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Experiências, práticas e/ou estratégias promotoras de desenvolvimento profissional

CAPÍTULO II — Revisão de dissertações e teses brasileiras sobre o início de carreira

2.3 Possibilidades e indícios de desenvolvimento profissional durante os primeiros anos de docência,

2.3.2 Experiências, práticas e/ou estratégias promotoras de desenvolvimento profissional

As dificuldades e os problemas evidenciados pelas pesquisas em relação ao início de carreira no Brasil remeteram-nos à busca de indícios de experiências, de práticas, de ações ou de estratégias relatadas pelas pesquisas que possamos interpretar como promotoras de desenvolvimento profissional.

Pudemos perceber que os professores iniciantes, ao analisarem a formação inicial, valorizam atividades e disciplinas que contemplem espaços de reflexão sobre a prática, sobretudo nas disciplinas de Prática de Ensino e Estágio Supervisionado (CAMARGO, 1998; ROCHA, L., 2005).

Vieira (2002) afirma que nem sempre a relação com a realidade e com as culturas de caráter essencialmente dinâmico é desvelada ao longo da formação inicial, pois começa a

ser fundamentada antes e durante essa formação. A autora relaciona reflexão — um processo a ser trabalhado ainda na formação inicial — com o aprender a ser professor.

A reflexão é o processo pelo qual os professores iniciantes se vão constituindo e consolidando na prática docente, em movimento de avaliação da profissão. Essa avaliação envolve análises reflexivas tanto da formação, quanto da cultura escolar ou da prática docente (GUARNIERI, 1996). Segundo a autora, os professores iniciantes, através da reflexão, buscam transformar o padrão de seu próprio trabalho e desenvolver-se profissionalmente. Essas avaliações também são referidas de modo semelhante em outras pesquisas que apontam a importância das reflexões sobre o trabalho docente, uma prática promotora de desenvolvimento profissional (PASSOS et al., 2006).

Vieira (2002) aborda tipos de reflexão, afirmando que quanto mais se assumem e se compartilham as incertezas, maior se torna a possibilidade de aprender nessa fase inicial da carreira. Os indícios apontam que uma prática promotora de desenvolvimento profissional esteja nas reflexões coletivas sobre a prática docente e no apoio específico aos professores iniciantes (CUSATI, 1999; GAMA, 2001).

De outro modo, as reflexões coletivas apareceram em diversos trabalhos, que apontaram sua influência no desenvolvimento profissional dos professores iniciantes, quando estes estiveram como sujeitos das pesquisas revisadas. Cabe destacar que os autores enfatizaram as dificuldades para localização dos professores iniciantes, pois normalmente sofrem ruptura com a universidade após o término da licenciatura e muitas vezes não possuem estabilidade no emprego, além de terem pouca disponibilidade de tempo.

Não obstante, o trabalho de Amorin (2002) revela a satisfação dos sujeitos em participar do próprio processo de pesquisa:

[...] ao encontrar, através dessa investigação, um espaço para partilharem suas experiências de iniciação docente e revelar a angústia e a solidão vividas nessa fase da carreira e a necessidade de apoio no enfretamento de dificuldades, possibilitando uma maior autonomia profissional por parte do professor. (AMORIN, 2002, p. 154)

A pesquisa de Freitas (2000) também constatou que, durante as entrevistas, várias professoras fizeram associações que não haviam feito antes. Este fato levou a pesquisadora a interpretar que elas tinham poucas oportunidades ou poucos interlocutores com os quais poderiam compartilhar seus sentimentos e pensamentos.

Nesse sentido, Rufino (2000) complementa, ao avaliar a posteriori sua metodologia de pesquisa junto aos professores iniciantes, e conclui: “se tivesse envolvido as professoras em um ambiente de reflexão coletiva sobre suas práticas, não somente teria se apropriado de seus saberes e da complexidade da docência, havendo possibilidade de ressignificacão de saberes compartilhados” (p. 145).

Martins (2002), em sua metodologia de pesquisa, valorizou a interação com os sujeitos — professores iniciantes —, utilizando reuniões de acompanhamento e de planejamento na perspectiva de supervisão apresentada por Alarcão (2005), uma atividade de natureza psicossocial, de construção intra e interpessoal, visando ao desenvolvimento profissional dos professores nas dimensões de conhecimento e ação docentes. A atividade de supervisão “joga-se na interação entre o pensamento e ação, com o objetivo de dar sentido ao vivido e ao conhecido, isto é, de compreender melhor para melhor agir” (ALARCÃO, 2005, p. 66).

Em relação aos encontros, Martins (2002) descreve como:

Oportunidade em que lemos, refletimos, trocamos experiências, interagimos. Pelos relatos das professoras, nas reuniões, notamos que elas, após alguns estudos e trocas de experiências já demonstravam vontade de inovar, demostraram já estar trabalhando o texto com maior freqüência. (MARTINS, 2002, p. 245).

Diniz (2001), também em relação aos aspectos coletivos em sua metodologia de pesquisa, previa inicialmente dois a três encontros coletivos da pesquisadora com professores em início de carreira que atendessem ao convite. Porém, a identificação dos sujeitos com a problemática da pesquisa, ou seja, com a discussão das dificuldades iniciais enfrentadas suscitou a continuidade dos encontros do grupo. Segundo a autora: “A própria problemática da investigação vinha ao encontro da problemática vivida por aqueles professores [...] e suscitou uma continuidade, que emergiu do próprio grupo,resultando em vinte e sete encontros e uma formação continuada, uma produção coletiva, independente da pesquisa.” (p. 28).

Além disso, a autora (op.cit) descreve que, ao voltarem à universidade para narrar seus encontros e desencontros vividos no seu início de carreira docente, os iniciantes reencontravam seus pares, rompendo o isolamento e a solidão vivida em seus locais de

trabalho e constatavam que as dificuldades e as necessidades profissionais não eram individuais: embora aí contidas, elas eram comuns a todos. Nesses encontros, apesar de não explicitar sua concepção de desenvolvimento profissional, Diniz (1998) parece atribuir outro olhar para a formação dos iniciantes:

Nos primeiros encontros houve uma “catarse coletiva” em que todos os professores expuseram, de forma desordenada, suas angústias trazidas da sala de aula. Havia nessa catarse uma busca de “receitas prontas” para a melhoria de suas práticas, havendo uma recusa em “atendê-las”, uma vez que não era esse o objetivo do trabalho. [...] Tomou-se como ponto de partida a experiência dos professores no cotidiano escolar. (p. 28)

Por outro lado, no trabalho de Vieira (2002), encontramos em uma professora iniciante pesquisada por ela, indícios de sua busca por um espaço de interlocução sobre o trabalho pedagógico, “criando um grupo de discussão fora da escola, foi um gesto de resistência impulsionado pelo sofrimento provocado pela solidão afetiva e pelo isolamento” (p. 118). O fato de promover situações coletivas de reflexão também parece representar uma prática promotora de desenvolvimento profissional.

Gori (2000), em outra perspectiva, também investigou a importância do contexto escolar em relação ao aspecto coletivo, e concluiu que “foi possível perceber um diferencial na prática dos professores que participam do trabalho coletivo das escolas onde trabalham e procuram se inserir em todas as atividades, mesmo naquelas que não são específicas da disciplina” (p. 106).

Nas pesquisas de Freitas (2000) e de Rocha, L. (2005) é discutido que as aprendizagens não ocorrem apenas por existirem encontros coletivos, mas pelo fato de estes serem mediados por reflexões compartilhadas.

Silveira (2002), em seu estudo sobre a própria prática como iniciante, menciona uma iniciativa de formação continuada ocorrida como parte de um convênio entre uma universidade pública e a Secretaria Municipal de Educação. Esse projeto foi realizado em uma escola com todos os professores nos HTPCs13, que parecem apresentar características do conhecimento “na” prática (COCHRAN-SMITH e LYTLE, 1999), priorizando a interação e a mediação de consultores externos. A pesquisa procura mostrar que, apesar de todas as condições objetivas, é possível alcançar resultados positivos e os professores

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iniciantes aprendem a ter clareza do significado do trabalho docente; a ter consciência do trabalho humano; a buscar competência técnica e paixão, com incorformismo.

Outra concepção ou possibilidade de formação continuada foi encontrada em Rocha, L. (2005), sobretudo ao revelar a possível relevância da participação em grupos de estudo, de um de seus sujeitos, com características colaborativas14 e com práticas baseadas fundamentalmente em reflexões compartilhadas e em investigações sobre a prática docente, para o desenvolvimento profissional dos professores iniciantes.

Os resultados dessas pesquisas apresentam fortes indícios sobre a importância, na fase inicial da docência, de práticas promotoras de desenvolvimento profissional, como os diversos tipos de reflexão individual, coletiva e/ou colaborativa e investigativa sobre suas práticas pedagógicas em diferentes contextos: na formação inicial, na escola e na formação continuada. Em síntese, os estudos evidenciam que os espaços coletivos de reflexão podem representar uma alternativa de apoio para uma iniciação à docência menos traumática, principalmente se ancorados em discussões, em aprendizagens e em investigações sobre a própria prática e sobre a prática de outros professores.

Além dessas evidências, no intuito de contribuir com futuros programas de apoio para o início de carreira docente, destacamos a seguir algumas recomendações dos trabalhos, em relação à formação contínua dos professores.