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Redução da Incidência dos Casos de Abusos Sexuais de Crianças

3. Prevenção dos Abusos Sexuais de Crianças

3.4. Avaliação dos Programas de Prevenção dos Abusos Sexuais de Crianças

3.4.3. Redução da Incidência dos Casos de Abusos Sexuais de Crianças

Investigadores e críticos dos programas de prevenção estão de acordo no que se refere à dificuldade em provar que estes programas são eficazes na prevenção dos abusos sexuais de

crianças. Uma das formas de podermos fazer essa análise é comparando os índices de incidência, pois se os programas de prevenção forem eficazes a incidência de casos deverá reduzir ao longo do tempo. Contudo, apesar de nos EUA existir um decréscimo dos índices de abusos sexuais desde 1995, é difícil provar que essa diminuição se deve aos programas de prevenção (Wurtele, 2002).

Todavia, nos EUA, país onde os programas de prevenção dos abusos sexuais de crianças têm tido uma presença constante desde os anos 80, o declínio dos casos registados pelos serviços de protecção às crianças, é real. Em 1992 foram registados, aproximadamente 149.800, e em 1999, o número de casos de abusos sexuais de crianças chegou aos 92.000, aproximadamente. Verificando-se, desta forma, uma queda total de 39% de casos de abusos sexuais de crianças identificados num período de sete anos (

Jones, Finkelhor & Kopiec,

2001)

, com os dados de 2000 esta descida passa para 40% (Finkelhor & Jones, 2004) e se a mesma análise for feita entre 1990 e 2004 essa percentagem de decréscimo passa para 49% (Finkelhor & Jones, 2006).

Sendo importante lembrar aqui, que o registo de casos de abusos sexuais de crianças, que surgem às entidades competentes representam apenas aqueles que chegaram à atenção dos profissionais da comunidade, estudos realizados com adultos sobreviventes de abusos sexuais de crianças (Cancela, et al., 2004; Ungara, et al., 2009) indicam que apenas uma pequena percentagem, cerca de 10%, relataram o abuso, como já referido anteriormente neste trabalho. Devido ao facto destes relatórios de números oficiais de casos representarem apenas uma pequena parte da realidade, as alterações nestes números devem ser analisadas com precaução de acordo com Leventhal (2001), quando nos referimos a uma verdadeira diminuição da ocorrência de casos de abusos sexuais de crianças.

Contudo, Finkelhor & Jones (2004), no seu artigo sobre as razões da diminuição dos casos de abusos sexuais de crianças, referem que uma das razões importantes para esta redução real é o aumento da consciência pública sobre os abusos sexuais de crianças, sendo esta combinada com esforços rigorosos de identificação, acusação e detenção dos perpetradores, criando-se, assim, nos potenciais abusadores um efeito dissuasor.

Relativamente ao primeiro dos fundamentos referido no artigo anteriormente citado, nas décadas de 80 e 90, nos EUA, os abusos sexuais de crianças receberam muita atenção, numerosos esforços de prevenção foram encetados e disseminados, nomeadamente os programas de prevenção realizados a partir do contexto escolar. Em relação ao segundo argumento, ainda que saibamos que não são muitos os abusadores intra-familiares a serem condenados, os dados recolhidos neste país confirmam uma diminuição elevada dos casos de abusos sexuais de crianças no âmbito da família. Assim, nas conclusões do seu trabalho Finkelhor & Jones (2004) consideram que é lógico atribuirmos a diminuição dos casos de abusos sexuais de crianças a estes esforços preventivos e de intervenção. Estas conclusões são igualmente suportadas pelo estudo realizado e publicado em 2008 por Almeida, Cohen, Subramanian & Molnar que afirmam que “results of our study suggest that activities such as children sexual abuse prevention programs and increased incarceration of offenders might likely be the real reasons for the decline” (p. 374).

Outra forma de analisarmos se os programas previnem os abusos é compararmos os índices de vitimação entre crianças que participaram em programas de prevenção e crianças que não participaram. Com este objectivo foi realizado por Gibson & Leitenberg, em 2000, uma investigação (já referida anteriormente) cuja finalidade foi aferir se a prevalência dos abusos sexuais de crianças diferem entre estudantes do sexo feminino que estiveram presentes em programas de prevenção durante a infância e estudantes do sexo feminino que não estiveram presentes. Por outro lado, procuravam ainda perceber se as mulheres que participaram e não participaram nesses programas de prevenção durante a infância possuem uma vida sexual activa ou se evitam as relações sexuais. Nesta investigação participaram 971 mulheres estudantes de psicologia e pretendia avaliar-se: 1) A sua participação num programa de prevenção do abuso sexual de crianças, 2) Abuso sexual durante a infância, 3) Satisfação sexual e 4) Prática frequente de relações sexuais.

Os resultados indicaram que 62% das participantes já tinham entrado num programa de prevenção dos abusos sexuais nas escolas e que estas eram menos susceptíveis de serem sexualmente abusadas do que aquelas que não tiveram acesso a programas de prevenção, apresentando o dobro da probabilidade de vitimação sexual. Relativamente à denúncia do abuso, não foram identificadas diferenças significativas entre as mulheres que participaram em programas de prevenção e aquelas que não participaram, contudo verificou-se uma tendência, por parte das participantes em programas de prevenção, de reportarem o abuso

mais cedo (Gibson & Leitenberg, 2000). Este estudo terá, eventualmente, sido o primeiro a revelar que os programas de prevenção implementados nas escolas reduzem o índice de abusos sexuais de crianças.

Consideramos importante referir que não devemos confundir a redução da incidência com o número de casos denunciados. Pois um dos possíveis efeitos em consequência do desenvolvimento mais alargado de programas e campanhas de prevenção dos abusos sexuais de crianças poderá não ser o da redução das denúncias/revelações, mas antes um aumento. Num estudo realizado no Canadá (Collin-Vézina, Hélie & Trocmé, 2010), uma das razões apontadas para explicar o aumento de casos denunciados de abusos sexuais de crianças é que as vítimas e as pessoas que as rodeiam, estão mais aptas e disponíveis para identificar e denunciar estes casos às entidades competentes em resultado de uma mudança social e cultural sobre o tema.