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3.1 ENSINO, PESQUISA, EXTENSÃO E ADMINISTRAÇÃO

3.1.3 Extensão

A extensão universitária como já descrita anteriormente é um dos três pilares estabelecidos na Constituição Federal brasileira como sendo indissociável ao ensino e à pesquisa no exercício da profissão dos docentes universitários, assim como deve também fazer parte da formação do discente universitário49.

A resolução nº 7, de 18 de dezembro de 2018 (BRASIL, MEC, 2018) estabelece as diretrizes da extensão universitária, definindo “os princípios, os fundamentos e os procedimentos que devem ser observados no planejamento, nas políticas, na gestão e na avaliação das instituições de educação superior de todos os sistemas de ensino do país”(artigo 1o).

De acordo com a referida resolução, artigo 3o a extensão universitária pode ser definida como:

Art. 3º. A Extensão na Educação Superior Brasileira é a atividade que se integra à matriz curricular e à organização da pesquisa, constituindo-se em processo interdisciplinar, político educacional, cultural, científico, tecnológico, que promove a interação transformadora entre as instituições de ensino superior e os outros setores da sociedade, por meio da produção e da aplicação do conhecimento, em articulação permanente com o ensino e a pesquisa. (grifo nosso)

Em seu artigo 7o a resolução esclarece que “são consideradas atividades de extensão as intervenções que envolvam diretamente as comunidades externas às instituições de ensino superior e que estejam vinculadas à formação do estudante, nos termos desta resolução, e conforme normas institucionais próprias” (grifo nosso), ou seja, as atividades de extensão são as atividades praticadas por docentes que possuem relação com o ensino e a pesquisa, mas que devem necessariamente envolver comunidades externas e estarem vinculadas à formação de estudantes. De acordo com o artigo 8º. existem cinco modalidades de extensão, que seriam: programas, projetos, cursos e oficinas, eventos e prestação de serviços.

Sobre as atividades de extensão em música, Costa, Baiotto e Garces (2013) acreditam que ela “potencializa e estimula a aprendizagem, tornando-a mais humana na medida em que estreita os laços da universidade com a realidade econômica, social, política e cultural e quebra

49 A resolução nº 7, de 18 de dezembro de 2018 (BRASIL, MEC, 2018) em seu artigo quarto estabelece que: “as atividades de extensão devem compor, no mínimo, 10% (dez por cento) do total da carga horária curricular estudantil dos cursos de graduação, as quais deverão fazer parte da matriz curricular dos cursos”. (BRASIL, MEC, 2018)

a visão dualista da razão instrumental, que foi dominante por longo período nas instituições sociais”. (COSTA, BAIOTTO & GARCES, 2013, p. 62).

A extensão universitária é, portanto, uma importante conexão da universidade com a sociedade. Através da extensão a universidade socializa e universaliza o conhecimento gerado dentro da instituição com a comunidade. As pesquisas e os conhecimentos desenvolvidos não podem ser vistos como um produto em si mesmos e por isso a extensão é tão importante, por ajudar a divulgar e promover esses conhecimentos gerados.

Já Cruvinel (2013) destaca a importância da extensão para os cursos relacionados à cultura dentro das universidades. Para a autora, as universidades públicas brasileiras desde o princípio se mostraram abertas às manifestações culturais que ocorriam dentro e fora de seus

campi, assim como as incentivavam sempre que possível. No entanto, destaca que nas últimas

duas décadas houve um esforço maior das instituições em construir uma política de maior interação entre universidade e sociedade, construindo e democratizando o acesso à cultura.

Ainda nos dias de hoje, a extensão universitária na área da música costuma estar bastante presente nas universidades, sobretudo através de projetos de ensino de música. Como para o ingresso no ensino superior, em geral, há a necessidade de conhecimento prévio avaliado no momento do ingresso através de um Teste de Habilidade Específica (THE), é comum que as universidades possuam cursos direcionados para iniciantes. Esses cursos servem como uma espécie de “preparatório” para futuros alunos interessados em ingressar nos cursos de graduação, fornecendo subsídios para tal. Urgel (1997) tem opinião nesse sentido, de que na área da música, “a extensão cumpre um importante papel na comunidade não só formando músicos e apreciadores de música, mas também dando subsídios para estudantes adentrarem nos cursos de graduação em música das universidades”.

Pelo fato de a maioria das universidades ainda cobrarem o THE, esses cursos de extensão voltados aos alunos de níveis iniciantes e intermediários são muito importantes no sentido de preparar os futuros ingressantes dos cursos superiores. Além desses cursos, a extensão nas universidades de música pode contar com diferentes tipos de abordagem, seja a do ensino individual/coletivo, shows, apresentações públicas, apresentações voltadas para a formação de plateia, grupos de câmara, orquestras, bandas, entre outros.

Para Louro (2003, p.103) a extensão universitária na música é de extrema importância, pois revela uma faceta do docente universitário como “gerador de uma ‘movimentação musical dentro da cidade’”. Nesse sentido, ressalta a autora, o professor de instrumento é responsável por incentivar e movimentar a vida cultural da cidade, promovendo apresentações públicas entre docentes, discentes e pessoas da comunidade. O professor de música teria então, a função

social de promover a cultura na cidade em que vive e proporcionar à sociedade uma democratização do acesso à cultura.

A promoção e o incentivo para que alunos toquem em diferentes espaços e dialoguem com a sociedade pode inclusive gerar possibilidades de trabalho futuras para esses discentes. A partir do momento que a vida cultural da cidade passa a ser mais estimulada, há o surgimento de oportunidades de trabalho, seja com a performance musical ou com o ensino de música.

Ainda segundo Louro (2004, p. 102 et seq) os professores entrevistados informaram que suas atividades extensionistas costumam ser “eventos pontuais, como cursos de uma semana ou concertos ou cursos de longa duração”. Sobre os cursos de longa duração promovidos pelas universidades, os professores possuem opiniões diferentes sobre a sua existência. Parte deles compreende que esses cursos são fundamentais na preparação dos futuros alunos que ingressarão no ensino superior, já os demais acreditam que essa não deveria ser uma função da universidade, mas de outras instâncias externas a ela, como as escolas de ensino regular.

Um grupo relatou a grande satisfação do público que frequenta esses cursos de extensão e da diversidade de possibilidades a serem ofertadas pela universidade, seja através do ensino ou do fazer musical. Relatam ainda que eventos, festivais de música com concertos,

masterclasses e semanas dedicadas a determinados instrumentos levam o trabalho realizado

dentro da universidade para “fora de seus muros”, promovendo uma maior integração com a comunidade.

Já um outro grupo acredita que a universidade deva se preocupar somente com o ensino em nível avançado. Ainda que compreendamos que outras instituições externas à universidade possam fazer o trabalho de iniciação musical e o ensino de instrumentos para jovens, adultos em níveis iniciante, básico e intermediário, não cabe acreditar que a universidade deva se preocupar exclusivamente com o ensino musical em nível profissional. A CRFB/88 estabelece a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, portanto não há como argumentar que a universidade não deva se ocupar com o ensino na extensão às pessoas da comunidade (em diferentes níveis de aprendizado musical). Advogar que a universidade deva se preocupar somente com o ensino em nível superior e diminuir ou menosprezar a importância da extensão demonstra uma falta de conhecimento sobre as funções do docente universitário, assim como da universidade e sua função social, além de promover uma visão elitista do ensino musical somente para “alguns”.

A autora salienta ainda que parece haver uma confusão a respeito do que seriam as atividades de extensão voltadas à subárea de práticas interpretativas mesmo no ambiente universitário. Guimarães (1997, p.57) apud Louro (2004, p.103) afirma que para que haja

realmente atividade de extensão é necessária “uma relação interativa entre universidade e sociedade, de modo que haja um fluxo entre conhecimento acadêmico e o popular com a finalidade de produção de um novo saber”. Com relação a essas dúvidas que existiam sobre o que deve ou não ser considerado extensão na área de música, cremos que a resolução nº 7, de 2018 (BRASIL, MEC, 2018) já possa ter sanado as controvérsias existentes.

Galizia (2007, p.31) por sua vez, afirma que mesmo sendo estabelecida em lei a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, na prática há uma ruptura entre as três atividades e a identidade do docente universitário. O autor acredita que os próprios mecanismos de avaliação dos professores tendem a valorizar mais a pesquisa que as demais atividades. Nesse sentido, vê-se uma hierarquia entre essas atividades, onde alguns autores acreditam ser a pesquisa a mais importante e outros o ensino.

A extensão é o elo responsável por dividir com a sociedade os saberes criados através do ensino e da pesquisa, entretanto, a percepção é de que ela é vista como o elo mais frágil deste tripé. Na pesquisa de Galizia (2007, p.4 et seq), é possível perceber entre os professores entrevistados que a extensão acaba sendo a atividade mais marginalizada nas universidades. A falta de tempo, o acúmulo de funções, tarefas e a falta de interesse de parte dos docentes faz com que ela seja tão desprestigiada. Acreditamos também que outro motivo para esse desprestígio esteja relacionado ao fato de grandes instrumentistas não quererem lecionar para iniciantes ou pessoas em nível intermediário. Há uma visão em nossa área de conhecimento de que um instrumentista de renome lecionar para iniciantes seria um desprestígio, o grande instrumentista só quer ensinar os alunos “talentosos” ou “geniais”, aqueles que ganharão concursos e que elevarão o nome do próprio mestre no ambiente musical. Esse pensamento está de acordo com as visões conservatoriais românticas apesentadas no capítulo anterior e diz mais sobre um individualismo e egocentrismo do professor (ou seria mestre?) do que sobre o que deveria efetivamente ser o ensino de música no século XXI.

Assim, as atividades de extensão na universidade devem ser compreendidas por todos como de grande importância, pois “a atividade social fora e dentro do campus é atividade promotora da construção de um conhecimento-na-ação, conduzido pelo refletir-na-ação” (SANTOS, 2003, p.67). Oensino deve ser sempre prático-reflexivo e as atividades de extensão, assim como as demais, devem fazer parte da formação do discente do início ao fim do processo de aprendizagem durante toda a graduação, devolvendo à sociedade o investimento feito por ela.