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Desde que houve a introdução da Lei 13.104/15 – Lei do Feminicídio no ordenamento jurídico, bem como nas qualificadoras do crime de Homicídio- Artigo 121- um grande debate no âmbito jurídico foi concretizado. Havendo aqueles que defendem a lei e demonstram sua necessidade e eficácia e há aqueles que as rejeitam por completo, considerando-a um simbo- lismo penal.

Direito Penal Simbólico ou simbolismo penal é aquele que por ser extremamente rigo- roso, na prática torna-se extremamente ineficaz. Quando o legislador para dar uma satisfação

para o clamor social, cria uma nova tipificação penal, não se preocupando com a efetividade e sim em dar uma devida satisfação à sociedade.

O simbolismo penal nasce do sentido de urgência, serve para gerar sensação de tran- quilidade para a sociedade, uma sensação “Fake” de que o Estado está realmente tomando as devidas providências para aquela necessidade, aquela urgência da sociedade. Ele defende uma ausência impreterível de reformar de forma precisa a legislação penal.

O Direito Penal é um instrumento legítimo utilizado pelo estado para controlar a vio- lência, por meio da tutela dos bens jurídicos mais relevantes. Entretanto, pelo viés simbólico, o Direito Penal se baseia no medo e na insegurança, tentando gerar uma fal- sa sensação de que o Estado consegue, por meio das leis penais, alterar subitamente a realidade social. Noutros termos, por meio da criação de leis mais severas ou do au- mento do rigor punitivo (aumento de penas e diminuição de direitos na execução pe- nal, por exemplo), tenta-se tranquilizar a sociedade. De certa forma, a mídia sensacio- nalista contribui para a instituição de um Direito Penal simbólico, ao intensificar o in- teresse da população pela questão criminal, especialmente pela exploração de determi- nados fatos criminosos como se fossem corriqueiros. (TALON, 2018).

Trata-se de uma dogmática que se perfaz em ações retóricas do Estado, que procura a edição de leis penais com efeitos práticos insignificantes, resultante de um critério não só ri- goroso, mas também eficaz para sua coerente aplicação.

Além da inefetividade, o Direito Penal Simbólico possui consequências que não afe- tam apenas a legislação, mas sim toda a sociedade:

Verdadeiramente, o Direito Penal simbólico descumpre sua função, pois, apesar de ter como fundamento a busca da segurança pública, institui uma enorme insegurança jurí- dica, seja pelo excesso de alterações legislativas (como no caso da embriaguez ao vo- lante e do homicídio causado por motorista embriagado), seja pela ausência de reflexão sobre o sentido da nova legislação (como ocorreu ao tornar crime hediondo a posse ou o porte de arma de fogo de uso restrito).Diante da busca de uma satisfação popular, di- ficilmente a legislação decorrente do Direito Penal simbólico terá alguma aparência de ressocialização. Nessas situações, a função retributiva da pena é invocada como única alternativa para resolver os problemas sociais. Ademais, outro efeito do Direito Penal simbólico que é contrário ao seu intento é o aumento da desconfiança da população. Muitos dos projetos de lei de caráter simbólico são inconstitucionais. Os poucos que são aprovados no Legislativo sofrem inúmeras restrições durante a sua aplicação, co- mo no caso do regime integralmente fechado para os crimes hediondos e equiparados. Nessa linha, a população passa a acreditar que, realmente, a legislação não é respeitada no Brasil. Cria-se uma bola de neve: as leis, por serem desnecessárias ou inconstituci- onais, não são aplicadas; o povo acredita que a legislação não é cumprida; a solução aparentemente mágica é… sim, mais leis desnecessárias, desproporcionais e inconsti- tucionais. Leis desnecessárias, rígidas e com penas desproporcionais são alguns dos re- sultados do Direito Penal simbólico, que reflete uma expressão contraditória: se o Di- reito Penal somente deveria ser utilizado quando realmente fosse necessário, a sua forma simbólica (ineficaz e com o desiderato preponderante de satisfazer a população) não seria, tecnicamente, Direito Penal. Portanto, não se trata de uma intervenção legí- tima do Estado. (TALON, 2018).

Após conceituar o simbolismo penal, é claramente possível relaciona-lo ao Feminicí- dio. Há grupos que sustentam que o Feminicídio é meramente simbólico, de que a pena im- posta aos autores do crime remete o simbolismo penal, alegam que o Feminicídio torna-se eficaz apenas para aqueles que são reincidentes, sendo uma lei “banal” para os primários. Afirmam que a qualificadora do Feminicídio é mera sugestão do simbolismo penal, criando uma concepção falsa de que antes não havia pena para crimes que eram motivados pelo gêne- ro das mulheres, além do mais, admitem que a criação do Feminicídio violaria o princípio do Direito Penal Mínimo, ou seja, não há lei penal sem necessidade.

Não só doutrinadores se posicionam nessa relação (Direito Penal Simbólico e Femini- cídio), a sociedade constantemente estão levando essa hipótese em consideração. “A Lei 13.104/2015, como se viu, diante de seus contornos, pouco de novo apresenta ao direito penal, afigurando-se, em verdade, como medida claramente simbólica, haja vista que incongruente com um real escopo de diminuir a ocorrência de delitos” (FIGUEREDO, HIRECHE, 2015)

Por que a Lei do Feminicídio possui aspecto do Direito Penal simbólico, guiado pelo populismo penal? Por adotar a política da repressão sem prevenção. Isto é, a priori- dade é o tratamento do sintoma “morte”, mas não verifica se esse apresentará resul- tados de cura para a “doença” violência contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, pois notório é o descaso tanto com redução da impunidade quanto com as medidas protetivas, voltadas para conter os crimes prenúncios do homicídio, quais sejam, ameaça e lesão corporal (DORATEU, ANDRADE 2015 apud GRECO, 2009, p. 12; NUCCI, 2015).

Nucci (2015) em seus ensinamentos alega que não é a criação do tipo penal que cessa- ra ou diminuirá excessivamente os homicídios contra as mulheres, mas sim “ir à raiz do pro- blema” (DORATEU, ANDRADE, 2015).

Partindo dessa premissa, mais uma vez, vem em pauta a outra relação já estabelecida por muitos doutrinadores, a respeito do crime passional e do Feminicídio, podendo nesse pon- to adicionar o simbolismo penal, afinal o ex-cônjuge que possuía uma relação de obsessão com sua mulher e não admitindo o término, mata-a com uma facada, agindo com torpeza ou o namorado que mata a namorada porque ela recusou a pegar um copo de água – motivo fútil- enquadraria no rol de crime hediondo, sendo inútil a utilização da qualificadora do Feminicí- dio (simbolismo penal).

Outra característica que corrobora para o efeito simbólico e desnecessário, da Lei do Feminicídio está no fato de que não ocorreu alteração em sua essência, visto que, veio penalizar algo que já estava previsto legalmente, ou seja, poderia ser caracterizado co- mo motivo torpe ou fútil, consagrados, respectivamente, nos incisos I e II, do parágrafo 2º, do artigo 121, do Código Penal Brasileiro (DORATEU, ANDRADE, 2015).

Além disso, um prequestionamento a respeito do Feminicídio como Direito Penal Simbólico é justamente o fato dos homens (gênero) se ofenderem com a tipificação. Muitos doutrinadores não entendem a necessidade da tipificação no ordenamento, por defenderem que o homem não possui esse “privilegio”, chegando até o ponto de ridicularizar a Lei. Po- rém, deve ser ressaltado que o simbolismo nesse capítulo é justamente a respeito da aplicabi- lidade da lei perante o crime de Feminicídio.

Cabette (2015) é um dos autores que mostram o inconformismo a respeito da necessi- dade da aplicabilidade da Lei do Feminicídio:

Em primeiro plano é preciso dizer que a honra é um bem jurídico passível de ser objeto de legítima defesa, desde que dentro dos estreitos limites impostos por essa excludente de ilicitude (artigo 25, CP), vez que não se faz distinção para tal fim entre bens jurídi- cos materiais e imateriais. [5] Com isso obviamente não se pretende dizer que a cha- mada “legítima defesa da honra” (sic) do matador de mulher possa sequer ser passível de consideração quanto à caracterização dessa excludente. A situação claramente não satisfaz os requisitos da Legítima Defesa de acordo com o artigo 25, CP, com especial destaque para os “meios necessários” e a “injusta agressão atual ou iminente”. Ade- mais, como muito bem destaca Mirabete, “a honra, (...), é atributo pessoal ou persona- líssimo, não se deslocando para o corpo de terceiro, mesmo que este seja a esposa ou o marido adúltero”. [6] Acrescente-se a tudo isso o fato da absoluta ilogicidade dessa su- posta “legítima defesa da honra” (sic), eis que se alguém viola os deveres de fidelidade conjugal assumidos civilmente (e até religiosamente em muitos casos), o desonrado, quem comete uma desonra a si mesmo é o cônjuge infrator e não aquele que foi traído. Portanto, sequer há qualquer bem jurídico a ser defendido nesses casos. O que há é violência injustificável motivada por amor próprio ferido e sentimentos mesquinhos de posse e orgulho. Muito longe de configurar alguma modalidade de legítima defesa, es- sas situações em que cônjuges, namorados, noivos etc. Matam uns aos outros por ciú- mes são típicos exemplos de “motivo torpe” que qualifica o homicídio. Mas, hoje, com o advento do “Feminicídio” perceba-se que há uma diferença: se o homem traído mata a mulher, a qualificadora é a do “Feminicídio”; se a mulher traída mata o homem trai- dor, a qualificadora é a do “motivo torpe”. As penas são as mesmas. Indaga-se: qual a utilidade disso?

Posicionamento que não deve ser acolhido, uma vez que fora analisada em capítulos anteriores as características do crime, assim como o menosprezo à mulher (razão de gênero) e a necessidade de uma medida rigorosa para cessar ou diminuir a violência.

Outro ponto de partida para o enquadramento do Feminicídio como simbolismo penal é justamente as estáticas da violência contra a mulher após a criação da lei, para a verificação da diminuição ou aumento dos casos. De acordo com o site de Secretária de Segurança Públi- ca do Estado de São Paulo, no mês de dezembro do ano de 2018 o índice de homicídio doloso contra mulheres foi em um total de 11 casos, enquanto no mês de dezembro de 2014, totalizou em 16 casos, havendo uma diminuição em Março de 2015 (vigência da lei 13.104/15) em um total de 08 casos.

Contudo, há o grupo de adeptos ao Feminicídio, aqueles que são contra a ligação ao direito simbólico e que sustentam a impossibilidade de violação do principio do direito penal mínimo nos casos de violência contra as mulheres, pelo fato de que a violência em si atinge a vida, assim como outros direitos e bens jurídicos (integridade física, psíquica, moral), haven- do a necessidade do recurso direcionado ao Direito Penal.

Não usar o Direito Penal para estes delitos resultaria absurdo. Não nos equivoquemos, estamos falando de violência contra as mulheres. Não morreram. As mataram. Quando se estabelecem as agravantes do homicídio ou do homicídio qualificado, é para sancio- nar não quem as matou, senão como as mataram. É a lógica do mundo penal para po- der estabelecer as qualificações. A partir deste ponto de vista se faz necessário um tipo penal que qualifique como estão matando estas mulheres e em que condições – que não são as mesmas que contém o homicídio qualificado. Quando falamos da perda da vida o conceito de uma intervenção mínima do Direito Penal é inadmissível. O direito é uma ferramenta de defesa para as mulheres. (YLLAN, 2011, p. 203).

Obviamente que para uma conclusão devida, não pode ser interpretado apenas fatos ou somente os dados, sendo necessário uma conexão entre fatos e dados. Entretanto, neste con- texto os dados e fatos se afastam, visto que, os dados mostram que houve uma efetividade em relação aos índices de violência contra a mulher, no entanto, os fatos direciona cada vez mais o feminicídio como um simbolismo penal, por não possuir tamanha efetividade em sua apli- cabilidade como deveria ser, além de possuir uma pena já existente. O feminicídio foi criado com a intenção de salvaguardar a vida das mulheres, de dar à elas segurança, devendo haver de fato uma diminuição drástica nos casos em questão. A lei 13.104/15 é extrema e deveria possuir uma efetiva extrema igual, deveria haver um equilíbrio, todavia, ainda é uma realida- de brasileira os crimes macabros contra as mulheres.

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