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Mapa 3 – Localização das empresas visitadas na cidade de São Paulo

2. CONCENTRAÇÃO INDUSTRIAL DAS ATIVIDADES DE SERVIÇOS DE TI:

2.2. Formação da indústria de software e serviços de TI: desenvolvimento internacional e

2.2.1. Experiências internacionais

Os EUA foram os pioneiros na criação da indústria de software, com um papel importante do setor militar americano na “gestação” dessa indústria. Nos primórdios da indústria não havia uma separação entre o software e o hardware, o que atrelava às linguagens de computação à existência de uma máquina. Somente com o desenvolvimento de linguagens

mais complexas (como o Fortran) e a geração dos transitores foi possível a consolidação das atividades produtivas desse segmento de forma independente (PIANNA, 2011).

Com a disponibilidade do uso pessoal dos computadores, antes fortemente restrito às atividades científicas, o software ganhou, a partir do meio da década de 60, maior notoriedade. Segundo Roselino (2006), essa época foi marcada pela fase inicial do setor, com a produção de computadores em série e a separação dos produtos de software e hardware pela IBM, pioneiros no segmento.

Devido à sua formação, houve uma predominância da indústria de software nos Estados Unidos com uma série de vantagens, como as condições favoráveis da demanda, o suporte governamental e os avanços tecnológicos dos componentes eletrônicos semicondutores. Além disso, os EUA eram regiões que possuíam grande ligação com as universidades, pioneiras no desenvolvimento de tecnologia computacional.

Entretanto, o desenvolvimento dessa indústria também ocorreu em diferentes países centrais, como em alguns países da Europa e no Japão. Nessas regiões, as políticas públicas convergiam para o desenvolvimento de atividades com grandes competidores nacionais (para o caso da Europa) e atreladas ao desenvolvimento de outras indústrias intensivas em conhecimento – como a eletrônica, no caso do Japão (PIANNA, 2011).

Porém, no começo dos anos 90, as mudanças no mercado internacional e a ascensão da competição asiática mudaram a conformação dessa indústria. O foco da competição entre as grandes empresas foi deslocado da ramificação da estrutura interna da moderna corporação (altamente verticalizada) para as economias externas e de redes criadas pela interação entre empresas. Esse fenômeno foi chamado de paradigma da produção em rede, apresentado por Sturgeon (2002).

As economias externas geradas por essas redes permitiram o desenvolvimento de confiança, compartilhamento de capacitações entre indústrias, maiores oportunidades de aprendizado e de transferências de tecnologias. Ademais, esse modelo respondeu a nova preocupação das grandes empresas, a habilidade de reconfigurar elementos produtivos de acordo com as rápidas mudanças requeridas pelo sistema econômico, seja pela expansão dos mercados ou pela volatilidade da demanda a que estão expostas essas empresas (STURGEON, 2002).

Dessa forma, esse processo resultou em uma transformação fundamental na forma de operação internacional das grandes corporações e com isso também, nas empresas de software. As empresas foram impulsionadas tanto pelo novo contexto concorrencial, quanto pelas mudanças nas condições do mercado internacional.

A cadeia de valor passou a ser fragmentada com uma especialização maior das atividades realizadas em cada país ou região. A estrutura dos recursos estabelecida anteriormente foi racionalizada, de maneira a aproveitar economias de escala e escopo possibilitadas pela gestão de atividades produtivas geograficamente dispersas. Passou a ser comum, portanto, haver filiais mais especializadas e responsáveis por fornecer componentes ou uma determinada linha de produtos para o restante da rede em uma determinada região ou mesmo globalmente, ficando responsáveis inclusive por funções corporativas associadas a essa linha (UNCTAD, 1995 apud SARTI et al., 2010, p.10).

Com as redes, a produção passou a ser separada em módulos. Essa separação somente foi possível porque houve a possibilidade de quebras dentro da cadeia, mesmo em indústrias mais complexas, como a produção de eletrônicos. Essas quebras são pontos dentro do processo de produção que as informações podem ser altamente formalizadas/codificadas e, assim, transferidas. O local onde esses pontos aparecem são determinados por fatores técnicos, especialmente pela possibilidade de abertura e estabelecimento de padrões que determinam protocolos de especificações para a produção de diferentes módulos. A forma como as redes estão estruturadas proporciona a conservação de recursos de esforços humanos, através do reuso de sistemas já desenvolvidos (STURGEON, 2002).

Seguindo essa tendência de dispersão, no final dos anos 80 empresas estabilizadas como IBM, Nortel, Apple Computer, 3Com, HP, Maxtor e a Lucent moveram rapidamente para a terceirização suas montagens de placas de circuitos e de produtos. Diversas outras menores também passaram a terceirizar suas atividades: Sum Microsystems, Silicon Graphics, EMC, Cisco, etc. Tal movimento foi fator importante no crescimento dos grandes fornecedores de manufatura (STURGEON, 2002).

Dessa forma, as soluções modulares deslocaram a atenção das companhias para áreas de projetos e de marketing, e levaram a manufatura das grandes empresas a ser transformada em commodities. Devido à existência de novas opções de tecnologias e as consequências das pressões econômicas, as maiores corporações multinacionais se transformaram em organizações focadas em um conjunto menor de competências principais e a consolidação de marcas se tornou um fator importante de inserção nessas redes. Assim, a dinâmica baseada em redes levou à hierarquização das atividades produtivas no nível empresarial e internacional, gerando uma grande divisão internacional do trabalho comandada pelas empresas detentoras de marcas. Como apontou Sarti et al. (2010):

A viabilização da criação de valor no conjunto da rede supõe que no outro extremo estejam as empresas que realizam as funções mais periféricas, responsáveis por etapas padronizadas e definidas pelos elos superiores da cadeia. A realização dessas etapas não necessita obviamente do domínio dos mesmos ativos intangíveis definidos anteriormente e, por isso mesmo,

significa uma participação muito menor na apropriação do total do valor criado (SARTI et al., 2010, p.11).

A hierarquização dessas redes também se reproduziu no nível dos países. Ou seja, mesmo nos países em desenvolvimento a habilidade de gerar capacitações foi diferente. Alguns países conseguiram estabelecer marcas e se tornaram grandes empresas líderes nessas cadeias. Esse fenômeno de modularização, assim como em outros setores, modificou a estrutura interna das atividades de software. Permitiu que as atividades ligadas ao desenvolvimento de um software pudessem ser feitas de forma segmentada, independente e concomitante com outras etapas do processo produtivo. Esses módulos combinados de forma correta passam a integrar o produto final.

Esse fenômeno é de grande importância para entender a dispersão geográfica da indústria e a dinâmica concorrencial do setor, além de sua interação com as redes globais de produção e comércio. Com a modularização, as empresas conseguiram gerenciar de forma mais fácil e eficiente a produção segmentada, organizar os trabalhos paralelamente e independentemente e facilitar o aprimoramento futuro de suas atividades.

Segundo Diegues (2007), com as redes ocorreu uma visível diminuição das incertezas em relação ao produto e seu processo produtivo na indústria de software, além de vantagens nas atividades de inovação. Principalmente, os investimentos em inovações foram beneficiados, pois houve a diminuição dos riscos e incertezas quanto às capacitações necessárias de cada agente envolvido no desenvolvimento de algum projeto.

Com o desenvolvimento da indústria de forma modularizada e dispersa, alguns países não centrais se tornaram grandes players desse setor, como Índia e Irlanda. Esses países são exemplos de casos bem sucedidos do ponto de vista dessas redes, com bases exportadoras associadas a grandes multinacionais provenientes dos EUA. Esses países seguem um modelo denominado por Roselino (2006) como terciário-exportador, sendo tecnologicamente subordinadas às tecnologias desenvolvidas nos países centrais. As atividades desenvolvidas nesses países não se relacionam com o desenvolvimento de atividades produtivas locais mais consolidadas, mas sim com fornecedores de serviços

outsourcing para a indústria de software proveniente de países avançados.

Na Índia, conforme apresentado por Diegues (2007), o desenvolvimento da indústria está atrelado ao fomento à importação de hardware, altamente voltado para o desenvolvimento de softwares próprios para exportação. Ou seja, é uma indústria baseada em uma tendência “offshoring voltado à redução de custos”. A grande presença de mão de obra especializada em programação e o domínio da língua inglesa foram fatores importantes para a

consolidação dessas atividades no país. Como apontou Diegues (2007), com a entrada nas redes globais de produção do setor as empresas indianas se transformaram nos principais destinos globais dessas atividades, principalmente nos anos 2000. Com impactos positivos na renda e emprego, as funções desenvolvidas pelas empresas são consideradas hierarquicamente inferiores do ponto de vista das redes de produção global, com baixo grau de autonomia tecnológica (DIEGUES, 2007).

Já a Irlanda é outro caso de sucesso paradigmático baseado no modelo exportador. Nos país, durante os anos 90, uma série de incentivos fiscais foi direcionada para a atração de filiais multinacionais estadunidenses para o país. Essas empresas aproveitaram os incentivos fiscais e a proximidade com o mercado consumidor europeu para estabelecer suas atividades, o que tornou a Irlanda um grande centro de atividades baseadas no mercado Europeu. Basicamente, essas empresas ofereciam serviços de tradução e adaptação às diversas línguas da região (DIEGUES, 2007).

Por meio dessa caracterização, depreendem-se alguns pontos importantes dentro dessa dinâmica exportadora. Segundo Diegues (2007):

A partir do exame do modelo desenvolvimento da indústria de software em países paradigmáticos como Índia e Irlanda, o que se observa é que a acoplagem às redes globais de produção não necessariamente constituiu uma indústria local apta a desenvolver soluções com alto grau de sofisticação tecnológica. De maneira geral tais indústrias orientaram sua atuação majoritariamente para o mercado externo e se inseriram em elos menos nobres da divisão internacional do trabalho na indústria de software. Isso fez com que elas não conseguissem estabelecer um vínculo orgânico com as estruturas produtivas locais e assim, não se capacitassem para desenvolver um conjunto mais amplo de soluções tecnologicamente sofisticadas necessárias para atender as demandas potencialmente mais complexas destas estruturas produtivas locais (DIEGUES, 2007, p.123).

Israel é outro exemplo de modelo de desenvolvimento da indústria de software. Sua consolidação no final dos anos 60, como apontado por Roselino (2006), foi baseada na ascensão de políticas para o desenvolvimento de instituições de pesquisa e academia, com grande financiamento para o desenvolvimento de atividades tecnológicas, com ênfase nas empresas de software. Conjuntamente a esse sistema educacional, um grande fluxo de recursos humanos oriundos do bloco soviético foi primordial para a consolidação dessas atividades no país. Como exposto por Pianna (2011), na sua origem as empresas israelenses contavam com a presença de empresas de hardwares em território nacional, essas empresas além de gerarem expertise para as empresas de software, também demandavam soluções dessas empresas. Ou seja, diferentemente de outros países exportadores, a indústria israelense nasceu relacionada ao desenvolvimento doméstico, com apoio as atividades de P&D e de

recursos financeiros disponíveis para o seu desenvolvimento. Entretanto, atrelar o desenvolvimento israelense a um modelo de crescimento doméstico ainda é discutível, uma vez que grande parte do capital proveniente para essas empresas foi de origem norte- americana.

À luz desses modelos, percebe-se que todos os países que tiveram um grande sucesso na área de exportação de software apresentaram uma série de características que foram essenciais para a sua consolidação, como as políticas públicas voltadas especificamente para as atividades de exportação, a forte demanda internacional e a grande rede de internacional de relacionamentos, que permitiu movimento de migração de trabalhadores, componente fundamentais na construção de laços nessas redes.

Apoiado a esses pontos, uma característica comum às estruturas locais desses países: a aglomeração dessas atividades em clusters, com grande potencial de colaboração entre agentes (como os de Bangalore, na Índia e Dublin, na Irlanda). Adicionalmente, a disponibilidade de mão de obra com distintas qualificações possibilitou a consolidação dessas estruturas (PIANNA, 2011).

2.2.2. FORMAÇÃO DA INDÚSTRIA DE SOFTWARE E SERVIÇOS DE TI NO