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Factores Protectores e Factores de Risco Associados aos Abusos Sexuais

3. Prevenção dos Abusos Sexuais de Crianças

3.2. Factores Protectores e Factores de Risco Associados aos Abusos Sexuais

Não existe um factor de risco isolado que só por si seja causa suficiente e necessária para o abuso sexual. Existem, no entanto, modelos etiológicos que apresentam factores individuais, familiares e socioculturais que podem aumentar a possibilidade deste tipo de abusos. Por outro lado, existem determinados factores que podem funcionar como factores protectores ou barreiras ao abuso sexual das crianças. Wurtele & Miller-Perrin (1992) elaboraram uma listagem de possíveis factores de risco e factores protectores dos abusos sexuais de crianças. De acordo com este modelo assume-se que quanto mais forem os factores de risco presentes nos vários sistemas maior será a probabilidade de existir abuso sexual e quanto menos factores protectores existirem maior será a possibilidade de haver abusos sexuais. Esta conceptualização multifactorial sugere que a redução da incidência dos abusos sexuais de crianças pressupõe uma abordagem individual, familiar e contextual com o objectivo de aumentar os factores protectores e diminuir os factores de risco. Neste trabalho focalizarmo-nos num dos principais factores de risco para as crianças: a sua falta de conhecimentos e competências no que se refere à segurança pessoal. Neste sentido apresentamos (tabela 5) parte da listagem de factores de risco elaborada por Wurtele & Miller-Perrin (1992).

Tabela 5

Factores de risco e factores protectores relativos aos abusos sexuais de crianças Componentes

dos abusos sexuais de crianças

Factores de Risco Factores Protectores

Criança - Falta de conhecimentos sobre comportamentos sexuais adequados e desadequados

- Com conhecimentos sobre

comportamentos sexuais adequados e desadequados

- Elevada necessidade de atenção e afecto

- Demasiado crédula - Assertiva

- Baixa auto-estima - Auto-estima elevada

- Pouco confiante Confiante

- Isolada

- Emocionalmente negligenciada - Tem pessoas que lhe dão apoio - Passiva e não assertiva

- Demasiado obediente

- Dificuldade em resolver problemas e em tomar decisões

- Facilidade em resolver problemas e em tomar decisões Família da Criança - Emocionalmente negligente relativamente às crianças - Expectativas inapropriadas relativamente à responsabilidade da criança (p.ex. inversão de papéis - Supervisão ineficaz ou esporádica - Desacordos maritais

- Sentimento de segurança em casa - Respeito pela privacidade de todos: adultos e crianças

- Relações afectivas entre pais e crianças

- Famílias caracterizadas por secretismo e falta de comunicação

- Relações igualitárias entre homens e mulheres

- Famílias demasiado sexualizadas - Falta de privacidade

- Situações em que os agressores têm acesso facilitado às vitimas - Desigualdade de poder entre os membros do casal

- Inexistência de modelagem de comportamento de protecção por parte dos pais

- Pais desadequadamente próximos ou demasiado distantes

- Factores de Stress na família (desemprego, pobreza, etc.)

- Casa geograficamente isolada

- Existência de modelagem de resolução de problemas por parte dos adultos

-Existência de modelagem de comportamento de protecção por parte dos adultos

- Fronteiras adequadas entre adultos e crianças

- História de abusos por parte de um dos pais

Tabela 5 (Continuação)

Factores de Risco e Factores Protectores Relativos aos abusos sexuais de crianças Componentes

do abusos sexuais de crianças

Factores de Risco Factores Protectores

Família da Criança

-Exploração da criança para responder às necessidades dos adultos

- Inexistência de pais Comunidade/

Sociedade

-Visão das crianças numa perspectiva de posse

- Uma cultura que não aceita a exploração sexual das crianças - Uma cultura que aceita a

exploração sexual das crianças

- Rápida investigação e consequente e adequada punição dos agressores pelo sistema legal

- Acesso facilitado a vítimas - Culturas que enfatizam a igualdade entre homens e mulheres

- Acesso facilitado a pornografia infantil

- Existência de educação sexual para as crianças

- Transmissão da imagem das crianças, por parte dos média e da publicidade, de seres sexualizados

- Existência de suporte comunitário para as famílias

- Relutância por parte do sistema legal para investigarem e condenarem os abusadores

- Baixa tolerância a comportamentos sexuais coercivos

- Cultura sexual restritiva

- Falta de suporte comunitário para as famílias

- Comunidades conscientes relativamente aos abusos sexuais de crianças e que desenvolvem esforços para a sua prevenção

- Desigualdade de poder nas relações, dominância masculina - Culturas patriarcais e autoritárias - Crença de que as crianças devem obediência total aos adultos

- Poucas oportunidades para que os homens possam cuidar, de uma forma dessexualizada, das crianças

- Existência de programas de investigação para aumentarem os nossos conhecimentos sobre os abusos sexuais de crianças e de como preveni-los

- Falta de educação sexual no âmbito do sistema educacional

- Desvalorização das crianças

- Comunidades que negam a existência dos abusos sexuais de crianças

Fonte: Wurtele, S. K., & Miller-Perrin, C. L. (1992). Preventing child sexual abuse: Sharing the responsibility.

Lincoln: University of Nebraska Press cit. por Wurtele, S. (2002). School-based child sexual abuse prevention. In Paul A.Schewe (Ed.), Preventing violence in relationships: Interventions across the life span (9-25). Washington, DC, US: American Psychological Association.

Assim, verificamos que os processos de risco associados com os abusos sexuais de crianças, bem como os processos protectores, se encontram ao nível das crianças, da família das crianças e da comunidade.

Os programas de prevenção dos abusos sexuais de crianças procuram actuar minimizando os processos de risco e criando ou enfatizando os processo protectores, sobretudo ao nível das crianças e dos seus micro sistemas, mas também com repercussões ao nível da comunidade. Nomeadamente, na criança, aumentando os seus conhecimentos sobre comportamentos sexuais adequados e desadequados, reforçando as suas competências para se tornar assertiva, com maior facilidade para tomar decisões e resolver problemas, mais confiante e menos isolada; no contexto familiar (e outros micro sistemas como a escola, as actividades extra curriculares ou a vizinhança), aumentando os conhecimentos sobre abusos sexuais de crianças, reforço de uma comunicação pais-filhos adequada e de uma supervisão eficaz, fortalecimento de fronteiras adequadas entre adultos e crianças; e ao nível da comunidade, incrementando comunidades conscientes relativamente aos abusos sexuais de crianças e que desenvolvem esforços para a sua prevenção, que fomentam respostas adequadas para as vítimas e seus familiares e que têm uma visão das crianças como seres de direito.