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usada. Talvez se o papel permitisse colocar mais longe, assim teriam feito. Como fizeram com a “escola” (a flecha amarela indica seu local), longe, quase fora. No entanto, o professor, indicado pela flecha verde, está perto, junto desses sujeitos. Onde estão os agentes socioeducativos? O psicólogo, o advogado... onde estão as equipes do castelo em meio a essa rede social, a esse mapa tomado de luz, vida, cor, desejo, alegria, mapa em que o “amigo do mal” foi lembrado, colocado, discutido e até mesmo considerado importante nessa rede, tem os componentes importantes da família – o pai não foi mencionado como importante, não foi colocado (seria a ausência da figura do pai que torna as famílias desestruturadas?). Assim como os trabalhadores, eles não estão, eles não são importantes (?), eles não são. Eles não foram sequer lembrados.

[...] destacamos que a vida, durante a privação de liberdade, não está em estado de pausa ou suspensa. [...] Ela se faz em meios às durezas e sempre encontra outros caminhos, produz desvios diante do fazer prescrito e regulatório, diante do programado institucionalmente, diante do governo que dela se ocupa, que via de regra é pautado em modelos universais de modos de vida, de atendimento, funcionamento e de práticas. (ARAGÃO; MARGOTTO; BATISTA, 2012, p.18).

Em meio às durezas, nessa possibilidade de levezas, de conversa, de rasgos, de microlutas76, os jovens encontraram caminhos: o “jogar futebol”, “jantar”, o “amigo

do bem”, “novos amigos”, “o confidente”. A vida.

Talvez esse mapa represente um ou dez jovens em cumprimento de medidas socioeducativas de internação, talvez represente muito mais. Mas certamente esse mapa diz algo. Imagino que essas vozes puderam aparecer na medida em que o corte daquilo que está fixo, ordenado, definido foi possível, digo, na medida em que uma ação micropolítica foi possível, por isso

o diálogo ou a conversação obedecem aos cortes de uma segmentaridade fixa, a vastos movimentos de distribuição regrada correspondendo às atitudes e posições de cada um, mas também como eles são percorridos e arrastados por micromovimentos, segmentações finas distribuídas de modo totalmente diferente, partículas inencontráveis de uma matéria anônima, minúsculas fissuras e posturas que não passam mais pelas mesmas instâncias, mesmo no inconsciente, linhas secretas de desorientação ou de desterritorialização: toda uma subconversação na conversação, diz ela, isto é, uma micropolítica da conversação (DELEUZE, GUATTARI, 1996, p.63).

76 Compreende-se o conceito na perspectiva de Foucault (2006), que reconhece que as pequenas

relações, ações, lutas de poder derivam dos grandes poderes, neste contexto, o poder disciplinar. Em um nível mais microscópico,

por sua vez, a rede social pessoal pode ser definida como a soma de todas as relações que

um indivíduo percebe como significativas ou define como diferenciadas da massa anônima

da sociedade. (SLUZKI 1997, p.41)

Os pequenos movimentos, os ditos que saem da ordem da disciplina, do poder disciplinar (esse macro colocado em normativas, operando no dia a dia), bem como os desejos, a própria fuga ou tentativa de fuga podem ser vistas como movimentos de pequenas forças, a ação que desenvolvemos com trabalhadores e jovens se coloca como um movimento micropolítico.

Toda sociedade, mas também todo indivíduo, são, pois atravessados pelas duas segmentaridades ao mesmo tempo: uma molar e outra molecular. Se elas se distinguem, é porque não têm os mesmos termos, nem as mesmas correlações, nem a mesma natureza, nem o mesmo tipo de multiplicidade. Mas, se são inseparáveis, é porque coexistem, passam uma para a outra, segundo diferentes figuras como nos primitivos ou em nós - mas sempre uma pressupondo a outra. Em suma, tudo é político, mas toda política é ao mesmo tempo macropolítica e micropolítica (DELEUZE, GUATARRI, 1996, p.83).

Na perspectiva de Deleuze e Guatarri (1996) são pelas linhas de fuga que uma sociedade se define, alguma coisa sempre escapa, foge da organização estabelecida. Vamos ver nos subcapítulos a seguir que essas microlutas não se mostram apenas na voz, ações ou nos desejos dos jovens, mas também dos trabalhadores do castelo.

Mas antes preciso reforçar meu olhar quanto a estes jovens – pois esse também é um movimento dessa pesquisa, preciso dizer (e há de ser dito) que esses jovens “são”! Eles não são menores. Eles também são adolescentes, mas mais que isso, eles são jovens. E além de jovens, são filhos, amigos, pais, namorados. Eles são João, Marcelo, Felipe, Heitor... Eles são! Eles são! E devem ser tratados nessa condição singular de ser. Mas como pudemos ver pelas evidências trazidas aqui, no castelo, eles não são e não devem ser – a não ser na dimensão das micropolíticas, das fissuras, das frestas.

O que foi apresentado até aqui são evidências que dizem de uma punição rigorosa, de uma disciplina, de um assujeitamento dos corpos, das vidas dos jovens. Mas o que a mídia, os jornais dizem desses espaços, dessas unidades, desses castelos? O que é anunciado, escrito sobre eles? Será que apresentam algo próximo ao que pude indicar? E quanto aos sujeitos, o que mais se diz destes? Como são referidos nos meios de produção de informação? E pela voz comum? Seriam ditos semelhantes àqueles que eu trouxe como pista?

“Ás vezes o amigo mau, esse que fica levando a gente pro mau caminho é o

cara que mais tá perto da gente.”

Fala de um jovem - Notas do diário de campo

4.3.2. A voz dos trabalhadores: Trama entre o poder disciplinar e as microlutas

Assim como nos encontros dos jovens, os diálogos estabelecidos com os trabalhadores evidenciaram a força do poder disciplinar instaurado no castelo, e as microlutas constituídas nesse lugar.

Destaco dois momentos, os quais partiram da produção de cartazes desencadeada por determinadas questões77 as quais o leitor poderá ver nas

foto[carto]grafias a seguir.

Compreendo que há muitos fatores que nos inquietam e pertubam nestas produções, entretanto, buscarei salientar os pontos os quais o grupo se deteve em discutir, apresentando-se para este estudo como achados potentes.