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FATORES PARA COMBATER O AUDIT EXPECTATION GAP

No documento O impacto do ensino de auditoria no (páginas 37-44)

3. COMBATER O AUDIT EXPECTATION GAP

3.1 FATORES PARA COMBATER O AUDIT EXPECTATION GAP

Muitos são os autores que traçam caminhos e apontam soluções, de modo a minimizar o problema das diferenças de expetativas em auditoria. No seguimento do exposto no capítulo anterior, é de extrema importância encontrar soluções para reduzir estas diferenças, pois só caminhando nesse sentido é que será possível manter e preservar a credibilidade e a independência da profissão de auditor perante a sociedade.

Na sequência da revisão de literatura citada, conclui-se que o AEG existe e está presente na sociedade. Assim, surge a necessidade de eliminar estas diferenças ou, pelo menos, tentar combatê-las. Humphrey (1997) esperava que o problema se esbatesse com o passar do tempo, o que podia efetivamente acontecer, mas os casos polémicos, envolvendo auditores e empresas vieram acentuar um fosso de expetativas que já era difícil de reduzir.

Segundo Almeida e Taborda (2004:2), “apesar de ainda não se ter chegado a um consenso relativamente às causas das diferenças de expetativas, a sua persistência é o testemunho da incapacidade ou relutância dos auditores na sua redução.

A resposta dos auditores a essa questão pode ser descrita como defensiva ou como construtiva (Sweeney, 1997: 20 e Gay et al., 1998: 474). A resposta defensiva enfatiza a necessidade de educar o público e de tranquilizá-lo acerca das exageradas críticas que se fazem sentir sempre que uma empresa entra em processo de falência, expondo repetidamente os métodos e técnicas utilizadas pelos auditores, com o objetivo de controlar o debate sobre as diferenças de expectativas. A resposta construtiva defende o alargamento do âmbito e da função da auditoria.” Gray e Stuart (200112), citado por Enes (2013:54), afirmam que a resposta defensiva consiste em educar o público face às exageradas críticas sobre os auditores, que se sentem quando existe um escândalo financeiro e consequente falência da empresa. Já a resposta construtiva dá prioridade ao alargamento do âmbito e função da auditoria.

De acordo com Godsell (1991:24), “a profissão tem de enfrentar os complexos problemas da diferença de expetativas em duas frentes. Em primeiro, deve procurar-se resolver quaisquer discrepâncias entre o seu próprio desempenho e as normas que os utilizadores dos seus serviços podem razoavelmente esperar. Em segundo lugar, deve tentar-se educar o público, e especialmente os utilizadores de serviços de auditoria de modo que eles saibam o que os deveres dos auditores realmente são”.

Segundo Almeida (2005), os auditores têm vindo a ser alvo de constantes críticas por parte dos diversos utilizadores da informação financeira. Esta manifestação reflete a mudança de atitude face aos auditores, resultando num aumento das diferenças de expetativas.

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Assim, na tentativa de reduzir estas diferenças têm sido apontadas por investigadores e pelos organismos internacionais várias soluções.

Porém, torna-se necessário equacionar a relação custo/ benefício de uma auditoria pois eventuais novos procedimentos a tomar pelos auditores devem ser vistos como pouco razoáveis se os benefícios da sua execução forem inferiores aos seus custos.

Contudo, deve salientar-se que, nem sempre, conseguimos medir os proveitos em termos quantificáveis, como acontece com os proveitos potenciais em que o seu valor é essencialmente intangível. Assim, os custos adicionais apenas se poderiam justificar se os benefícios para a sociedade aumentassem, independentemente da forma como esses mesmos benefícios fossem avaliados.

De acordo com Heliodoro (2009:9), “as causas da existência do expectation gap passam pelo distanciamento das perspetivas dos auditores às do mercado e do público no geral. Por um lado, deverá existir maior informação e formação relativamente aos objetivos, resultados e responsabilidades dos auditores, por outro lado, os auditores deverão fazer um esforço de adaptação às novas exigências do mercado. De igual modo, deverá existir uma divulgação junto do público e da sociedade em geral do que consiste o trabalho do auditor e quais as limitações inerentes ao mesmo”.

Sikka et al. (1998) referiram que a diferença de expetativas em auditoria é prejudicial para o público, investidores e políticos, porque numa economia capitalista, o processo de criação de riqueza e estabilidade política dependem fortemente da confiança nos processos de prestação de contas. Por conseguinte, para restabelecer a confiança da sociedade no processo de informação financeira e nas funções de auditorias, a diferença de expetativas em auditoria deve ser eliminada se não for significativamente reduzida.

A Comissão das Comunidades Europeias (CEE, 1996) apresentou o Livro Verde sobre o papel, estatuto e responsabilidade do Revisor Oficial de Contas na União Europeia. Neste documento é proposto um aumento da informação mencionada no relatório de auditoria, nomeadamente, sobre as normas profissionais relacionadas com o trabalho do auditor, indicação de reservas que possam existir e o cumprimento de requisitos legais e regulamentos relacionados com a informação financeira. De forma a aproximar as expetativas do público daquilo que é “razoável”, os auditores devem fomentar ações de sensibilização e educação sobre o tema, transmitindo aos utilizadores quais são os objetivos da auditoria e quais os deveres e responsabilidades que estes possuem realmente.

De salientar que muitos estudos, como o de Salehi et al. (2009), mostram que existe uma relação muito próxima entre a independência dos auditores e o expectation gap. De acordo com Enes (2013:9), “a independência define-se como a capacidade para atuar de forma íntegra e objetiva, sendo que a integridade é um elemento de caráter que revela firmeza de princípios éticos e de honra”.

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O preâmbulo do Código de Ética da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas (CEOROC) diz-nos que “no exercício das suas funções de interesse público, os auditores devem observar e cumprir o novo Código de Ética que define os princípios éticos fundamentais aplicáveis e apresenta uma estrutura concetual para os implementar com o objetivo de identificar ameaças ao cumprimento dos princípios fundamentais, avaliar a importância das ameaças identificadas e aplicar as salvaguardas necessárias, para eliminar as ameaças ou reduzi-las a um nível aceitável.”

O CEOROC indica-nos ainda que os auditores devem cumprir os seguintes princípios fundamentais: integridade, objetividade, competência e zelo profissional, confidencialidade e comportamento profissional.

Assim, segundo o mesmo Código, no Ponto 3.1.3 Secção 1 Capítulo 3 e Anexo 1, o cumprimento destes princípios fundamentais pode ser colocado em risco por um conjunto vasto de circunstâncias. Essas ameaças podem ser de origem diversa, a saber:

 Ameaça de interesse pessoal: a ameaça de que um interesse financeiro ou qualquer outro interesse venha a influenciar de forma indevida o julgamento ou comportamento do auditor. Exemplos: um membro da equipa de trabalho de garantia de fiabilidade que tenha um interesse financeiro direto no cliente; uma firma que tenha excessiva dependência de honorários de um cliente sobre o total dos honorários; uma firma que esteja preocupada com a possibilidade de perder um cliente importante.

 Ameaça de auto revisão: a ameaça de que o auditor não avalie adequadamente os resultados de um julgamento ou de um serviço anteriormente efetuados por si próprio, pela firma em que integra ou por entidades da rede, associação ou aliança a que pertence. Exemplos: uma firma que emita um relatório de garantia de fiabilidade sobre a eficácia da operacionalidade de sistemas de gestão após conceber ou implementar tais sistemas; um membro da equipa de trabalho de garantia de fiabilidade que tenha sido recentemente diretor ou quadro do cliente; um membro da equipa de garantia de fiabilidade que tenha sido recentemente recrutado pelo cliente, podendo exercer influência significativa sobre o assunto em causa do trabalho.

 Ameaça de representação: a ameaça de que o auditor defenda a posição de um cliente, ao ponto de a sua objetividade poder vir a ficar comprometida. Exemplos: a firma que faça a promoção de instrumentos de capital num cliente de auditoria; um auditor que atue como representante de um cliente de auditoria em litígios ou disputas com terceiros.

 Ameaça de familiaridade: a ameaça de que, devido a um relacionamento íntimo ou prolongado com um cliente ou pessoa com cargo de responsabilidade no cliente, o auditor seja demasiado condescendente em relação aos seus interesses, ou demasiado crítico em relação ao seu trabalho. Exemplos: um membro da equipa de trabalho de garantia de fiabilidade que tenha um membro íntimo da família como diretor do quadro do cliente ou como trabalhador do cliente e que está numa posição de exercer influência significativa sobre os assuntos abrangidos pelo trabalho; um auditor que aceite presentes ou tratamento preferencial de um cliente, salvo se o valor for insignificante ou inconsequente.

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 Ameaça de intimidação: a ameaça de que o auditor seja dissuadido de atuar objetivamente devido a pressões reais ou veladas, incluindo tentativas para exercer influência indevida sobre si. Exemplos: uma firma que seja ameaçada de demissão pelo cliente; uma firma que seja pressionada a reduzir de forma não apropriada a extensão do trabalho a executar a fim de reduzir honorários; um auditor que se sinta pressionado para aceitar o julgamento de um trabalhador do cliente porque esse trabalhador tem mais conhecimentos no assunto em questão.

De modo a eliminar as ameaças identificadas ou reduzi-las a um nível aceitável, no Anexo 2 do mesmo Código são apresentados exemplos de salvaguardas que se enquadram em duas categorias:

 Salvaguardas criadas pela profissão, legislação ou regulação: requisitos de formação académica e experiência profissional para inscrição na lista dos Revisores Oficiais de Contas; normas e regulamentos profissionais; procedimentos de monitorização do exercício da atividade profissional estabelecidos pela OROC; procedimentos de natureza disciplinar da OROC; supervisão pública da atividade de auditoria (exercida pelo CNSA).

 Salvaguardas estabelecidas no contexto do trabalho: políticas e procedimentos para implementar e monitorizar o controlo de qualidade nos trabalhos; políticas e procedimentos internos documentados que exijam o cumprimento dos princípios fundamentais; políticas e procedimentos para monitorizar e, se necessário, gerir a independência dos honorários recebidos de um único cliente; um mecanismo disciplinar para promover o cumprimento dos princípios fundamentais.

Corroborando esta ideia, o Artigo 71º do EOROC diz-nos que:

“1 – No exercício das suas funções, os revisores oficiais de contas e as sociedades de revisores oficiais de contas, bem como quaisquer pessoas singulares em posição de influenciar direta ou indiretamente o resultado da revisão legal ou voluntária de contas, devem ser independentes relativamente à entidade auditada e não devem participar na tomada de decisões dessa entidade. 2 – Os revisores oficiais de contas e as sociedades de revisores oficiais de contas tomam todas as medidas adequadas para garantir que, no exercício das suas funções, a sua independência não é afetada por conflitos de interesses existentes ou potenciais nem por relações comerciais ou outras relações diretas ou indiretas que os envolvam e, se aplicável, que envolvam a sua rede, os seus gestores, auditores, empregados, qualquer outra pessoa singular cujos serviços estejam à disposição ou sob o controlo do revisor oficial de contas ou das sociedades de revisores oficiais de contas ou qualquer outra pessoa ligada direta ou indiretamente ao revisor oficial de contas ou às sociedades de revisores oficiais de contas por uma relação de domínio.

3 – Os revisores oficiais de contas e as sociedades de revisores oficiais de contas não podem realizar uma revisão legal ou voluntária de contas caso exista uma ameaça de auto revisão, interesse próprio, representação, familiaridade ou intimidação criada por relações financeiras, pessoais, comerciais, de trabalho ou outras entre o revisor oficial de contas ou a sociedade de revisores oficiais de contas, a sua rede ou qualquer pessoa singular em posição de influenciar o

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resultado da revisão legal das contas, e a entidade auditada, em resultados da qual um terceiro pudesse concluir, de modo objetivo, razoável e informado, e tendo em conta as medidas de salvaguarda aplicadas, que a independência do revisor oficial de contas ou da sociedade de revisores oficiais de contas está comprometida”.

Salehi et al. (2009:170) referem que “a manutenção da independência do auditor é muito importante para os utilizadores das demonstrações financeiras. Quanto mais independente o auditor parecer, maior será a confiança no seu trabalho e na sua opinião. A independência do auditor é um importante fator para reduzir o audit expectation gap porque o investidor e os outros vão esperar mais do auditor”.

Gill e Cosserat (199613), citado por Salehi et al. (2009:166), enfatizaram que “independência é a pedra angular da profissão de auditoria”. Ou seja, “sem independência a opinião do auditor é suspeita”. De acordo com Salehi (2011), deve-se aumentar o nível de independência do auditor e as suas responsabilidades com medidas mais punitivas, de modo a reduzir os escândalos financeiros e aumentando a qualidade da auditoria, através da diminuição do nível de desfasamento entre as expetativas de auditoria.

Segundo Rodriguez (200214), referido por Enes (2013:10), existem vários fatores de cariz não financeiro que podem influenciar a independência do auditor:

 Pressão do cliente (este pode pressionar o auditor de modo a que este envie sinais mais tranquilizadores aos mercados);

 Dimensão da empresa de auditoria (os investidores, por norma, sugerem que as entidades mais importantes tendem a ser mais conservadores e vulneráveis ao risco de litigâncias legais);

 Duração da relação entre auditor e cliente (inicialmente quando a relação não e familiarizada, o auditor pode sentir-se mais exposto ao risco de não conseguir detetar erros);

 Crescimento e desenvolvimento do cliente (aqueles clientes que têm um maior crescimento podem ser tratados de forma mais favorável e liberal);

 Setor económico em que o cliente se enquadra;

 A dificuldade financeira ou a possibilidade de insolvência do cliente (pode influenciar o tipo de informação a emitir).

Salehi et al. (2009:166) acrescenta que “a independência do auditor pode ser influenciada pela imprecisão consciente ou inconsciente no reporte da informação. A imprecisão consciente pode surgir de vários fatores como a proximidade do cliente, a dependência do cliente para a subsistência do auditor, a aceitação de bens ou serviços de clientes diretamente ou através de seus funcionários, entre outros”.

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Gill, G. e Cosserat, G. (1996). Modern Auditing in Australia. Fourth Edition Wiley and Sons Australia.

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Porém, recorrendo a exemplos de escândalos como o da Enron, ficou provado que existiu a concordância e conivência dos auditores aquando da emissão de pareceres com opinião “limpa”. Sendo que este foi o caso de maior dimensão mediática, detetou-se ainda que a empresa que lhe prestava serviço de auditoria era a mesma que lhe prestava serviço de consultoria - o valor cobrado por este último superior ao respeitante do serviço de auditoria. Este é um dos casos em que se pode questionar a independência do auditor em relação às entidades que auditam. O mediatismo em torno deste e de outros escândalos em muito contribuíram para descredibilizar a função do auditor. Contudo, deve, ainda, salientar-se que também muitos profissionais desempenharam as duas funções de forma isenta e com zelo profissional, contribuindo para a redução de perdas, precisamente por terem presentes o cumprimento de tais valores.

Concluindo, é fundamental para a credibilidade da profissão, que os auditores sejam independentes. Este é um fator fulcral para que a diferença de expetativas existente na auditoria não seja, ainda, maior. Quantos mais escândalos financeiros forem aparecendo e onde se constate que tiveram a conivência dos auditores, mais a questão da independência será posta em causa e mais difícil será tornar esta profissão credível. Os utilizadores esperam que o trabalho seja desempenhado de forma independente pelo que, se não for, irá aumentar a diferença entre aquilo que eles esperam da auditoria e aquilo que ela realmente transmite.

Quanto às responsabilidades dos auditores, o organismo internacional responsável pela emissão de normas internacionais de auditoria é o IAASB, como já foi referido anteriormente. De salientar a responsabilidade do auditor na ISA 240 (The auditor’s responsabilities relating to fraud in an audit of financial statements), onde o IAASB estabelece regras relativas à responsabilidade do auditor, ao considerar o erro e a fraude na revisão da informação financeira prestada pela empresa. Salienta-se ainda que, o auditor é responsável por obter segurança razoável de que as demonstrações financeiras como um todo estão isentas de distorção material, quer causada por fraude quer por erro. Devido às limitações inerentes de uma auditoria, existe um risco inevitável de que possam não ser detetadas algumas distorções materiais das demonstrações financeiras, mesmo que a auditoria seja devidamente planeada e executada de acordo com as normas. Os objetivos do auditor são identificar e avaliar os riscos de distorção material das demonstrações devido a fraude; obter prova de auditoria apropriada suficiente respeitante aos riscos avaliados de distorção material devida a fraude, por meio da conceção e implementação de respostas apropriadas e responder apropriadamente a fraude ou a suspeita de fraude identificada durante a auditoria.

O auditor tem sob a sua alçada a planificação e execução do trabalho de auditoria de modo a permitir a deteção legítima de quaisquer distorções materialmente relevantes. Se existirem suspeitas de atos fraudulentos, o auditor tem a responsabilidade de averiguar até que as suas dúvidas sejam eliminadas ou confirmadas15.

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Concluindo, as normas definem claramente que não é responsabilidade do auditor procurar esquemas de fraude, sendo que esta é uma informação que não é conhecida pela generalidade da sociedade. A não deteção de fraude não significa mau desempenho por parte do auditor, desde que reúna a documentação necessária.

Lee et al. (2008) analisaram métodos para reduzir o AEG, tais como: educação, expansão do relatório de auditoria, metodologias de auditoria estruturadas, expansão das responsabilidades dos auditores e valorização do desempenho dos auditores.

Nesta senda deste pensamento, Kose e Erdogan (2015) referem que existem duas grandes questões nas pesquisas sobre o AEG: a primeira tem a ver com a existência do fosso de expetativas naquele país em concreto e a outra tem a ver com o as formas de reduzir esse fosso. A literatura diz-nos que existem três formas principais para reduzir esse fosso: relatório de auditoria expandido, aumento das responsabilidades do auditor e a educação do público.

Segundo Almeida (2005:197), “em relação às expetativas que são consideradas pouco razoáveis, ou seja, expetativas às quais os auditores não podem responder de uma forma eficaz, os profissionais de auditoria necessitam de diminuir as expetativas do público para níveis razoáveis. Esta situação requer programas de educação do público e melhorar a comunicação sobre a natureza da auditoria e sobre os deveres que os auditores podem razoavelmente desempenhar.” Para além do reforço da independência e o conhecimento das responsabilidades dos auditores por parte do público, uma das formas defendidas para atenuar as diferenças de expetativas e aproximar os utilizadores da informação financeira aos auditores é a educação, como iremos analisar de seguida.

No documento O impacto do ensino de auditoria no (páginas 37-44)

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