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Parte II Temas desenvolvidos na Farmácia de Coimbrões

Tema 1 Envelhecimento cutâneo

2. Introdução

2.1. Fisiologia da pele

A pele é um órgão, o maior do corpo humano e provavelmente o mais sensível, sendo vulgarmente designada como uma camada de tecido que protege os órgãos internos [41-43]. A camada mais externa da pele, a epiderme, apresenta uma

renovação constante de células (queratinócitos, melanócitos, células de Merkel e células de Langerhans)[43]. Esta camada é constituída por um filme hidrolipídico (água e gorduras) que permite dar firmeza e proteger contra agentes agressores (bactérias e fungos por exemplo). Uma pele saudável apresenta um pH fracamente ácido (5,4- 5,9)[43, 44]. Este pH é o ideal para garantir o crescimento de microrganismos responsáveis pela flora da pele e a eliminação de outros que danificam a mesma [43]. A espessura da pele difere consoante a região do corpo, sendo por exemplo mais fina em redor dos olhos e mais grossa na sola dos pés [43, 45, 46].

A camada intermédia, a derme, é constituída maioritariamente por tecido conjuntivo (colagénio e elastina) tornando a pele resistente e elástica, típica de uma pele saudável. Estas fibras estão envolvidas por ácido hialurónico, capaz de reter água e de manter o volume da pele. Com o envelhecimento, a capacidade de síntese natural de colagénio e de elastina e a retenção de água vai diminuindo, surgindo as rugas. Ao contrário da epiderme, a derme é vascularizada. Esta camada é regulada pelo sistema nervoso autónomo na inervação da pele, mas também é responsável pela regulação da temperatura corporal e da pressão arterial [43-45].

Abaixo da derme, está a camada designada por hipoderme que é constituída por células adiposas (fornecem energia e servem de isolamento térmico), fibras de colagénio especiais e vasos sanguíneos. Cada pessoa tem um número de células gordas variáveis, diferindo ainda entre homem e mulher [43-45, 47].

A pele varia consoante o metabolismo de cada pessoa, as características hereditárias, os hábitos de vida, o ambiente em que reside, entre outros fatores. Essas condições biológicas e climáticas permitem classificar a pele de acordo com as suas características fenotípicas (pele branca, morena, muito morena ou muito escura) e grau de oleosidade da mesma (seca, sensível, normal, oleosa, mista ou madura) [46].

A pele é um órgão fundamental com um papel complexo nos processos biológicos da vida, nomeadamente, na ativação de células do sistema imunológico, protegendo-o de agentes agressores provocadores de doença [43, 45, 47].

2.2. Envelhecimento cutâneo

2.2.1. Alterações fisiológicas da pele

À medida que a pele envelhece ocorrem modificações fisiológicas e estruturais especificas nas várias camadas. A espessura da epiderme torna-se mais fina nas regiões do corpo onde o processo de renovação celular se torna mais lento, nomeadamente no rosto, no pescoço, nos braços e nas mãos. A síntese de lípidos fica comprometida diminuindo a coesão celular o que origina anomalias na permeabilidade da barreira celular da pele. Com o envelhecimento da epiderme há uma menor

hidratação, menor quantidade de células importantes na pigmentação e imunidade da pele (melanócitos e de células Langerhans) e uma menor comunicação (de oxigénio e nutrientes) entre as camadas. A pele envelhecida torna-se seca, com textura e pigmentação irregular e com rugas[41, 48].

A derme também passa a ter uma menor espessura, uma vez que diminui a quantidade existente de fibroblastos, mastócitos, colagénio, elastina e de ácido hialurónico. Tal processo contribui para uma maior flacidez e menor elasticidade da pele. A camada de adipócitos presentes na hipoderme diminui, levando também ao aparecimento de rugas [41, 48].

Os órgãos anexos da pele também sofrem alterações, há a tendência para reduzir a produção tanto das de glândulas sebáceas (a pele a tornar-se mais seca) como das glândulas sudoríparas (há menor produção de suor). Os folículos pilosos diminuem em quantidade e as unhas alteram de tom de cor e ficam mais finas. É importante referir que há uma menor função sensitiva pois há um menor número de terminações nervosas, o que pode levar ao aparecimento de xerose cutânea, diminuição sensitiva, cabelo fraco e unhas baças e quebradiças [41, 48].

2.2.2. Reflexo do estado de saúde geral

A conexão entre a nutrição, o estado da pele e o efeito no envelhecimento da mesma tem suscitado cada vez mais interesse por parte dos investigadores e da população em geral. O envelhecimento cutâneo envolve dois processos biológicos independentes, o envelhecimento intrínseco da pele (o envelhecimento cronológico) e o envelhecimento extrínseco da pele (pele envelhecida) [41].

O processo de envelhecimento intrínseco da pele envolve a perda de funções de homeostasia fisiológica, de defesa a agentes externos, de regulação e de replicação celular que consequentemente levam à diminuição da elasticidade da pele, ao aumento da fragilidade, à diminuição da cicatrização, e ao aparecimento de flacidez, rugas e linhas de expressão [41].

O envelhecimento extrínseco da pele resulta de fatores externos e ambientais como a exposição crónica ao sol, a radiação ultravioleta (UV), o tabagismo, a poluição, a privação de sono e a má nutrição. A radiação UVB (de onda curta) interfere principalmente nos queratinócitos, produzindo radicais livres que vão induzir mutações diretas no DNA. A radiação UVA (de ondas longas) afetam os queratinócitos da epiderme e os fibroblastos da derme, gerando mutações indiretas no DNA mitocondrial [41].

A melhor forma de contrariar o envelhecimento extrínseco da pele é a prevenção. Deve-se optar por um estilo de vida saudável, evitando níveis de stress prolongados e

dando importância por exemplo aos cuidados com o corpo, à prática de exercício físico, a uma dieta nutricional equilibrada, que inclua a ingestão de alimentos ricos em antioxidantes [41].

2.2.3. Nutrição e prevenção

Numa sociedade em que a preocupação com a prevenção do envelhecimento cutâneo tem ganho mais adeptos, faz com que evolução dos estudos da biologia da pele caminhe no sentido do desenvolvimento de tratamentos inovadores. Os produtos cosméticos existentes no mercado farmacêutico conjugam uma série de vitaminas com funções biológicas que visam a minimização da expressão de rugas.

A pele naturalmente tem antioxidantes endógenos enzimáticos (superóxido dismutase, catalase e glutationa peroxidase) e não enzimáticos (vitamina E, coenzima Q10, vitamina C e carotenoides), em que a principal função é eliminar as ROS produzidas pelo natural metabolismo celular. No entanto, estas reversas antioxidantes endógenas podem esgotar-se facilmente devido aos fatores extrínsecos do envelhecimento anteriormente descritos, provocando um estado de stress oxidativo permanente [41].

Agentes antioxidantes capazes de promover a saúde e a beleza da pele são os carotenoides, tocoferóis, flavonoides, vitaminas A, C e D, ácidos gordos essenciais (ómega-3). A estimulação apropriada de espécies reativas de oxigénio (ROS) parece ter efeitos benéficos na proteção celular e no antienvelhecimento. As ROS estimulam a ativação de fosforilações especificas de um fator de transcrição especifico (FoxO) das proteínas cinase, levando a sua translocação do citoplasma para o núcleo, que deste modo, leva a indução da expressão de enzimas antioxidantes, como a enzima superóxido dismutase, a enzima catalase, etc. Assim, a expressão e regulação positiva das enzimas antioxidantes intrínsecas da célula protegem a mesma contra as ROS [41].

Resumidamente, serão apresentados alguns antioxidantes utilizados em formulações de antienvelhecimento:

2.2.3.1. Vitamina C

A vitamina C (ácido L-ascórbico) é solúvel em água, fotossensível e um dos antioxidantes mais importantes que se encontra natureza em duas formas: reduzida (ácido ascórbico) ou oxidada (ácido deidroascórbico). Não existe naturalmente no organismo humano, logo a sua ingestão em quantidades adequadas é essencial para saúde. Os alimentos mais ricos neste composto são as frutas e vegetais (cítricos, groselha, goiaba, pimenta e salsa). A vitamina C pode ser administrada por via oral ou pode ser de uso tópico exercendo os seus efeitos ao nível da pele. Trata-se de um

cofator da lisil e prolilhidroxilase, ambas estabilizadoras da estrutura helicoidal do colagénio. Também, tem um papel importante na síntese de colesterol, absorção de ferro e aumenta a biodisponibilidade do selénio. Uma das manifestações na pele mais comuns devido à deficiência em vitamina C (influenciando a síntese de colagénio), para além do escorbuto, é a ceratose de folículos pilosos [41, 49].

Este ácido é utilizado cada vez mais em produtos cosméticos em formulações de antienvelhecimento e de proteção solar. Como se oxida facilmente na exposição ao calor, protege outras espécies do processo de oxidação. As formulações estão desenvolvidas combinando a proteção através de um filtro UV e de antioxidantes. Devidos às características físico-químicas da vitamina C a sua utilização em produtos cosméticos não é tarefa fácil devido à rápida redução e degradação na presença de oxigénio [41, 49, 50].

Suplementos alimentares com vitamina C funcionam como fotoprotetores, capturam os radicais livres e reparam a vitamina E oxidada ligada à membrana. Muitas das formulações presentes no mercado baseiam-se em ésteres mais estáveis ou em outros derivados da vitamina C [41, 49].

2.2.3.2. Vitamina E

O tocoferol (vitamina E) é um antioxidante presente na membrana lipossolúvel com propriedades de eliminação de radicais livres (oxigénio singleto). Como a vitamina C, não é sintetizado naturalmente pelo organismo e ambos atuam de forma sinérgica. Quando há dano celular devido a moléculas da radiação UV ocorre um conjunto de reações que leva à oxidação da vitamina E. Este composto regenera através de uma reação desencadeada pela vitamina C, glutationa ou coenzima Q10. Alimentos com quantidades suficientes em vitamina E são vegetais, óleos vegetais (girassol, trigo), milho, soja e carne. A ingestão destes produtos contribui para a diminuição de processos que danificam o colagénio e que estimulam a peroxidação lipídica, processos esses existentes no envelhecimento da pele [41, 51].

A vitamina E atua estabilizando a membrana celular através da inibição da oxidação dos ácidos gordos polinsaturados (ácido araquidónico) dos fosfolípidos da membrana. O uso tópico deste composto leva à redução de eritemas, dano celular cutâneo devido à exposição UVB e fotocarcionogénese. A falta de vitamina E leva a alterações seborreicas, secura, despigmentação em prematuros, etc. [41, 51]. O uso combinado de vitaminas C e E por via oral demonstraram um aumento fotoprotetor comparado com utilização em monoterapia [41, 51].

2.2.3.3. Carotenoides

Carotenoides (vitamina A, β-caroteno, astaxantina, retinol) são antioxidantes altamente eficazes com propriedades fotoprotetoras. O β-caroteno tem atividade

provitamina A e atua eliminando radicais lipídicos, protegendo assim, a formação de eritemas induzidos pela radiação UV. Alimentos que contém este fotoprotetor endógeno são cenoura, abóbora, batata doce, manga e papaia. A astaxantina presente em microalgas, salmão, truta, camarão, lagostins e crustáceos, parece ter aplicações promissoras na saúde e nutrição da pele. Os retinoides são outro composto utilizado na prevenção e tratamento do envelhecimento da pele. Estes dividem-se em retinoides naturais (retinol, tretinoína e isotretinoina) e sintéticos (tazarotene e adapaleno) [41, 52, 53].

A vitamina A atua na expressão de genes de diferenciação e de proliferação das células, tendo cada retinoide uma atividade independente na ligação aos recetores nucleares específicos. O primeiro retinoide a ser usado foi a tretinoína, atua estimulando a renovação das células o que provoca um melhoramento de rugas, da pigmentação e da aparência da pele. Normalmente é usado em formulações de cremes destinadas a peles sensíveis e de geles para peles oleosas. A sua utilização deve fazer-se acompanhada de proteção solar. A isotretinoina também é utilizada com o mesmo efeito que a tretinoína, mas apresenta menores efeitos irritantes. O tazarotene existe em formulações de cremes e geles, atua ao nível da epiderme, diminuindo a sua atrofia normal aquando o envelhecimento, torna a pele menos áspera e diminui as rugas finas. Poderá originar irritações, edema e sensação de picadas [41, 52, 54].

2.2.3.4. Vitamina D

A vitamina D no ser humano, atua como pró-hormona e a sua síntese dá-se a partir da exposição solar. Na ingestão alimentar de gordura de peixe e da gema do ovo provêm pequenas quantidades desta vitamina, sendo que por vezes há o enriquecimento dos alimentos com esta vitamina, como por exemplo leite, cereais e manteiga. Excesso de vitamina D provoca efeitos tóxicos no organismo devido a sua acumulação no tecido adiposo, causando náuseas, vómitos, pouco apetite, etc. [41, 55]. A vitamina D é essencial para a homeostasia do cálcio, integridade óssea, resposta imunológica e, ao nível da pele protege de mecanismos de morte celular e de apoptose induzida por radiação UVB. Com o envelhecimento, há uma diminuição da capacidade que a pele tem em sintetizar esta vitamina, diminuindo assim os efeitos protetores que esta apresenta. Tal deve-se a fatores como menor exposição solar, desnutrição, mas também, a alterações a nível intrínseco devido ao declínio que ocorre naturalmente da concentração do precursor de vitamina D, a partir dos 20 anos até aos 80 anos de idade. Torna-se essencial a suplementação desta vitamina e de cálcio em população idosa. Há, assim, uma associação evidente entre o envelhecimento cutâneo e a diminuição dos percursores de vitamina D [41, 49, 55].

2.2.3.5. Polifenóis

Os polifenóis tem ganho grande importância na cosmética de antienvelhecimento devido principalmente às suas características antioxidantes, associada à prevenção de stress oxidativo. Estes encontram-se em sumos de fruta, chá, café e vinho tinto. Dependendo da estrutura química dos fenóis estes podem ser divididos em vários compostos. Dos compostos polifenóis os flavonoides, o resveratrol, os polifenóis do chá verde, a curcumina, entre outros, são os que têm maior interesse no efeito antienvelhecimento [41, 56].

2.2.3.6. Coenzima Q10

A coenzima Q10 é uma substância endógena, está presente nas células desempenhando um papel importante como componente da cadeia de transporte de eletrões na respiração celular aeróbia. Na pele atua essencialmente ao nível da epiderme como barreira antioxidante contra agressões externas e fotoenvelhecimento [41, 57-59].

2.2.3.7. Probióticos

A consumo de probióticos em quantidades adequadas têm demonstrado ter efeitos positivos na saúde da pele e poderá ser uma alternativa aos antibióticos usados no tratamento de doenças da pele. Estudos sugerem que a utilização destes compostos de forma a modular a homeostasia imunológica da pele alterada devido à exposição solar, por exemplo, poderá contribuir para preservar a mesma [60-62].

2.2.3.8. Vitamina F

Os ácidos gordos essenciais, também designados por vitamina F, são ácidos gordos de cadeia longa polinsaturados derivados do ácido linolenico (ómega-3), linoleico (ómega-6) e oleico (ómega-9). Estes compostos têm funções importantes na regulação dos níveis de colesterol e são precursores de prostaglandinas. Quanto ao envelhecimento da pele estes parecem diminuir a secura, a atrofia da pele e a inflamação induzida pela radiação UV [63, 64].

A restrição calórica sem que haja desnutrição parece ser uma das formas de atrasar o inicio do envelhecimento possivelmente através da inibição da expressão de genes potenciadores de indução de cancros. Muito ainda há para descobrir sobre o papel da nutrição no envelhecimento da pele, mas será certamente uma estratégia promissora no reforço do sistema antioxidante endógeno cutâneo. É importante ter em conta a necessidade de educar os utentes para isso, no qual a ingestão de suplementos alimentares ricos em antioxidantes de forma isolada e permanente não é o método mais saudável. O hábito de ter uma dieta equilibrada aumentando o consumo de frutas e legumes será de certo o método mais aconselhado [65].

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