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1   INTRODUÇÃO 17

1.1   LEUCEMIA LINFÓIDE CRÔNICA (LLC) 17

1.1.9   Fisiopatologia 36

Os mecanismos geradores de doença na LLC resultam de um complexo processo constituído de etapas múltiplas, tendo como resultado a proliferação de um clone maligno de linfócitos B com capacidade de replicação. Não obstante algumas vias fisiopatogênicas estejam praticamente elucidadas, muitas etapas deste processo ainda permanecem desconhecidas.

Tendo em conta o conhecimento atual, acredita-se que todos os casos de LLC sejam antecedidos por uma fase de LBM inicial; muito embora saibamos que apenas uma minoria daqueles com LBM efetivamente evoluirão para LLC (Figura 1). Deste modo, a patogênese da LLC pode ser compreendida como um incidente constituído por dois passos seqüenciais (GHIA; CALIGARIS-CAPPIO, 2012):

• Estabelecimento da LBM: apesar do evento inicial permanecer incógnito, as células B memória clonais com fenótipo de LLC parecem resultar de alterações citogenéticas que surgem como conseqüência de uma resposta anormal ao fenômeno de estimulação antigênica.

Figura 10: Curvas de sobrevida global de acordo com os grupos de risco determinados pelas alterações citogenéticas e moleculares na leucemia linfóide crônica.

Curvas de Kaplan-Meier demonstrando a significativa diferença de probabilidade cumulativa percentual de sobrevida global ao longo do tempo para pacientes com leucemia linfóide crônica, de acordo com o grupo de risco avaliado pelas alterações citogenéticas e moleculares (p<0,0001): alto (vermelho), intermediário (amarelo), baixo (verde) e muito baixo (azul). A sobrevida global do grupo de risco “muito baixo” não é estatisticamente diferente da população geral pareada, representada em preto (p=0,1455).

Fonte: modificado à partir de (ROSSI et al., 2013).

• Progressão de LBM para LLC: provavelmente induzida por novas injúrias ao clone de células B na forma de anormalidades citogenéticas adicionais ou alterações no microambiente do tecido linfohematopoiético em questão.

Há evidências de que a propensão para gerar células B clonais é adquirida pelos precursores ainda no estágio de células tronco hematopoiéticas (CTH). Kikushige e colaboradores em 2011 constataram que, quando

comparadas com CTH de controles normais, as CTH coletadas de pacientes com LLC são capazes de gerar um número de células B policlonais proporcionalmente muito maior, provavelmente refletindo uma anormalidade intrínseca de comprometimento com a linhagem linfóide B. Os mesmos autores utilizaram um modelo de transplante xenogênico para demonstrar que CTH purificadas de pacientes com LLC eram capazes de gerar células B clonais em camundongos imunossuprimidos, simulando um quadro de LBM (KIKUSHIGE et al., 2011) (Figura 11). As células B clonais produzidas pelo receptor xenogênico apresentavam rearranjos no gene IGVH diferentes daqueles presentes no clone original do paciente, sugerindo que os processos de desenvolvimento ocorreram de maneira independente.

Figura 11: Representação esquemática do desenvolvimento de células de leucemia linfóide crônica humanas em modelo de transplante xenogênico de células tronco hematopoiéticas provenientes de pacientes portadores de leucemia linfóide crônica.

Quando aplicadas em transplantes xenogênicos, células tronco hematopoiéticas provenientes de pacientes com leucemia linfóide crônica sofrem determinadas alterações citogenéticas (evento primário) que induzem o comprometimento com a linhagem linfóide e produção aumentada de células B policlonais (expansão). Alguns clones de células B são selecionados e expandem-se em resposta a exposição a auto ou xenoantígenos, resultando no desenvolvimento de linfocitose B monoclonal. Anormalidades cromossômicas adicionais podem desempenhar um papel na fisiopatogênese da progressão da linfocitose B monoclonal para leucemia linfóide crônica.

Como mencionado anteriormente, as alterações citogenéticas recorrentes na LLC tem impacto no prognóstico e no comportamento das células clonais, reforçando a idéia de que as vias moleculares afetadas estejam envolvidas na fisiopatogênese da doença (especialmente as relacionadas com os microRNAs miR-15a, miR-16-1 e miR-34b/c). Em experimentos com culturas de linhagens celulares e de linfócitos clonais de pacientes com LLC, Fabbri e colaboradores em 2011 empregaram a técnica de imunoprecipitação de cromatina para estudar as relações funcionais entre os diferentes genes envolvidos nestas mutações (FABBRI et al., 2011). Os autores concluíram que as anormalidades nos cromossomos 11, 12 e 13 participam da construção de um circuito de interação “TP53-microRNA”, onde o geneTP53 desempenha um papel central para os mecanismos geradores de doença. O fato deste circuito ser perturbado em diferentes níveis por alterações gênicas distintas pode servir de modelo para explicar a ocorrência da mesma doença manifestando-se de forma variável do ponto de vista clínico-laboratorial. O circuito de interação “TP53-microRNA” está ilustrado na Figura 12.

Figura 12: Circuito de interação "TP53-microRNA" como modelo fisiopatogênico na leucemia linfóide crônica.

Ilustração das interações entre as principais alterações citogenéticas e as vias moleculares correspondentes, responsáveis pelo desenvolvimento da leucemia linfóide crônica. “Setas” indicam estimulação e “linhas truncadas” indicam inibição. O gene ATM pode exercer sua função reguladora diretamente sobre a p53, ou de maneira indireta por meio da cinase

checkpoint 2 (CHK2)

2 JUSTIFICATIVA

A LLC é a forma de leucemia mais prevalente em países ocidentais. Conquanto os dados epidemiológicos brasileiros ainda não sejam conhecidos de maneira precisa, as taxas de incidência da LLC chegam a atingir a média de 6,4 casos para cada 100.000 habitantes por ano na Inglaterra, sendo esperados mais de 15.500 casos novos anuais nos EUA, o que configura uma patologia de interesse para os órgãos e instituições responsáveis pelo planejamento e pelas ações de saúde pública.

A forma familiar da doença corresponde a pelo menos 5% dos casos e em uma parte considerável (até 17%) dos familiares de pacientes portadores de LLC podemos identificar a presença de LBM, o que para alguns (1 a 2%) pode representar a fase inicial da doença, traduzindo um risco significativamente maior do que o da população geral para o desenvolvimento desta patologia.

Não obstante as alterações citogenéticas recorrentes (detectadas por bandeamento cromossômico e por FISH) e suas vias moleculares correspondentes ofereçam evidências significativas sobre os mecanismos geradores de doença, a fisiopatogenia da LLC ainda é mal compreendida, o que representa um desafio para a ciência.

O estudo de anormalidades cromossômicas em nível submicroscópico na LLC familiar constitui um excelente modelo para o melhor entendimento dos possíveis fatores relacionados com a herdabilidade e dos mecanismos envolvidos na fisiopatogênese desta entidade nosológica. A técnica de análise cromossômica por microarranjo (CMA) também pode contribuir para a melhor compreensão dos fenômenos responsáveis pelas diferenças de comportamento do clone leucêmico e de evolução da doença observados em indivíduos afetados de uma mesma família (entre os quais podemos citar o fenômeno de AG).

3 OBJETIVOS

3.1 OBJETIVO GERAL

Investigar as alterações citogenéticas moleculares relacionadas com a LLC familiar utilizando a técnica de CMA e correlacionar os eventuais achados com os possíveis mecanismos de herança e de desenvolvimento de doença, particularmente em relação ao fenômeno de AG e suas influências sobre a evolução e o prognóstico desta enfermidade.

3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Descrever as características clínicas, imunofenotípicas e citogenéticas encontradas em três membros de uma mesma família acometidos por LLC e, portanto, caracterizando em conjunto um quadro de LLC familiar.

Investigar, por meio de avaliação clínico-laboratorial e imunofenotipagem de sangue periférico, a presença de LBM ou LLC assintomática nos indivíduos declarados como não-afetados, parentes dos portadores de LLC, membros da mesma família agora em estudo.

Ressaltar as semelhanças e diferenças na apresentação clínico- laboratorial e no comportamento (evolução) da doença de cada indivíduo afetado, em especial as considerações com pertinência para a avaliação do prognóstico e de progressão da doença, bem como a correlação com a AG.

Empregar a técnica de CMA para dissecar as alterações citogenéticas em nível submicroscópico presentes nos clones leucêmicos de cada indivíduo afetado. Correlacionar os achados do CMA com os mecanismos fisiopatogênicos e com o fenômeno de AG da LLC familiar, especialmente aqueles com eventual influência sobre a evolução e o prognóstico na LLC familiar.

Comparar o perfil de CMA encontrado em células mononucleares e parietais dos indivíduos portadores de LLC com o dos indivíduos não-afetados da mesma família, buscando o reconhecimento de possíveis marcadores de relevância fisiopatogênica na LLC familiar que possam ser utilizados na identificação de fatores de risco para o desenvolvimento da doença.

4 MATERIAL E MÉTODOS 4.1 POPULAÇÃO DO ESTUDO

Trata-se de um estudo de caso tendo como população alvo uma família composta por 26 indivíduos, sendo três deles portadores de LLC, cujas relações de parentesco podem ser apreciadas no heredograma retratado pela Figura 13. No heredograma cada um dos indivíduos foi identificado numericamente em ordem crescente, de acordo com a geração a que pertence (A, B e C, respectivamente). Os indivíduos portadores de LLC (afetados) foram identificados com “” conforme a ilustração da Figura 13.

Figura 13: Heredograma de leucemia linfóide crônica familiar com três membros afetados.

Indivíduos marcados com “” possuem informações clínico-laboratoriais completas, indivíduos marcados com “” são portadores de leucemia linfóide crônica.

Informações clínicas completas e resultados de exames laboratoriais pertinentes (hemograma completo e imunofenotipagem de sangue periférico) estão disponíveis para oito dos 26 membros da família (indivíduos B2, B5, B6, C5 a C9, sujeitos da pesquisa, identificados no heredograma com o símbolo “”), incluindo os três indivíduos afetados. Para os demais indivíduos não foi possível a realização de investigação clínico-laboratorial por limitações de

ordem geográfica (residentes em regiões fora da área de influência do Distrito Federal), sendo as informações sobre o estado de saúde e sobre a possibilidade de afecção por patologias onco-hematológicas (inclusive LLC) obtidas unicamente por meio de entrevista por telefone ou fornecidas e confirmadas por pelo menos dois de seus parentes de primeiro grau.

Como informação adicional, o indivíduo C6 (não afetado) tem tipagem HLA classe I e II idêntica a do indivíduo C8 (afetado) sendo, portanto, o potencial doador de células tronco-hematopoiéticas em caso de transplante de medula óssea.

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