século seguinte, a

Espanha, partes da Índia, Indonésia, China entre outras; transformando o

Islã hoje na religião com cerca de 1,7 bilhões de seguidores.

Devemos entender que os cismas, ao longo da história do Islã,

geraram muitos conflitos que não foram todos resolvidos definitivamente,

surgindo assim várias linhas de interpretação da fé, e diferentes formas

de organização sócio religiosa, dividindo o mundo islâmico em

praticamente dois significativos grupos os sunitas e xiitas. (PACE, 2005,

p.76-77). Ainda sobre esses dois seguimentos:

Sunita. Era um grupo que não concordava com uma sucessão hierárquica do profeta Muhammad para o califado, antes defendia apenas a tradição, ou seja, os reais registros orais e palavras e atos deixados pelo profeta.

Xiita vem de Shi’a que significa partidários. Esse segmento do islã, defendia que os Califados deveriam ser sempre aqueles que descendiam de Ali e Fátima, ou seja, membros da descendência do profeta Muhammad. Conservam a lista oficial dos que deveriam ter governado o mundo muçulmano. Observa Demant, que esse seguimento do Islã, se dispunha a uma fragmentação sectária e mística, defendendo que a liderança religiosa deveria ser sempre hierárquica, chegavam a crer que o profeta Muhammad retornaria, o denominado imã oculto Muhammad al-Mahdi (o Esperado). (DEMANT, 2015, p. 51, grifo nosso).

Outro fator já foi relatado na introdução deste trabalho (conf. p.

16-17), o crescimento do Islã conforme descrito por DEMANT (2015) se dá

por três causas: alta taxa de natalidade; a conversão de novos fiéis e a

fidelidade dos fiéis em permanecerem na religião.

Ainda sobre o crescimento histórico do Islã registra-se:

Depois das três primeiras fases de expansão (entre os séculos VII e XVIII), uma quarta fase foi provocada involuntariamente pela revolução industrial e pela colonização europeia durante os séculos XIX e XX. Na realidade, trata-se menos de uma onda que de um fluxo alimentado por conversões coletivas, principalmente na África negra e no Sudeste Asiático. De fato, nos países colonizados que foram parcialmente islamizados, o Islã tornou-se um refúgio da resistência popular, sendo percebido como uma religião do Terceiro Mundo em oposição aos colonizadores do Ocidente cristão. É necessário levar em consideração igualmente as importantes taxas demográficas que caracterizam os países em desenvolvimento em comparação com os países já industrializados. As ações violentas de grupos islâmicos contribuíram para diminuir o ritmo das conversões, mas esse fenômeno foi compensado pelas contribuições financeiras oferecidas sobretudo pela Arábia Saudita. Hoje em dia, considerando uma população que remonta a cerca de 860 milhões, um africano em cada dois é muçulmano, um em quatro é cristão e um em oito é católico-romano. [...] Na Europa Ocidental, calcula-se que haja mais de quinze milhões de muçulmanos imigrados, naturalizados ou não, dos quais cerca de cinco milhões (principalmente vindos da África do Norte) somente na França; três milhões e duzentos mil (predominantemente turcos ou curdos) na Alemanha; cerca de três milhões (na maioria indo-paquistaneses) na Grã-Bretanha; oitocentos mil na Holanda; mais de setecentos mil (em grande parte marroquinos) na Espanha; cerca de quatrocentos mil (quase todos originários do Magrebe ou turcos) na Bélgica; 350 mil na Suíça; trezentos mil na Grécia. Nos Bálcãs, existem cerca de três milhões na Albânia, outros tantos na Sérvia, dois milhões na Bósnia-Herzegovina, um milhão na Bulgária e duzentos mil na Romênia. (BALTA, 2010, p. 125-126).

Assim, em constante crescimento, o Islã se concentra em várias

partes do mundo, já ultrapassando o número de 1,5 bilhões de fiéis:

Desde o sul das Filipinas até a Nigéria. 25% dos muçulmanos habitam o Paquistão e a Índia, 20% sul do Saara, e 15% no sudeste asiático. Aproximadamente 15% vivem no mundo árabe. 10% na Rússia e China. 10% na Turquia, Iran e Afeganistão. O país com maior população muçulmana do mundo é a Indonésia com 200 milhões de muçulmanos. Além do mais, existem 5% na Europa, Norte e Sul das Américas e Austrália. As minorias mais numerosas se encontram na Rússia, Índia e África Central. Existem 8 milhões de muçulmanos nos Estados Unidos; calcula-se em média que de cada quatro pessoas no mundo uma é muçulmana, pelo que não nos deve parecer uma religião alheia ou estranha e fora da realidade. (PHILIPS, 2009, p. 60).

Outra causa da expansão islâmica, essa a mais recente, é o que

os estudiosos denominam como o ressurgimento do “Fundamentalismo

Islâmico”, movimento originário do seguimento xiita, onde líderes

intelectuais e religiosos (yatollah’s) insatisfeitos com a pobreza em

alguns países como no sul do Líbano, Irã e outros, criaram movimentos

sindicais com base religiosa para lutar pelos direitos civis dos xiitas e dos

fiéis mais marginalizados do mundo islâmico. Começando assim a ser

desenvolvido por esses líderes uma “exegese” social dos textos

sagrados do Alcorão, semelhantes à teologia da libertação que o

catolicismo fez na América Latina. Surge assim em décadas posteriores

a “globalização” dessas ideias, transcendendo do campo de luta

religiosa/social (Jihad Islâmica) para o campo político organizado

(PINTO, 2010, p. 155-159).

A nova configuração política islâmica contribuiu e ainda contribui

para a expansão da religião em todo o mundo.

Os novos partidos islâmicos não se colocam mais como uma vanguarda revolucionária que visa modificar a sociedade [com luta armada], mas sim como canais de expressão política de demandas emanadas de diferentes grupos e movimentos sociais. O islã aparece como um idioma cultural que permite a expressão das questões sociais em um quadro simbólico compartilhado, o qual permite a construção de relações de confiança nas estruturas e nos atores partidários. [... apesar que], a adaptação dos partidos e movimentos islâmicos ao jogo político liberal não impediu que processos de radicalização continuassem a existir em diferentes contextos. (Ibid. 2010, pg. 176-177).

Muhammad sabia que para a sua mensagem sobrevivesse era

necessário desconstruir o sectarismo árabe em relação aos novos

convertidos. A Ummah

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ensinava que a justiça social era a virtude

crucial do Islã. Os muçulmanos tinham como primeiro dever a construção

36 Umma ou Umma. Comunidade de crentes formada por todos os muçulmanos no

mundo. Jornal I, Pequeno Dicionário do Islamismo. Disponível em:

de uma comunidade caracterizada por uma compaixão prática, na qual

haveria uma distribuição justa de riqueza (ARMSTRONG, 2001, p. 45).

A unidade islâmica que se consolidou em Medina foi

marcadamente simbolizada pelo espírito de paz e comunhão, entretanto,

após a morte de Muhammad e com o fim do califado dos rashidun,

iniciou-se um período de expansão ainda mais amplo com os omíadas.

Durante essa etapa, as conversões ao islamismo eram desencorajadas

entre os “dhimmis” identificados como os judeus e cristãos que viviam no

território islâmico. As conversões, quando ocorriam, ainda tinham um

forte caráter étnico; havia, de certa forma, uma confusão entre islamismo

e arabismo. Os neo-convertidos eram, portanto, associados a alguma

tribo árabe, acarretando que fossem, quase naturalmente, ainda vistos

como cidadãos de segunda classe. A discussão terminou com o fim do

regime omíada e a ascensão dos abássidas. A questão sociológica

sectarista é até hoje uma questão a ser enfrentada pelo islã. O marco da

quebra de paradigma do arabismo se deu com o início da dinastia

abássida, que passou a dar chances iguais a muçulmanos não árabes,

que apesar de conflitos e revoltas, conseguiu garantir uma prolongada

época de paz. Isso proporcionou uma grande unidade e poder militar da

nação islâmica, registrando dois séculos de grande prosperidade e

crescimento cultural, denominada de a Clássica Época de Ouro da

civilização muçulmana. Foi nessa época que os processos de arabização

e a islamização configuraram o atual Oriente Médio em seus moldes

demográficos e étnicos (DEMANT, 2015, p. 43-44). O resultado dessa

configuração sociológica é transição para o próximo ponto a seguir.

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