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FRAUDE, GANÂNCIA E (DES)CONFIANÇA

No documento Política e Negócios (páginas 77-89)

1. Bernard Madoff. Até há poucos dias, este nome dizia pouco, ou nada, ao cidadão comum. De repente tornou-se o centro de todas as atenções, de todas as crónicas, de todas as imprecações. A fama (ou infâmia?) associada ao nome tem a ver com o facto de Bernard Madoff, um corretor e gestor de fundos nova-iorquino, ter perpetrado uma das maiores, se não a maior, fraude financeira de todos os tempos. O número avançado é astronómico. Cerca de cinquenta mil milhões de dólares. Um pouco por todo o mundo os indivíduos e instituições afectados vão dando sinal de si. Portugal, e alguns portugueses, também aparecem na lista, embora numa modesta posição, em termos de grandeza. Segundo o Banco de Portugal, que efectuou um levantamento das posições dos investidores nacionais, a exposição nacional à fraude rondará os 85 milhões de euros. No entanto, eu, modesto funcio- nário público, também me considero vítima desta fraude e, nem por isso, o Banco de Portugal teve em consideração tal facto na sua análise. Limitou-se a somar as potenciais perdas dos ricos (um termo que passou a estar muito

em voga ultimamente).

2. O valor da fraude deixa-nos relativamente indiferentes, embora represente cerca de um quarto da riqueza produzida em Portugal durante um ano. Tal indiferença dever-se-á, sem dúvida, ao facto da opinião pública ter vindo a ser anestesiada nos meses mais recentes com números da ordem das centenas de milhares de milhão de dólares, por virtude da crise financeira mundial que se está a viver e das consequentes intervenções que os governos têm efectuado para estimularem a economia e apoiarem o sistema bancário. Tendemos a prestar mais atenção aos detalhes que nos possam fazer perceber como foi concretizada tal fraude, do que à dimensão da mesma. Com efeito, a acreditar no que se ouve e lê nos media, esta fraude

parece desafiar aquela velha máxima de que é impossível enganar todos todo o tempo. Não só parece ter-se desenrolado ao longo de dezenas de

anos, como foi levada a efeito nas barbas de instituições financeiras, regula-

doras e de controlo que julgávamos acima de qualquer possibilidade de serem ludibriadas deste modo e em tal dimensão. Espero, ansiosamente, por detalhes que me façam perceber como tudo aconteceu, pois, no momento, não consigo sequer imaginar o modus operandi da fraude. A minha curiosi-

dade não se inclui no que habitualmente se designa por curiosidade mórbida, isto é, na apetência do ser humano pelos ínfimos detalhes de desastres e catástrofes. Considero que a minha curiosidade é de natureza positiva. Os detalhes de cada fraude, os desta em particular, fornecem informação importante para ajudar a precaver a ocorrência de situações análogas no futuro. Para já, aquilo que parece ser um ingrediente básico desta fraude é a ausência de divisão de funções no negócio de Bernard Madoff: o seu grupo era, simultaneamente, o corrector que fazia as compras e vendas dos activos no mercado e o gestor dos fundos de investimento e das fortunas dos clientes deixadas a seu cargo. Estava criada a condição primeira para que o sistema de controlo interno não funcionasse e, por consequência, o ambiente para a ocorrência da fraude. Ninguém, ou quase, parece ter dado importância a tal facto.

3. “Ganância”, do Castelhano ganancia, lucro (dicionário Texto Editores).

Em português, o primeiro dos significados propostos para ganância é ambição de ganho. Com o explodir da crise financeira internacional, em Agosto do

corrente ano, a origem da mesma foi assacada por determinadas corren- tes ideológicas à ganância dos banqueiros, que terão forçado a concessão

de crédito a quem não tinha condições para o obter. Não fui subscritor de tal explicação. Considerei e considero que a ganância, a ser a razão princi- pal, estava tanto do lado dos banqueiros como de quem tomava os créditos. Basta pensar, por exemplo, que parte do crédito à habitação que veio a ser incorporado nos denominados produtos tóxicos teve por detrás a expecta-

tiva dos investidores na valorização dos imóveis a curto prazo. Em minha opinião, todo o ser humano tem o seu bocadinho de ganância. A dimensão

desse bocadinho, ou o modo como este é controlado, dependerá dos valores

éticos de que cada um está imbuído. Os brasileiros costumam usar, a título de máxima, a expressão quando um não quer dois não dançam. No caso de

uma qualquer transacção financeira, a ganância de uma das partes só será satisfeita se da outra parte existir um sentimento de idêntica natureza.

4. No caso da fraude em apreço, nenhum dos intervenientes fica bem na fotografia. Bernard Madoff, obviamente, por ter sido o perpetrador do

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acontecimento. Aquilo que se intui é que a sua ganância não foi de índole

estritamente financeira, mas sobretudo de índole social e de preservação de uma imagem de sucesso pessoal. Do lado dos intervenientes passivos – reguladores, auditores, investidores –, os dois primeiros pecaram por incapa- cidade em interpretarem os sinais de fraude que ao longo do tempo vieram à superfície – o que é espantoso, pois se trata de instituições dotadas dos técnicos mais qualificados. Os investidores são culpados em primeira linha por excesso de ganância. Segundo a informação disponível, os fundos de Madoff pagaram ao longo de muitos, muitos anos, independente do ciclo dos mercados, retornos anuais relativamente estáveis entre os 12 e os 15%, superando a tendência de longo prazo da rentabilidade do mercado de acções americano, que não chega ao 12%. Se adicionalmente se tiver em consideração que os retornos pagos apresentavam entre si uma correla- ção temporal positiva quase perfeita, quando a teoria financeira apresenta evidência de que os retornos de mercado têm correlação negativa – se num ano aumentam, no seguinte tendem a diminuir –, não se pode atribuir a atitude passiva dos investidores dos fundos de Madoff, onde se incluem bancos como o Santander ou fundos de investimento e sociedades gestoras de fortunas, a outra razão que não fosse a ganância. Esta, condicionou-os nas suas decisões financeiras. Um psiquiatra norte-americano, questionado para explicar a atitude de tais investidores, atribui o respectivo comporta- mento ao que denominou de euforia irracional. A rentabilidade obtida nas

suas aplicações era o ópio dessa euforia, toldando-lhes o discernimento para

se aperceberem de que alguma coisa estaria mal em fundos que pagavam tais retornos, e que diziam usar estratégias de investimento que nenhum outro fundo conseguia reproduzir em termos de rentabilidades. Ganância da mais elevada pureza. Hoje, muitos desses investidores aparecem a reclamar judicialmente os seus créditos transvestidos de virgens enganadas. O

cidadão comum sente-se revoltado, até porque receia que, no limite, tenha de ser ele a pagar as euforias de um conjunto de (gananciosos) investidores. 5. Tudo o mais constante – ou usando a celebre expressão tão do agrado dos economistas, ceteris paribus –, em termos económicos a fraude é inócua.

Não implica destruição de riqueza, mas tão só a respectiva redistribuição. Por isso, Bernard Madoff poderia ser considerado uma variante moderna do lendário Robin dos Bosques. O que ele fez, na essência, foi roubar alguns dos

seus ricos clientes, distribuindo o produto pelos restantes (igualmente ricos) clientes. Faltou nesta redistribuição um cheirinho de luta de classes, em que

os ricos fossem espoliados em favor dos pobres. Tivesse isso acontecido e possivelmente o modo como hoje olharíamos para este caso seria diferente. Teríamos, certamente, um olhar mais complacente para com a actuação de Madoff. Mas não foi assim. O critério da redistribuição foi mais asséptico. Os prejudicados foram os últimos a entrar nos fundos, para benefício dos que entraram primeiro. Tal como nos banquetes, chegar primeiro compensou.

6. Pelo que acabo de referir, o leitor poderá ser levado a concluir que as fraudes em geral, a que se vem discutindo em particular, não são situações a temer dada a ausência de efeitos económicos. Não é correcto. Aliviando o pressuposto redutor que está subjacente ao ceteris paribus, verifica-se

que há efeitos sociais e económicos resultantes da fraude. Para o caso em apreço, o principal desses efeitos ocorreu, e vai continuar a produzir impacto, ao nível da confiança dos agentes económicos. Sejam estes investidores activos, sejam meros aforradores, a confiança que depositavam no sistema financeiro, e nas instituições que regulam e supervisionam o respectivo funcionamento, saiu necessariamente enfraquecida. Tendo em consideração que a fidúcia (confiança) é o cimento agregador desse sistema, escusado será discutir as consequências económicas resultantes da existência de fraudes como a perpetrada por Madoff. No período que estamos a viver, com uma crise financeira que está longe de estar resolvida, tais impactos negativos na confiança correspondem a mais um tiro no casco de um porta-aviões que os

líderes políticos e financeiros da generalidade das economias mais desenvol- vidas se esforçam por manter a flutuar no meio de ondas alterosas. Mesmo quando os efeitos da fraude não extravasam do interior das empresas onde são produzidas, os efeitos negativos sobre a confiança tendem a ocorrer, minando as relações entre as pessoas. A fraude tem, portanto, efeitos sociais e, por essa via, efeitos económicos. É, pois, um mal a combater por todos os meios. No caso Madoff não faltam, infelizmente, áreas – da regula- ção à auditoria – a necessitar de intervenção imediata profunda, autênticos campos de batalha onde se irá jogar a estabilidade e credibilidade futuras do sistema financeiro e económico mundial.

7. Não consigo traduzir em euros as minhas perdas com a fraude. É um facto que não tenho aplicações directas em tais fundos. A estreiteza do meu rendimento não me permitiria, mesmo que o desejasse, ter acesso ao selecto clube dos investidores que colocavam as suas fortunas nas mãos de Madoff. No entanto, já não estou completamente seguro de que algum do dinheiro que nos últimos anos investi num PPR (Plano Poupança Reforma)

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não tenha sido para aí canalizado. Independentemente do que a este último nível tenha acontecido, a minha principal perda ocorreu no domínio da confiança no sistema financeiro e nas instituições onde deposito as minhas magras poupanças. Já dei comigo a pensar se não fará mais sentido voltar aos tempos da minha infância, replicando a estratégia de investimento dos

cidadãos da aldeia onde então morava, que guardavam o magro pé-de-meia

no meio do folhelho de um qualquer colchão lá de casa. Nas minhas cogita- ções, quando estou mais por baixo e os mais negros pensamentos me avassa-

lam, dou por mim a pensar que talvez nem valha a pena manter um estilo de vida que se baseia na contenção dos gastos, para reter uns euros que me possam ajudar a viver esse futuro incerto em que serei reformado. Quando o Governo aparece a propor-se ajudar tudo e todos, independentemente dos seus comportamentos financeiros actuais e passados, eu mais me convenço que a melhor estratégia de consumo a seguir é a que se costuma traduzir, em linguagem popular, por chapa ganha, chapa batida. No futuro, o Estado,

através do Governo, lá estará para me estender a mão generosa e me apoiar financeiramente através de um qualquer subsídio social destinado às vítimas da sociedade de consumo ou de investimentos financeiros arrojados. Nessa

altura, engolirei a minha actual descrença num Estado omnipresente que sufoca a sociedade, tomarei um Alka Sezer para ajudar à digestão, e gozarei

os proventos recebidos por essa via.

8. Reli a crónica. Estou mesmo em baixo. Os acontecimentos dos últimos

tempos, da crise financeira à fraude de Madoff, colocaram a minha confiança no sistema financeiro, no Estado e nos outros, de rastos. Isso nota-se.

José António Moreira 2009-01-06

1. “satyam”, “verdade” em sânscrito. Em 1987 Ramalinga Raju, um jovem empresário indiano, deve ter achado o termo deveras apelativo e passível de penetrar facilmente no mundo globalizado dos negócios. Decidiu inclui- -lo no nome da sua novel empresa, a Satyam Computer Services, Ltd. Fosse pelo nome, fosse pelo engenho do empresário, ou por efeito de ambos, o facto é que a empresa, dedicada ao “outsourcing” informático e à venda de “software” empresarial por medida, verificou desde então um crescimento assombroso. Foram 20 anos de contínua ascensão. Os últimos números falam por si: operações em mais de 60 países, mais de 50 000 empregados, volume de negócios superior a mil milhões de dólares por ano, carteira de clientes que inclui as maiores empresas mundiais. O reverso desta história paradigmática de “sucesso” aconteceu, subitamente, no início de Janeiro, quando o presidente e fundador da empresa, Raju, enviou uma carta ao seu conselho de administração dizendo que as contas publicadas pela empresa estavam inflacionadas e que, dos cerca de 1,1 mil milhões de dólares de depósitos e caixa referidos no balanço, cerca de mil milhões pura e simples- mente não existiam, eram um mero registo contabilístico sem suporte real. As acções da empresa, cotadas em várias bolsas, caíram a pique. A Índia entrou em estado de choque ao constatar que o seu ídolo, o “self-made man” Raju, afinal tinha pés de barro.

2. Uma grande fraude, com o ingrediente habitual: perpetrada por uma pessoa que estava acima de qualquer suspeita. Foi assim com Bernard Madoff, muito recentemente, foi agora com Ramalinga Raju. Para se ter ideia da imagem social e empresarial deste homem tenha-se presente que é um filantropo com obra feita na ajuda a populações carenciadas, tem vários doutoramentos “honoris causa”, foi eleito em 2007 pela Ernest & Young o empresário do ano. Era considerado, pela população, como sendo modesto e honesto. O que se conhece do “modus operandi” da fraude, a partir da

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carta que endereçou aos seus administradores, não coloca em causa a sua honestidade pessoal – chegou a tomar empréstimos pessoais para manter a empresa a funcionar –, mas tão só a sua honestidade como empresário. Com efeito, os “buracos” nas contas terão começado, há vários anos, com um pequeno ajuste nos resultados da empresa, de modo a não defraudar as expectativas do mercado bolsista e seus analistas. Aquilo que na gíria se designa por um “dourar dos resultados” e que, com mais frequência do que seria desejável, muitas empresas praticam. O objectivo desse tipo de actuação é, em geral, divulgar resultados superiores aos que a empresa efectivamente verificou no período, a partir de uma escolha criteriosa das regras contabilísticas adoptadas ou, então, de uma escolha do “timing” das transacções. Por exemplo, a contabilização no período corrente (“período 0”) de uma venda pertencente ao período seguinte, ou o “atirar” para períodos futuros de custos de operação que seriam de considerar no período a que as contas respeitam. São o tipo de actuação que, em geral, até por falta de uma fronteira bem definida entre o que é fraude e o que é uma actuação dentro das regras contabilísticas geralmente aceites, se considera cair dentro desta última categoria. Daí a pouca importância que se tende a tributar a tais casos, mesmo quando o respectivo impacto é visível para o destinatário da informação. Veja-se, no caso em apreço, que um membro da Bolsa de Bombaim, onde as acções da empresa também estão cotadas, refere que sempre tinha havia a sensação de que a Satyam usava uma “contabilidade criativa” – outro termo correspondente a “dourar dos resultados” –, mas que não se julgava compaginar uma situação de fraude. Isto é, fechavam-se os olhos, descansavam-se as consciências, porque, “apenas”, se tratava de “contabilidade criativa”.

3. O perigo associado ao uso de criatividade na contabilidade das empresas está naquilo que tecnicamente se designa como “reversão dos efeitos”. A contabilidade não cria valor, limitando-se a registar este num ou noutro período, consoante as soluções preconizadas pelo preparador da informação. O valor é criado pelas operações efectuadas pela empresa. Portanto, quando se antecipa a escrituração de resultados num dado período, eles irão faltar no ou nos períodos seguintes. Trata-se de um “empréstimo” de resultados. Voltando ao exemplo anterior, se no período 0 se contabi- liza uma venda que pertenceria ao período 1, o volume de negócios deste irá ressentir-se negativamente dessa falta. E aqui duas situações podem ocorrer. Primeira, as vendas do período 1 cresceram independentemente da

criatividade aplicada no período 0, e a reversão do efeito manipulativo tende a ser acomodada, passando desapercebida. É este pressuposto de cresci- mento do negócio que tende a estar presente no espírito de quem adopta este tipo de actuação, assumindo o período 0 como um ano excepcionalmente mau e o período 1 como um ano excepcionalmente bom. Segunda, infeliz- mente nem sempre tal pressuposto se concretiza e o volume de negócios do período 1 pode ser tão decepcionante ou mais do que o do período anterior. É o que tende a acontecer, por exemplo, em tempos de crise económica e financeira. Agora, a não se fazer nada, o efeito da reversão nos resultados torna-se visível, pois parte daquilo que devia ser reportado como resultado do período 1 já constou do resultado do período anterior. O gestor tem de fazer uma escolha difícil: ou divulga o resultado do período 1 tal como ele é, com todas as consequências que daí podem advir para a cotação das suas acções em bolsa; ou volta a usar de criatividade contabilística, agora para esconder o efeito cumulativo dos maus resultados dos períodos 0 e 1. No caso da Satyam, segundo Ramalinga Raju, esta segunda opção foi escolhida. Tudo começou com um pequeno ajustamento dos resultados, que nos anos seguintes se foi repetindo, procurando esconder uma realidade cada vez mais desfasada dos números contabilísticos divulgados aos investidores em cada período. Portanto, este caso é um exemplo paradigmático de que o uso de criatividade nos números contabilísticos, não legalmente punível e muitas vezes com efeitos iniciais moderados nos resultados, pode vir a ser o embrião de situações de fraude de elevada dimensão. A partir de determi- nada altura o processo de esconder o “buraco contabilísico-financeiro” deixa de ser controlável, e passa a impor o seu próprio ritmo ao gestor. Isso mesmo pôde comprovar Raju, que descreve tal processo como sendo semelhante ao “cavalgar de um tigre sem saber como sair de cima dele sem ser comido”. E tudo começou com um pequeno ajuste contabilístico.

4. Diz-se frequentemente que a “memória das pessoas é curta”. Se se admitir que o espaço nela disponível – qual disco de computador – é finito, à medida que nova informação vai sendo registada, haverá que apagar informa- ção antiga. Neste contexto, pode-se aceitar aquela “máxima”. Porém, há pessoas que, pelas funções que executam, não podem ter memória curta. Pelo contrário, têm de preservar a memória de situações passadas com vista a dela fazerem uso no tratamento de situações actuais. É o caso dos auditores. Na fraude da Satyam, não saíram bem vistos. Pelo contrário. A pergunta que se faz é como foi possível que ao longo de vários anos as contas da empresa

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fossem certificadas quando parte dos activos constantes do balanço – e de modo especial os depósitos – não existiam na realidade. Quer os auditores internos, quer os externos (PricewaterhouseCoopers), deixaram passar em branco, de forma sistemática, tal situação. No entanto, o caso Satyam tem muitas semelhanças com o caso do grupo italiano Parmalat, igualmente de triste memória, onde a fraude descoberta em finais de 2003 também estava acantonada em depósitos que não existiam. Em ambos os casos, a gestão dos depósitos estava adstrita a uma única pessoa – na Satyam era ao seu presidente, Raju –, ninguém mais tinha autorização para lhes mexer. Não seria isto motivo de desconfiança para os auditores internos e externos? Conheci- dos casos anteriores com contornos semelhantes, não seria de esclarecer a situação? A resposta a estas perguntas é, necessariamente, afirmativa, embora o procedimento concreto tenha sido, como resulta do desfecho conhecido, o oposto. O pior de tudo é que a opinião pública, os mercados financeiros em particular, já parecem ter assumido que os auditores não auditam, que não são confiáveis, mesmo quando se trata de uma Big4. Quase não se comenta a

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