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Francisco: participação política, religiosidade e família

PARTE 2 SINGULARIDADES NA CONSTRUÇÃO DE

2.5 Francisco: participação política, religiosidade e família

Francisco apresenta-se como alguém que tem esperança e que acredita no ser humano, em um mundo melhor e mais justo para todos. Por

isso, gosta de enfatizar que, desde a sua juventude, vem participando de diferentes movimentos sociais. Francisco construiu em São Paulo uma possibilidade de reinventar-se, ao se descobrir artista. Sua grande expectativa tem sido sustentar-se com a venda de esculturas em argila, pois, aos 47 anos de idade, afirma ter dificuldade de conseguir um trabalho no mercado formal.

A trajetória de rompimentos, a vida no "trecho" e a busca por diferentes possibilidades de vida de Francisco foram aqui reconstituídas com base nas entrevistas realizadas e em entrevista publicada no jornal O Trecheiro*, na qual contou sua história de vida, assim como nos meus registros dos encontros do Fórum de Debates sobre a População em Situação de Rua entre 2005 e 2006. Sua inserção em circuitos ligados à participação política, compondo alguns de seus "pedaços", e a possibilidade de criação de vínculos identitários, assim como outras redes de proximidade (como companheira e família), serão elementos importantes da análise para buscar uma compreensão desta experiência singular de construção de pertencimento e fortalecimento de identidades.

De Guarapari para o trecho

Francisco nasceu em Guarapari, no estado do Espírito Santo. De quatro filhos, é o mais novo e, por isso, reconhece que tem uma relação

*

Toda vez que for utilizado algum trecho desta entrevista será mencionada a fonte, fazendo a distinção das entrevistas realizadas por mim durante o trabalho de campo.

especial com sua mãe. Sua formação católica, herança desta relação materna, foi lembrada em diversos momentos:

— [...] eu venho dentro do catolicismo, sou católico pela minha mãe. Minhas características me levam até aqui, isso eu não vou esquecer nunca! Que eu mude, que eu não mude, minha característica é essa. Minha mãe me ensinou desde novo, quando eu ia dormir minha mãe me botava sentado na cama pra rezar com ela. Minha mãe rezando na frente, e eu atrás! Era uma coisa muito forte, pra você ver como é que são as coisas!

Além da influência materna na formação católica, Francisco participou da construção da primeira comunidade eclesial de base (CEB) de Vitória, marco importante para sua conscientização política, em um período em que o País vivia sob a rigidez do regime militar.

Até o falecimento de seu pai, quando tinha 17 anos, Francisco tinha uma vida "de classe média". Depois disso, passou a trabalhar e estudar à noite, devido às necessidades financeiras que se impuseram.

Concluiu o 2º grau, casou-se aos 23 anos e teve três filhos. Trabalhou como vendedor nas Casas Pernambucanas e participou ativamente do fortalecimento do sindicato do comércio de sua cidade*. A falta de

oportunidades de trabalho e dificuldades no casamento motivaram-no a procurar alternativas. Desempregado, resolveu sair de casa. Em entrevista ao jornal O Trecheiro, em agosto de 2005, comentou:

— Fiquei muito tempo desempregado e comecei a ficar angustiado. Aí teve um dia que resolvi correr atrás. Deixei um bilhete para minha esposa e fui trabalhar numa fazenda no Mato Grosso, com a idéia de melhorar. Só não sei se foi para melhor para mim ou para minha família. Hoje, acho que foi para melhorar para mim. Talvez foi para alimentar meu próprio ego, pois eu não

consigo viver na mesmice. Quando alguma coisa não está acontecendo, eu tenho que fazer acontecer.

E assim Francisco iniciou sua trajetória em busca por oportunidades em diferentes cidades brasileiras. Na mesma ocasião, revelou, ainda, que em 1983, veio de Mato Grosso a São Paulo pela primeira vez:

— A primeira vez que cheguei aqui em São Paulo, todo mundo já sabe: o cara, quando chega aqui, vai para a Praça da Sé. Comunicando com um e com outro, descobri a Pedra do Brás, famosa Praça do Brás. Ali tinha um hotel de vaga que não me esqueço. O nome dele era Rocha Sampaio, do lado da estação, perto do Leite Paulista. Hoje já não existe mais. Naquela época não tinha albergue, e a gente tinha que se virar. Neste tempo, eu trabalhava na Veritas Promoções e Eventos. Depois me tornei um "gato", pois contratava pessoas para trabalhar. Eu era conhecido como Alemão. Isto aconteceu em 1990 e 1991. Esta foi a melhor época de minha vida. Cheguei a ir para casa de avião. Só que isto durou somente um ano. Depois voltei para fazer bicos.

Francisco também esteve algumas vezes no Rio de Janeiro. Como havia poucas vagas em albergue na cidade, a praia era a única alternativa para dormir.

— Geralmente, quando vou para Vitória eu não venho direto para São Paulo. Adoro o Rio, inclusive já morei em Caxias. Eu trabalhava em Copacabana, carregando as barracas, para ganhar um dinheirinho. Dormia na areia de Copacabana, não tinha outro lugar.

Segundo Francisco, os retornos para casa de sua mãe — em Vitória (ES) — dependem, ainda hoje, da sua condição financeira, pois acredita que a família reage de maneira diferente quando está sem dinheiro. Refletiu, em muitos momentos, se "valeu a pena" ter deixado a família em busca de seu sonho; mas não tem dúvidas de que "o cara sai de casa pra vencer". É desta forma que percebeu sua trajetória e a de muitos migrantes brasileiros que

hoje se encontram em situação de rua. Sobre este tema, narrou uma história que transcrevo apesar de longa, por acreditar que seja muito importante para compreender a perspectiva de análise que Francisco desenvolveu sobre sua vida.

— Eu queria te contar uma história, essa história eu sempre conto, acho importante de você colocar também. [...] Com a queda do Império Romano, você sabe que se formaram os grandes feudos; o que eram os feudos? Eram uns senhores, chamados os senhores feudais, grandes donos de terra. Com a queda do Império é que se formaram os grandes países da Europa. Então essas pessoas eram aquelas que tinham mais soldados, que conseguiam mais terras, o valor dele é dado sobre os que tinham os melhores soldados, que eram os que tinham os melhores exércitos, maior detentor do dinheiro e da terra. Existia no Leste europeu um grande detentor de terras. Ele tinha um filho só. Então ele deu pra esse filho tudo que ele podia saber pra ser um grande general: mandou chamar espadachim da China, deu espada de ouro, pra ele se tornar um dos melhores. A melhor espada era dele. O melhor armamento, tudo que tinha no mundo de melhor o pai deu pra ele. Aí, quando alcançou a maioridade, o pai mandou que fosse numa guerra dessas, guerra de fronteiras, pra ganhar terra. Ele levou uma grande legião de soldados. Ele foi pra essa guerra e batalhou, batalhou, só que perdeu. Ele não conseguiu ganhar essa guerra, essa batalha pra conseguir mais terras pro pai. O que ele fez? Ele batalhando e perdendo, recuou, chegou pro general dele, falou: vai e fala pro meu pai que eu morri. Não, eu não posso fazer isso com o seu pai, ele tá te esperando, não faça isso! Você vai ter que jurar pra mim agora que você tem que voltar e falar pro meu pai que eu morri, estou te ordenando. Ele seguiu com o cavalo dele, pra que os outros não o pegassem; saiu fugido, e os outros retornaram pro reino dele. O general chegou lá e falou: olha, perdemos a batalha e seu filho morreu. Aquele senhor ficou arrasado: meu melhor filho! Tudo o que eu tinha, este terreno é dele, e agora está morto. Ficou muito triste. Foram passando os anos, e aquele general se sentiu — não, eu tenho que contar a verdade — e foi e contou a verdade pro rei: vou te contar a verdade. Qual verdade? O seu filho não

morreu. O quê? Meu filho está vivo? Tá, nós só não sabemos onde está. Não, eu vou achar ele! Aí mandou gente pra tudo que é lado, e acharam ele perto de uma taberna, bêbado igual morador de rua. Naquela época, não tinha albergue, não tinha assistente social, não tinha T.O. (terapeuta ocupacional), não tinha nada, então aquele tempo era complicado mesmo. Então, o que aconteceu? Ele se tornou uma pessoa alcoólatra, de vinho, suas mãos tremiam, já não era aquele soldado vigoroso que era, ele era um miserável, um homem de rua. Aí avisaram o pai dele, que veio correndo com aquela carruagem toda, aqueles cavalos árabes pra buscar ele. Chegando lá, encontrou ele: meu filho! Abraçou: meu filho, volta! Não, pai, eu não posso voltar. Mas tudo lá é seu! Pai, eu sou um perdedor! Mas você tem que voltar! Convence daqui, convence dali... Tá bom, eu vou voltar! Só colocaram ele na carruagem, e, quando chegou no meio do caminho, ele falou: pai, eu quero ir no mato, porque não tinha banheiro. Tudo bem, você quer que um soldado acompanhe? Não, me empresta só a sua adaga no caso de chegar algum animal. Aí ele desceu no mato e se matou! O pai dele estava esperando ele, dali a pouco foi lá ver, tava morto!

Francisco completou essa história dramática, analisando sua relação com a população em situação de rua:

— O morador de rua é exatamente esse soldado que veio pra lutar, só que ele veio aqui pra ganhar, ele não veio aqui pra perder! Você pergunta pra algum desses aí se eles querem voltar do jeito que eles estão pra casa deles: eles preferem morrer na Praça da Sé, bebendo cachaça, do que voltar do jeito que eles estão. Esses são os verdadeiros heróis!

Novas perspectivas em São Paulo

Para Francisco, dormir na rua significa correr alguns riscos: "[...] de ser assassinado, de nego tocar fogo em você, todo esse tipo de malvadeza". Porém, ao chegar a São Paulo em 2005, não encontrou alternativa. Por três

meses, dormiu no Largo São Francisco, ao lado da igreja, no centro da cidade. Sobre este período, relatou:

— [...] eu saía de lá cedo, levantava cedo, 6 horas. Ia lá pro Albergue São Francisco, pegava fila pra tomar meu banho, já guardava meu sabonetezinho lá no bolso, chegava lá tomava meu banho. Aí eu começava a me sentir gente por aí, não tinha jeito. Aí daí, pronto, ia fazer meus corre, sei lá, dava um jeito lá, arrumava um dinheiro, ia me virar de qualquer jeito.

Na análise de sua experiência e na observação de pessoas de seu convívio, Francisco ponderou o quanto é difícil livrar-se do que chamou de "estigma de mendigo". Para ele, há pessoas que assumem esta identidade, o que aconteceu com ele em certo período de sua vida, marcado por descuido com a higiene pessoal e excesso do consumo de álcool. Mas "[...] você tem que lembrar que é um ser humano e que aquilo ali não tem nada a ver com você [...]". Outra característica identificada por ele é acreditar que não têm direitos:

— [...] A gente fica castrado pra certo tipo de coisa, eu falo porque eu tava entrando nisso [...] eu tenho direito a ver sinfonia, participo de tudo isso, mas as pessoas acham que não têm direito a isso mais, porque não trabalham, porque tá pendurado no tempo aí, só vivendo de comida [...].

Foi na época em que dormia na rua que Francisco teve seus primeiros contatos com pessoas do movimento da população em situação de rua. Havia certa tensão com a mudança de gestão da Prefeitura, e o repasse de verbas para os serviços de atenção a pessoas em situação de rua estava suspenso. Desta maneira, um grupo de pessoas em situação de rua articulou-se para uma mobilização. Francisco lembrou esse momento:

— Quando eu voltei, não tava achando vaga em albergue nenhum, nem pernoite eu tava achando. Porque as entidades estavam sem dinheiro, tava todo mundo quebrado, o Serra entrou pra arrebentar todo mundo. Aí encontrei com Sebastião, e ele falou: Francisco, só tem um jeito. Ou a gente faz greve ou a gente vai ficar na pior! Aí eu falei: vamos fazer greve. O negócio é esse. A gente fica aí, se tiver que desmaiar, ir pro hospital, eles não vão deixar a gente morrer. E aí nós tivemos apoio das entidades, o pessoal apoiou a gente, o padre Júlio Lancelotti [...].

Essa greve*, na sua avaliação, foi o que possibilitou sua saída da rua, e

os contatos estabelecidos facilitaram sua aproximação com o Fórum de Debates e o Fórum da População, engajando-se na construção do movimento da população em situação de rua. Francisco não perdia um encontro do Fórum de Debates, sempre muito participativo. Afirmou que, "durante um certo tempo, vocês foram uma família lá, de 15 em 15 dias eu tinha que ir lá e ia com o maior carinho". Foi com apoio de integrantes do Fórum que conseguiu recontatar sua família. Além de transitar por este circuito de participação política, Francisco retomou suas atividades como artista. Em 2004, havia feito um curso de cerâmica no Albergue São Francisco, o que lhe deu base para a produção de suas peças, que passou a vender, principalmente, no circuito mencionado. Francisco insistia que tinha poucas chances de conseguir entrar no mercado formal de trabalho; em entrevista ao jornal O Trecheiro, em agosto de 2005, comentou: "Eu tenho 47 anos, e tenho consciência que para conseguir um trabalho vai ser difícil, então, eu tenho que me apegar aos bicos e à minha arte em cerâmica."

Ponderou, contudo, que sua trajetória o levou a criticar e rejeitar certos tipos de trabalho.

— [...] eu nasci vendedor e hoje sou escultor. Por que que eu sou escultor hoje? Porque, se eu ficar dentro de uma loja pra ficar em pé, atendendo as pessoas, eu acho que não consigo mais. Por quê? Minha experiência, estou botando a minha experiência, porque talvez, por tudo que eu já passei até hoje, por tudo que eu já segui até hoje, não porque eu não tenha paciência, eu tenho! Você vê que pra esculpir eu fico bastante tempo. É porque eu vejo as pessoas sendo tratadas diferente, até pela própria ideologia da loja, tem que tratar fulano assim, porque era filha de fulano de tal, eu passei muito por isso quando eu era vendedor. Nas Pernambucanas, eu trabalhei. Então hoje eu acho que eu não participo desse círculo, dessas coisas, hoje eu tenho uma mentalidade diferente.

A alternativa encontrada, mesmo que temporária, foi conciliar a bolsa da Frente de Trabalho e suas atividades de escultor*. Vale ressaltar que o

serviço que freqüentava foi sensível ao oferecer esta oportunidade:

— [...] consegui unir o útil ao agradável: eu consegui uma bolsa pra continuar a fazer os meus trabalhos. Eu falo isso, nego fica me olhando: pô, você é um sortudo! Converso com caras ligados à arte, você ganhar do governo um dinheiro pra trabalhar dentro da sua arte! Então, graças a Deus! E outros que têm que largar o negócio dele, tem muitos que tão varrendo o chão, passando um paninho no chão pra ganhar o dinheiro dele, seus R$ 250, 00. Então é por aí o caminho, é uma coisa meio transitória.

Um novo caminho abriu-se na esfera afetiva. Foi na Igreja São Francisco que encontrou Maria.

— [...] tá vendo como a religião ajuda? Eu a conheci dentro da Igreja São Francisco, eu te contei a história?

*. A distribuição das bolsas de Frentes de Trabalho tem sido realizada pelos

equipamentos sociais, que se encarregam, inclusive, de criar os postos de trabalho e acompanhar os trabalhadores. Nesta época, Francisco freqüentava o Albergue São Lázaro.

[...] Eu estava lá sentado, ela passou por mim, me olhou, ela passou de novo, me olhou; aí dei uma piscada pra ela, assim; foi, sentou atrás de mim assim, ficou um tempo ali. Tá me olhando, vai dar rock esse negócio! [...] É bonita essa história. Eu que já tinha desistido, vou morrer sozinho mesmo, tô falando sério, quem vai querer um morador de rua, com essa filosofia de política que eu tenho, tudo isso aí? Se eu fosse mulher, eu não ia me querer... Solidão é terrível, você vê as pessoas com namorado, companhia feminina. Isso é superimportante, passou esse tempo já era. E por incrível que parece encontrei meu pé torto pro meu sapato torto.

Francisco surpreendeu-se com a nova possibilidade neste relacionamento, mas não deixou de refletir sobre os conflitos que vivia diante da relação. Havia a diferença de classe social, fato que deveria ser sempre administrado em sua avaliação. Questionava-se que tipo de ajuda poderia aceitar de sua companheira. Achava justo, por exemplo, que ela o ajudasse financeiramente para um tratamento dentário: mas não aceitava receber um celular de presente nem freqüentar restaurantes caros. No entanto, a pressão para conseguir um trabalho passou a incomodar.

— [...] tem essa grande diferença social. Isso me incomoda um pouco, porque, querendo ou não, ela fica me pressionando: ah, você tem que trabalhar pra gente sair dessa! É uma coisa que... Me colocar contra parede, eu não vou produzir nada, eu dependo da minha arte [...] eu quero melhorar cada vez mais e eu vou sobreviver da minha arte e essa vai ser a minha meta, isso que eu planejei pra mim.

Esta relação durou certo tempo. As tensões no movimento das pessoas em situação de rua fizeram com que Francisco se distanciasse um pouco deste circuito. No final do trabalho de campo, havia se afastado dos Fóruns e do movimento, e fui informada de que, com o apoio da família, havia se internado em uma clínica de tratamento para dependentes de álcool.

A religiosidade e a inserção em circuitos de participação política parecem ser dimensões muito importantes na forma como Francisco foi tecendo suas redes — que, inclusive, colaboraram para sua reaproximação com familiares e com a nova companheira. Estas relações de proximidade (cf. Castel1) mereceram destaque nas reflexões de Francisco, assim como seu investimento em voltar a tecê-las.

Participação política e reflexões sobre a situação de rua

Sempre chamou atenção, de maneira positiva, a participação de Francisco nos debates que freqüentei. Uma característica muito marcante que observei nesse tempo de convivência foi sua capacidade de pensar e agir coletivamente. Sua trajetória de participação política iniciou-se com a formação da primeira Comunidade Eclesial de Base (CEB) de Vitória (ES).

— [...] Então eles tavam fundando uma comunidade de base lá, comunidade Jesus Menino, primeira comunidade de Vitória. Comecei cavando terra lá, agora tem até sala de informática lá, coisa que eu bato no peito e falo: essa foi uma das coisas que fiz e vou deixar aí. Isso não foi pra mim, não foi pra ninguém, é uma coisa pra todo mundo, uma coisa coletiva muito importante.

Ao discutir o evangelho, lembrou Francisco, o grupo conseguia conscientizar-se em relação aos abusos do governo brasileiro:

— Não podíamos falar aberto contra o governo, e nós éramos esperto. [...] Nas reflexões do evangelho, a gente colocava a vida real nossa e jogava o que poderia fazer pra melhorar a situação que nós estávamos, contra essa ditadura.

Essa participação foi um marco importante para a formação de Francisco ao avaliar que o processo "abriu minha mente".

O papel da Igreja Católica no processo de resistência à ditadura e de redemocratização do País foi lembrado por Gohn72: esta pesquisadora considerou as CEBs e as pastorais como movimentos sociais que contribuíram para a construção da cidadania dos brasileiros. Souza73 ponderou que, nos anos seguintes ao regime militar, em que lugares de articulação política, sindical e social estiveram fechados, a Igreja foi um espaço de "relativa liberdade de organização e ação". Para este autor, as CEBs tiveram papel muito importante:

Mas a presença decisiva foi das Comunidades Eclesiais de Base (as CEBs), que foram brotando em diferentes igrejas locais (Vitória, Goiás, Crateús e, logo depois, na periferia de São Paulo). Eram pequenos grupos de cristãos de setores populares que se reuniam para momentos de oração e de celebração de sua fé, mas também de reflexão sobre seus problemas concretos de trabalho, saúde, educação, direitos humanos etc. Havia uma ligação muito profunda entre fé e vida concreta, que estaria na base da reflexão latino-americana desses