• Nenhum resultado encontrado

Glossário de Siglas

CONSTRUÇÃO ANALÍTICA DE UM OLHAR SOBRE AS PROFISSÕES DE SAÚDE

4. O FECHAMENTO DAS TEORIAS DAS PROFISSÕES NO SEU OBJECTO DE ESTUDO

Inicia-se esta discussão com a identificação de alguns dos traços característicos da sociologia da saúde em Portugal. Sendo expectável que a prática sociológica nacional incorpore tendências e debates externos, o objectivo passa por entender a configuração do raciocínio sociológico na saúde e, assim, situar o contributo que se apresenta entre o capital teórico existente.21

Face à necessidade de um corpo docente dotado de autoridade científica para leccionar e orientar estudos pós-graduados, atribui-se a emergência da sociologia da saúde em Portugal à tese de doutoramento de Graça Carapinheiro (Antunes e Correia, 2009). Seguindo orientações, quer de tradição francófona, quer de tradição anglo-saxónica, Carapinheiro (1993) fez convergir dimensões como o poder e a racionalidade médica para os contextos hospitalares, locais privilegiados de produção e reprodução desse poder. Denominou a sua abordagem como uma sociologia dos serviços hospitalares, fazendo confluir perspectivas da sociologia das organizações, das profissões e da saúde, às quais associou outras formulações de natureza mais alargada como a questão dos processos sociais de vigilância e de controlo exercidos pela medicina.

Muito embora nos dias de hoje a sociologia da saúde em Portugal apresente um indubitável estado de difusão, traduzido quer no aumento das instituições que conferem o grau de doutor na especialidade de saúde, quer nos temas privilegiados, Antunes e Correia (Ibid.) demonstram continuar a existir um núcleo mais restrito de autores nacionais – Graça Carapinheiro e Boaventura de Sousa Santos – e estrangeiros – Foucault, Herzlich, Goffman, Freidson e Parsons – que permitem traçar uma relativa confluência nas construções teóricas das investigações de âmbito nacional. Atente-se ao facto que falar numa relativa e não total confluência diz respeito ao efeito que a filiação institucional

21

Partes constituintes deste ponto representam debates que já foram alvo de avaliações inter-pares (Correia, 2009b, 2009c, 2010a, 2010b).

imprime às opções de investigação, sendo, por este motivo, redutor considerar uma homogeneidade na prática da investigação portuguesa em sociologia da saúde.22

A existência desta relativa confluência teórica pode ser tomada como indicativa de que a sociologia da saúde portuguesa atravessa ainda um processo de consolidação científica. Se por um lado, permanecem por explorar certos domínios empíricos, por outro, aqueles que têm sido estudados, pelo reduzido número de investigações, assumem ainda um estatuto pioneiro.23

Não sendo aqui o lugar para desenvolver esta questão, o que interessa realçar é que as investigações nacionais no domínio da sociologia da saúde têm atribuído um lugar de destaque à análise das profissões (e.g. Carapinheiro, 1993; Lopes, 2001a; Serra, 2004; Carvalho, 2005; Tavares, 2007; Areosa e Carapinheiro, 2008). Nestas, reconhecem-se nos contributos de Freidson (1970, 1986, 1994, 2001) e de Foucault (1975) uma importante ancoragem teórica.24 Se no caso de Freidson essa influência é expressa principalmente através do papel das profissões na divisão do trabalho e nas consequentes relações de autoridade, nas trajectórias de profissionalização, na constituição de jurisdições profissionais e nas estratégias existentes na procura de manutenção de monopólios vários (por exemplo da educação e da formação ou do controlo da prática profissional), por seu lado, o pensamento de Foucault permite uma leitura do modelo biomédico como forma de poder e, nestes termos, de sujeição dos comportamentos.25 A forte influência que Freidson

22

“Efeito de escola” que os autores encontram de forma mais demarcada na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC) do que propriamente no Instituto Superior de Ciência do Trabalho e da Empresa (ISCTE), onde Graça Carapinheiro introduz um efeito particular em relação à sociologia característica aí desenvolvida.

23

A existência deste pioneirismo nalgumas áreas da saúde leva a considerar, para já, insensato falar na consolidação de linhas de investigação emergentes, por estarem ainda directamente dependentes dos seus primeiros intervenientes. É por exemplo o caso das representações e construções sociais, tanto da medicina como da doença (Antunes e Correia, Ibid.).

24

Ainda que a referência não exaustiva a investigações nacionais sobre profissões respeite o espaço empírico da saúde, não podem ficar omissos outros contributos no panorama nacional, entre os quais, Gonçalves (1996) sobre os economistas, Rodrigues (1999) sobre os engenheiros ou Caria (2005) sobre os veterinários.

25

Em traços gerais, Foucault (1975) utiliza a noção de disciplina numa vertente de estruturação dos comportamentos dos indivíduos. O poder disciplinar, entendido enquanto conjunto de técnicas passíveis de serem apropriadas pelos indivíduos, tem uma aplicação directa sobre a conceptualização das organizações, especificamente aquelas onde a medicina desenvolve o seu modelo de compreensão dos corpos, das doenças e, consequentemente, dos sujeitos.

demonstra ter na conceptualização sociológica das profissões em Portugal comprova os argumentos de Sciulli (2005: 917) de que esse autor, inserido na corrente revisionista, a par de outros como Johnson, Larson ou Collins, mantém uma preponderância no actual debate da sociologia das profissões.

A preocupação de Freidson passa, em traços gerais, pelos processos de transformação social das ocupações em profissões e no modo como estas se relacionam com o Estado, com outros grupos profissionais, com os seus clientes e com o fechamento do seu saber (e.g. Dingwall e Lewis, 1983; Walby e Greenwell, 1994; Timmermans, 2008). Associando aos contributos foucauldianos, um conhecimento (científico) adquirido em instituições de ensino reconhecidas para a sua reprodução transforma-se numa

micropolítica de disciplina que assegura uma ordem de acção também ao nível

profissional. Por conseguinte, o exercício da profissão tende a ser entendido pelo ponto de vista da aquisição de conhecimentos que regulam a prática individual, o que nessa medida permite compreender e delimitar diferentes racionalidades profissionais.

Como se disse anteriormente, é nesta articulação de contributos que se situa parte das abordagens da sociologia das profissões de saúde que tem caracterizado as investigações de âmbito nacional. Saberes e Poderes no Hospital de Graça Carapinheiro apresenta com clarividência um posicionamento teórico interaccionista que analisa o processo de construção de lógicas de dominação e de controlo exercido pelos saberes da profissão médica, perspectiva teórica que aliás tem vindo a orientar análises sociológicas recentes que conferem um lugar de destaque à reflexão de autores como Berger e Luckman (e.g. Serra, 2004).

Mapeados os contributos fundamentais na teorização das profissões de saúde em Portugal, importa perceber como os paradigmas nas profissões evoluíram. Convocando os contributos de Torstendahl (1990: 44 – 5), o estudo das profissões pode ser dividido em três grupos de abordagens. Em primeiro lugar, as que caracterizam as profissões, o profissionalismo e a profissionalização, de modo a obter uma base adequada de classificação de pessoas e de ocupações. Perspectivam os grupos profissionais por via da sua história e pré-história. Para Torstendahl, tratam-se das abordagens que analisam as ocupações claramente identificadas enquanto profissões. Em segundo lugar, as abordagens que se centram nas relações (sobretudo de conflito) entre grupos profissionais. Dizem respeito às ocupações que visam o seu processo de profissionalização, isto é, de conquista de poder sobre a sua actividade. Em terceiro lugar, as abordagens que se debruçam sobre

as relações de um determinado grupo ocupacional ao longo do tempo com respeito a outros grupos ocupacionais. Procuram-se mudanças, tanto na sua constituição, como na sua condição no contexto da sociedade em que se insere. Este tipo de problematização permite compreender principalmente como as profissões se reconfiguram em contextos de mudança social.

Nestes termos, surge com alguma clareza a ideia de que entre as abordagens consideradas é atribuído um lugar de destaque às profissões em si. Sem querer por enquanto aprofundar este argumento, o importante a salientar neste momento é que a análise das profissões, ora pelas suas características ora pelos seus processos, apresenta uma centralidade em torno da vertente institucional. Na realidade, um dos traços marcantes que se irá identificar na sociologia das profissões, e que acaba por levar ao argumento central neste trabalho, é que a construção deste campo de saber seguiu um processo tendencial de fechamento sobre si mesmo, isto é, encerrado sobre o seu objecto empírico, ou seja, nas próprias profissões.

Pode-se associar este processo, desde logo, às preocupações precursoras de autores clássicos como Weber, Durkheim ou Spencer, para os quais as profissões são as formas modernas dos antigos ofícios, aparecidas para responder às novas exigências sociais e económicas (Dubar, 1991). Este modo de conceber a existência das profissões – diga-se que determinante num dado momento histórico, político e social – acabou por condicionar o desenvolvimento deste debate, imprimindo na sociologia das profissões uma configuração identitária muito própria.

Tal fechamento comprova-se olhando para as interrogações centrais que emergiram desde a segunda metade do século XX, período em que se deu a sua sedimentação teórica. Trata-se de questões que permanecem nos nossos dias, ainda que possam apresentar um maior grau de sofisticação conceptual: “o que é uma profissão?”, “como é que uma

ocupação se transforma em profissão?”, “sob que condições ocorre essa transformação?”, “qual a função social das profissões?”, “qual o sentido da evolução das profissões?” (Rodrigues, 2002: 3).

Olhando para a forma como Rodrigues (Ibid.) mapeia o que foi e o que tem sido a ancoragem teórica da sociologia das profissões percebe-se o porquê desta absoluta necessidades de pensar as profissões em si mesmas. São, assim, separadas em duas as tradições teóricas na análise das profissões: uma centrada na estrutura e outra no processo,

e que acabam por divergir nos temas, nos objectivos, nas problemáticas e nas metodologias.26

As abordagens centradas na estrutura consideram as profissões como grupos reais, que partilham valores e uma ética de serviço à sociedade (vd. Parsons, 1966; Merton, 1982). A divisão do trabalho representa um processo de diferenciação funcional, já que as profissões evoluem de estruturas organizativas anteriores, por via tanto da sua capacidade para responder a necessidades sociais essenciais, como pela sua evolução técnica e material.

As abordagens centradas no processo, por sua vez, não analisam as profissões como grupos reais, mas como categorias construídas socialmente suportadas por uma ideologia de profissionalismo. Constituem, por isso, uma crítica à natureza essencialista que a existência de um tipo-ideal de profissão pressupõe. Na medida em que valorizam uma interpretação contextualizada histórica, económica, política e socialmente, assume-se a divisão do trabalho como um facto social resultante de relações de negociação e de conflito na obtenção de autonomia funcional. Por autonomia entende-se o exercício do trabalho sem o controlo de outras profissões e das organizações onde a actividade profissional é desenvolvida (cf. Freidson, 1970). Cabe dizer ainda que esta orientação pelos processos inclui formas interligadas, mas não inteiramente coincidentes, de conceptualizar as profissões, como é o caso das perspectivas de Johnson (1972), Larson (1977) ou Collins (1990).27

Como se viu anteriormente, esta constitui a abordagem predominante no domínio das profissões de saúde ao nível da investigação nacional, onde as dinâmicas de fechamento social das profissões (Hugman, 1991) e, consequentemente, de reforço da sua

26

Para uma síntese mais completa ver Rodrigues (2002: 131 – 2). Salientar apenas que embora esta discussão seja construída com base em autores da segunda metade do séc. XX, o pensamento, tanto funcionalista como interaccionista, tem início anos antes. No caso do interaccionismo são apontados contributos iniciais da Escola de Chicago, enquanto no funcionalismo autores dos anos 30, como Carr-Saunders (ver Sciulli, 2005 ou Saks, 1983).

27

Isso é explícito, por exemplo, no caso dos vectores explicativos do poder profissional. Johnson parece centrar-se mais na obtenção de poder por via da relação assimétrica entre o profissional e os seus clientes, enquanto Larson confere maior atenção à questão do fechamento das profissões enquanto capacidade de controlo do acesso à actividade e do seu mercado. Collins, por seu lado, reflecte sobre o modo como as profissões obtêm poder na sua relação com a estrutura capitalista.

posição na divisão social do trabalho são perspectivadas, tendo a socialização profissional como mecanismo de transmissão de aprendizagens sociais e culturais.

Um outro modo de entender estas diferenças relaciona-se com um hiato entre a perspectiva francófona e a perspectiva anglo-americana (Evetts, 2006b). Se a primeira tem suportado toda uma linha de investigação sobre a socialização profissional e o modo como esses processos conduzem à partilha de identidades profissionais, a segunda, tem privilegiado a dimensão dos poderes e dos privilégios ocupacionais.

Actualmente, esta segmentação continua a ser evidente mesmo perante desenvolvimentos recentes que procuram formas mais ou menos híbridas de ligar pressupostos associados a essas duas formas distintas de conceber as profissões. Há, no entanto, uma diferença entre o debate característico até aos anos 70 e aquele que se desenvolveu, grosso modo, na segunda metade dos anos 80. Se nas perspectivas, tanto funcionalista como interaccionista, é imediatamente reconhecível os traços teóricos responsáveis pelo seu afastamento conceptual, nesta vaga mais recente de propostas passam a vigorar posições de síntese que equacionam as fraquezas e virtuosidades de uma e de outra.

É à análise sistémica de Abbott (1988) que habitualmente se atribui o começo desta terceira corrente (e.g. Rodrigues, 2002), a que se juntam outros autores cuja posição é mais comparativa do que propriamente sistémica (e.g. Torstendahl, 1990; Siegrist, 1990). Convém mencionar que situar no trabalho de Abbott o marco inicial desta terceira corrente não anula o facto de há muito tempo serem procuradas formas de compatibilizar o pensamento funcionalista ao interaccionista. Veja-se o caso de Wilensky (1964) em que a partir do seu trabalho começou a parecer redutor assumir um posicionamento que contradiga linearmente qualquer uma das perspectivas anteriormente consolidadas.

Como se disse, o traço característico desta nova fase nas teorias das profissões é a articulação e complexificação daquilo que outrora se sedimentou como duas escolas de pensamento distintas – veja-se, por exemplo, a opção de Rodrigues (2002: 4) em designar esta como “a abordagem sistémica e comparativa ou a procura de modelos complexos”. Ainda assim, isto não significa que hoje em dia tenham deixado de existir propostas que assumidamente continuam a salientar as distâncias entre o funcionalismo e o interaccionismo. Evetts (2003; 2006b) fala de um intenso debate em torno da questão do profissionalismo, considerando existir uma corrente que procura reequacioná-lo sob o

ponto de vista do seu valor normativo positivo para a ordem social (e inclui os contributos mais recentes de Freidson próximos da teoria dos sistemas de Parsons), distinta de outra, cuja interpretação do profissionalismo continua a ser numa lógica dos efeitos negativos de uma ideologia de controlo e de fechamento por parte das ocupações. A autora insere-se nesta última perspectiva, indo buscar aos contributos de Foucault a dimensão da normalização e do controlo social.

Ainda assim, um exemplo explícito da forma como hoje em dia se privilegiam abordagens síntese na sociologia das profissões é encontrado em Champy (2009). O autor realça a existência de algumas incompatibilidades conceptuais entre o funcionalismo e o interaccionismo, por exemplo, no que representa uma profissão. No entanto, o seu objectivo é salientar elementos de ambas as perspectivas e o modo como a sua articulação permite avanços na conceptualização das profissões. Se por um lado, considera que deve ser mantida como irredutível a natureza de determinadas actividades, dada a função que envolvem e a sua responsabilidade na vida social, por outro, argumenta que existem mecanismos alargados de defesa dos monopólios por parte de outras ocupações que não são apenas detidos pelas profissões. Simplificando, se é verdade que a natureza das funções diferencia o lugar das profissões na sociedade, ou seja, o grau de complexidade e incerteza que as suas decisões envolvem, é igualmente verdade que não se pode esperar encontrar determinadas características que, invariavelmente, diferenciem as profissões de outras ocupações. Isto porque, é imprudente ignorar os processos de conquista dos diferentes monopólios. Em suma, e na esteira do raciocínio de Abbott, Champy (Ibid.) considera relevante a ideia de que as profissões são configurações contingentes, mas cuja actividade pode encontrar uniformidades espaciais decorrente das suas jurisdições

profissionais serem reconhecidas por instâncias da sociedade, como o Estado ou os seus clientes.28

Num outro domínio da discussão, o contributo de Champy permite comprovar aquilo que anteriormente se disse ser o fechamento do campo das profissões sobre si mesmo. Com efeito, nesta terceira fase de síntese permanece uma construção conceptual totalmente alheada dos argumentos e dos protagonistas da esfera da teoria social. Sabendo que a ordem social, portanto, a padronização dos comportamentos sociais, é o ponto elementar do pensamento sociológico (Pires, 2007), a sociologia das profissões tem analisado as profissões nas e pelas profissões, ficando de fora a reflexão sobre os pressupostos epistemológicos de se adoptar um posicionamento funcionalista, interaccionista ou de síntese entre esses dois contributos.

Este é, contudo, um alheamento puramente discursivo, dado que adoptar uma perspectiva funcionalista e/ou interaccionista implica sempre uma opção sobre o entendimento que se confere à estrutura e à acção social. Por exemplo, em que medida é possível separar no pensamento de Parsons o seu entendimento essencialista das profissões (1966) do modo como concebe a teoria dos sistemas sociais (1951)?

O argumento que se apresenta é que este fechamento das profissões pelas profissões, comprovado, desde logo, pelas questões fundamentais que se têm colocado neste campo da sociologia (cf. Rodrigues, 2002: 3, apud. p. 32), conduz àquilo que se pode designar como o predomínio de uma análise institucional. Embora não seja condição determinante, as análises de tipo institucional assumem maior dificuldade em

28

Estes pressupostos teóricos levaram Champy a considerar quatro objectos sociológicos distintos. O primeiro e que mais interessa nesta discussão refere-se a um conjunto de profissões que, com base no conceito de prudência de Aristóteles, procedem mais do que outras a um raciocínio de adaptação à singularidade. É o caso de profissões como a medicina em que a complexidade inerente às suas funções faz com que a tomada de decisão revele maiores níveis de indeterminação. De algum modo, a proposta do autor acaba por constituir a base daquilo que Freidson (1994) se refere como sendo autonomia ou Evetts (2001) por discricionariedade. O poder destas profissões decorre de demonstrarem socialmente os benefícios que o seu fechamento profissional pressupõe para a qualidade do serviço prestado. O segundo objecto refere-se a actividades judiciais cujo fechamento decorre das suas funções de criação dos conteúdos legais, através dos quais um país se rege. O terceiro objecto dá conta de actividades cujas funções são assumidas pelo Estado como tendo um carácter de interesse nacional. São actividades que, contrariamente às anteriores, não se vêm protegidas por algum grau de indeterminação dos seus saberes, mas que são considerados centrais para o desenvolvimento de um país (o autor pensa no sector dos transportes). O quarto objecto sociológico diz respeito a todo o resto de actividades que não são consideradas profissão.

conceptualizar a dimensão individual da acção: ou simplesmente não a consideram por não ser essa a preocupação do seu enfoque ou, por via dos seus pressupostos teóricos, os comportamentos dos indivíduos em contexto profissional assumem uma lógica de reprodução em conformidade com as estruturas sociais que os delimitam.

No caso em particular da sociologia das profissões, esta ideia é algo evidente, independentemente de a questão ser posta em termos das estruturas ou dos processos, dado que a preocupação de base tem sido a compreensão sobre o modo como as profissões se relacionam com outras estruturas: saberes, Estado, clientes e outras profissões. Por exemplo, que elementos teóricos a sociologia das profissões oferece para explicar como, nos mesmos contextos, os profissionais numa mesma posição hierárquica na estrutura profissional podem exibir formas de actuação diferentes ou mesmo contraditórias? Como se comprova pelas palavras de Evetts (2006b: 135):

in these ways, the normative value system of professionalism in work, and how to behave, respond and advise, is reproduced at the micro-level in individual practitioners and in the workplaces in which they work. Some of the differences in occupational socialization between occupations have been identified but the general process of shared occupational identity development via work cultures, training and experience was regarded as similar across occupations and between societies.