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02.2.1 – Situações Surpresas na formação docente

Sessão 02: Familiarização com software e Formação

[00h00 – 00h30] Familiarização com o Cabri: Ao iniciar aula, Professor fala que a sessão em questão é o processo de familiarização com o

software, no caso, Cabri Géomètre II for Windows. Também menciona que no

ensino de matemática assistido por computador a primeira ação que deve ser iniciada em uma formação é a familiarização. Somente Boole está ausente nesta sessão, pois está em uma reunião de planejamento no CMF. E Ada se faz

presente neste momento. Um dos bolsistas CNPq/PIBIC antes do inicio da sessão fala sobre o dia anterior e apresenta o contrato didático explícito que o Professor estabeleceu no dia anterior. O Professor fala sobre a estrutura básica de um

software de geometria dinâmica.

[Professor]: “A atividade de vocês agora, consiste em averiguar os comandos do software para que sejam devidamente utilizados por vocês. Em princípio vocês vão explorar os comandos do Cabri, mas saibam que existe uma estrutura básica neste programa. Nós podemos dividir os programas de geometria dinâmica em 03 partes: (01) menu de comandos; (02) barra de ferramentas; (03) zona de desenho. Vou mostrar como isto funciona [...]”

Após explicar tal fato, Professor vai ao notebook ligado ao datashow28, e fala aos alunos-professores sobre a organização básica do Cabri.

Willes diz conhecer o software e o Professor lhe pede para ajudar os outros colegas. O Professor lhes dá tempo para realizarem a atividade, e afasta-se dos alunos-professores observando-os ao fundo. Os alunos interagem mais que na sessão anterior e conversam. Euler pede aos colegas que façam silêncio. A interação entre Willes e Fibonacci apresenta um diálogo transcrito:

[Willes]: “Dados dois pontos existe uma única reta que por eles passa, é esse princípio que os comandos: reta, semi-reta e segmento seguem no Cabri [...]”.

[Fibonacci]: “Quer dizer, que tenho de saber matemática para lidar com esse troço [...]”.

O aluno-professor está confuso sobre uso dos comandos “ponto”, e “ponto sobre objeto” e o Professor interage com Hilbert. O caderno de atividades foi distribuído pelos bolsistas aos alunos-professores.

Comentários: O Professor estabelece contrato didático desta sessão que trata da familiarização sobre os comandos do Cabri Géométre II. Alunos-professores realizam atividade A das folhas de atividades (Anexo 01: p.342). Nesta sessão há mais interação entre os alunos. O barulho incomoda Euler que chama atenção dos outros professores. Fibonacci percebeu, através

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da explicação de Willes, que o software Cabri Géomètre II segue princípios axiomáticos para realização dos seus comandos. E Hilbert confunde comandos “ponto” e “ponto sobre objeto”, e tal questão faz sentido, pois na geometria das construções régua e compasso não há “tipologia” dos pontos. Quanto o papel de Willes enquanto ‘monitor” do Professor, este é um tipo de mediação pedagógica. Pois ao declarar “saber fazer”, o Professor utiliza-se da prática do aluno para que o mesmo possa revisar suas concepções sobre o assunto, bem como, viabiliza a postura mão-no-bolso do Professor. O diálogo entre Fibonacci e Willes revela o caráter deste tipo de mediação.

[00h30 – 01h00] Ação instrumental e teorema em ação: O Professor vai a frente e fala sobre a concepção de grau de liberdade (conceito de lógica) para os alunos-professores, e faz comparação entre a representação com régua e compasso no quadro branco (Velho PC), em relação a representação no computador (Novo PC). O Professor chama atenção dos alunos-professores para diferença entre desenho e construção geométrica.

Situação Surpresa 002 – O contra-exemplo da intersecção

Mostra que no quadro branco uma intersecção entre retas concorrentes é perceptível visualmente, no entanto, no Cabri a mesma intersecção é perceptível visualmente, mas ela não existe para o computador se isto não lhe for indicado através de comandos. Daí a necessidade em ter comandos como “ponto”, “ponto sobre objeto” e “ponto de intersecção”. para estabelecer uma relação lógica entre entes matemáticos no computador. Neste sentido o computador seria uma máquina “burra” diz o Professor.

Após explicação sobre graus de liberdade, o Professor chama alunos-professores para realização de atividades. Hilbert vai voluntariamente ao

notebook para apresentar os comandos que descobriu. Fala sobre os comandos

para construção de: retas, circunferência e polígonos. Depois mostra comandops para construção de retas paralelas e perpendiculares. Hilbert sente dificuldades na manipulação do mouse (motricidade fina), no entanto, não deixa atividades sem realização e explicação. Hilbert pergunta ao Professor se os construtores do Cabri trabalham sobre postulados e axiomas para elaboração dos comandos. O

Professor comenta que um dos construtores do Cabri Jean M. Laborde, em sua tese de doutoramento, faz relação entre grafos e geometria analítica. Professor fala aos alunos-professores sobre axiomas de geometria euclidiana. Euler orienta algumas ações de Hilbert e Willes faz observações que o ajudam.

Comentários: O problema dos graus de liberdade apresentados por Hilbert, leva professor à comparação entre Novo PC e Velho PC. O exemplo comparativo, viabiliza uma situação surpresa 002 apresentada pelo Professor, que chama atenção sobre o uso de instrumentos. Em outras palavras, não se trata aqui de uma limitação computacional como geratriz de situação surpresa, mas sim, de questões relativas ao uso de instrumentos. Neste caso, a apresentação desta situação surpresa 02 é usada como uma forma que viabilizou uma mediação pedagógica, e permitiu exibir características do Novo PC em relação ao Velho PC. Hilbert se mostra participativo, mas sente dificuldades de motricidade fina. Euler e Willes interagem com Hilbert o ajudando. Pergunta de Hilbert sobre uso de axiomas e teoremas na elaboração de comandos, mostra que Hilbert percebe que no software Cabri, está implícita a idéia de “teorema em ação”29.

[01h00 – 01h30] Manipulação e teorema em ação: Hilbert aparenta cansaço e solicita que outra pessoa realize atividade:

[Hilbert]: “Professor, estou cansado outra pessoa poderia explicar os comandos?”.

[Professor]: “Ok, Quem se prontifica?”.

Situação Surpresa 003 – Problemas na ação instrumental e os conceitos geométricos

[Talles]: “Eu vou”.

Talles se dirige ao notebook para realização da atividade. Os alunos- professores estão atentos as ações dos colegas em suas apresentações. Hilbert

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Teorema em ação: É uma concepção de Vergnaud (1996: p.9-19), que considera que ao desenvolver uma ação, em sua realização, estão implícitas concepções matemáticas. No caso do Cabri Géomètre II, os comandos para construção de ponto, retas, segmentos, circunferências entre outros, expõem a natureza dos conceitos matemáticos formais, ainda que nas ações não sejam as concepções sistematizadas. Logo, o uso de comandos em sua ação instrumental estão enunciando teoremas em ação para Hilbert.

aparenta cansaço. Alunos interagem mais sobre atividades. O áudio e o vídeo dificultam compreensão dos transcritores de dados.

[Talles]: “Quero chamar a atenção sobre a questão do clique, é fácil errar aqui! Eu fui fazer um triângulo [ABC], usei o comando dos polígonos, afinal um triângulo é um polígono, mas daí dei 2 cliques a mais e ficou parecendo um triângulo, mas para o computador não é triângulo. Veja, minha intenção foi uma o resultado foi outro [...]”.

Enquanto Talles explica, a diferença entre os comandos “triângulo” e “polígonos” no Cabri, ele faz no computador as figuras e ações correspondentes as figuras 23 e 24 apresentadas abaixo. Muitos alunos-professores observam exposição e tentam reproduzir o que os colegas explicam no computador.

Figura 024 – Triângulo de Talles após manipulação.

Após explicação de Talles, o Professor chama E.Noether, no entanto, ela diz não querer ir sozinha ao computador, por tal motivo, Talles continua formando dupla com E.Noether. Noether explorou comandos estáticos do Cabri e os apresentou antes do intervalo. Intervalo inicia, alunos têm 20 minutos para descanso.

Após retorno do intervalo, o Professor fala sobre a necessidade em se realizar sessões didáticas a partir dos campos conceptuais envolvidos nas concepções que se pretenda ensinar, bem como, nas concepções que os estudantes-professores possam adquirir sobre a realidade sócio-histórica dos alunos. Professor explica articulação das idéias do trabalho com as idéias presentes em pesquisa.

Professor retoma atividade E.Noether tentou usar comando cônicas, no entanto, quem finaliza cônicas é Talles após questionamento do Professor:

[Professor]:” Quantos pontos são necessários para se obter uma cônica qualquer”.

[Talles]: “Pelo Teorema de Pascal (que não é o aluno) é por 5 pontos e a partir daí finaliza sua cônica”.

Noether não respondeu questionamento proposto pelo Professor. Talles realiza teorema-em-ação.

Comentários: Talles ao usar comando “polígono” do Cabri, para construir um triângulo [ABC], pressupõem que o comando “polígono” seja equivalente ao comando “triângulo. No entanto, o comando ”triângulo” no Cabri finaliza em 3 cliques, já o comando “polígono” para finalizar precisa de 2 cliques no final, ou ainda, precisa que o clique inicial coincida com o clique final, de tal modo que o teorema-e-ação corresponda com o conceito sobre polígono.

No entanto, por razões de ordem instrumental, ainda que conceitualmente um triângulo seja sempre um polígono, se sabe que a recíproca nem sempre é verdadeira, no entanto, em termos de software Cabri, o comando “triângulo” é uma função computacional distinta do comando “polígono” em termos de ações realizadas, ou seja, nunca um comando será em termos de ação instrumental correspondente ao outro comando. Fato este que enuncia teoremas- em-ação distintos devido ações instrumentais, mas que não correspondem às concepções matemáticas sobre o assunto. Trata-se de um problema de ação instrumental, mas é uma limitação que decorre das concepções que os autores possuem sobre um determinado enunciado matemático. Neste caso, Talles percebe a limitação e a explica.

Uma outra ação instrumental que enuncia um teorema-em-ação, é com respeito a construção do comando cônicas do Cabri, que é baseado no Teorema de Pascal. O aluno Talles percebeu a correspondência instrumental com o saber matemático em questão, mas E.Noether não compreendeu, e tinha somente uma percepção estética sobre as construções realizadas no Cabri. Tal aspecto, foi notado na variação de cores para suas construções, bem como, para variação de espessura para segmentos e para retas. Em outras palavras, nem sempre a idéia de teorema-em-ação está presente, para muitos alunos, sejam professores ou não, a animação e visualização é mais “encantadora” que as possibilidades epistemológicas de um recurso computacional. Além disto, a

capacidade em refletir sobre suas ações e o software em uso, envolvem o conhecer-na-ação, refletir-na-ação na perspectiva do teorema-em-ação. E para isto é um pré-requisito estruturas cognitivas do operatório formal que viabilizem estas ações superiores. Sobre o cansaço de Hilbert, as dificuldades de manipulação devido problemas de motricidade fina, teriam lhe levado à exaustão. Isso implica em um fator: Boa parte das ações instrumentais, quando existem dificuldades de manipulação, forçam as estruturas cognitivas ao limite. Fato este que exige uma postura docente compreensiva e midiática para favorecer aprendizagem cognitiva e o desenvolvimento de motricidade do estudante. Há maior interação no grupo Talles se apresenta como voluntário, no entanto, Noether têm receio em estar só diante do computador .

[01h30 – 02h00] Velho PC ao Novo PC - Funcionou acabou : Após os alunos-professores apresentarem o que compreenderam sobre os comandos do Cabri, o Professor explica o processo de familiarização com o software e sua relevância para recapitulação de concepções matemáticas. O Professor propõem atividade 02 do caderno de atividades, sobre construção de retas paralelas. Alunos-professores interagem e tentam estratégias para efetuar construção de retas paralelas Hilbert, Pascal e Ada interagem e desenvolvem a construção das retas paralelas conforme figura 025.

[Hilbert]: “Dados uma reta [r] e um ponto [A] fora desta reta, é para fazer uma reta [s] paralela a reta [r]. Não tem segredo nenhum esse negócio Pascal [...]”.

Professor pede que Pascal, Hilbert e Ada apresentem sua resolução no notebook. Eles vão a frente. O Professor fica observando a ação dos alunos- professores. Pascal chama Professor e pergunta:

[Pascal]: “Posso usar o comando reta paralelas?”.

[Professor]: “Não Pascal, a idéia é fazer as retas paralelas sem o comando reta paralelas [...]”.

Pascal, Hilbert e Ada se mostram frustrados e pedem tempo ao Professor. O Professor dá mais tempo para alunos realizarem a atividade, no entanto, o tempo já estava à hora da finalização desta sessão. O Professor vai a frente e finaliza aula dizendo que a atividade será retomada na sessão seguinte.

Comentários Gerais: Ao final desta sessão, os alunos já utilizam o

software Cabri Géomètre II. Logo, a familiarização foi concluída com sucesso. E

mesmo com dificuldades nas manipulações por parte de alguns alunos, os alunos são mais participativos que na sessão anterior. Os alunos percebem limitações computacionais associados à problemas de ação instrumental, e também, compreendem que o software na ação instrumental incentiva o ato de conhecer- na-ação pelos teoremas-em-ação. O uso de situações surpresa na mediação pedagógica (situação surpresa 002), viabiliza compreender aspectos da natureza do Velho PC em relação ao Novo PC. No entanto, nos trinta minutos finais, ao apresentar atividade 02 aos alunos-professores, em nenhum momento professor estabelece em contrato didático que os alunos não poderiam usar comando “retas paralelas” para efetuar tal construção. Logo surge como necessidade, a reformulação do contrato didático implícito, através do contrato didático explícito presente nas falas entre o Professor e Pascal. Houve problemas com a gestão do tempo, e a continuidade da atividade 02 fica para sessão posterior.