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FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA EJA

4- Formação de Professores na EJA

4.1 - EJA: quem forma o professor?

A EJA, olhada do ponto de vista da formação de professores, historicamente, foi se constituindo como uma modalidade de formação e de práticas educativas fragmentadas. Esse fato explica-se por não exigir formação específica, deixando para o próprio educador a busca por sua formação. Assim, parece que qualquer professor formado para atuar no Ensino Fundamental e Médio é docente de EJA. E, muitas vezes, tal profissional não teve sequer uma disciplina ou discutiu internamente no âmbito de outras disciplinas o ensino na EJA.

Dessa realidade, advém o que presenciamos – o ensino da EJA realizado com base em atividades infantis, sem levar em consideração as características específicas da clientela jovem, adulta. Temos, então, um ensino infantilizado para adultos, o que é, em nosso ponto de vista, problemático.

Para que o profissional esteja preparado para pensar e enfrentar essas situações, a busca por formação deve, ou deveria ser, inerente à prática deste, um processo constituinte de desenvolvimento e estruturação profissional. No entanto, esta busca, muitas vezes, não faz parte do cotidiano dos professores e não é incentivada pelas instituições formadoras60, nem pelas instituições empregadoras.61

A Agenda para o futuro, aprovada pela V CONFITEA, traz o compromisso dos países em melhorar as condições de formação, as perspectivas profissionais e as

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Por instituições formadoras entendo as escolas de formação em nível médio e nível superior: as escolas normais de nível médio, as faculdades e as universidades;

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Por instituições empregadoras entendo as secretarias estaduais, municipais e as instituições particulares.

condições de trabalho dos educadores de adultos. Porém, no Brasil, as estatísticas mostram o contrário (INEP, 2000):

Dão conta da existência de quase 190 mil professores atuando na educação básica de jovens e adultos (40% dos quais não têm formação superior), aos quais se somam alguns milhares de voluntários engajados em projetos de alfabetização no meio popular. Em ambos os casos, esses educadores (a esmagadora maioria de mulheres) têm uma formação inicial insuficiente, que vem sendo complementada em programas continuados de formação em serviço.

Nesse sentido, pensar sobre a formação de professores, e mais especificamente aqui, de EJA, é essencial, pois, no momento que tivermos mais professores habilitados para a escolarização de jovens e adultos, mais chance a escola terá de participar de processos de mudança. Sabe-se que a formação de professores para atuar com alunos jovens e adultos é recente. Poucos cursos estão criando habilitações ou inserindo disciplinas62 para tratar sobre o ensino de jovens e adultos, ou ainda programas de pós-graduação em nível de especialização com trabalhos produzidos nessa modalidade. Segundo o INEP, em 2003, apenas 23 dos 1320 cursos de Pedagogia no país ofereciam habilitação em EJA. Assim, percebe-se que o educador da EJA adquire seus saberes na prática e na formação continuada, pois, dificilmente, na formação inicial ele foi levado a refletir sobre o aluno adulto.

Na LDB 9.394/96, encontramos artigos sobre a formação de professores, nos quais se contempla a educação básica, mas não aparece especificamente a formação do professor da EJA. Então, ficamos a pensar onde se forma este professor? No entanto, no artigo 61 da mesma Lei pode-se entender a contemplação da EJA quando refere-se a “atender os diferentes níveis e modalidades de ensino e às características de cada fase do desenvolvimento do educando”.

A formação de profissionais da educação, de modo a atender aos objetivos dos diferentes níveis e modalidades de ensino e às características de cada fase do desenvolvimento do educando, terá como fundamentos: (Regulamento) I - a associação entre teorias e práticas, inclusive mediante a capacitação em serviço; II – aproveitamento da formação e experiências anteriores em instituições de ensino e outras atividades. (ART. 61)

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Na UFSM, a nova matriz curricular inseriu disciplinas de educação de jovens e adultos, que está em vigor desde 2004.

Nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos (PARECER CNE/CEB 11/2000) no título VIII está posto que:

Com maior razão, pode-se dizer que o preparo de um docente voltado para a EJA deve incluir, além das exigências formativas para todo e qualquer professor, aquelas relativas à complexidade diferencial desta modalidade de ensino. Assim esse profissional do magistério deve estar preparado para interagir empaticamente com esta parcela de estudantes e de estabelecer o exercício do diálogo. Jamais um professor aligeirado ou motivado apenas pela boa vontade ou por um voluntariado idealista e sim um docente que se nutra do geral e também das especificidades que a habilitação como formação sistemática requer.

Devido a este panorama – de um lado a necessidade de formação dos professores atuantes e de outro a legislação contemplando como deve ser o processo formativo dos educadores da EJA - emerge a elaboração de estratégias de formação que dêem conta de todos os profissionais do ensino que não tiveram esta oportunidade na sua formação inicial e nem estão tendo na formação continuada. Pois “a formação docente qualificada é um meio importante para se evitar o trágico fenômeno da recidiva e da evasão” (rodapé 64 do Parecer CNE/CEB 11/2000).

Nesse sentido, as instituições formadoras dos professores e as escolas precisam se responsabilizar pela formação e atualização do profissional da EJA. Todas as licenciaturas e habilitações ligadas ao ensino não podem deixar de considerar a realidade da EJA.(ibid)

Portanto, verifica-se a relevância de pensar sobre a educação de jovens e adultos, no contexto da formação geral do professor devido à urgência de construção de saberes para o profissional que age nessa forma de ensino. Da mesma forma, torna-se fundamental a realização de pesquisas na área. Não uma pesquisa sobre o ensino e sobre os professores, mas uma pesquisa para o ensino e com os educadores, tendo estes como colaboradores e como co-pesquisadores. O educador precisa ocupar o papel de ator da própria ação e o de autor do próprio discurso. (TARDIF, 2002)

Assim, a formação dos docentes precisa estar como prioridade nos projetos da EJA, envolvendo os professores em processos de mudança e de desenvolvimento curricular. E, principalmente, levando-os à reflexão de suas crenças e práticas.

4.2- Formação Continuada

A formação profissional pressupõe o caráter contínuo, engloba formação inicial e continuada e conhecimentos teóricos e práticos para e no exercício da docência. Visto que o conhecimento é complexo, multidimensional e incerto e que a cada instante surgem inovações, torna-se importante que o professor possa aprender continuamente.

Aprender a ser professor não se encerra com a formação inicial. A aprendizagem docente ocorre por meio de situações práticas que exigem desse profissional um desenvolvimento amplo não apenas de conhecimentos, mas de atitudes, valores, bem como de capacidade de trabalho colaborativo. Aos professores, exige-se uma prática reflexiva competente condizente com as mudanças:

Agora se exige do professor que lide com um conhecimento em construção – e não mais imutável - e que analise a educação como um compromisso político, carregado de valores éticos e morais, que considere o desenvolvimento da pessoa e a colaboração entre iguais e que seja capaz de conviver com a mudança e com a incerteza. (MIZUKAMI, 2002, p.12)

Desse modo, a formação profissional do professor é vista como um processo dinâmico e com possibilidades de aperfeiçoamento crescente, como um “continuum”, um processo de desenvolvimento para toda a vida, produzindo os sentidos e significados de ser professor e garantindo, ao mesmo tempo, os nexos entre a formação inicial, a continuada e as experiências vividas (MIZUKAMI, 2002). Os professores:

[...] em relação ao aprender a ensinar passam por várias etapas (pré- formação, formação inicial, iniciação e formação permanente), as quais representam exigências pessoais, profissionais, organizacionais, contextuais, psicológicas, etc., específicas e diferenciadas. (GARCIA, 1999, p. 112)

Nesse sentido, em qualquer etapa que o professor estiver precisa aprender com a sua prática pedagógica, numa atitude de ação-reflexão-ação, buscando a melhoria contínua e o oferecimento de aprendizagens significativas para seu aluno

jovem-adulto. É necessário a condição de eterno aprendiz, aquele que aprende com seus alunos, com os teóricos do conhecimento e com seus colegas de trabalho.

Alfabetizar alunos de classes populares é possível, [...] sobretudo, com clima permanente de aprendizagem para os professores, porque “só ensina quem aprende”. Os professores têm que ter acesso às teorias mais atualizadas sobre como se aprende, às descobertas extraordinárias que os avanços em vários ramos do conhecimento ensejaram sobre o aprender e o não aprender, dando inclusive à didática o estatuto de um campo científico próprio, da maior utilidade e atualidade. (GROSSI apud FUCK, p. 11, 2003)

Concebendo o processo de sua própria aprendizagem, como um aprender contínuo o educador construirá a sua relação com a prática como um processo dialético de aprender/ensinar e, através da reflexão crítica sobre esta, irá contribuir para a construção da identidade do profissional que atua na EJA.

Dessa forma, o educador também despertará no aluno as qualidades de: ação, reflexão crítica, curiosidade, questionamento, inquietação, incerteza, comunicação, pesquisa, raciocínio lógico, sínteses e elaborações teóricas, organização e disciplina de/para seu próprio trabalho, independência e autonomia, tão importantes para a vida hoje. Enfim, o professor que aprende continuamente ajuda o aluno a organizar sua aprendizagem, a ser um aprendiz autônomo e a distância. Como expressa Shor in Shor & Freire, o professor “deve ser um aprendiz ativo e cético na sala de aula, que convida os estudantes a serem curiosos e críticos... e criativos.” (2000, p.18-19)

Nesse contexto, é importante que a formação de professores promova uma humanização63 do profissional para que assuma um compromisso com a aprendizagem significativa dos alunos e com o desenvolvimento de projetos em conjunto com outros colegas de trabalho.

A formação de professores, nessa perspectiva, torna-se um meio para a elaboração de teorias práticas no ensino. Por isso, a necessidade da elaboração de projetos que desenvolvam nos professores a competência de se tornarem pesquisadores da sua própria prática:

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A humanização é o caminho pelo qual os homens e as mulheres podem chegar a ser conscientes de si mesmos, de sua forma de atuar e de pensar, quando desenvolvem todas as suas capacidades pensando não somente em si mesmo, mas de acordo com as necessidades dos demais. (GLOSSÁRIO Paulo Freire – disponível em http://www.paulofreire.org)

É preciso fortalecer e apoiar os educadores, no sentido de serem investigadores criativos e reflexivos em suas práticas e de estabelecerem interações com os educandos nas quais respeitem sua cultura, seus valores e seu processo de aprendizagem, de saberem escutar e interpretar suas expectativas. O grande desafio consiste em estabelecer um processo de formação permanente, promovendo aprendizagens relevantes para a atuação profissional e para o desenvolvimento de práticas pedagógicas que respondam a um conceito amplo de alfabetização e às demandas educativas desses grupos.”(VÓVIO, 2004, p. 25)

Seguindo esta lógica, chega-se ao conceito de formação continuada64. Para Santos (1998), a formação continuada consiste em propostas voltadas para a qualificação do docente, tendo em vista as possibilidades de melhoria de sua prática pelo domínio de conhecimentos e de métodos de seu campo de trabalho. A autora sugere que os conteúdos, trabalhados nas diferentes modalidades de educação continuada, podem estar:

1) relacionados com a superação de problemas ou de lacunas na prática docente, ou

2) promovendo a introdução de um novo repertório de conhecimentos de natureza teórica ou prática, decorrentes da produção de novos saberes nas diferentes áreas de conhecimento.

Enquanto no primeiro caso o objetivo principal é trabalhar com base em diferentes tipos de deficiências diagnosticadas na prática docente, no segundo caso trata-se, sobretudo, de atualizar o professor e contribuir para seus processos reflexivos.

De acordo com Santos (1998), alguns educadores argumentam que as propostas de educação continuada produzem mais efeito quando partem de demandas feitas pelos próprios professores. Nesse contexto, os professores, muitas vezes, definem não apenas o conteúdo da formação, os problemas a serem tratados, mas também a sua forma e organização. No entanto, não podemos deixar de considerar que, em certos casos, a administração da escola pode, também, tomar a iniciativa e propor aos professores algum programa65 de educação continuada com o objetivo de melhorar a qualidade de ensino.

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Na literatura encontramos os termos Formação Permanente, Formação Contínua, Formação Continuada e Formação em Serviço – vou optar por utilizar Formação Continuada.

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Julguei importante trazer os termos utilizados para a formação de professores encontrados em PRADA (1997) ANEXO E

Candau citada por Mizukami (2002) comenta eixos para a formação continuada de professores:

¾ O lócus da formação a ser privilegiado é a própria escola, isto é, é preciso

deslocar o lócus da formação continuada de professores da universidade para a própria escola de primeiro e segundo graus66.

¾ Todo processo de formação tem de ter como referência fundamental o saber docente, o reconhecimento e a valorização do saber docente. ¾ Para um adequado desenvolvimento da formação continuada, é necessário

ter presente as diferentes etapas do desenvolvimento profissional do magistério, não se pode tratar do mesmo modo o professor em fase inicial do exercício profissional, aquele que já conquistou uma ampla experiência pedagógica e aquele que já se encaminha para a aposentadoria; os problemas, necessidades e desafios são diferentes e os processos de formação continuada não podem ignorar essa realidade promovendo situações homogêneas e padronizadas, sem levar em consideração as diferentes etapas do desenvolvimento profissional. (Ibid, p. 27-28)

Portanto, torna-se fundamental que os programas de formação estejam atentos a essas questões levantadas e que trabalhem para que o professor em formação tome consciência de si mesmo, das suas origens e preconceitos culturais e sociais e também para que a tolerância e a flexibilidade perante a diferença de gênero, raça, idioma sejam uma norma habitual do seu comportamento na aula. Gadotti (2005) defende:

Para nós, a formação continuada do professor deve ser concebida como reflexão, pesquisa, ação, descoberta, organização, fundamentação, revisão e construção teórica e não como mera aprendizagem de novas técnicas, atualização em novas receitas pedagógicas ou aprendizagem das últimas inovações tecnológicas. (GADOTTI, 2005, p.17)

Dessa forma, sabe-se que a legislação brasileira, garante a formação