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Experimentos de espalhamento de luz dinâmico correlacionados com a redução de atrito hidrodinâmica.

2. Fundamentos sobre as técnicas utilizadas no trabalho

4.3 Experimentos de espalhamento de luz dinâmico correlacionados com a redução de atrito hidrodinâmica.

Outro aspecto avaliado nesse trabalho foi em relação ao tamanho das micelas gigantes. É sabido que os agentes redutores de atrito devem apresentar cadeias longas e flexíveis para atenuar a perda de carga no regime turbulento.13,33,46 Dessa

forma, estimou-se a dimensão dos agregados através da técnica de DLS. Os métodos de espalhamentos são uma das principais técnicas disponíveis para extrair informações estruturais relevantes.47 O espalhamento de luz dinâmico é comumente

utilizado para determinação do raio hidrodinâmico dos objetos espalhadores. Porém, o raio hidrodinâmico é calculado a partir da equação de Stokes-Einstein (ver Equação

8), onde é assumido que objeto espalhador é aproximadamente uma esfera.48 No

entanto, sabe-se que as micelas gigantes são objetos alongados com grande razão de aspecto. Portanto, apesar do raio hidrodinâmico ser definido como o raio de uma esfera rigída que se difunde na mesma taxa que o objeto espalhador em observação, optou-se por apresentar o tempo de decaimento como uma propriedade proporcional ao tamanho do objeto espalhador.

Além disso, o objetivo principal desse estudo foi de correlacionar a dimensão dos agregados com os fenômenos de redução de atrito em uma tentativa de elucidar o que ocorre com os agregados em regiões próximas à temperatura crítica. Por se tratar de experimentos realizados em regimes completamente distintos, sendo o regime turbulento para os experimentos de redução de atrito e o regime browniano para as medidas de espalhamento de luz, é inviável garantir que as dimensões obtidas pelo espalhamento de luz realmente condizem com a estruturas das micelas gigantes no regime turbulento.

Frente as considerações descritas, já foi demonstrado que a técnica de DLS pode ser utilizada para estimar a dimensão de micelas gigantes através de medidas controles realizadas em ângulos distintos. O fato do resultado obtido ser independente do ângulo do detector garante que a medida se trata da difusão do agregado como um todo, e não apenas de uma fração da micela gigante.49

Em seguida, determinou-se o tempo decaimento característico para uma solução contendo micelas gigantes formadas por TTAB e NaSal em razão molar igual a 1,0 e concentração de 2,0 mmol L-1, o mesmo sistema que vem sido discutido. O

estudo foi conduzido em diversas temperaturas. Porém, com o aumento da temperatura a contagem de fótons foi gradativamente reduzida até valores muito baixos (ver Figura 25), de forma que a reprodutibilidade da medida fosse comprometida.

Figura 25 – Contagem de fótons em função da temperatura para experimentos de DLS realizados com uma solução de TTAB e Salicilato de sódio em proporção equimolar e concentração de 2,0 mmol L-1.

A temperatura crítica, determinada pelos experimentos de HDR, para esse sistema é de aproximadamente 41 °C (ver Figura 20). Porém, nota-se que a caracterização desse sistema por espalhamento de luz dinâmico é inviável em temperaturas acima da descrita. Como alternativa para a investigação adotou-se um novo sistema como objeto de estudo.

Em nosso grupo de pesquisa, uma série de estudos têm sido realizados com cossolutos aromáticos derivados do ácido benzoico com átomos de cloro em diferentes posições substituintes, que formam micelas gigantes quando combinados com surfactantes catiônicos. Já foi reportado na literatura a habilidade desses cossolutos de trigarem a formação de micelas gigantes.50 Além disso, a presença dos

átomos de cloro acrescenta uma grande vantagem para as medidas de espalhamento, relacionadas com o aumento de contraste em relação à luz espalhada por conta do índice de refração e consequentemente um aumento na intensidade de espalhamento.

Na Figura 26 é apresentado os dados de redução de atrito hidrodinâmico correlacionados com os dados de espalhamento de luz dinâmico para ambos os sistemas: TTAB + NaSal e TTAB + 3,4-DCB. Os dados em vermelho são correspondentes ao sistema formado por TTAB e salicilato de sódio, sendo que os quadrados vazios são os dados de espalhamento de luz e estão relacionados com o eixo da esquerda. Já a linha contínua corresponde aos dados de redução de atrito hidrodinâmica, relacionados com o eixo direito. Os dados em azul são

correspondentes ao sistema formado por TTAB e 3,4 diclorobenzoato, onde a mesma lógica é aplicada. 26 28 30 32 34 36 38 40 42 44 46 48 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 Temperatura / °C  3,4 DCB  NaSal HDR NaSal HDR 3,4 DCB HDR Água Te mp o d e d eca imen to / m s To rq ue /  N m 1100 1200 1300 1400 1500 1600

Figura 26 –Valores de tempo de decaimento obtidos através de experimentos de

espalhamento de luz dinâmico, em função do aumento de temperatura para sistemas formados em proporção equimolar de TTAB e NaSal (vermelho) e TTAB e 3,4-DCB (azul) em comparação com os dados de experimento de redução de atrito para ambos os sistemas. O eixo da esquerda corresponde aos valores de tempo de decaimento e o eixo da direita corresponde aos valores de torque.

Os valores de tempo de decaimento, assumidos como proporcionais ao tamanho dos agregados, diminuem com o aumento da temperatura, concordando com os modelos (ver Equação 2) que preveem o decréscimo do comprimento de contorno das micelas gigantes, sendo que o mesmo comportamento foi observado para os dois sistemas. Por outro lado, fora do regime Browniano, sob turbulência, o fenômeno de redução de atrito é dependente de características do agente redutor como seu tamanho e flexibilidade.46 Portanto, considera-se contra intuitivo esperar

que a habilidade de redução de atrito, como observado nos diagramas, aumente progressivamente com o aumento de temperatura, uma vez que seria esperado a diminuição do tamanho das micelas gigantes. Assim, é possível propor que o cisalhamento imposto ao sistema, de alguma forma atue impedindo que os agregados

diminuam de tamanho. Em outras palavras, a variação da propriedade determinada no regime Browniano, como o tempo de decaimento, decresce continuamente com o aumento da temperatura, enquanto que, em regime turbulento, a curva do torque apresenta a descontinuidade característica.

Quanto a essas características será proposto duas hipóteses. 1) A influência do cisalhamento nas propriedades termodinâmicas.

A literatura reporta alguns efeitos do cisalhamento sobre propriedades termodinâmicas de sistemas.51 Em 1984, Wolf52 se baseou na Teoria de Flory-

Huggins para avaliar o efeito do fluxo sobre a variação da energia livre para poliestireno em transdecalina. Ele observou que, sob fluxo, as soluções de poliestireno de baixa massa molecular (5.000 g mol-1) apresentam separação de fases

(cloud point) em temperaturas mais baixas do que em repouso. No entanto, para poliestireno de maior massa molecular (1.700.000 g mol-1) maiores temperaturas são

exigidas. Este resultado foi atribuído aos efeitos não-Newtonianos que surgem quando o polímero de alta massa molecular encontra-se sob fluxo. Wolf argumenta que a razão para as diferenças observadas é a de que as macromoléculas armazenam energia quando em fluxo e, que devido ao cisalhamento, diferenças de temperatura de separação de fases de até 100 °C são observáveis.

Sob cisalhamento, Wolf propõe que a variação da energia livre molar de mistura por segmento polimérico pode ser escrita de acordo com Equação 10.

∆𝐺̅𝛾̇ = ∆𝐺̅𝑧 + ∆𝐸̅𝑠 – Equação 10

Sendo que ∆𝐺̅𝑧 é a variação da energia livre de Gibbs de mistura para a situação em que o sistema está em repouso e ∆𝐸̅𝑠 se refere a energia armazenada nas cadeias poliméricas em determinado fluxo estacionário.

∆𝐸̅𝑠 é determinado a partir da diferença de energia armazenada pelos componentes puros do sistema sob fluxo, 𝐸̅𝑠𝑖, em relação à mistura, 𝐸̅𝑠. A Equação

11 correlaciona estas variáveis.

∆𝐸̅𝑠 = 𝐸̅𝑠− (𝜑1𝐸̅𝑠1+ 𝜑1𝐸̅𝑠2 ) – Equação 11

𝐸̅𝑠 = 𝑉𝑠𝑒𝑔

𝜏0

𝜂0 (𝜂𝛾̇)

2 – Equação 12

Sendo 𝑉𝑠𝑒𝑔 o volume molar do segmento polimérico,  e  a viscosidade e o tempo de relaxação característico, respectivamente. O índice 0 indica o comportamento no regime de viscoelasticidade linear.

Baseado nestes aspectos, é possível considerar que a presença de uma tensão cisalhante seja capaz de modificar a energia livre das moléculas presentes nos agregados das micelas gigantes.

Com relação as questões termodinâmicas, o potencial químico padrão de determinada micela gigante (𝜇𝑔0) que possui 𝑔 moléculas do surfactante em sua cadeia é dada pela Equação 13.

𝜇𝑔0 = (𝑔 − 𝑔

𝑐𝑎𝑝)𝜇𝑐𝑖𝑙0 + 𝑔𝑐𝑎𝑝𝜇𝑐𝑎𝑝0 – Equação 13

Onde 𝑔 é o número de moléculas de surfactante na micela inteira, 𝑔𝑐𝑎𝑝 é o

número de surfactante nos endcaps e (𝑔 − 𝑔𝑐𝑎𝑝) é o número de moléculas no corpo

cilíndrico da micela, 𝜇𝑐𝑖𝑙0 é o potencial químico padrão das moléculas no corpo cilíndrico da micela e 𝜇𝑐𝑎𝑝0 é o potencial químico padrão de cada molécula dos caps.

A mudança no potencial químico das micelas gigantes pode estar relacionada com o fato de que a propriedade medida em repouso (DLS) variar continuamente com a temperatura, enquanto que sob cisalhamento intenso (HDR), observa-se a descontinuidade característica. De acordo com esta interpretação, as cadeias micelares se mantém longas, mesmo com o aumento da temperatura, permitindo a observação do fenômeno de redução de atrito hidrodinâmico em temperaturas em que as cadeias correspondentes em regime Browniano seriam curtas demais para que fosse observado o efeito. Assim, devido ao cislhamento, 𝜇𝑐𝑖𝑙0 se mantém baixo em relação à 𝜇𝑐𝑎𝑝0 , de forma que é possível manter a grande dimensão das micelas

gigantes. No entanto, a partir da temperatura crítica característica, a micela se fragmenta, resultando na perda da capacidade de manter a redução do atrito hidrodinâmico.

2) A redução de atrito e o tamanho crítico do agente redutor.

Já foi reportado por Hoyt53, através de um estudo realizado com soluções

poliméricas de PEO, que o fenômeno de redução de atrito hidrodinâmico é dependente tanto da concentração de polímeros quanto de sua massa molar média. Foi observado que o aumento da massa molar garante um aumento na porcentagem de redução de fricção, sendo esse aumento mais significativo com o aumento da concentração (ver Figura 27).

Figura 27 – Redução da fricção com soluções aquosas de PEO de diferentes massas

molares médias e concentrações de 3, 5, 10, 30 e 500 ppm. (Figura da referência 53)

Conforme pode ser observado na Figura 27, no caso de 10 ppm de PEO de massa molar 5 106 g mol-1, a máxima capacidade de redução de atrito é observada

( 68%). No entanto, se a massa molar é reduzida 10 vezes (5 105 g mol-1), a

capacidade de 10 ppm em reduzir o atriito é diminuída para 20%.

Tendo isso em vista, outra possível explicação para a aparente divergência entre os resultados dos efeitos térmicos nos dois regimes (Brwoniano e turbulento) está associada apenas com os fenômenos mecânicos do processo de redução de atrito. Dessa forma podemos interpretar que o aumento da temperatura leva a redução progressiva do tamanho médio dos agregados, garantindo um aumento na concentração de micelas gigantes, porém com dimensões menores. Além disso, com agregados menores a viscosidade da solução certamente diminui. Dessa forma, se

as micelas ainda são longas o suficiente para reduzir o atrito, a viscosidade passa a desempenhar um papel menor frente ao fenômeno de redução de atrito como discutido nos resultados de HDR em diferentes rotações). Portanto, a combinação das características de aumento de concentração e diminuição de viscosidade implicariam em um aumento progressivo da redução de atrito. No entanto, tal eficiência ocorre apenas até o limite da temperatura crítica a qual corresponde a um tamanho mínimo necessário para garantir a redução de atrito. No entanto a transição não ocorre de maneira vertical, devido a distribuição de tamanho, onde pequenas populações com tamanhos maiores são capazes de prolongar o efeito por uma pequena faixa de temperatura acima da temperatura crítica.

Para complementar o estudo que visa correlacionar o tamanho dos agregados com o experimento de redução de atrito, elaborou-se o seguinte experimento. Termostatizou-se a solução de micelas gigantes por 15 minutos em diferentes temperaturas para que o experimento de HDR fosse iniciado com o agregado em solução com diferente tamanhos, uma vez que o tamanho das micelas gigantes no regime quiescente decresce com o aumento da temperatura, como mostrado na

Figura 26. Em outras palavras, quanto maior a temperatura inicial, menor seria o

25 30 35 40 45 50 1000 1100 1200 1300 1400 1500 25 35 38 40 42 45 Torque / N m Temperatura / °C a) 25 30 35 40 45 50 25 35 38 40 42 45 Torque / u.a . Temperatura / °C b)

Figura 28 – Experimentos de redução de atrito realizados com solução de TTAB e

NaSal em concentração de 2,0 mmol L-1 e razão molar igual a 1,0 em rotações de

900 rpm. Cada curva representa um experimento que foi iniciado em uma diferente temperatura inicial. Todas as amostras foram termostatizadas por 15 minutos antes de dar início à análise. Em a) é apresentado os valores de torque absolutos obtidos no experimento. Em b) os valores de torque são apresentados com unidades arbitrárias, uma vez que as curvas foram deslocadas ao longo do eixo y para melhor visualização.

Nota-se que variações na temperatura inicial do experimento não provocam mudanças significativas no valor do torque esperado para cada temperatura. É possível observar que as curvas não se sobrepõem exatamente, porém é difícil de apontar alguma tendência. No entanto, observa-se que independente da temperatura inicial o sistema atua como redutor de atrito. Aparentemente, as transições características que ocorrem nessas curvas se tornam menos sutis quando o sistema se aproxima da temperatura crítica. Nota-se que a curva de 40, 42 e 45 °C apresentam inflexões menos suaves. É possível que o comportamento descrito esteja associado com a distribuição de massa molar em torno de um valor médio. Com o aumento da temperatura, uma fração menor de micelas gigantes se mostra apta para produzir o fenômeno.

Com base nos resultados apresentados, é possível inferir que a hipótese 2, relacionada com a de redução de atrito e o tamanho crítico do agente redutor de atrito, seja a mais provável para explicar as diferenças de comportamento térmico observado quando as micelas gigantes estão nos dois regimes.

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