• Nenhum resultado encontrado

Fonte: Foto própria (2016)

Foto 16. Favela Recente em rua institucional da COHAB Castelo Branco

Aventa-se que estes processos recentes, além de vinculados à impossibilidade de pagar aluguéis ou de permanência na casa de parentes, relacionam-se com o próprio adensamento das favelas existentes e com o fato destas, então consolidadas, estabelecerem um mercado imobiliário. Por este último aspecto, a nova favela permitiria escapar do custo da compra da habitação, o que ocorre inclusive nas áreas de ocupação informal, bem como a geração de renda pela venda da casa.

Considerações finais ao capítulo II

Significativas situações de pobreza sempre marcaram o território brasileiro, as quais se tornaram predominantemente urbanas pelo próprio movimento de urbanização de nossa sociedade. É preciso entender as especificidades socioespaciais dessa pobreza urbana, particularmente em regiões metropolitanas, como aqui estudado.

As situações precárias de trabalho, renovadas na década de 1990 por novos expedientes de “inclusão marginal do trabalhador” (KOWARICK, 2009), continuam a reproduzir péssimas condições de renda para grande parte da sociedade. E o espaço urbano, enquanto meio de acumulação, segue perpetuando situações de pobreza.

A partir de um determinado espaço-tempo é a favela a expressão da pobreza urbana metropolitana. A favela que surgiu com intensidade em São Paulo num momento de crise como forma de solucionar a necessidade de moradia, consolidou-se e tornou-se permanente. Ela se intensifica em condições econômicas e sociais especificas de um tempo, desenvolve-se sob as condições de um espaço produzido determinado. É uma das formas-conteúdo de experiência urbana da pobreza de nosso tempo-espaço contemporâneo.

Como pontua Telles (2009: 9), a “experiência da cidade (...) sob o signo da vulnerabilidade” foi ampliada: entre 1991 a 2010, as favelas brasileiras passaram a abrigar de 5,7 milhões a 11,4 milhões de habitantes; em Carapicuíba, com um aumento de 147% da população em favelas na década de 1990, chega-se ao ano de 2010 com quase 18,5% da população municipal habitando favelas, isto é, quase 70 mil habitantes (IBGE, 2010; PLHIS, 2011; MATION et al. 2014).

A extensa produção do espaço urbano a partir das favelas realiza-se, especificamente, em Carapicuíba: pela apropriação informal de áreas públicas e privadas, com casas progressivamente inseridas na dinâmica de mercantilização; a partir dos agentes do lugar e de lideranças ascendentes e de suas táticas horizontais e relações comunicacionais constituídas pela teia de relações sociais, preponderantemente, a dos laços familiares; abrigando trajetórias habitacionais descendentes; produzindo resistências; e pela ausência do investimento público, mas pela presença do clientelismo e da repressão do Estado.

No século XXI, as favelas não são mais residuais, mas também não têm mais a mesma forma-conteúdo do século anterior (KOWARICK, 2009; TELLES, 2009; PASTERNAK, 2016). Nas favelas de Carapicuíba hoje, predominam casas de alvenaria, em grande parte verticalizadas, produção que não se resume à autoconstrução; locam-se cômodos e vendem-se casas; os serviços de energia elétrica e abastecimento de água são parcialmente regularizados; há um maior número de vielas e travessas asfaltadas e cimentadas; e seus moradores não estão ali de passagem, as favelas conformaram seus bairros de residência definitiva na metrópole. Da mesma forma o entorno das favelas também é outro: são bairros equipados com as infraestruturas urbanas básicas, com casas de qualidade construtiva e arquitetônica mais desenvolvida; há um extenso circuito inferior da economia urbana, bem como redes de consumo do circuito superior e superior marginal; e no conjunto deste espaço urbano, dentre numerosas atividades comerciais, culturais e sociais uma vida social intensa. Nessa direção comenta Kowarick (2009: 12): “as periferias estão longe das imagens de desolação de trinta anos atrás, as redes urbanas chegaram lá – também para as favelas, os indicadores de habitabilidade melhoraram; também no caso das favelas, a paisagem urbana é hoje muito diversificada e heterogênea”.

Uma maior garantia de permanência e muitos anos de moradia fizeram com que as casas pudessem ser melhoradas e as lutas para melhorar o bairro pudessem ser adensadas. Nesta direção, assevera-se, com base em Pasternak (2016), que o aumento do número de favelas e moradores de favela levou estas a receber, mesmo nos governos autoritários, investimento público em infraestrutura básica, oferecendo segurança de permanência. Mas isto tem pouco ou nada a ver com distribuição de renda, com superação das lógicas predatórias de produção do espaço urbano, com igualdade socioespacial; isto tem a ver com permanência. A

favela permanece e se consolida como o urbano possível para os mais pobres da metrópole. Como esclarece Telles (2009: 12): “Persistências e diferenças, é disso que é feita a dinâmica urbana e é isso que se faz necessário conhecer”.

Nessa direção, a contraponto das transformações supracitadas, ainda persistem diversas vulnerabilidades no espaço urbano constituído pelas favelas: grande número de domicílios à margem de córregos ou em áreas de acentuada declividade sujeitas à inundação e erosão; ruas estreitas e com traçado irregular, em grande parte impenetráveis para automóveis e caminhões de coleta lixo; domicílios sem espaçamento entre si, predominando condições insatisfatórias de ventilação e iluminação; precariedade do esgotamento sanitário e da coleta de lixo; não legitimação da propriedade da terra/ posse; carência de meios de consumo coletivo, como os serviços de saúde, mobilidade, cultura, educação e lazer; coabitação não voluntária; segregação, inclusive racial; expansão da fronteira de reprodução do capital imobiliário para as periferias e o processo contínuo de periferização dos mais pobres (KOWARICK, 2009; PASTERNAK, 2016).

Claramente, a desigualdade do espaço socialmente produzido é transmutada, mas permanente; como sublinha Telles (2009: 12) num rearranjo de diferenças e persistências se “reatualiza a pertinência da noção de espoliação urbana”. As privações variam, mas não cessam; a distância entre o mundo das possibilidades e a realidade vivida, entre os direitos e a práxis, é uma constante para a maioria.

CAPITULO III – ESTADO, SOCIEDADE CIVIL E O PROBLEMA HABITACIONAL EM CARAPICUÍBA-SP

A grande expansão dos loteamentos precários, sua consolidação, a proliferação das favelas, sua consolidação; não apenas como tipos habitacionais, mas formas-conteúdo de nossa persistente “urbanização predatória” (TELLES, 2009). Sobre este percurso de produção do urbano, segue-se agora à sua compreensão a partir dos processos relativos à esfera política: Estado e sociedade civil.

O Estado, que historicamente centraliza a proposição e implementação das políticas públicas, formula a questão social a partir de sua posição e estratégias de poder. A sociedade recebe, opõe-se e participa destas formulações não pela visão dos detentores do poder, mas pelo lado de quem vive o cotidiano marcado pelo atraso social. Nos diferentes projetos político-econômicos desenvolvidos no território nacional, a questão social recebeu diferentes compreensões e “soluções” por parte do Estado.

Como afirma Feltran (2010: 204), a relação entre Estado e sociedade civil, em específico, “entre periferias e mundo público foi historicamente marcada pelo conflito”. O conflito que, segundo Kowarick (2009), é uma dimensão estruturante das dinâmicas urbanas e de sua evolução no tempo. Da repressão, à redemocratização, à tentativa de efetivação da democracia-participativa, diferentes dispositivos permearam a relação de conflito entre as partes, marcando, principalmente, dois períodos distintos, o da “luta política” e o da “gestão social” (FELTRAN, 2010).

Debruçando-se sobre a questão da moradia, especificamente da moradia na favela, serão destacados os diferentes tratos da questão social pelo Estado, as relações de conflito nos respectivos períodos e a situação no Município de Carapicuíba.

3.1. A favela e a evolução da política pública e da luta urbana no Brasil

Bolaffi (1982) afirma que há sempre uma diferença entre os reais problemas de uma sociedade e aqueles que são reconhecidos como tais pelas estratégias dos grupos de poder. Isto é, entre a essência e a aparência. O que não significa que se elevem questões imaginárias, destituídas dos movimentos do real, mas que se mascara a natureza dos problemas, ocultando-se causas factuais e criando-se priorizações tendenciosas.

Na sociedade brasileira, o Estado tem a função hegemônica de elaboração de normas, planos e programas sociais. Embora seja agente complexo, trata-se de um Estado capitalista, em que o papel do capital é hegemônico e as ações da sociedade civil e de suas organizações sociais são secundárias. Revela-se que a leitura dos problemas sociais legitimada institucionalmente não se realiza de forma ascendente.

A favela ganhou centralidade na leitura dos problemas sociais urbanos brasileiros a partir dos anos 1960. Foi sobretudo a partir dela que a questão habitacional passou a ser pensada no Brasil, e a compreensão do processo que a engendra foi diferentemente formulada desde então. A princípio, sob inspiração do pensamento sociológico latino americano dos anos 1960 e 1970, especificamente pela influência da teoria da marginalidade social, a favela foi entendida enquanto um problema físico-ecológico: o habitat e a condição de vida seriam o fulcro da marginalidade e da pobreza, assim bastaria sua extirpação para solucionar estes problemas. Em outra chave de interpretação, estudos baseados nas formulações de integração social da escola do pensamento sociológico funcionalista passam a compreender a favela como resultado da migração rural-urbana, isto é, como um estágio de integração à cidade a ser oportunamente superado. A superação desta tese, por sua vez, ocorre pela influência da teorização crítica da acumulação capitalista, que evidencia a exploração da força de trabalho e dá origem aos estudos sobre a periferia urbana (VALLADARES, 1983; PASTERNAK, 1984; PASTERNAK & BALTRUSIS, 2007).

Durante o regime ditatorial, a compreensão da favela como causa motriz da marginalidade resultou na tradução da questão urbana como um problema de déficit habitacional, negligenciando as causas estruturais dos problemas sociais brasileiros. Essa interpretação da favela que justificava sua remoção casou-se bem

à conjuntura política de matiz repressiva da década de 1960, onde os votos da população não tinham poder de barganha. Formulava-se então a solução: ampla produção de moradias públicas e extinção das favelas (BOLAFFI, 1982; VALLADARES, 1983; PASTERNAK,1984; RODRIGUES,1988). Conforme Bolaffi (1982: 42) da elaboração deste falso problema tem-se consequentemente “uma tragicomédia de desacertos”.

Nessa lógica, enquanto as favelas apenas começavam a crescer, as remoções já se tornavam forma de atuação comum. Assinala-se que esta primeira forma de intervenção do poder público foi possível devido à “diminuta” população habitante de favelas da cidade de São Paulo, 100 mil pessoas à época. Na Grande São Paulo as políticas de desfavelamento da década 1960 restringiram-se à capital (PASTERNAK & BALTRUSIS 2007). Sobre o período, registra Rodrigues (1988) que os relatos das remoções de favelas bem como a demonstração de temor social ante ao fenômeno preenchiam quase diariamente as notícias de jornais.

Interessa ressaltar que as remoções, como parte da elaboração de um falso problema, ocultavam a intencionalidade da atuação. O que está por trás delas é a disputa pelo espaço da cidade; é o conflito entre produção da cidade para extração de valor de troca e produção da cidade para obtenção de valor se uso; meio de acumulação versus meio de existência. Numa época de acelerada urbanização, alavancada não apenas pela industrialização do território, mas pela importância econômica da atividade de lotear, empreendida por empresários industriais, banqueiros, empresários de materiais de construção e de imobiliárias e construtoras (BONDUKI, 1998; SAMPAIO, 1994). Inclusive, as transformações no mercado imobiliário no período, a exemplo da criação do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) e do Banco Nacional de Habitação (BNH), vieram a garantir à acumulação capitalista com a terra urbana mais do que à carência de habitações populares (BOTELHO, 2007).

No entanto, neste percurso as remoções não foram exitosas para o Estado capitalista. A reinstalação dos removidos, ocorrendo sobretudo em terrenos periféricos, resultava no retorno à favela, insucesso que restringiu a atuação às áreas de risco. Sucessivamente, com a aceleração do processo de formação de favelas ao longo da década de 1970, o entendimento da pobreza urbana ganha outros contornose projetam-se outras formas de intervenção.

Agora a pobreza urbana vai ser entendida como algo transitório, próprio de um período de reorganização da produção, esquecendo-se que a pobreza estava em outras diversas regiões do país e o que ocorria em seu centro econômico era a “exacerbação do contraste entre acumulação e pobreza” (CAMARGO et al., 1975: 19). Nesse viés, vinculava-se erroneamente pobreza e condições de vida urbana desiguais à migração, quando tratava-se de uma questão estrutural de desigualdade social (CAMARGO et al., 1975; PASTERNAK, 1984 e 1986). Nessa linha, imperava a significação da favela enquanto lugar do migrante recente, isto é, um recurso de entrada na cidade, forma transitória de adaptação que seria sucedida pela ascensão social e pela casa de alvenaria (PASTERNAK, 1986; RODRIGUES, 1988).

Contudo, embora grande parte dos habitantes de favela na década de 1970 fosse migrante, não se tratava de processo migratório recente41. Conforme Pasternak (1986), as favelas paulistas cresciam muito mais por pauperização do que por migração. Pauperizados pela remuneração deteriorada e vítimas do processo de especulação sobre a terra urbana42, à época, grande parte dos novos habitantes de favela passava por um processo de “filtração descendente”, isto é, já haviam experimentado melhores condições de moradia em fases anteriores de suas vidas (PASTERNAK, 1986). O tempo médio de permanência na favela paulistana dos chefes migrantes passou de 5,56 para 10,95 anos entre 1973 para 1980 (PASTERNAK, 1986), não relevando tendência à transitoriedade, mas à fixação dessas apropriações ilegais.

Entretanto, as políticas públicas da época foram formuladas a partir da compreensão do habitante de favelas como migrante recente. Primeiramente, na primeira metade da década de 1970, tem-se a proposta das Vilas de Habitação Provisória (VHPs) e seus Alojamentos provisórios (APs), de alvenaria e madeira, respectivamente. Ambas serviriam de moradia provisória para os moradores de favela, para que fossem alfabetizados, recebessem cursos de profissionalização, tirassem documentos e assim tornarem-se aptos à integração ao mercado habitacional regular e à vida urbana (RODRIGUES, 1988; PASTERNAK &

41 Há um relação entre favelamento e migração, a grande maioria dos chefes moradores de favelas não é originária do estado de São Paulo (em 1993, apenas 17,6 %), no entanto grande parte não são migrantes recentes, posto que 35% já tiveram experiências habitacionais anteriores diversas (Pasternak, 1997).

42 Aponta Pasternak (1986:86) que ao longo da década de 1970 “o aumento real do preço

do m² do terreno foi de 160%, enquanto que o salário mínimo real médio anual de 1979 representava apenas 76% do salário de 1970”.

BALTRUSIS, 2007). No entanto, assinala Rodrigues que, embora muitos projetos de VHP tenham sido elaborados, nenhum foi concretizado. Com o mesmo intuito, lança- se então o FUNAPs (Fundo de Atendimento à População Moradora em Habitação Sub-Normal) no final da década de 1970, que criou alojamentos provisórios nas próprias favelas, enquanto fornecia às famílias subsídio ou empréstimo individual para a reconstrução de moradias em situações emergenciais e para a aquisição do terreno.

Tendo elegido a carência de habitações como problema fundamental, o centro da política urbana do regime militar destinou-se a produção seriada de moradia. À época, além da centralização do poder político na esfera federal, toda atividade relativa ao desenvolvimento urbano estava sob encargo do Banco Nacional de Habitação (BNH), o que corroborava uma política de metas quantitativas (ROLNIK, 2009; RODRIGUES, 2011).

Todavia, na prática, a produção financiada pelo BNH não se destinou à área de habitação de interesse social. A maior parte dos financiamentos destinou-se às faixas de renda média e alta, em sua maioria a rendas acima de 12 salários mínimos. Das 4,5 milhões de unidades financiadas entre 1964 e 1986, “somente 33% foi destinado aos setores populares, sendo que os atingidos pelos programas alternativos (entre 1 e 3 salários mínimos) foram contemplados com apenas 250 mil unidades, o que significa 5,9%” (RIBEIRO & AZEVEDO, 1996: 13).

Isto significa que esta produção não foi voltada para a verdadeira carência de habitações, uma vez que à época 55% da demanda referia-se à população com renda de até 4 salários mínimos. Parte desta contradição, o financiamento desta política deu-se pela utilização de recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço do trabalhador (FGTS). Ademais, o pouco destinado à moradia popular realizou-se na longínqua e urbanisticamente precária periferia, induzindo a periferização, a especulação fundiária, a privação do direito à cidade, como no caso do conjunto Habitacional COHAB43 Castelo Branco em Carapicuíba.

Reflexo desta deficiente política urbana, as favelas continuam a crescer. Mais que isso, a partir da crise socioeconômica de meados da década de 1970, num contexto amplo de pauperização e deterioração das condições de vida, observa-se

43

Rodrigues (1988) afirma que parte da produção habitacional do período funcionava pela disponibilização de crédito do BNH para companhias públicas subsidiárias, geralmente estaduais, como a COHAB-SP.

um crescimento explosivo de favelas no país, especialmente na RMSP. Neste contexto crítico, o regime militar vai perdendo legitimidade, causa e efeito da ascensão, resistência e enfrentamento de diversas mobilizações sociais e de organizações políticas de oposição que se organizaram a partir de pautas e agentes distintos44 (JACOBI, 1984; KOWARICK, 1983; RODRIGUES, 2007c; BOGUS, 2009).

Neste momento, ganha espaço no pensamento social a teoria crítica da acumulação capitalista, que escancara a super exploração da força de trabalho e a deterioração das condições de vida45. Nesta direção, a favela, de uma disfunção do sistema, passa ser entendida como expressão física de suas contradições. Os estudos e a noção de periferia urbana oriundos deste período desenvolvem-se em conjunto com os movimentos de reivindicação, que trazem à tona a problemática do morar na periferia da RMSP. São organizações relacionadas aos loteamentos clandestinos, às favelas e às ocupações. Como aponta Kowarick (1983), é sobretudo a questão urbana que está em pauta neste momento (VALLADARES, 1983; JACOBI, 1984; PASTERNAK & BALTRUSIS, 2007; BOGUS, 2009).

No que se refere aos loteamentos clandestinos, foram as ações articuladas por seus moradores aquelas que constituíram o primeiro movimento popular organizado, em meados da década de 1970 – o Movimento Contra os Loteamentos Clandestinos (MLC). A articulação se dava a partir dos moradores organizados em associações ou não, os quais aglutinavam-se em torno das Comunidades Eclesiais de Base46 (CEB’s) e de algumas pastorais da Igreja, auxiliados juridicamente por estudantes de direito (JACOBI, 1982; BOGUS, 2009).

Entende-se a partir de Jacobi (1982) que a união dos loteamentos a partir do movimento pôde agregar ações antes individualizadas e dispersas. O movimento, originário na Zona Sul do município de São Paulo, buscando conscientização e participação massiva da população, expandiu-se pela cidade e ganhou visibilidade

44

As contestações se organizaram a partir de pautas e agentes distintos, tais como: estudantes; feministas; negros; trabalhadores; professores e outros profissionais de educação; funcionários públicos diversos; favelados; moradores de loteamentos; desempregados; usuário de transportes coletivos; sem teto; usuário de creches; entre outros.

45 Conforme Sampaio (2003) a obra São Paulo Crescimento e Pobreza 1975 é um marco

deste processo.

46 As Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), que se difundiram no Brasil e na América Latina nas décadas de 1970 e 1980, são organizações que aglutinam moradores de bairros populares e membros da Igreja Católica, influenciados pela Teologia da Libertação. Em São Paulo, as CEBs colaboraram com movimentos de diversas especificidades, como a Luta por Creches em São Paulo.

nacional. Suas principais reivindicações giravam em torno da regularização47 e obtenção de benefícios urbanos para os loteamentos, pressionando poder público, loteadores, imobiliárias e Cartórios de Registro de Imóveis.

Segundo Jacobi (1982), a resposta do Estado a esse processo reivindicatório não construiu uma política pública abrangente, mas forneceu medidas paliativas. Ademais, organizando-se de forma seccionada a partir de colegiados regionais, a atuação do poder público ocorria de forma desigual, fragmentada e burocrática, induzindo justamente a fragmentação do movimento. As regularizações não implicavam em melhoramentos urbanos, mas desresponsabilizavam o loteador e oneravam os moradores pela urbanização, criando-se terreno para o clientelismo político e para a cooptação de lideranças. Segundo Jacobi (1984), as experiências de manifestação na década de 1970 e seu atomismo reivindicatório combinam-se à forma de atuação do poder público à época: parcial, fragmentada, cooptadora e desmobilizante. Ao revés, alguns bairros buscaram novos espaços, conquistaram associações antes concedentes ao clientelismo e reorganizaram entidades autônomas estreitadas com as lutas populares (JACOBI, 1982).

No que concerne às favelas da Grande São Paulo, mobilizações sociais significativas irrompem a partir dos últimos anos da década de 1970. As mobilizações decorrem por diferentes organizações, dispersas e desassociadas, com variadas articulações e propostas. Não ocorre, portanto, a formação de um conjunto homogêneo com participação massiva dos moradores de favela. Assinala Jacobi (1982) que o processo caracteriza-se justamente pela desorganização. Conforme Bogus (2009), as reivindicações trabalhadas por estes movimentos iniciaram-se em torno do abastecimento de água, de luz e de melhorias urbanas gerais, posteriormente, pautaram-se em projetos de urbanização e na questão da