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CAPÍTULO 3 | DESIGN DE PRODUTOS

3.6 A forma segue a ideação : funcionalidade, racionalidade e emotividade no

3.6.1 Funcionalidade

Refere-se aos aspectos de uso dos elementos urbanos, tanto do ponto de vista individual quanto coletivo, abarcando as funções práticas do produto. Observam-se os fatores fisiológicos do homem (aspectos ergonômicos e antropométricos) que facilitam ou comprometem as condições funcionais e a usabilidade62 do produto pelos usuários, tendo por finalidade o conforto, a facilidade

62 “A usabilidade descreve a facilidade com que o usuário de produto pode compreender

no manuseio e no uso dos produtos, como também o emprego de materiais e tratamentos superficiais e adequados às tarefas e condições ambientais, adequação das diferenciações posturais e dimensionais dos indivíduos. Para Serra (2000, p. 07)63,

[...] a Funcionalidade é necessária porque os elementos devem atender às condições funcionais e de uso. Devem servir, ser úteis e o desenhista deve sentir essa utilidade. O espaço urbano não pode nem deve suportar objetos de uma utilidade duvidosa nem de uma utilidade plagiada de outras culturas e necessidades.

“O objetivo principal do desenvolvimento de produtos é criar as funções práticas adequadas para que, mediante seu uso, possam satisfazer as necessidades físicas” (LÖBACH, 2010, p. 58), ou seja, as funções práticas devem corresponder as expectativas dos usuários com relação aos usos dos produtos, atendendo às suas demandas por artefatos úteis que os auxiliem na consecução de atividades diárias fundamentais, como sentar, erguer, transportar, deslocar (se), e que mantenham sua integridade física sem provocar problemas motores ou frustações de ordem psicológica pois a não observância de parâmetros ergonômicos, antropométricos, de segurança e de conforto, podem provocar situações inadequadas no uso do artefato, inclusive acidentes.

A capacidade do produto em suportar a carga do corpo humano, angulações e curvaturas indicadas para o encaixe e o conforto da coluna vertebral; e dimensões adequadas para aberturas, apoio e manipulação, são requerimentos funcionais inerentes ao desempenho fisiológico do produto que interferem no processo de uso. Funcionalidade também se refere ao uso adequado do espaço público, no sentido de qualificá-lo a partir da organização do mobiliário (distribuição, arranjo físico), da sua configuração geral (dimensionamento, escala, proporção) e o eficiente emprego de materiais e tratamentos superficiais (conforto térmico, visual, tátil).

2008. P. 57.

63 Tradução livre: La Funcionalidad es necesaria porque los elementos tienen que cumplir unas condiciones funcionales y de uso. Han de servir, ser útiles y el diseñador ha de sentir esa utilidad. El espacio urbano no pude ni debe soportar objetos de utilidad dudosa o de utilidad trasladada de otras culturas o necesidades. Serra, Josep Ma. Elementos urbanos. Barcelona, 2000.

O conceito de funcionalidade não deve restringir-se apenas à resolução de questões de ordem meramente técnica e/ou tecnológica; mais do que isto, vários outros fatores moldam e definem a estrutura do objeto industrializado no sentido de torná-lo funcional ao indivíduo, seja através do processo de uso, ou através do significado do uso (sensações, memória, experiências, percepções). Como explana Baudrillard (2008, p. 69-71), o conceito de funcionalidade é amplo e,

[...] Cores, formas, materiais, arranjo, espaço, tudo é funcional. Todos os objetos se pretendem funcionais como todos os regimes se pretendem democráticos. Ora este termo, que encerra todos os prestígios da modernidade, é particularmente ambíguo. Derivado de “função”, ele sugere que o objeto se realiza na sua exata relação com o mundo real e com as necessidades do homem. Efetivamente, resulta das análises precedentes que “funcional” não qualifica de modo algum aquilo que se adapta a um fim mas aquilo que se adapta a uma ordem ou a um sistema: a funcionalidade é a faculdade de se integrar em um conjunto. Para o objeto é a possibilidade de ultrapassar precisamente sua “função” para uma segunda função, de se tornar elemento de jogo, de combinação, de cálculo, em um sistema universal de signos.

Os produtos urbanos devem ser concebidos com o propósito de atuarem como mediadores entre o sujeito e o espaço público na realização de suas atividades, porém para que isto aconteça é imprescindível que o indivíduo reconheça e compreenda o artefato urbano em seus aspectos funcionais, utilizando- o da maneira mais apropriada, fazendo com que o produto atinja a finalidade para a qual foi criado. Cardoso (2012, p. 63) argumenta que não existe apenas uma “função” para o produto, mas “funções” que determinam as ações dos usuários no processo de uso do artefato industrializado, segundo uma estrutura hierárquica de atributos designados para tal, conforme especifica De Moraes (2010, p. 91-92),

Função principal (ou básica), que corresponde à função operativa do produto. Essa função deve ser salvaguardada e mantida mas não é suficiente para garantir o sucesso do produto no mercado;

Funções secundárias, que correspondem às funções suporte ou de melhoramento para execução da função principal que podem, ao contrário, ser determinantes para o sucesso de um produto;

Funções de uso, que representam ações no campo físico e concreto e são normas facilmente mensuráveis e quantificáveis na definição das características;

as torna de difícil mensuração e quantificação. Essas funções contribuem, em grande parte, para a definição dos valores formais dos produtos.

Essas várias funções compõem a estrutura geral do produto possuindo um caráter relacional entre si a fim de satisfazer às necessidades dos usuários em todos os aspectos físicos e psíquico-sensoriais do objeto. Este equilíbrio deve pautar-se, prioritariamente, nas necessidades do sujeito por produtos que, qualitativamente, correspondam tanto às suas expectativas emocionais quanto funcionais. Sendo os produtos urbanos criados para atender às carências de seus usuários no espaço público, a manutenção e a conservação daqueles são parâmetros preponderantes para a vida útil do produto e sua existência física no ambiente urbano. Produtos entregues “à própria sorte” no ambiente urbano sofrerão rápido desgaste da sua estrutura física e, consequentemente, de suas funções, conduzindo a usos inadequados que comprometerão o desempenho e o ciclo de vida aproximando-o mais rapidamente da sua destruição, reduzindo seu valor de uso.

O mobiliário urbano levado a situações de grande desgaste em sua funcionalidade compromete a realização de certas atividades pelos cidadãos auxiliados por aqueles artefatos, prejudicando a organização, a legibilidade, a ordem e o conforto, quase sempre influenciando no uso do espaço público. Novos recursos técnicos decorrentes do progresso tecnológico devem ser acrescentados aos produtos, como forma de ampliar o raio de atuação do mobiliário urbano, fornecendo-lhe os atributos necessários para melhorar seu desempenho no espaço público.

John e Reis (2010, p. 196) esclarecem que, quando bem frequentados, os espaços públicos têm maior possibilidade de serem bem-sucedidos do que outros menos frequentados ou não frequentados. Uma vez que o mobiliário urbano funciona como atrativo para a apropriação desses locais pelos indivíduos, deduz-se que elementos degradados interferem na apropriação e na percepção dos espaços, levando-os à degradação e isolamento. Para De Moraes (2010, p. 89),

A funcionalidade e a usabilidade são, realmente, muito importantes, mas outras relações também devem ser consideradas na interatividade do homem com os objetos como: o prazer, a alegria, a excitação, o medo e a ânsia dentre muitos outros mais.

Uma vez posicionados, no espaço público, o mobiliário deve espelhar a ordem e a clareza urbana da cidade, pois, como argumenta Serra (2000, p. 08) “cada elemento deve buscar seu lugar e não modificá-lo como ocorre com frequência”. Assim, como o mobiliário urbano influencia o meio onde está instalado, o ambiente também exerce significativa interferência sobre o produto devendo este apresentar características funcionais que estejam em sintonia com a qualidade ambiental da infraestrutura de cada contexto específico onde se encontre como no coletor mostrado na Figura 16.

Os coletores Big Belly instalados em alguns locais da cidade de São Paulo apresentam tecnologia, design e funcionalidade que facilitam o manuseio, armazenagem e coleta dos resíduos urbanos contribuindo para a qualidade dos serviços urbanos e para a redução dos custos com manutenção e coleta.

Figura 16 - Lixeira Big Belly - Lixo compactado, limpeza e redução nos custos de manutenção e coleta64

O mobiliário proporcionará, ao usuário, uma relação de uso mais intensa e duradoura à medida que a ideia de conjunto e coerência se torna evidente levando as pessoas a interagirem de modo mais efetivo com aqueles objetos obtendo a satisfação de suas necessidades durante o processo de uso e da compreensão das funções atribuídas àqueles produtos, provocando reações sensoriais, psicológicas e emocionais, que facilitam a interface homem-produto-ambiente.

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Fonte - Foto 1: http://www.blogdasppps.com/2014/04/sao-paulo-ganha-papeleiras- inteligentes.html?spref=fb. Acesso em: 24/04/2014

Foto 2 - http://extra.globo.com/noticias/brasil/rua-em-regiao-luxuosa-de-sao-paulo-ganha- lixeiras-que-mandam-mensagens-para-celular-usam-energia-solar-12266620.html. Acesso em: 13/06/2014.

De acordo com Norman (2008, p, 93) “tarefas e atividades não são bem auxiliadas por recursos isolados. Elas exigem atenção à sequência de ações para alcançar a meta final, isto é, as verdadeiras necessidades”. Norman (2008) ajuda a entender que o design de qualquer tipo de objeto deve estar orientado a um projeto sistêmico no qual o somatório de todas as partes que compõem o produto é maior que o resultado final envolvendo vários fatores que realimentaram o próprio design. Portanto, requisitos concernentes à funcionalidade devem também considerar parâmetros relacionados à ética, a cultura, a sustentabilidade, a identidade e a estética como forma de obter soluções inovadoras e criativas que qualifiquem o espaço público e o cidadão se sinta valorizado.