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Fontes leibnizianas e o primeiro ensaio da Característica Universal –

Como mencionamos, especialmente no século XVII e início do século XVIII, fortemente influenciados por Bacon e Comenius, muitos estudiosos se dedicam a buscar uma Linguagem universal, sendo que, especialmente a partir de 1641, ocorrem muitas publicações sobre este tema. A língua universal é abordada e desenvolvida de diversas formas e em diversos campos do conhecimento, recorrentemente sob a alegação de que possibilitaria uma via direta de acesso ao conhecimento além de servir como ferramenta para facilitar a comunicação entre povos que utilizam diferentes linguagens. Em todos os casos, o ponto de partida para a invenção de tal língua ora é a consciência dos limites das línguas existentes, a que se atribui a responsabilidade pelas dificuldades de comunicação e outras imperfeições discursivas, ora é o desejo de se ter uma linguagem que comunique perfeitamente o pensamento, motivos pelos quais todo projeto da criação de uma Linguagem universal se apresenta como forma de superação de defeitos.

A língua universal então é pensada enquanto uma possibilidade de permitir o conhecimento tanto verificando a veracidade de ideias já existentes quanto produzindo novas descobertas, além de oportunizar a comunicação

entre os homens, não importando qual seja sua nacionalidade.

Na análise de Couturat (1901), a intenção de fundar uma nova linguagem que substitua todas as línguas não só no comércio entre os diferentes países, mas principalmente nas relações entre os filósofos de toda Europa, procede do movimento intelectual da Renascença, que ao renovar as ciências e a filosofia, revela a unidade fundamental do espírito humano e cria a ideia de “[...] uma rede de correspondências de pessoas que, no século XVII, pretendiam divulgar o saber então produzido. Tais pessoas se autodenominavam ‘República das Letras’”. (BRITO, 2012, p. 11). Couturat (1901) entende que,

Enfim, o espírito humano tomava consciência de sua unidade, e da unidade da ciência; todo esse grande movimento de ideias, essa renovação das ciências, e a reforma da Lógica que era ao mesmo tempo a condição e o resultado devia naturalmente sugerir a criação de uma língua filosófica e científica mais lógica que as línguas vulgares, que seria comum a todos os eruditos e em consequência uma língua internacional.68 (LC, p. 56).

Leibniz, estudioso dedicado, participa intensamente de diversos movimentos intelectuais de seu tempo, discutindo as ideias, apoiando-as, refutando-as ou retirando delas o que têm de mais relevante, e neste caso divulgando seus autores e prestando-lhes homenagem, demonstrando assim sua honestidade intelectual. Especificamente em relação ao projeto sobre Linguagem universal, ele explora praticamente todas as modalidades que estão sendo investigadas e estabelece diversas estratégias para sua concretização. Na opinião de Pombo (1997) é

[...] com Leibniz que esse projeto encontra o seu momento mais alto e significativo. Com Leibniz se poderá dizer ter ele

68 “Enfin l’esprit humain prenait conscience de son unite, et de l’unité de la science; tour ce

grand movement d’idées, cette renovation des sciences, et la réforme de la Logique qui en était à la fois la condition et le résultat, devaient naturellement suggérer la création d’une langue philosophique et scientifique plus logique que les langues vulgaires, qui serait commune à tous les savants, et par suíte internationale.”(LC, p. 56).

alcançado o mais elevado nível de problematicidade, adquirido maior consciência das suas implicações lógicas e epistemológicas. Simultaneamente, pela natureza diversificada das estratégias e perspectivas com que Leibniz o procura circunscrever, pelo caráter fragmentário e radicalmente inconcluso dos seus múltiplos esboços, é também em Leibniz que ele se revela em toda a sua incontornável aporeticidade. (POMBO, 1997, p. 18)

Mesmo assim é possível estipular dois grandes objetivos em Leibniz, relativos aos seus estudos em Linguagem universal, quais sejam: o de compreender e aperfeiçoar as línguas naturais e o de construir uma nova linguagem. Sob o ponto de vista de Pombo (1997), os projetos relativos a este tema decorrem “[...] tanto da consideração do caráter impróprio das línguas naturais para a constituição e progresso dos conhecimentos científicos, como do reconhecimento das dificuldades que a linguagem humana oferece à sua correcta utilização.” (POMBO, 1997, p. 168).

Na concepção de Leibniz, para a concretização da Linguagem universal é necessário estabelecer as noções primitivas da filosofia, estipular um sistema adequado de signos para representá-las e escolher as regras lógicas que ligam as ideias simples ou noções primitivas para formar as noções complexas e então expressar os pensamentos. Vale ressaltar que estes preceitos não necessariamente precisam ser executados nesta ordem, porém se executados, mesmo que em outra sequencia, estaria criada a Linguagem universal. A partir daí, as investigações filosóficas poderiam ser feitas por meio dela, e o erro, se houvesse, seria detectado por uma aplicação de regras de combinação, transferência ou inferência. No prefácio do texto Science générale (Ciência Geral) de 1677, Leibniz comenta que:

Aqueles que escreverem nessa língua não se enganarão desde que evitem (os erros de cálculo), barbarismos, solecismos e outras faltas em gramática e em construção. Ademais, essa língua tem uma propriedade maravilhosa, que é calar os ignorantes. Porque não se poderá falar nem escrever, nessa língua, daquilo que não se entende; se se ousar fazê-lo, pode acontecer uma de duas coisas: ou a vacuidade daquilo que se afirma é manifesto (para toda a gente), ou aprende-se ao escrever ou ao falar.69 (LEIBNIZ, 1677)

69 “Ceux qui ecriront en cette langue ne se tromperont pás pourveu qu’ils evitent les <erreurs de

Conforme já declaramos no presente texto, a primeira proposta de Leibniz em relação à constituição de uma Linguagem universal está contida na obra Dissertatio De Arte Combinatoria.

A respeito deste trabalho, Couturat (1901) comenta que nele Leibniz concebe o plano de uma língua universal verdadeiramente filosófica que supera os projetos até então conhecidos, na medida em que não se trata apenas de uma estenografia ou uma criptografia70, mas sim de uma escrita

universal lógica na qual uma ideia é representada por meio de sinais. Mais tarde Leibniz reconheceria o valor de sua obra, porém com algumas ressalvas. Nos Novos Ensaios do Entendimento Humano ele comenta que

Foi fruto da minha primeira adolescência, e todavia a obra foi reimpressa depois de muito tempo, sem consultar-me e mesmo sem observar que se tratava de uma segunda edição. Isso levou alguns a crerem, a meu desfavor, que eu era capaz de publicar tal obra em idade avançada. Com efeito, embora existam ali teses que ainda aprovo, outras há que só podem convir a um jovem estudante. (LEIBNIZ, NE, p. 309)

Apesar da autocrítica, Leibniz se refere a projetos posteriores como uma continuação desse trabalho.

Nele Leibniz desenvolve a concepção de Logicae inventionis (Lógica inventiva ou Lógica da descoberta) ou ars inveniendi71 (arte de inventar). Como resultado prático de tal lógica, decorre a proposta de uma nova linguagem. Ali, Leibniz ainda não se refere especificamente a uma Linguagem universal, mas sim a uma scriptura universalis (escrita universal), assegurando que as ideias contidas em seu texto levam à “[...] escrita universal, isto é, [uma escrita] para

cette langue aura une proprieté merveilleuse, qui est de fermer la bouche aux ignorans. Car on ne pourra pás parler ny ecrire en cette langue que de ce qu’on entend: on si on osa le faire, il arrivera de deux choses: une ouque la varité de ce qu’on avance soit manifeste <à tout le monde>, on qu’on apprenne em écrivant on en parlant.” (LEIBNIZ in OC, p. 156)

70 Estenografia (ou taquigrafia): arte e método de escrever tão rápido como uma pessoa fala,

por meio de sinais e abreviaturas. Criptografia (ou esteganografia): “[...] língua secreta para codificar mensagens.” (ECO, 2001, p. 241, 242).

71 ‘ars inveniendi’ é uma expressão latina que significa ‘arte de descobrir’, ou, ‘método de

inventar’, ou ainda ‘ciência da descoberta’. Na expressão temos ‘ars’ que é um substantivo significando ‘arte, método, artifício, ciência, tudo que é de indústria humana’; e ‘inveniendi’ que é um verbo significando ‘achar, encontrar, descobrir, inventar’.

qualquer leitor, qualquer especialista em linguagem inteligível, tal como até hoje muitos homens eruditos tentaram.”72 (LEIBNIZ, 1666, p. 89).

Vale salientar que a escrita universal apresentada não é inspirado na Álgebra ou na Aritmética, uma vez que, naquela época, Leibniz era um principiante no campo da matemática, mas a exemplificação da teoria sobre este tema é elaborada no campo da matemática.

Figura 14 - Capa e primeira página da obra Dissertatio de Arte Combinatoria.

Fonte: <http://www.rarebookroom.org/Control/leiart/index.html.>73 Acesso em 18.10.2013.

72 “[...] scripta universalis, id est cuicunque legenti, cujus cunquae lingua perito intelligibilis,

qualem hodie complures viri eruditi tentarunt [...]”. (LEIBINZ, 1666, p. 89)

73 Em relação ao diagrama constante desta figura Yates (2010) interpreta que “[...] o quadrado

dos quatro elementos está associado ao quadrado lógico de oposição, [e isto] mostra que Leibniz compreendia o llullismo como lógica natural.” (YATES, 2010, p. 472)

Na Dissertatio de Arte Combinatoria, Leibniz primeiramente apresenta a sinopse, depois uma Demonstratio existentiae Dei (Demonstração da existência de Deus) como um suplemento do texto e então inicia o texto propriamente dito com a expressão CUM DEO, que significa, “Sob o comando de Deus”

Figura 15 - Excertos do Dissertatio de Arte Combinatoria.

Fonte: <http://www.rarebookroom.org/Control/leiart/index.html> Acesso em 18.10.2013.

Em linhas gerais, o texto compreende inicialmente um tratado sobre o que ele denomina Lógica Inventiva, cujos princípios dão origem à atual Análise Combinatória. Depois apresenta um estudo sobre as figuras do silogismo, para em seguida utilizar os resultados obtidos na Lógica Inventiva e aplicá-los às figuras do silogismo. Finalmente usa esses mesmos resultados para descrever o método para construção do que designa Scriptura Universalis, “[...] isto é,

uma língua que é inteligível para todos que a lerem [...]”74(LEIBNIZ, 1666, p.

43), e logo depois, apresenta um exemplo dessa escrita na disciplina de matemática. Acrescenta, no decorrer do texto, comentários a respeito de outros projetos sobre este assunto, ora criticando-os, ora aprovando-os.

Para construir a teoria da Lógica Inventiva, começa estipulando diversas definições até chegar ao conceito do que denomina complexiones. Afirma que à “Variabilidade de uma associação chamamos ‘complexiones’, por exemplo, quatro coisas podem ser juntadas de quinze maneiras diversas”75 (LEIBNIZ,

1666, p. 04).

Podemos deduzir que o significado que Leibniz dá ao termo complexiones é o mesmo significado que atribuímos atualmente a todas as combinações simples, considerando os subconjuntos com todas as quantidades possíveis de elementos. Se tomarmos o conjunto formado pelos elementos: A, B, C e D, temos as seguintes combinações: Combinações de quatro elementos tomados um a um (A, B, C, D); combinações de quatro elementos tomados dois a dois (AB, AC, AD, BC, BD, CD); combinações de quatro elementos tomados três a três (ABC, ABD, BCD, ACD) e finalmente combinações de quatro elementos tomados quatro a quatro (ABCD), que são quinze combinações, ou seja, ‘as quinze maneiras diversas que quatro coisas podem ser juntadas’, conforme as palavras de Leibniz.

Em seguida apregoa que, para certa complexion ser determinada, o maior conjunto deve ser dividido em partes iguais assumidas como a menor. Afirma ainda que cada parte terá um número determinado de elementos que será representado por um expoente. Ou seja, ele define complexion como cada uma das combinações com certo expoente, sendo o expoente a quantidade de elementos do subconjunto, como fazemos hoje na Análise combinatória. Por exemplo, uma complexion com expoente três será a ‘combinação de quatro elementos tomados três a três’. Ou seja, por complexiones ele entende todas as complexion.

Exemplifica da seguinte forma:

74 “[...] id est cuicunque legenti, cujuscun’que línguae perito intelligibilis [...]” (LEIBNIZ, 1666, p.

43)

75 “Variabilitatem complexionis dicimus complexiones, v. g. Res IV modus diversis 15 invicem

Se o todo é A B C D. Se os menores conjuntos tiverem duas partes, por exemplo, AB. AC. AD. BC. CD o expoente será 2. Se for três, por exemplo, ABC. ABD. ACD. BCD o expoente será 3. Dado o expoente da complexiones então escrevemos: se o expoente é 2. Com2nationem (combinationem) se 3. Con3nationem (conternationem) se 4. Con4nationem, etc.76 (LEIBNIZ, 1666, p. 04)

No exemplo dado por Leibniz, o conjunto maior tem quatro elementos: A, B, C e D. Com2nationem é o que chamamos combinação de quatro elementos tomados 2 a 2, que são AB, AC, AD, BC e CD. Con3nationem é o que chamamos combinação de quatro elementos tomados 3 a 3, que são ABC, ABC, ACD e BCD.

Daí Leibniz constrói toda teoria das complexiones, incluindo um estudo sobre as figuras do silogismo, e então passa a explicar como construir uma nova linguagem por meio de termos primitivos e termos derivados de primeira classe e de segunda classe, e assim por diante, o que, em suas palavras consiste num emprego da Lógica Inventiva.

Explica que se os termos primitivos são, por exemplo, designados por 3, 6, 7 e 9; os termos derivados da segunda classe serão (1) 3,6; (2) 3,7; (3) 3,9; (4) 6,7; (5) 6,9; e (6) 7,9; denominados com2nação (combinação)77. Os de

terceira classe, denominados con3nação (conternação) podem ser expressos por três termos primitivos, por exemplo, 3, 6, 9; ou como .9, que significa o primeiro termo (expresso pelo numerador) da segunda classe (expresso pelo denominador) – que é o 3,6 – e o 9; ou então .6, que significa o terceiro termo da segunda classe – que é o 3, 9 – e o 6; ou ainda, .3.

Afirma então que é hora de passar a outra parte da Lógica inventiva, que diz respeito às proposições. Para Leibniz uma função de sua arte de inventar é a de encontrar os possíveis sujeitos de uma proposição, sabendo qual é o predicado, e os possíveis predicados de uma proposição, conhecido o sujeito. Em suas palavras:

76 “Si totum A B C D. Si tota minora constare debent ex 2, partibus, v.g, AB.AC.AD.BC.CD

exponens erit 2. Si ex tribus, v.g, ABC.ABD.ACD.BCD exponens erit 3. Dato Exponente Complexiones ita scribemus: si exponens est 2. Com2nationem (combinationem) si 3. Con3nationem (conternationem) si 4. Con4nationem, etc.” (LEIBNIZ, 1666, p. 04).

Uma proposição é composta de sujeito e predicado; todas as proposições, portanto, são com2nações. É então, a ocupação da Lógica inventiva resolver estes problemas: 1. Dado um sujeito, encontrar seu predicado; 2. Dado um predicado encontrar seus sujeitos [...] tanto afirmativa quanto negativa.78 (LEIBNIZ, 1666, p. 31)

Entende que para esta função seja concretizada, primeiramente é necessário encontrar os termos primitivos; depois, fixar as categorias das coisas e então utilizar a arte das combinações (complexiones) para formar os termos derivados.

Para encontrar os termos primitivos, antes de tudo, cada termo composto ou derivado deve ser colocado em suas partes formais, ou seja, nas explicitadas pela definição, e estas em outras partes até chegar a termos indefiníveis (termos primitivos ou termos primeiros). Os termos primitivos são coisas, modos ou relações. Depois dos termos derivados terem sido reduzidos a termos primitivos, esses termos derivados devem ser colocados em classes e designados por sinais; sendo mais conveniente que eles sejam representados por números.

Pelo fato dos termos derivados serem com2nação, se compostos por dois termos primitivos; con3nação, se compostos por três termos primitivos; e assim por diante, são criadas classes hierarquizadas de acordo com a complexidade crescente.

Encontrados os termos primitivos, a eles se associam números. Os termos derivados, por serem decompostos em termos primitivos, são, portanto, combinações dos números correspondentes àqueles termos. Desta forma todos os possíveis sujeitos e predicados podem ser encontrados por meio da teoria exposta no texto.

Leibniz então exemplifica como construir um sistema desse tipo. Ele declara que a Matemática é mais adequada para um ensaio, e passa a

78 “Propontio componitur ex subjecto & praedicato, omnes igitur propositiones sunt

com2nationes. Logicae igitur inventivae propositionum est hoc problema solvere: 1. Dato subjetcto praedicata, 2. Dato praedicato subjecta invenire utrag tum affirmative, Tum negative.” (LEIBNIZ, 1666, p. 31)

descrevê-lo.

Enunciamos a seguir uma parte deste ensaio, retirada de sua obra Dissertatio de Arte Combinatoria:

A Classe I contém os primeiros termos (termos primitivos): 1. Ponto. 2. Espaço. 3. Entre. 4. Adjacente, ou, contíguo. 5. Disjuntos, ou distantes. 6. Limite, ou, o que é distante. [...] 9. Parte. 10. Todo. 11. Mesmo. [...] 14. Número.[...]

A classe II terá: 1. Quantidade é 14.9 (quantidade é o número de partes); 2. Contorno é 6.10 (contorno é o limite do todo) [...] A classe III terá: 1. Intervalo é 2.3.10 (intervalo é espaço entre o todo); 2. Igual é 11.1/2 (igual é mesma quantidade) (1 do numerador indica a posição e o denominador 2 indica a classe). A classe IV terá: ... 3. Linha é 1/3 1 (2) (linha é o intervalo entre dois pontos). 79 (LEIBNIZ, 1666, p. 42 e 43)

Leibniz vai descrevendo os elementos das demais classes, até chegar à Classe XVII e lá dentre as outras definições, consta a de triângulo escaleno como “Scalenum est . cujo . consiste de (3). não (3).”80 (LEIBNIZ, 1666, p. 43). Esta representação significa o seguinte: ‘Triângulo escaleno é uma figura cujo contorno consiste de três segmentos de reta, os três não iguais.’81

Depois de completar seu ensaio, afirma que, até aqui “[...] tratamos da lógica inventiva, cujas categorias seriam formadas por uma tabela de termos deste tipo, e daí flui como corolário o uso XI. Escrita Universal [...]”.82 (LEIBNIZ, 1666, p. 43).

Daí comenta que

79 “Ergo classis I, in qua termini primi: 1. Punctum. 2. Spatium. 3. intersitum. 4. adsitum seu

contiguum, 5. dissitum, seu distans. 6. Terminus, seu quae distant. [...] 9. Pars. 10. Totum. 11. Idé. [...] 14. Numerus [...]. Classis II. I Quantitus est 14.9, 2. Includens est 6.10. [...] III. I. Intervallum est 2.3.10, 2. Aequale 11. . [...] IV [...] 3. Linea . I(2) [...] ” (LEIBNIZ, 1666, p. 42 e 43)

80 “Scalenum est cujus est (3) non (3)” (LEIBNIZ, 1666, p. 43)

81 Triângulo escaleno é quinto elemento da quarta classe (figura), cujo segundo elemento da

segunda classe (contorno) consiste de (3) terceiro elemento da oitava classe (segmento de reta) não (3) segundo elemento da terceira classe (igual).

82 “[...] seu Logica inventiva disseruimus, cujus quasi praedicamenta ejus modi Terminorum

tabula absolverentur, fluit velut Porisma: seu usus XI. Scriptura Universalis, id est cuicunque legenti, cujuscun’que línguae perito intelligibilis [...]” (LEIBNZ, 1666, p. 43)

[...] quando as tabelas ou categorias de nossa arte complicada forem constituídas, algo maior surgirá. Então os termos primitivos de cujas combinações consistirão todos os outros, serão designados por signos (notis) e estes signos (notae) serão um tipo de alfabeto. Será conveniente para os signos serem o mais natural possível, por exemplo, para o número um, um ponto; para números, pontos; para as relações de ente para ente, linhas [...]. Se estes forem correta e engenhosamente constituídos, esta escrita universal será tão fácil quanto comum, e será capaz de ser lida sem o auxílio de dicionários; simultaneamente o conhecimento fundamental de todas as coisas será obtido.83 (LEIBNIZ, 1666, p. 44)

Nesta obra Leibniz menciona alguns projetos contemporâneos, especialmente o de um espanhol anônimo, o de Johann Joachim Becher (1635-1682) e o de Athanasius Kircher (1601-1680). Ele apenas os cita, sem trazer maiores informações sobre eles.

No entanto, verificamos que o projeto do espanhol a que Leibniz se refere data de 1653, e consiste em distribuir as coisas, ou seja, os conceitos correspondentes a elas, em classes, e a estas atribuir uma numeração. Então, designar cada um desses conceitos por outro número, que aponta sua localização na classe a que pertence. Dessa forma cada coisa ou noção é indicada por dois números: um que indica a classe a que pertence, e outro que indica a localização dentro de sua classe. A esses dois números, são adicionados alguns sinais que substituem as flexões gramaticais. Este projeto nos lembra fortemente a Escrita Universal proposta por Leibniz.

As outras duas obras lembradas por Leibniz são o Characteres pro notitia linguarum universalis (Características para o entendimento da língua universal), por vezes citada como Clavis convenientiae linguarum (Chave para entendimento das línguas), de J. Joachim Becher, publicado em Frankfurt em 1661, e o Polygraphia nova et universalis ex combinatória arte detecta (Poligrafia nova e universal a partir da revelação da arte combinatória) do padre jesuíta Atanasius Kircher, publicada em Roma em 1663.

83 “Verum constitutis Tabulis vel praedicamentis artis nostrae complicatoriae, majora emergent.

Nam Termini primi ex quorum complexu omnes alii constituuntur, signentur notis, hae notae erunt quase alphabetum. Commodum autem erit notas quam máxime sieri naturaes, v. v. preo uno punctum, pro numeris puncta; pro relationibus Entis ad Ens lineas [...] Ea si recte constituta fuerint & inbgeniose, scriptura haec universalis aeque erit facilis quam comanis, & quae posit fine omni lexico legi, simulque imbibetur ominum rerum fundamentalis cognitio.” (LEIBNIZ, 1666, p. 44)

O projeto de Becher exposto no Characteres pro notitia consiste na construção de um dicionário alfabético com pouco mais de dez mil palavras latinas, enumeradas, incluindo tabelas de conjugações e tabelas de flexões. A partir desse dicionário, ele se propõe a estabelecer uma correspondência numérica entre as palavras sinônimas de línguas distintas, deixando sua execução a cargo do leitor. Por meio dessa equivalência, um texto escrito em caracteres numéricos em uma língua pode ser traduzido com o dicionário correspondente ao idioma do leitor.

Sobre esse assunto, Eco (2001) comenta que

Cada termo é acompanhado por um algarismo arábico (para escrever Zürich é necessário o número 10283); um segundo algarismo arábico remete a uma tábua das conjugações (que abrange também cifras para comparativos, superlativos e adverbializações) e um terceiro para uma tábua de flexões. A dedicatória inicial (“Inventum Eminentissimo Principi, etc”) escreve-se da seguinte forma: 4442.2770:169:3.6753:3 e deve ser lida como “Inventum eminens (+ superlativo + dativo singular) princeps (+ dativo singular).” (ECO, 2001, p. 247).

Ao imaginar que pode haver povos que não saibam ler algarismos arábicos, Becher oferece outra maneira de representar os números mediante pontos e traços colocados em torno de uma estrutura.

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